PAZ
E VENTURA
“A
Maria, a Senhora Eleita, a chefe das falanges que socorrem nas
trevas, dedicamos a narrativa seguinte, agradecendo enternecidamente
a sua graciosa cooperação na transmissão da mesma.”
M.E.B.
PAZ
E VENTURA
Estar
em dia com as leituras sobre a Lei de Deus e o Evangelho não
significa que se esteja em dia com aquelas obras que a Lei e o
Evangelho concitam; porque é
muito fácil conhecer,
propalar, fazer berreiros aos semelhantes, mas
não é fácil viver
as lições e ordenanças que os dois excelsos documentos comportam.
E é por isso que os abismos da subcrosta e os umbrais estão cheios
de criaturas tituladas com as mais variantes colorações religiosas
do Planeta.
A
bem pensar, ou pensando simplesmente, qualquer um pode chegar à
conclusão de que, realmente, a Justiça Divina jamais poderia estar
conforme com os exteriorismos que as religiões fabricam e exportam a
bom dinheiro, quando nisso ficam, pois com eles costumam, acima de
tudo, manobrar governos e impor suas imperativas ditaduras, na
certeza de que, pelo fato de serem fabricadas e impostas em nome de
Deus, todos as aceitam, cabisbaixos, submissos, pagando ainda para
assim se revelarem ignorantes e ridículos.
O
único grande tribofe da História é, sem dúvida, o tribofe
religioso, pois é aceito e pago, em nome de Deus, curvando-se as
vítimas defronte aos tribofeiros, pelo fato de terem sido
suficientemente ludibriados. Dir-se-ia alguém, bastante roubado, que
viesse por fim a pedir uma ficha de estulto, para em apresentando-a,
obter as palmas de uma assembléia de outros tantos infelizes.
Já
disse alguém, de vosso plano de vida, que se a metade dos que berram
em nome do Evangelho no mundo, vivesse a metade do que o Evangelho
ensina, desde muitos séculos a Terra não seria mais um mundo de
guerras, pestes e fomes. Infelizmente, os temas evangélicos são
comumente transformados em cabides de vaidades e interesses
subalternos, sendo muitas vezes usados para ocultar os mais hediondos
crimes. Tudo serve de reposteiro, no mundo, para ocultar vergonhosas
ações; e os motivos celestiais, embasados na Lei de Deus e no
Divino Exemplo do Cristo, são os preferidos, pois com eles costumam
obter, não apenas a justificativa dos erros, mas também as
ridículas curvações das próprias vítimas.
Desde
remotos dias, no início das Iniciações Fundamentais, e por infeliz
acréscimo, depois da vinda do Cristo, grupos de homens, com manias
clericais e desejosos de mandonismos a todo custo, deram de confundir
entre a Verdade e os religiosismos. E de tal modo se aprofundaram no
erro, e de tal modo apanharam sempre as gentes desprevenidas em
matéria de conhecimentos da Verdade, que conseguiram burlar até
mesmo a si próprios; porque muitos dos seus elementos, passaram a
acreditar piamente nos engodos por eles mesmos fabricados.
Parece
impossível que um filho de Deus, chegue a não confiar na Verdade,
no Amor e na Virtude, em práticas sociais, para acreditar em todos
quantos macaquismos ritualistas uma plêiade de agrupamentos
clericais conseguiu organizar; mas a realidade é simplesmente essa,
pois há muitos que, para cumprir uma oferenda mentirosa ou comprar
uma indulgência altamente criminosa, passam por cima dos mais
comezinhos deveres de Justiça e de Bondade. E é por isso que, todos
os minutos e segundos, o plano carnal remete a estes lados, criaturas
que ostentam carradas de escapulários e tranqueiras adquiridas a bom
preço e curvações, estando apenas em condições de chafurdar por
longos anos nas regiões de sombra e de dor, não só a pagar as
lesivas liberdades pretendidas à custa de formalismos pagos, como
também o fato de se tornarem
propositalmente idólatras.
A
Lei de Deus e o Cristo ensinam que a Libertação é filha das ações
sociais corretas ou condizentes com eles mesmos, as duas testemunhas
fiéis e verdadeiras de que trata o Apocalipse; ensinam a praticar o
que é Verdadeiro, Bom e Belo; mas os lastros mistifóricos que a
Humanidade consigo arrasta, fazem desprezar o que é justo e
imperecível, para correr após aquilo que é caro, comprometedor e
ridículo.
Eis
a razão por que os abismos da subcrosta e as faixas umbrosas que
circundam o Planeta, albergam bilhões de criaturas rotuladas com
todos os matizes das mais estranhas policromias religiosistas. Não
se duvida de que, se os rotulismos tivessem préstimos, até o
próprio Deus, se fosse individual ou antropomórfico, já teria sido
derrotado por certos campeões da farândola ritualista. Sucede
porém, e com vigor de Eternidade, ser a Justiça Divina acima de
ginásticas humanas, bem ou mal intencionadas.
Resta-nos
pensar, todavia, quando a Humanidade terrestre irá aprender a lição
do bom senso, para confiar na Verdade, no Amor e na Virtude, em obras
sociais, em lugar de andar se esforçando para adquirir idolatrias,
ou mesmo ouvir discursozinhos histéricos, sobre a Lei de Deus e o
Divino Exemplo do Cristo, por parte daqueles que, fora disso, nada
mais sabem fazer do que dar maus exemplos.
*
* *
Cada
centelha espiritual é um Cristo feito ou um Cristo em fazimento; se
está feito, trilhou os milhões de anos de auto-elaboração e
atingiu a Sagrada Finalidade; e se não está feito, quer dizer que
resta fazer-se, tendo que elaborar o que ainda em si mesmo não
elaborou. Em Deus tudo é Eterno, Perfeito e Imutável, e Seus Santos
Desígnios não voltarão atrás. Faça, ou cuide o homem de seus
deveres e direitos, que é tudo quanto lhe compete. Saiba, porém,
que diante da Justiça Divina, jamais rótulos religiosistas formarão
como elementos de outorga celestial, para garantir vantagens que em
Espírito e Verdade não foram adquiridas. Pelo contrário, bilhões
é que somam o número dos que vergam sob o peso de semelhantes e
infernais enganosidades.
Resta
aqui prestar homenagem ao Bem-Fazer, ao Amor posto em prática nos
atos sociais; porque aqueles que tenham exercitado a Bondade, se
perdem na certa com as idolatrias, ou com os escapulários comprados
à guisa de absolvições, ganham
na certa pelo Amor posto em prática.
Tudo é questão de atingir o devido grau de compensação
vibratória,
de movimentar no bom sentido a lei do peso específico.
Dito
isto, em linhas mestras tudo está dito; mas a História de uma
galáxia, de um sistema planetário, de um povo ou de um espírito, é
a História das movimentações coletivas, em leis, elementos e fatos
indispensáveis. Não acredito que chegue alguém ao Grau Crístico,
sabendo dizer tudo sobre todos os motivos de felicidade e de
tristeza, que no seu caminho tenham aparecido, desde antes de
ingressar nos reinos mineral, vegetal e animal, para no seio deste,
ao ingressar na espécie hominal, terminar a sua longuíssima
carreira. E como seria desprezível aquilo que fez vibrar, que forçou
o despertar de uma consciência?
Para
outros fins é importante saber o que vai pelas trilhas do espírito,
antes de ingressar na espécie hominal; para nós, entretanto, é a
questão Moral que nos importa, porque somos funcionários de um
Departamento que trata dos compromissos Morais dos espíritos. Os
respeitáveis fatores que dizem respeito aos automatismos e reflexos
apenas instintivos, esses não são os nossos, pois a nossa tarefa é
lidar com aqueles filhos de Deus, nossos irmãos, que já atingiram a
escala da razão, dos jogos intelectivos, das elucubrações mentais;
lidamos com aqueles que lidam no seio dos conceitos de Passado,
Presente e Futuro, aí se preparando, portanto, para algum dia
ingressar no de Eterno Presente.
*
* *
Quando
alguém encarna cumpre um desígnio natural, submete-se ao
determinismo de uma lei simples, cujo fim é fazer atingir a Sagrada
Finalidade; se o sujeito sabe ou não, dos porquês, isso em nada
importa à lei. Algum dia ele o saberá, e mais do que isso, pois
terá que vir a ser um administrador de alta hierarquia, antes de
atingir o Grau Crístico. Todavia, é bom perguntar de onde vem, como
vem e para o que vem, não de modo genérico, porém específico.
Quando
alguém desencarna, também cumpre desígnio simples, porque sair da
carne é medida que cumpre a quem encarnou; resta saber, porém, de
onde veio e como e para o que fazer, e para onde e como irá, em
virtude do que fez ou deixou de fazer.
Existem
os abismos da subcrosta, com sessenta e oito subdivisões, tudo
pertencente ao Segundo
Céu, pois a crosta ainda está a ele sujeito.
Portanto, pode o encarnado vir daí, de uma dessas subdivisões,
depois de ser convenientemente preparado. Somam bilhões os
habitantes desses lugares e são os que mais necessitam voltar às
lides carnais, em termos de provas evolutivas e de expiações
necessárias ao reequilíbrio Moral.
Pertencentes
ao Terceiro
Céu
temos sessenta quilômetros de atmosfera terrestre, temos mil e
duzentos quilômetros de faixas umbrosas e temos as primeiras zonas
de sombra, que dão acesso gradativo aos primeiros rincões de
acentuada celestialidade, porém lugares ainda próprios de
organizações hospitalares e outros socorros.
Daí
para cima ou para fora do Planeta, temos o Quarto
Céu,
que indo até às fronteiras do Quinto,
vai entregando o espírito a elevados níveis vibratórios, até
entregá-lo, um dia, ao chamado Oitavo
Céu ou Céu Crístico,
quando a lei das reencarnações obrigatórias cessa, só vindo a
reencarnar em condições de toda liberdade.
Considere-se
que mais reencarnam os mais necessitados, e observe-se que todos
devem sair de algum lugar, em tais ou quais condições, para tomar
um corpo, uma nova ferramenta. Assim mesmo, quem desencarna irá
parar nalgum lugar, para baixo ou para cima, ou poderá ficar muito
tempo na atmosfera terrestre, no duplo astral de tudo quanto a Terra
tem, sabendo ou sem saber que é um desencarnado.
Tudo
pode ser dividido em três partes:
a)
A Origem Divina, a chamada saída de Deus ou da Essência Divina, ou
do Ato de Manifestação da centelha, por parte de Deus, fato que
excede ao que por ora a nossa objetividade pode alcançar, para
discernir;
b)
O Processo Evolutivo, a longa jornada através dos reinos, espécies
e famílias, até atingir a espécie hominal, no seio da qual
realizará a plena conscientização;
c)
A Sagrada Finalidade, o Grau Crístico ou de Unidade Vibratória com
a Divina Essência Onipresente, Onisciente e Onipotente, que tudo
rege por leis Eternas, Perfeitas e Imutáveis.
Só
isso, apenas isso, nada mais do que isso, embora isso, por ora,
esteja acima de nosso poder de análise. Para definir isso,
lembremos, teríamos que saber analisar totalmente o Emanador, a
Emanação e todas as leis determinantes da marcha evolutiva dos
espíritos, além de termos que analisar o Espaço e o Tempo, que
para Deus são apenas como se não fossem, além de termos que
analisar os infindos mundos, todos e cada um em particular, em tudo
aquilo que importe em suas verdades intrínsecas, em realidades e
valores que a ciência terrestre desconhece.
E
ainda assim, quando soubéssemos aplicar toda a terminologia técnica
ou científica, explicando assim todas as razões e valores de todos
os infindos mundos, estaria o fator Moral,
o Centro de Gravidade dos espíritos, a nos sujeitar ao seu
desiderato final, pois a Ordem Moral é aquela que realmente importa,
é aquela que significa a Balança
da Harmonia,
da qual ninguém jamais poderá se livrar, porque ela está presente
sempre, no espírito, seja ele um Cristo, seja ele alguém que se
arrasta nos abismos da subcrosta, purgando hediondos crimes. Se a
Ordem Cósmica ou física é aquela que o Cosmo apresenta, como
vedes, façam idéia do que seja a Ordem Anímica, a Ordem Moral, que
do imo de cada centelha tudo vigia e determina, em matéria de
direitos e deveres.
Afirmar
que Deus, de Seus filhos, apenas espera Amor, isso é repetir a
receita imortal, é aconselhar o que todos aconselham aos outros...
Entretanto, ninguém se verá um dia no Céu Crístico, por ter
apelado para outro fator básico. Se empatar tempo em muitos outros
afazeres é importante, nada é tão importante como produzir atos
de Bondade Pura,
de perfeita Renúncia. Até onde conheço dos Altos Planos da Vida, a
regra do viver é fazer todo o Bem possível, jamais passando pela
mente de alguém, prejudicar o seu irmão. A simples idéia de Mal,
se houvesse, faria sombra à Luz Divina com que se vestem as almas
cristificadas.
*
* *
Vivia
eu a minha vida de advogado novato, em pequena cidade do interior,
sem ter a menor idéia de casamento. Pensava, é certo, contrair
matrimônio algum dia, quando as coisas andassem economicamente
melhores. Mas como a cada dia basta a sua preocupação, segundo os
ensinos do Cristo, também a cada dia compete apresentar o seu
coeficiente de novas questões e oportunidades. Nem poderia ser de
menos, pois em um mundinho tacanho como a Terra, como haveria
progresso, sem que o Emanador fizesse jorrar, continuamente, novas
modalidades de acontecimentos na vida de Seus filhos? Como irem Seus
filhos à Verdade Integral, sem que ela se revelasse, todos os dias,
em novas peculiaridades?
Bailes,
eu os tinha dançado, e moças prendadas já havia muitas no rol de
minhas amizades; mas Noêmia apareceu, naquela noite festiva, naquele
aniversário de gente amiga, e em face de qualquer coisa estranha que
sua presença espiritual revelava, disse eu a mim mesmo, que com ela
iria me casar. Quem encarna mergulha as lembranças de sua história
num véu de esquecimento, enfumaça a vista do espírito e veda a
passagem de suas observações mais íntimas; porém o sentimento, a
impressão que entra pelo coração, mostra com mais facilidade os
horizontes da história e dos fatos que ela registra. Assim é que
vemos alguém, não entendemos esse aparente estranho, mas de pronto
o coração diz alguma coisa, queiramos ou não. E se a razão
precisa trabalhar para revelar, o coração abre ou fecha portas
repentinamente, causando muitos esforços às modificações
porvindouras, quando se fazem necessárias.
Noêmia
teve em mim todas as portas abertas, desde a primeira visão, quando
a vontade de dançar me fez girar para trás; porque ela estava a um
metro, se tanto, de mim, e ao virar tive-a diante de mim, como se
fora uma aurora de luz, despontando ao meu espírito, dentro daquele
salão de danças, em casa de família amiga.
Ela
atendeu, sorridente, e nós atravessamos a noite em danças e
conversas felizes, porque seus pais ali estavam, eram tios da jovem
aniversariante, e uma vez feitas as apresentações, ficamos unidos
por fortíssimos sentimentos de amizade. E com o progredir de tudo,
marcamos casamento dois meses depois, para ser realizado um ano
adiante, como de fato aconteceu, para um roteiro feliz, para uma vida
repleta de graças do Céu.
E
como não é possível conhecer mais pessoas sem enfrentar mais
problemas, o casamento com Noêmia lastreou três cunhados, um dos
quais era padre de profissão e de exercício; isto é, assim ganhava
a sua vida e punha, ou julgava pôr, em prática a sua devoção. Era
simples, aparentemente manso, tendo para mim bem saliente uma
duplicidade de modos, que ocultava com muito engenho. Ocupava a
condição de padre, a de familiar e tinha, também, aferrada
tendência à política, manifestando fortes evidências ditatoriais,
pois nunca entrava com suas livres opiniões, e sim com suas
truculentas exigências, ainda que apenas teóricas. Tudo porém
indicava que, se um dia fosse eleito e tivesse outorga executiva,
muito mais lhe agradaria mandar com exigência do que observar a lei
com elevada reverência.
Entre
todos os familiares e ele, para efeitos de religiosidade, as coisas
andavam pelas vielas do comodismo eufórico; ele o padre, o salvador
da família e o orgulho da parentela toda, e a família e a parentela
toda, sempre curvada a ele através dos ritos. E assim por diante,
todos curvados a Roma, que inventou um clero para através dele
defender um Império, teve o Império desfeito e o clero a dominar
tudo.
Tudo
sempre correu em santa paz, nada anuviou a vida familiar, sem ser
doenças e mortes, aquilo que é normal. Padre Antônio fechou os
olhos para o mundo no dia em que Noêmia, minha esposa, completava
quarenta e nove anos; e fê-lo, segundo o mundo, em cheiro de
santidade, porque, acreditava eu, tivera a sorte de jamais ter-se
metido em política de modo ostensivo. Seu despotismo, aplicado
dentro da Igreja Romana, fê-lo não ir além de simples cura de
aldeia; ele agia com muita cautela, para não se revelar como de fato
o era, mas se traía facilmente, para com os seus superiores, dando
opiniões contrárias, pretendendo forçar situações, criando casos
e pondo-os alerta. Para o bispo, um homem encanecido e pacato, aquele
padrezinho nervoso, cheio de idéias esquisitas, bem que poderia
fazer a vida mudar de rumo, ir parar em lugar bem menos sossegado. E
tudo isso para o mundo continuar o mesmo, dizia o bispo, pois nem
Jesus Cristo o consertara! Que todos, portanto, fossem vivendo, que
bastantes pensares já lhes causava o pastor luterano, desviando
ovelhas ou fregueses para outras bandas ou balcões.
Muitos
são os vícios, e perigosos, mas nem todos são realmente
catalogados ou mesmo admitidos como tal, porque escapam ao raciocínio
lógico, ao veredicto da inteligência superior, e superior porque
trabalhada na forja dos estudos e das experiências contínuas. Sem
isso, como pensar livremente? Sem isso, como marchar para Deus,
deixando para trás os ranços da miséria humana?
Piores
do que o fumo, o álcool, a bebida e outros, é a mente viciada no
comodismo formalista dos religiosismos. A mente humana, derivada da
Mente Divina, deveria ficar sempre acima de preceitos humanos, sempre
ligada à Causa Fundamental e Universal, que não admite dogmas,
instituições e estatutos humanos, como cangalhas, como peso em
cima. Quem sujeita Deus e Suas Divinas Leis a preceitos humanos, a
igrejismos, não sujeita realmente a Deus, mas a si mesmo se
escraviza, a si mesmo se corrompe e desvirtua.
E
padre Antônio fora enterrado sob toneladas de discursos
encomiásticos, até havendo quem mandasse esperar “milagres” de
seu túmulo, tal o montante de virtudes e galardões que a sua pessoa
arrastara em vida. E para nós, os parentes, aquilo era uma
participação no Reino das Graças, porque ele era nosso, era
privativo do sangue e de bastantes documentos selados e registrados
em cartórios. Por cima o tempo mandou chuva, chuva grossa, que a
gente do povo ligou ao fado da sorte, porque aquilo que aconteceu com
a rica e poderosa família, não estava, quem sabe, no mérito de
alguma pobre gente, se o defunto fosse dela, que não seria rico,
padre nem poderoso. As coisas, vistas pelo prisma do mundo, de seus
conceitos e dos cômoros de sua multimilenar superstição, não são
como são, porém como parecem, como as pintam os olhos vesgos do
mundo. Aquela bruta chuvarada seria uma praga num enterro de pobres,
mas era bênção de Deus num enterro de ricos; e confesso que a
minha causídica mentalidade aceitava tudo aquilo, achava normal,
mesmo levando em conta que as leis de Deus, regentes da Natureza, não
seriam modificadas pelo enterro de mais um filho Seu, que explorara o
Seu Nome a vida inteira, para ser servido e festejado por outros
filhos Seus, pequeninos e humildes, a grande maioria embutida em
tremenda ignorância e pobreza. Aquilo me soava bem, porque um pedaço
do defunto me cabia, por ser meu cunhado. O Céu nada avisou, a chuva
caiu e rolou normalmente pelo chão, a terra dadivosa também fizera
silêncio... Mas tudo aquilo era sorte, a chuva abençoada regara,
limpara de alguma coisa a alma do santo padre Antônio... Assim
diziam e assim se ouvia e acreditava!
O
papel a ser representado pela Justiça Divina, segundo as crenças do
mundo, seria o da ignorância e do ridículo, somados, bem somados,
para gáudio de todos os cérebros doentios, escravos de ajeitamentos
e interesses subalternos. Principalmente destes últimos, pois
enquanto o povo ignaro aceita tudo, muita gente se locupleta,
materialmente, mesmo sabendo que perante Deus as coisas se passam de
outro modo. O bolso, o estômago e outros fatores, queiramos ou não,
vivem a nos açoitar a vida inteira, enquanto nos arrastamos sobre a
Terra; e de tal modo inculcam seus ditames, que em altas doses passam
para cá, forçando a remorsos e angústias. Não é fácil analisar
o homem, quando encarnado, porque mil e um fatores o tornam realmente
insondável; as aparências se apresentam prontamente, são logo
vistas, porque todos as temos, mas a realidade íntima, todos a
escondemos, quem mais e quem menos, e com inaudita capacidade
automática. O encarnado parece que vive mais de malícia do que de
alimentos e do ar que respira!
E
como no Espaço e no Tempo todos os fenômenos se desenvolvem, chegou
o dia em que se ouviu uma mulher do povo dizer:
—
Sempre
vejo padre Antônio correndo, fazendo viagens entre a igreja e o
cemitério...
Quem
era essa mulher do povo? Quem era essa infeliz que via o santo padre
Antônio correndo, entre a igreja e o seu túmulo? Era uma pobre
lavadeira, alguém muito pobre, viúva cheia de filhos, que por dizer
aquilo perdera ali o seu ganha-pão, pois a rica e culta família a
pusera fora da porta, com ordem severa de jamais ali retornar, nem
mesmo para pedir esmola.
— Que
atrevimento!... – bramiu a minha boa sogra, encarquilhada pela
idade, mas cheia de mil certezas sobre o Paraíso em que seu rico e
poderoso filho deveria estar.
Entretanto,
porque a consciência fala alto em horas que muitas vezes parecem
impróprias, a família começou a pensar em rezar missas, muitas
missas, centenas de missas, milhares de missas. E a boa mãe de padre
Antônio, começou a se fazer mais afim com o rosário, de vez em
quando regando-o com suas maternais lágrimas.
— Que
diz, você, Artur? – perguntou-me Noêmia, sem se revelar surpresa.
Eu,
que não esperava pela pergunta, e que como advogado devia partir
sempre da segunda intenção, segundo a escolástica e os dotes da
malícia, dei-me a raciocinar, para enfim dizer, vagamente:
— Acho
melhor, querida, não dizer coisa alguma...
Noêmia
encarou-me bem, enterneceu os seus já bem ternos olhos, murmurando:
— Meu
bem, nós não temos certeza alguma... Quem sabe é Deus...
E
assim findou a conversa, pairando um abismo entre os conceitos
humanos e a Soberana Justiça de Deus, que ninguém encontra de modo
materialmente ou individualmente exposta, para com ela discutir,
levantar questões, quem sabe ensinar-lhe alguma coisa, que seria do
gosto de muitos sobre a Terra.
Como
é da ordem natural, fomos enterrando os outros, até que um dia
chegou a nossa vez; fomos pela porta simples e boa da Morte, que
entrega a domicílio, sem ter nada que ver com o produto, se é
melhor ou pior em matéria de qualidades.
*
* *
Embora
todos estejamos acostumados, multimilenarmente acostumados, a Morte é
a Vida que se apresenta com vestes um tanto diferentes, por isso
mesmo que parece novidade, feia ou bonita, segundo o estado de
merecimento e segundo o estado mental da pessoa. Diremos que ela é
igual para todos, mas nem todos são iguais para com ela e suas
decorrências. Ela é simples funcionária da Vida, faz apenas a sua
parte, mas as decorrências dão ou podem dar muito o que falar,
porque a Síntese da Vida é muito simples, mas as minúcias se
desdobram ao Infinito. É muito fácil dizer o que é um grão de
areia, mas não é fácil dizer de onde vem, para onde vai, como
realmente é e para o que serve, bem como onde poderá vir a estar e
como, no curso dos milênios ou da Vida Eterna que tudo em Deus tem.
Sempre
tive por lema da vida não pegar causas repugnantes; a mim mesmo me
dizia medroso, talvez covarde, mas escolhia minhas causas, porque
pretendia dizer a verdade. Um tremendo sentimento de culpa me
acompanhava, surgindo dos abismos de minha consciência; e mesmo não
sabendo de seus porquês, que vinham do meu histórico, a ele fiquei
devendo mil e um favores. E como, por medida de prudência, dava meus
trabalhos aos mais pobrezinhos, digo que tive sorte, porque a Morte
me entregou nos braços de gente amiga, pouco hierarquizada mas de
boa qualidade em questões de sentimento, de préstimos e vasto
lastro pelos séculos pretéritos.
Dormi
e acordei, logo em seguida ao enterramento do corpo; e se tenho a
dizer que a Morte não causa abalos de morte, devo dizer que ela muda
repentinamente o panorama exterior, pondo em sérios embaraços o
mundo dos reflexos interiores, das impressões imediatas e
irrefreáveis.
—
Tenha
confiança em si mesmo, mantenha a mente vigilante, lembre-se de que
nascer e morrer é o comum da vida! – dizia-me o professor
Silvestre, que fora encarregado de me cuidar, até a entrega do corpo
no cemitério.
Porém,
que lição tremenda de autodomínio, ver a família reunida defronte
ao nosso cadáver, chorando pelo parente vivo diante do corpo inerte,
sem poder dizer coisa alguma, remetido irremediavelmente a outro
continente vibratório. Os sentimentos prendendo à esposa e aos
filhos, a mente ligada aos destinos do espírito e a novidade da
Morte fazendo fremer o campo das esperanças, defronte ao infinito
dos fenômenos porvindouros, daquilo que é simples na ordem natural,
mas que as incertezas do momento fazem parecer sonhos indecifráveis.
Todavia,
como as leis regentes pertencem a Deus, tudo foi acontecendo, vendo
eu enterrar o corpo, com discursos e festas intelectuais, achando
tudo muito esquisito e interessante ao mesmo tempo, de certo modo
pensando que não era comigo ou em torno de mim que se movimentavam
aquelas formalidades caudalosas. Nunca me sentira assim importante,
cercado de tantas “virtudes de tabuleta”, tudo isso de que se
enfeitam as imagens, quando chegam as datas festivas. Sinceramente,
vinham à minha lembrança os dias de minha infância, quando os
retratos de Santo Antônio, São João e São Pedro eram festejados,
eram retirados do porão da casa, limpados e enfeitados, lá de
quando em vez comprados novos, para os devidos festejos, para logo
mais voltarem ao porão... Tinha chegado a minha hora, pensava,
enquanto uns e outros chegavam, diziam coisas tristes e bonitas à
minha adorada viúva, fazendo com que ela caísse em repetidos
prantos, o que me incomodava bastante, pois ela e eu parecíamos um
só, conforme a lição bíblica.
—
Quanto
falta para o enterro? – perguntei muitas vezes a Silvestre.
E
Silvestre filosofava antes, para lacônico responder:
— Isso
é assim mesmo! Você vai se acostumar!...
—
Acostumar
com o que, professor?!...
Ele
sorriu, muito brevemente, argumentando:
— Isto
é... Se você tiver que servir como eu, em acompanhamento de
enterros, logo verá que a coisa se repete tanto, tanto... A
novidade, Artur, é para o recém-vindo, e assim mesmo as incertezas
e esperanças, bem como esse sofrimento todo causado pela separação
dos entes queridos... Nós, entretanto, que fazemos isto há muito
tempo e por obrigação funcional, achamos até bastante monótono
esse negócio de morrer...
Silvestre
fora meu professor ginasial, talvez um pouco aparentado de bem longe,
homem simples e de língua solta, isto é, de coração na boca ou
franco a todo custo. Alegre, tomando a vida como era, sabendo fazer
amizades e gozando em mantê-las. Deixara longa progênie e muito bom
rastro sobre a Terra, saudades incontáveis, e para mim fora muito
bom tê-lo ao meu lado na hora do desprendimento. Se vinha
encontrá-lo como receptor de novatos junto aos impérios da Morte,
isso não poderia eu dizer porque, em que grau da engrenagem do
imenso maquinismo se fundamentariam os motivos. Mais tarde eu o
saberia.
—
Então,
professor, isto não lhe parece um sofrimento tremendo?!...
Ele
encolheu os ombros e comentou:
— Pode
ser que pareça, como não, meu caro Artur... Mas quem vai mudar isso
que é por Deus?... Lembre-se, acima de tudo, que você teve a sorte
de ser imediatamente recolhido... Pior seria, Artur, acontecer isso e
você estar endereçado aos lugares de pranto e ranger dos dentes...
Devo
ter apresentado uma careta muito expressiva, pois ele completou:
— Sim,
senhor!... Você pensa que Jesus falou aquilo tudo em vão ou para
ter como empatar o tempo? Há criaturas que nem sabem que deixaram o
corpo, tal o estado de atraso, ignorância, confusão e dores em que
o fazem...
— Vão
parar no inferno!... – exclamei, sentindo alegria imensa, pelo fato
de ter merecido outra direção.
— O
nome certo eu não sei, Artur, mas a verdade é essa mesma; acho até
que nomes não importam, o que importa é não parar nesses lugares
medonhos, seja pouco ou muito tempo, porque aqueles que de lá
vieram, com quem tenho falado, contam coisas horríveis.
A
conversa andava nessas alturas, quando a hora do enterramento do
corpo chegou, e tudo depois aconteceu, como ficou dito anteriormente.
A seguir, ou depois do enterramento do corpo, fui dormir. Quando
acordei, estava deitado ao lado de formoso riacho, no meio de vasta
campina florida, um verdadeiro tapete de flores que não deixam de
ser fragrantes e perfumadas. Um indizível prazer espiritual me
invadia e, por isso, dei-me a levantar depressa, olhar ao redor,
respirar aquele ar perfumado, tisnado de um não-sei-que celestial,
esse sentimento da Presença Divina que se tem nos lugares de Paz e
de Luz.
Observei
a planície florida, os montes distantes, o céu de um azul puríssimo
e o voejar de aves e borboletas maravilhosas; vi que a certa
distância perambulavam alguns homens, notando que um deles vinha ao
meu encontro, ou pelo menos na minha direção. E como tivesse
vontade de conversar com alguém, de entrar em contato com a nova
condição de vida, fui-me ao seu encontro, vindo a estacar diante
dele, sem dizer coisa alguma, apenas observando que era feliz,
saudável e risonho, parece que revelando uma intimidade qualquer,
que eu não podia no momento explicar ou admitir.
— Sou
apenas um servidor... – disse ele – Como são vários os que
dormem para se refazerem, uns tantos guardas perambulam pela campina,
a fim de atender aos que porventura venham a carecer de socorro...
—
Neste
lugar de Paz e Ventura celestiais alguém pede socorro?! –
perguntei, interrompendo-o.
—
Embora
seja de Paz e Ventura, como diz, alguns aqui aportam com os seus
dramas em continuação. Isto não é o Céu Crístico, nem mesmo um
Céu muito inferior ao Crístico, mas de elevada capacidade
vibratória, onde os recém-chegados podem estar absolutamente livres
de certos percalços. Quem aqui chega, tanto pode estar um pouco
melhor, como um pouco pior, nada além disso...
Estava
gostando da conversa, principalmente notando que tomava caráter
técnico, e de uma técnica que fugia aos meus conceitos de
celestialidade. Essa questão do Céu ou de Céus, para quem passa
uma vida inteira comprando formalismos clericais, não voga bem a
quem chega ao mundo espiritual, todo ele totalmente diferente das
mesmas encomendas formais. Portanto, procurei dar andamento à
conversação, perguntando:
— Você
conhece bem o problema dos Céus?
Afável,
de uma afabilidade nada formal, toda absorvente, respondeu:
— Como
você virá a conhecer, pelo Mapa Diagramático, uma vez que, para
conhecer praticamente, necessário é evoluir praticamente.
Antes
que entrasse em detalhes, perguntei sobre o ponto que mais me
interessava:
— Como
é esse Mapa Diagramático?
— É
o Atlas Astral do Planeta, nada mais. Mostra o Planeta sólido e os
Céus astrais, que vão do seu interior até certa distância, para o
exterior, até atingir a fronteira vibratória do Céu Crístico.
Quando estiver familiarizado com o Mapa Diagramático, verá que a
questão não reside em dar muita atenção ao que a Deus compete, e
sim ao que nos compete, que é atingir o Céu Crístico o mais
depressa possível. Isto é o que nos cumpre, é ao que chamamos
evoluir
praticamente,
aquilo
que não é apenas conhecimento teórico.
—
Nunca
ouvi dizer isso lá na vida carnal...
Ele
deu continuidade, depois de fazer um gesto de lamentação com a
cabeça, como a dizer que, infelizmente, as religiões se importam
muito com os formalismos que engordam orgulhos e vaidades, em lugar
de cultivar o máximo respeito pela Verdade:
— Nem
eu tinha ouvido dizer isso, nem muitas outras verdades mais, que vim
aqui encontrar. Por lá tudo cheira a conceitos e preconceitos
humanos, de sorte que, quando se pensa estar adorando ou servindo a
Deus, se está fornecendo farto material de monopólio aos engodos
religiosistas. Enquanto aqui se aprende que o Pai deseja de nós
Verdade, Amor e Virtude, traduzidos em obras sociais, por lá a coisa
funciona em termos de ritualismos comercializáveis, com grandes
somas votadas em favor dos orgulhos nobiliárquicos, que no curso dos
milênios criaram raízes profundas no arcabouço da humanidade.
— É
lastimável!... – murmurei, entrando a meditar sobre mil e uma
questões, porém sem articular palavra, para que o guarda fosse
avante com as suas considerações.
— Sim,
é lastimável... Até parece que as religiões, na Terra, nada mais
fazem do que servir ao Mal em nome do Bem... Pelo menos, meu irmão,
podemos afirmar que há uma diferença muito grande entre as verdades
reais e os interesses de grupos religiosistas.
Naquele
momento, pouco adiante, um vulto se pôs de pé, começando a berrar
e a correr pela campina; e o guarda volitou no seu encalço,
deixando-me sozinho, ou em companhia de minhas elucubrações. Pouco
depois, havendo retornado, sem fazer referência ao caso,
perguntou-me:
— Quer
ficar mais um pouco por aqui, antes de ir para a sede da região?
—
Antes
gostaria – repliquei – de saber como terminou o acidente...
Pareceu-me que o nosso irmão não estava bem...
Ele
deu de ombros, sorriu e disse:
— A
sua interpretação do caso, irmão Artur, bem prova que não conhece
destes misteres; isso nada tem de acidente, é apenas o normal por
aqui, como já lhe falei antes. O tal irmão, como viu, saiu correndo
e gritando, de medo da Morte, da desencarnação...
— Mas
se ele já morreu!... – atalhei.
Novo
sorriso e nova explicação singela:
— Mas
ele não é obrigado a saber isso, logo após a desencarnação.
Sucede, também, que deixou a carne por motivo de doença cardíaca
prolongada, por cujo motivo sofreu angústias horríveis, que o
traumatizaram mentalmente. E, para o seu governo, vá desde já
observando que tudo isso é normal, importando apenas o fato de que é
necessário ampará-los na hora certa e com os recursos certos.
Nunca, por aqui, faremos o que fazem os religiosismos terrícolas,
que depositam confiança nos seus rotineiros formalismos, deixando de
parte a essência das questões. O lema, por aqui, é atacar o centro
de gravidade das questões, e esse, pode estar certo, não é com
exteriorismos idólatras que serão resolvidos.
— Eu
lhe agradeço as lições e lhe peço que me encaminhe à sede da
região, pois estando encantado com tudo isto, desejo ser útil o
mais breve possível. E se me quiser responder, diga-me sobre o fato
de saber o meu nome, pois ainda há pouco me chamou por ele.
Ele
me reclamou a mão, apertou-a com efusiva alegria e disse:
—
Você,
Arthur, foi meu benfeitor no mundo... E eu pedi para ser o primeiro a
lhe falar, ao acordar do sono reparador. Por ora, nada mais quero
dizer, sem ser que muito feliz me considero, de tê-lo servido.
Mostrou-me
o caminho, dizendo:
— Siga
o riozinho, pois ele atravessa a cidade... E, lembre-se, não faça
caso de algum perturbado que possa encontrar pelo caminho, pois os
que estão servindo são muito competentes e bem controlados.
Nas
regiões de Paz e Ventura há um Amor que brota do imo de tudo e de
todos, e a este Amor eu tenho atribuído todas as alegrias destes
rincões maravilhosos; e se é certo que ainda estamos muito longe do
Céu Crístico, também é certo que tudo isto, apesar de muito
inferior ainda, deixa longe, muito longe, aquilo que as estultices
religiosistas da Terra apregoam.
*
* *
Não
sei quanto tempo terei demorado na caminhada, pois fui observando as
belezas da natureza. Com aquela graça que tudo tem, e mais um
sentimento profundo de Amor que invade a vida em geral, não se tem
pressa para nada, sem ser na hora de atender alguém, de fazer um
bem, de ter a santíssima oportunidade de pôr em prática o
sentimento de fraternidade.
Ao
chegar ao topo da colina, de onde se descortinava o panorama da
cidade, os olhos se me encheram de lágrimas; parece que de dentro,
das profundezas de mim mesmo, alguém dizia que eu voltava ao meu
lugar de partida. E como aquele sentimento de Deus Presente me
dominava intensamente, dobrei os joelhos e orei, caindo num pranto,
de tamanha alegria, que ninguém poderia jamais traduzir em letras de
forma.
Levantei-me
e prossegui, até o local em que o riozinho fazia uma curva, para
depois entrar na cidade, que mais parecia um jardim entremeado de
casas. Não esperava, entretanto, que um grupo de cidadãos da cidade
me viesse dar as boas-vindas, ao transpor o marco de entrada da
mesma. Entre eles estava Silvestre, tendo sido ele o apresentante de
todos, que, disse, já eram do meu conhecimento, porque dali partira
eu para reencarnar.
E
fomos ao governador da cidade, um irmão que na encarnação fora
político de não poucos valores, porém incompreendido, razão por
que veio a desencarnar muito cedo, atacado de mal cardíaco. Embora
tudo certo, porque fatores cármicos assim determinassem, mas a
realidade é que, infelizmente, na Terra, bem pouca coisa é feita
com o sagrado objetivo de atingir os supremos desideratos do
espírito. Tudo ainda é feito em termos de concorrência, de
invejas, de falsidades e de traições, enquanto se fazem discursos
laudatórios a bem da humanidade e das indispensáveis instituições
basilares.
— Terá
uns dias de folga – disse o governador da cidade – para rever
tudo quanto quiser... E não diga que vai dispensá-los, porque terá
que aproveitá-los e muito, fazendo muitas perguntas e ouvindo
bastantes respostas.
E
enquanto me dava o seu abraço amigo, entressorrindo observou:
— Não
pense, por ora, em visitar a família, que seria menos interessante
para si e para os seus; lembre-se de que tem amigos que tudo já
providenciaram, conforme o possível, pois é natural que as
condições e situações, criadas na Terra, representem lições
imperiosas, traduzam aprendizados indispensáveis ao despertamento da
consciência.
Agradeci
por tudo, como melhor pude, prometendo que, em breve, gostaria de
fazer pelos outros, uma partícula daqueles bens de que estava sendo
objeto. E foi assim que partimos rumo ao meu novo domicílio, onde
fui reencontrar alguns parentes distantes, pois os mais próximos
haviam já reencarnado, alguns no próprio seio familiar, o que muito
me fez sentir alegria.
Estando
com a esposa, os filhos e os pais encarnados, e sendo os parentes de
boa distância, tive facilidade em fazer de toda a comunidade a minha
família. E digo isto com algum embaraço, porque só seremos grandes
de fato, quando o sentimento de irmandade for capaz de abraçar a
humanidade
cósmica,
assim como por ora abraçamos o mais querido parente, aquele que
pareça ser a razão de ser da nossa própria vida. Tal é o destino
glorioso dos filhos de Deus, todos eles, pois que filhos especiais
nunca os fez ou teve, dizem os grandes mestres que de mais altos
planos vêm, para nos falar e envolver com a grandeza de suas luzes,
com o poder de suas auras benfazejas.
Silvestre
me apresentou a certo irmão, dias depois, dizendo:
—
Conhece-o,
Artur?
—
Tenho
certeza que sim, mas de onde não me recordo – respondi.
—
Funcionou
como seu Anjo de Guarda, como dizem; seu nome é Solano, que foi o
último usado na Terra. E não tenha para com ele mesuras especiais,
porque tudo é simples, é normal, além de ter sido você, já, o
seu Anjo de Guarda.
Abraçamo-nos
carinhosamente, como irmãos do coração, tendo-lhe eu agradecido
por tudo quanto teria por mim feito, aquilo que eu de modo algum
poderia aquilatar, visto nada entender de tais assuntos, de modo
prático. E com esses e outros acontecimentos, a montante amiga
crescia, dia a dia, enchendo minha vida de imensas alegrias e
fartíssimas obrigações de puríssima amizade.
Devo
dizer que o caso do meu cunhado, padre Antônio, começou a
tamborilar no meu cérebro, cada vez mais intensamente. E se nada
disse aos mais chegados, que eram Silvestre e Solano, porque os
parentes tinham ocupações muito diversas, foi em virtude de
reconhecer que eles conheciam os meus pensares e desejos. Eles,
pensava eu, diriam sobre a questão o mais certo e útil, assim que
fosse chegado o momento. Entretanto, mais de uns três meses depois,
fui perguntado:
— Quer
estar presente a uma aula?
—
Quero
estar onde quer que seja que possa aprender ou ser útil.
—
Então,
logo mais, que vai estar de folga, venha me procurar em casa, que
juntos iremos a essa aula.
E
lá estava eu, na hora, entrando pela casa adentro, onde alguns
outros amigos também estavam; a residência de Silvestre estava
sempre cheia de visitas, nas horas determinadas, certos dias, em
virtude dos serviços que prestava, pois era chefe do grupo de
guardas que funcionava naquela planície, onde eu dormira para efeito
de recuperação perispirital.
Partimos
dali, rumo ao Salão de Conferências da cidade, a fim de assistir à
aula, para a qual fomos convidados. E para o achatado prédio,
plantado como um enorme repolho no centro de formoso gramado,
adentramos poucos minutos depois, mesmo andando a pé. Notamos que os
salões internos se dividiam em forma de V, com o vértice para
dentro, observando assim a simetria do prédio. E como no centro
havia uma cúpula, avisou-nos Silvestre que ali estavam instalados os
aparelhos de projeção. Isto é, que para as trinta e tantas salas
se distribuíam canais especiais, para as devidas ilustrações
durante as aulas, quando se fizessem necessárias.
Ali,
foi dizendo, projetavam desenhos e mapas, de galáxias, sistemas
planetários, planetas, satélites, nebulosas e diagramas em geral,
além dos diagramas em geral, de espécies minerais, vegetais,
animais, etc. Disse-nos da importância do ser humano, com as sete
coroas energéticas ao redor da centelha, ativando o corpo
perispirital e o físico, quando encarnado. Falou de cada chacra ou
plexo, os sete, cada um correspondendo a uma coroa, enaltecendo a
importância do seu desenvolvimento, até a formação, ao atingir a
espécie humana, para depois se dilatarem e observarem a ação
convergente, ou unificação
de todos no plexo coronário,
ao atingir o Grau Crístico.
A
conversa se alongou até o momento da entrada de um grupo, chefiado
por um velhote muito alto e simpático, e grupo que foi instalar
costados lá na frente, a uns dez metros do painel vítreo que ficava
nos fundos, ocupando toda a largura da parede.
Como
eu nada de mais observasse, perguntou-me Silvestre:
— Não
viu alguém do seu parentesco no grupo?
— Não.
— Seu
cunhado está ali no meio...
—
Padre
Antônio?!...
— Sim.
— Que
faz ele?
—
Prepara-se
para reencarnar, Artur.
— Ele
está bem, Silvestre?
—
Agora
está melhorando...
—
Esteve
mal?
—
Muito
e muito tempo...
— Por
quê, Silvestre?
—
Porque
a Justiça Divina funciona divinamente, Artur.
— Ser
padre compromete?
— Até
certo ponto, Artur.
— Que
ponto, Silvestre?
E
o diálogo parou, porque uma campainha sinalou o início da aula, que
foi apenas uma leitura, feita por aquele encanecido irmão, com um
vigor tal de voz, que mais parecia um dardo fumegante a penetrar
nossas mentes.
De
pé, sozinho lá na frente de todos, bem encostado ao painel, começou
a ler:
“LEMBRA-TE”
Que
Deus,
a Essência Divina que tudo emana, sustenta e destina através de
Leis Eternas, Perfeitas e Imutáveis, é por si mesmo Onisciente,
Onipresente e Onipotente, pairando acima de todos os conceitos e
preconceitos humanos, crentes ou descrentes;
Que
a Emanação,
espiritual e material, que enche o Infinito, do qual todos somos
parte e relação, não a manifestou Deus segundo os caprichos
religiosistas ou não de quem quer que seja;
Que
o Movimento,
ou a lei que a isso força, obriga tudo e todos no sentido da
Finalidade, também sendo acima de manobrismos sectários quaisquer;
Que
a Imortalidade
é normal no que deriva de Deus, nada devendo aos conchavismos
religiosistas ou não dos homens;
Que
a Evolução
é lei simples, queiram ou não as crenças ou descrenças humanas;
Que
a Responsabilidade
cresce nos espíritos, sempre em correspondência com o crescimento
em conhecimento de causa, nada havendo que possa depor contra;
Que
a Reencarnação
é lei comum na Ordem Divina, é a válvula redentora e evolutiva
dos espíritos, aceitem ou não os fanatismos religiosistas de quem
quer que seja;
Que
a Revelação
é Instituição Divina, com a função de advertir, ilustrar e
consolar os filhos de Deus entre si, funcionando nos mundos e
intermundos, saibam ou não os homens, gostem ou não os
religiosismos humanos;
Que
a Habitação
Cósmica
é uma herança de todos os filhos de Deus, que nada deve aos
conceitos humanos, crentes ou descrentes, ditos sábios ou
ignorantes;
Que
a Sagrada
Finalidade
é um Desígnio de Deus, não havendo quem possa eliminá-la;
Que
os Dez
Mandamentos
constituem o Código de Conduta, contra o qual se rebentarão todos
os erros humanos;
Que
a Lei de Deus e o Cristo sintetizam a Moral, o Amor, a Revelação,
a Sabedoria e a Virtude, sendo as duas testemunhas fiéis e
verdadeiras de que fala o Apocalipse;
Que
a Verdade que Livra é o cultivo da síntese da Lei e do Cristo, a
VERDADE, o AMOR e a VIRTUDE, jamais havendo argumentos religiosistas
ou formalistas que possam substituí-los;
Que
a Autoridade Doutrinária pertence à Moral, ao Amor, à Revelação,
à Sabedoria e à Virtude, jamais podendo pertencer a homens e a
instituições humanas;
Que
no AMAI-VOS UNS AOS OUTROS está resumido tudo, em matéria de
deveres morais, importando aos filhos de Deus cumprir esses deveres,
visto que a parte de Deus não depende dos homens e de suas
concepções;
Que
a Religião é o cultivo da VERDADE, do AMOR e da VIRTUDE, que
sintetizam os ensinos da Lei de Deus e do Cristo, e que devem ter
absoluto emprego nos atos entre irmãos;
Que
o Reino de Deus é de ordem interna, é a Glória que deve ser
desabrochada no íntimo de cada um, pelo desabrochar das virtudes
espirituais em geral, que se resumem em VERDADE e AMOR;
Que
a Volta do Cristo é sobre as Legiões Consoladoras, a quem cumpre
advertir, ilustrar e consolar os irmãos entre si, assinalando que é
bem-aventurado todo aquele que, tornando-se consciente, venha a
tomar parte nesse Divino Ministério;
Que
é infeliz aquele filho de Deus, em quem a Justiça do mesmo Deus
encontrar sem VERDADE, AMOR e VIRTUDE, pois nenhuma artimanha
religiosista poderá jamais dar-lhe Paz e Ventura;
Que
o conhecimento das VERDADES FUNDAMENTAIS constitui o CÓDIGO
IMORTAL, pairando acima de religiões, filosofias, instituições e
estatutos humanos quaisquer, porque vigora no templo da consciência,
responsabilizando totalmente o filho de Deus;
Que
só existe uma Unificação necessária, que é entre o Pai Divino e
Seus filhos, e que fora da VERDADE, do AMOR e da VIRTUDE, jamais
poderá ser realizada;
Que
a Era Cósmica convida todos os filhos de Deus para um encontro com
o BOM SENSO, a fim de atender a Jesus Cristo, cuja bandeira branca,
tendo no centro escrita a palavra AMOR, convida ao abandono dos
preconceitos em geral, para que o Reino de Deus possa desabrochar no
íntimo de todos, marcando a entrada deste Planeta no âmbito de
outras dimensões vibratórias;
E
que é bem-aventurado aquele que assim entender, reconhecendo no
Espiritismo o trabalho de Elias que, consoante a profecia do Cristo,
com esse nome repôs as coisas no lugar, no curso de três
encarnações consecutivas.
Ao
término da leitura, pediu uma oração endereçada a Deus, a
Primeira e Total Potestade, aos Cristos Planetários ou Segunda
Potestade, e ao Consolador ou Ministério da Revelação, a Terceira
Potestade.
E
foi então que se deu o inesperado, pois o prédio pareceu sumir,
vendo-se o céu referto de brilhantes estrelas, céu que também se
foi tornando brilhante, cada vez mais brilhante, até tornar-se
visível o glorioso semblante de Jesus Cristo, que estava engastado
no centro de multidões de gloriosos espíritos, estando bem próximo
as chamadas Três Marias, rodeadas de legiões de maravilhosas
criaturas, tudo numa festa de luzes e esplendores celestiais, tal
como seria impossível descrever.
Ao
cabo de tudo, o prédio ali estava, tudo em ordem, tudo natural,
porém atapetado de pétalas de rosas brancas, perfumadas e vivas,
assim como tudo é nestes rincões maravilhosos, sem que se saiba
como e porquê, a não ser o fato de se sentir a Presença Divina, de
modo simples, puríssimo, sem a farta e repugnante intervenção dos
ritualismos terrestres, desses engodos que, exercitados em nome de
Deus, engordam bolsos, estômagos, sexos, orgulhos e vaidades
truculentas, de homens despudorados, fingidos de ministros de Deus,
fantasiados e que têm o direito de comprar e vender o que é
Sagrado, só porque lidam com gente ignorante, tão ignorante que não
acredita na VERDADE, no AMOR e na VIRTUDE, para acreditar em bagunças
clericalistas.
*
* *
Depois
que o velhote disse estar finda a aula, estando todos
conseqüentemente livres, Silvestre avisou-me:
—
Quero
te apresentar ao ex-padre Fabiano e também deixar-te livre, para
conversar com o teu cunhado Antônio. Leve em conta, Artur, o estado
de acanhamento em que possa cair o teu cunhado... Não pergunte coisa
alguma sobre onde esteve e como esteve... Compreenda que a Justiça
Divina basta, para dar a cada um segundo as suas obras, sem haver
necessidade de que um irmão coloque mais peso sobre os já pesados
débitos de outro irmão devedor.
Calei-me,
embora estivesse com a mente ocupada por mil e umas indagações,
inclusive aquelas que diziam respeito ao ex-padre Fabiano, que sendo
padre, teve outra sorte ou destino, pelo que se via. Mas Silvestre,
olhando-me bem, entrou a dizer:
— Você
pensa no caso de Fabiano, que veio bem da carne, apesar de ter sido
padre ou mercador de idolatrias. Lembre-se de que muita gente boa
seguiu os erros de Roma, sem saber o que estava fazendo; lembre-se de
que o importante são as obras de humanidade, fora de questões
religiosistas, e que esse irmão Fabiano viveu, para a sua
felicidade, pedindo aos mais ricos para dar roupas, comida, remédios
e quantas bondades pôde aos pequeninos do mundo. Assim como você
deu trabalhos jurídicos aos mais pobres, assim como você não
defendeu causas repugnantes, assim mesmo ele confiou nas obras de
fraternidade, criando para si essa quantia de Paz e Ventura, com que
você o vê galardoado.
Ainda
continuei calado, mas com a mente fervilhando, motivo por que
Silvestre aduziu:
— Seu
cunhado, entretanto, andou envolvido em adultérios e outras
porcarias, orgulhos e vaidades, além de confiar no ritualismo e nas
possíveis vantagens clericais. Como temos dito, Deus não quer
filhos padres, sejam quais forem as colorações sectárias, mas sim
filhos decentes, cultivadores da VERDADE, do AMOR e da VIRTUDE. Aí
tem você, de pronto e em síntese, a história toda...
—
Fico-lhe
muito grato pela explicação, amigo Silvestre.
Ele
virou-se presto para mim, emendando:
—
Lembre-se
de que poderíamos estar nós no lugar dele, ou em lugar e condições
muitíssimo piores, amigo Artur, porque se a Terra é um mundo
perigoso, nós temos em nós as piores marcas cármicas, que nos
induzem a desvios horripilantes, fabricantes de tenebrosas prendas
infernais, fontes de desarmonias íntimas que podem custar milenares
anos de ressarcimento. Como, pois, enxergar o mosquito no olho do
próximo, deixando de considerar o camelo que temos no nosso?
E
fomos na direção do grupo, que saía em companhia do ex-padre
Fabiano.
Frente
a frente com o meu cunhado, esbocei satisfatório sorriso, mas em
breve retrocedi, porquanto ele baixou a cabeça e derramou lágrimas
abundantes, não de alegria, mas de pesar. Assim envolvido, também
fui conduzido àquele estado emocional. E quando olhamos ao redor, os
amigos e companheiros nos haviam deixado a sós, para termos
liberdade e não sentirmos ainda mais alguma possível tortura moral.
Passado
tudo, Antônio falou, dizendo que sabia de minha volta, por lhe
haverem dito os amigos e parentes, com quem tivera contato através
de uma sessão espírita, dois ou três dias antes.
—
Sessão
espírita?!...
— Sim,
senhor, sessão espírita... Foi ali que ganhei consciência do meu
estado... Lembra-te da lavadeira de mamãe?
— E
bastante!...
— Pois
está muito velhinha e bem alentada de espírito...
— E
não morreu de fome, pelo fato de lhe tirarem o trabalho, quando
disse a verdade que devia dizer, pois não?
Antônio
volveu a mim, perguntando:
— Como
é isso, Artur?
—
Poucos
dias depois da sua passagem, disse ela, em casa, que te via
constantemente correndo do cemitério para a igreja, e da igreja para
o cemitério; e como a nossa gente pensasse de outro modo, puseram-na
fora de casa, com ordem de nunca mais aparecer, nem mesmo para pedir
esmola, se viesse a precisar.
Antônio
enterneceu-se, murmurando:
— Quem
pode lá saber, onde o Bom Deus semeou as Suas Graças?... Ela deu-me
à luz da realidade, quando a hora chegou... Que o Bom Deus a
recompense e perdoe os nossos parentes, porque se a ignorância é
pecado, muitos deles têm eles para arrastar pelos dias afora, como
eu arrastei!...
— Você
falou em parentes... Alguém nosso foi visitar a lavadeira?
—
Noêmia...
A minha irmã e sua esposa... A nossa compreensiva Noêmia foi a ela,
no seu Centro Espírita, pois agora é um Centro, com o intuito de
saber de você, e soube de mim, também, porque o Bom Deus determinou
que fosse instruído, tratado e recolhido a este lugar, de onde
deverei em breve sair, para reencarnar.
—
Soube
disso, Antônio, da parte de Silvestre; convidou-me para a aula, com
o intuito de nos prodigalizar encontro. E quanto a mim, saiba, nada
tive e nada tenho contra pessoas da família, pois vivia minha vida
como melhor pude, procurando fazer o Bem, tal e qual como por lá
podia entendê-lo. Creio que para um advogado é bastante, não acha?
Antônio
assentiu com a cabeça, com ar muito pensativo, para depois comentar:
— Para
um advogado é bastante!... Mas para um padre, que pretendia vender o
Céu a peso e a retalho, que representa ficar dezenas de anos em tal
estado, correndo entre a igreja e o cemitério, como uma tempestade
em forma de homem, nada podendo fazer por si e muito menos pelos
outros?
— Você
ouviu bem a lição de hoje, Antônio?
— Não
ouvi, apenas... Devorei o quanto pude!...
— Eu
também... Nunca pensei que em tão poucas palavras coubessem
tamanhas lições! Tinha a impressão que Deus falava pelo velho
ex-padre Fabiano!
— Foi
um homem de elevada moral e rico em piedosas qualidades; não foi a
religião do mundo quem lhe deu o que tem, que poderia guindá-lo às
mais altas esferas, mas sim a Moral e o Amor, essas armas contra quem
as trevas jamais poderão triunfar.
— Eu
também estou aprendendo outras lições...
— Aqui
a gente sente a Presença de Deus e se entrega à simplicidade... Lá
na carne a gente sente os ímpetos do bolso, do estômago, do sexo,
do orgulho, de uma caudal intérmina de animalismos desbragados, que
parecem querer devorar até os mais recônditos pensamentos de
Bondade, já não digo de Verdade, porque a Verdade é muito mais, é
tudo quanto há de Divina Realidade!
— Bem,
Antônio, a vida é Eterna e a Evolução é lenta, sendo a Sagrada
Finalidade um fato garantido por Deus. Ainda que errando, que
descendo aos rincões de pranto e ranger dos dentes, de lá se sairá,
para a marcha em busca do Reino de Deus, que temos dentro de nós
mesmos.
— Você
viu como as coisas se passaram, durante a oração?
— Vi
muito pouco...
— Por
quê, Antônio?!...
—
Porque
Fabiano disse que cada um tem a visão da Verdade, assim como merece
ou faz por merecer... Eu vi apenas o Divino Mestre, que representa a
Verdade, pendurado no lenho, no alto do Calvário... E creio que é
muito...
Tornamos
a derramar lágrimas, pois a situação de Antônio era mentalmente
dolorosa, e eu dela participava, e com muito gosto, pois sentia que
éramos irmãos, não apenas cunhados. Basta que seja um plano de
Luz, Paz e Ventura, para se ter vibrante a mais intensa sensação de
irmandade; e isto força a tomar parte nos fados ditos alheios.
Bem
pelas tantas nos recolhemos, se formos atender aos fatores
geográficos do mundo. E devemos assim fazer, porque no Céu em que
me encontro, e em sua subfaixa, as condições são muito ligadas ao
Planeta sólido. Apesar de tamanhas considerações, lágrimas e tudo
mais, a despedida momentânea foi em termos de alegria e de vigorosas
esperanças de melhora. Afinal, consideramos, a vida é Eterna.
No
dia seguinte, portanto, encontrando Silvestre e Solano juntos,
perguntei:
— Por
que meu cunhado viu aquela gloriosa visão de modo diferente?
Silvestre
comentou:
— Qual
de nós está, aqui, vendo a total Presença de Deus? Entretanto,
lembremos, se Jesus Cristo aqui estivesse, poderia dizer da Presença
Divina aquilo que para nós seria impossível, talvez, até mesmo
conceber. Assim sendo, consideremos que o modo geral é esse, e que
nas especificações, os acontecimentos tendem a observar essa
diretriz. Portanto, cada um viu segundo diferentes dimensões
vibratórias, como é de lei.
E
colocando as mãos no meu ombro, avisou-me:
— Vá
perguntando sempre... Mas vá raciocinando sobre os fatos, porque
nunca encontrará mistérios e milagres pela frente, na Ordem Divina.
Tudo é segundo leis eternas, perfeitas e imutáveis, e com elas
temos que harmonizar, se quisermos progredir na escala hierárquica,
isto é, se quisermos fazer crescer o Reino de Deus que temos dentro
de nós mesmos, como o Cristo deixou avisado.
—
Então
– comentei – as religiões terrícolas andam todas fora de
esquadro, longe de interpretar a Soberana Vontade de Deus.
Solano
interveio, ponderoso:
— A
Soberana Vontade de Deus é no sentido de que Seus
filhos conheçam e ensinem,
uns aos outros, aquelas Verdades Fundamentais que forem podendo
conhecer, e isto sem o caráter de trustes religiosistas, sem os
feios e degradantes interesses subalternos de grupos comercialistas e
politiqueiros. Entretanto, considerando a lentíssima evolução de
qualquer agrupamento humano, temos que por em evidência toda a
prudência possível, para não arriscar a perda dos tentos
conquistados a custo nos milênios anteriores.
— Não
entendi bem... Quer trocar isso em miúdos? – roguei.
Solano
fitou-me bem e começou:
— Você
se esforçou para se formar em Direito?
— Sim,
o quanto pude – respondi.
— E
se esforçou para conhecer verdades espirituais fundamentais?
— Bem,
sempre achei que essa parte era com os padres, que deviam fazer por
nós o trabalho de salvação. Agora sei que andei errado, e que a
humanidade terrícola anda errada, mas por lá, assim foi que andei
pensando e agindo.
Solano
fez um gesto de desalento, retornando à fala:
—
Lembre-se
pois, que antes da ida ao mundo do Cristo Planetário, para deixar
todos os exemplos de Verdade, Amor e Virtude em termos de realidade
simples, duzentos e quarenta mil anos de ensinos já haviam sido
entregues à humanidade terrestre; Budas, Vedas, Zoroastros, Moisés
e Hermes, Profetas e Pitágoras, e tantos outros grandes vultos
andaram semeando verdades básicas, e, depois disso tudo, um homem
culto, um advogado, passou pelo mundo e não se interessou por aquilo
que é e será sempre o mais importante a saber, que são as verdades
sobre a Origem Divina do espírito, o Processo Evolutivo a que está
sujeito e a Sagrada Finalidade, que por seus esforços deverá
atingir. Observe, portanto, que se o número de descuidados é grande
entre os analfabetos, também não é pequeno entre aqueles que
ostentam títulos doutorísticos.
Bastante
encabulado, murmurei:
— O
problema do Céu é muito grave!
Solano
acrescentou, pesaroso:
— Não
acusamos ninguém, porque somos igualmente errados; mas enquanto uns
erram porque fazem das coisas do espírito uma quitanda como outra
qualquer, outros erram porque abandonam o magno problema aos cuidados
de homens fantasiados, fetiches, rituais, ginásticas, exteriorismos
e altas negociatas idólatras em geral, inclusive a sujeição das
supremas realidades do espírito, aos manobrismos de natureza
politiqueira, colocando o Reino do Céu debaixo dos tacões do reino
do mundo.
Silvestre
comentou, sorrindo:
— E
vivemos dizendo que foi um único Esaú que trocou, a primogenitura
do espírito por um prato de lentilhas!...
Solano
considerou:
— Bem,
estamos em pleno século vinte, com o Caminho do Senhor reposto no
lugar, graças ao trabalho de Elias, que, consoante a profecia do
Senhor, cumpriu a parte que lhe tocou. O Espiritismo adverte, ilustra
e consola, mas não pode forçar. O sagrado relativo direito de livre
arbítrio, bem sabemos, é outorga do Pai a Seus filhos. Portanto,
aguardemos que o Tempo faça com que os filhos do Pai se convençam,
que devam ser iguais para com Ele, assim como Ele é igual para eles.
Eu
tinha que cuidar de meus deveres, que consistiam em conversar com
alguns recém-recolhidos, e no curso da conversa, sem parecer, dar
alguns esclarecimentos da nova condição de vida. E foi por isso que
os deixei, visto que tinha perguntas muitas a fazer. E ainda assim
acontece, pois se a Verdade Genérica é já bem fácil de conceber,
porque a colocamos acima de análises humanas ou tão relativas, as
verdadezinhas em que ela se manifesta são tantas, mas tantas, que
por todos os lados as encontramos, chamando a nossa atenção,
reclamando o nosso raciocínio, desejando a cooperação do nosso
esforço individual, para assim nos forçar ao crescimento
intelecto-moral, chave de todos os demais crescimentos.
*
* *
Jesus
ensinou que a fé remove montanhas? Sim, Ele ensinou, dando provas
disso com a Renúncia que pôs em prática, indo ao encontro da cruz,
pelo fato de saber que além dela estava a Liberdade, porque o mundo
e a carne serão, para os espíritos, as grandes montanhas que devem
ser removidas.
Porém
as coisas se passaram de modo diferente nos ouvidos humanos, desde
então para cá, pois os homens só pensam em montanhas exteriores,
deixando o grande problema das montanhas interiores para mais tarde
ou para os outros resolverem.
Tudo
materialmente se defronta!
O
homem arranja elementos para descer terra adentro, subir aos ares,
penetrar socavões submarinos, esfarelar a matéria, etc., etc. Mas
quando chega a hora de mudar um conceito, avançar na direção da
Verdade que livra e sondar os recônditos de si mesmo, então as
coisas terão que ser coadas pelo prisma das superstições, das
manias religiosistas, dos fanatismos sectários, dos estreitismos
conceptivos.
Meu
trabalho, que servia para entrar em contato com o meio e sondar os
complexos da alma humana, de fato tudo isso ensejava, fazendo com que
pudesse ver em homens e mulheres encanecidos, fartos indícios de
infantilidade espiritual. Um deles assentava nos conceitos
religiosos, e ainda assenta, pois se de lá saí faz muito tempo,
tudo por lá continua na mesma e a humanidade, que fornece mortos ao
plano da vida, continua cultivando suas manias, seus vícios
sectários, ou idólatras, em lugar de procurar aquela Verdade
Absoluta, que jamais poderia ser escrava de cacoetes tão pueris, ela
que é bastante acima de tudo quanto o homem pode conceber, até esta
etapa cíclico-evolutiva.
Para
que façam uma idéia da ordem natural do meio ambiente, basta saber
que para este lugar não podem vir os ruins, os maldosos, pois isso
jamais a lei do peso específico, de ordem vibratória, o permitiria;
só uma certa dose de Bondade, e Bondade aplicada durante a
existência carnal, é que determina a vinda para este lugar ou
quaisquer outros correspondentes; mas, note-se, os efeitos de certas
doenças, as preocupações mentais, os complexos religiosos, e até
mesmo as mais singelas questiúnculas familiares, tudo para aqui vem,
tudo pode acompanhar o recém-chegado, fazendo defrontar a situação
e dando muitas vezes não pouco trabalho aos servidores do local.
E
como é regra geral que o doente porta-se como doente, e é devido
respeitar a situação, porque o problema é de esclarecimento e não
de força bruta a ser empregada, fácil é conceber o quanto pode dar
de trabalho, para muitas vezes render pouco ou quase nada. Em tais
casos, quando o paciente é teimoso, primeiro se lhe diz que a Morte
não volta atrás, depois que a Ordem Divina jamais se modificará
segundo os nossos caprichos, e, se ainda perdurar a teimosia, pode-se
garantir ao teimoso que os reinos de treva, pranto e ranger dos
dentes não existem por acaso, porque afora os que por lá já estão,
outros lhes podem ter que fazer companhia, caso teimem em pretender
ensinar a Deus, essa feia coisa que quase todos os religiosistas
gostam realmente de pretender fazer.
Convém
saber que isso tudo, ou muito disso não acontece com os melhores
elementos, porque o poder das afinidades é como por força de magias
brancas, parece encantamento divinal; estes, que mais tendem para os
planos mais elevados do que para os inferiores, logo se importam com
o trabalho amoroso e útil, disso fazem a religião e o devotamento,
e o mais tudo, que corre mesmo por conta de Deus, se encarrega de
torná-los felizes, produtivos e progressistas. Estes tais são quase
sempre aqueles que não passaram a vida discutindo teologias e
teodicéias, porque o cumprimento do dever não lhes fez sobrar
tempo; e não tendo enchido a cabeça de pernosticismos, viveram
simplesmente e simplesmente vieram ter a estes planos, o que muito
lhes valeu. Reconhecem que o Plano Geral a Deus pertence, e que
fazendo os Seus filhos todo o Bem possível, uma Divina Justiça
deles cuidará, jamais permitindo que as trevas possam contra eles
arremeter seus dardos traiçoeiros.
Sem
nenhum esforço podemos compreender, depois de deixar a vida
transcorrer por conta de Deus, através de Suas leis, que o problema
do Amor é para ser aplicado por parte de Seus filhos, e não
discutido. E como tal, perguntando a muitos sobre o fator religião,
em essência, ninguém conseguiu dizer mais e melhor, resumindo, do
que afirmando que fora dos atos de Bondade ele não existe ou não
fornece elemento algum realmente produtivo, simplesmente
celestializável.
O
fato principal, segundo o nosso entender, ou daqueles que singram o
mar da vida espiritual na nossa região ou no nosso nível
vibratório, é que ninguém pode melhorar bem e depressa, tão
facilmente como quando procura sintonizar com o Deus ou Pai que traz
no seu íntimo. Quem sente que tem o Pai em si e que está mesmo a
Ele ligado fundamentalmente, e que Ele nada mais pede aos filhos do
que Verdade, Amor e Virtude, esse é o que mais consegue em Paz e
Ventura. E se não foi outra a lição do Cristo de Deus, não
adianta querer, em muitos casos, fazer compreender essa realidade
feliz, aos que trouxeram do mundo suas enraizadas concepções
sectárias, suas pretensas infalíveis tabelinhas salvadoras.
Naquela
manhã, o primeiro a ser atendido no Departamento Inicial, uma escola
de iniciação à reintegração na vida espiritual, foi um
israelita. O seu problema eram a bebida e os charutos, pois
havendo-os proibido terminantemente o médico, ele passara para este
lado com os seus desejos em dia, e, nos primeiros momentos e sintomas
reacionais, reclamava-os, berrando para que a esposa os trouxesse.
Delirava primeiro, revoltado e inconsciente dos fatos, para se
acalmar depois, quando de tudo era servido, pois só não temos o que
não queremos ter, ou aquilo que por determinação superior nos é
proibido ter.
Logo
após, entrava a doutrinação, fazendo ver que há importância em
lutar contra todo e qualquer vício, por menos prejudicial que pareça
ser, em primeiro lugar porque o Pai nos quer ver Espírito e Verdade,
assim como Ele é, e em segundo lugar, porque regalias muito maiores
estão ao dispor dos Seus filhos, regalias de todo espirituais, acima
de vícios quaisquer.
Passado
esse período, que a grande maioria tinha que passar, pelos lastros
oriundos da carne, vinham as questões mais difíceis, aquelas de
ordem passional e as de posse, pairando alto e prejudicialmente as de
caráter religioso, as manias ou os vícios sectários. Com esse
israelita tudo tornou-se fácil, pois tendo a concepção do Deus
Informe ou IÉVÉ, e de que a Lei de Deus não manda observar
cerimoniais exteriorísticos, presto colocou-se face a face com a
idéia do Infinito em Tempo e Espaço, situando o sentimento de Amor
no topo de todas as cogitações.
A
separação dos entes queridos é uma das torturas de muitos
espíritos, porém a noção de que ninguém
morre
e todos devem retornar à Pátria Espiritual, conforta e condiciona
logo mais ao ideal, favorecendo a normalização da mente. Bem bom é
reconhecer, ainda na carne, que o importante é o bem espiritual, o
bem da entidade imortal, que deve prosseguir em demanda à Sagrada
Finalidade, deixando quaisquer outras circunstâncias abaixo dessa.
Ademais, quem pode fazer que as leis de Deus deixem de ter andamento
normal? E uma vez reconhecido isso, há como que um mundo de Paz e
Ventura à disposição do espírito que mereceu recolhimento, e
coisa essa que deve aumentar ao Infinito, respeitando a lei de
progresso lento, com o ir e vir da encarnação, tantas quantas vezes
sejam necessárias, para dar-se o despertar integral da centelha
espiritual.
—
Então
– perguntou o israelita satisfeito – o Reino de Deus a ser
desabrochado no íntimo de cada um depende da Verdade, do Amor e da
Virtude praticados, postos em função na vida social, acima de
conceitos e de preconceitos humanos?
—
Exatamente!
– foi-lhe respondido.
Sorriu,
gozou qualquer coisa que lhe ia no coração e comentou:
—
Estou
muito satisfeito! Ninguém sendo proprietário particular da Verdade,
do Amor e da Virtude, algum dia os religiosismos terão fim e os
homens compreenderão o sentido messiânico de Israel, apresentando
Jesus Cristo ao mundo, como Divino Modelo da Origem Divina do
espírito, do Processo Evolutivo, da Sagrada Finalidade a ser
atingida e da Ressurreição Final do espírito.
Informaram-no,
ainda:
—
Lembre-se
do Seu Batismo de Espírito, ou da Generalização da Revelação, no
Pentecoste, depois de tornar como espírito. Leia com atenção o
Livro dos Atos, porque a Igreja do Caminho, estabelecida sobre a
Revelação, só começou depois do Pentecoste.
Fomos
dali, da conversa com o israelita, tratar do mesmo assunto com outros
religiosistas, outros escravos de vícios sectários, cada um
pretendendo estar de posse da Verdade, capacitado a ensinar a Deus em
lugar de aprender com Deus.
— Mas
então eu fui burlado! Burlado!... – começou a berrar um
ex-ricaço, que deixara estipulada no testamento, a quantia fabulosa
que devia ser gasta em missas que deviam ser rezadas a seu favor.
— Quem
compra idolatrias é como quem as vende, irmão Borges. E pode render
graças a Deus, de ter amparado obras de assistência social, isso
que motivou sua vinda a este plano de relativa Paz e Ventura. E se
tivesse confiado apenas nos exteriorismos ritualistas?
—
Quisera
encontrar o bispo X!... – fremeu ele, pensando nos conselhos que o
tal bispo lhe dera, para que deixasse a fabulosa soma com a qual,
convertendo-a em missas, teria a Eterna Bem-aventurança.
Ensinaram-no:
—
Basta
ao errado o peso da própria culpa; ninguém precisa pesar mais sobre
ele, nem tem esse direito, porque também não é um perfeito. E
afora a questão pessoal, lembre-se de que o perdão é de ordem
universal, porque se é certo a responsabilidade de cada um, também
é certo que a humanidade é um organismo. Se uns não perdoarem aos
outros, pelas mútuas falhas, como o todo virá a ser harmônico?
Ainda
amuado, perguntou Borges:
—
Então
tudo é questão de fazer o Bem, em nome de Deus e pelas graças de
Deus?
— E
não pode haver o verdadeiro Bem, onde não haja o verdadeiro perdão,
o perdão que é ir ao encontro do culpado, para fazer-lhe o Bem.
Ressentido,
rogou Borges:
—
Deixem-me
algum tempo isolado, para meditar... Afirmo que hei de perdoar a ele
e a todos, para que Deus me perdoe... Mas preciso de tempo...
Fomos
a um outro, fardado de ministro de Deus, com as insígnias de certa
organização sectária, fanático de repetir textos bíblicos, mas
desleixado das devidas práticas, no trato com os semelhantes. Como
fora a quinta conversação, a última segundo o programa, foi-lhe
dito que as demais seriam em outros tempos, quando voltasse algum dia
das trevas, pois para lá teria que ir inapelavelmente, se
continuasse a pretender impor suas interpretações dos textos
bíblicos, para safar-se de suas culpas.
— Como
assim!... Como assim!... – principiou a dizer, aturdido.
Foi-lhe
dito:
— Um
bom lugar para os teimosos discutirem com a Justiça Divina é nas
trevas
abismais...
E uma boa conduta religiosa é a imitação do Cristo, que foi parar
no meio das gentes sofredoras, a dizer palavras de consolo, a enxugar
lágrimas, a curar enfermos, a lembrar a Lei de Deus, ela que não
indica fanatismo sectário algum, ela que foi transmitida pela
Revelação...
Mardoqueu
tinha o livro na mão e para ele ficou olhando, sem dizer palavra, e
o instrutor acrescentou:
— O
livro não tem culpa, ele ensina, apenas... Culpados são aqueles que
fazem discursos longos, com o livro na mão, pensando que isso os
desculpará de andarem de coração vazio... Culpados são aqueles
que transformam o livro em cabide de suas vaidades e prepotências,
aliando-se às politicalhas do mundo, usufruindo benefícios
imerecidos, arrogando-se honras que o Divino Modelo não quis...
Mardoqueu
apertou o livro contra o peito, retirando-se de rosto banhado. Tinha,
por fim, compreendido a Divina Lição que o Cristo em si mesmo é,
da qual Divina Lição os escritos nem sempre avisam fielmente.
E
assim terminamos o dia de trabalho, advertindo, ilustrando e
consolando o próximo, conforme o programa, isto é, colocando a Lei
de Deus e o Cristo como medidas a serem observadas, para libertar os
filhos de Deus do jugo infernal dos sectarismos religiosistas, do
vício nefando das práticas ritualistas, que fazem esquecer o
AMAI-VOS UNS AOS OUTROS.
*
* *
O
Cristo, como indivíduo, é um filho de Deus como os demais, que se
elevou à Sagrada Finalidade, fazendo a evolução normal, isto é,
cedendo ao Processo Evolutivo, através dos mundos e das vidas,
portanto implicitamente sujeito às condições que os fatores
circunstanciais jamais deixam de impor.
O
Cristo, como Cristo Planetário, é o seu Diretor, pois como todos os
mundos têm o seu, a Terra não deixaria de ter; é aquele conhecido
como Jesus.
O
Cristo, como funcionário encarnado, ou Jesus encarnado, funcionou
como derramador do Espírito sobre a carne, ou generalizador da
Revelação, tendo ainda testemunhado aquelas realidades que estão
expressas no “CÓDIGO IMORTAL”, documento poderoso em síntese,
mandado distribuir na Terra pela Mensageiria Divina ou Ministério do
Espírito Consolador.
Tudo
isso dá muito para falar no Cristo. Porém, como o Cristo Programa é
que importa, eis que muitos teóricos do Cristo sentem-se por aqui
apeados. A mente é fértil em capacidade imaginativa, o arcabouço
histórico é poderoso, mas o coração permanece vazio, raquítico,
faminto.
Foi
Solano quem me convidou a visitar um sábio homem, recém-vindo da
carne e sujeito a tratamento. Fora católico praticante, como poderia
ter sido filiado a qualquer outra alcunhada escola religiosa, tendo
passado a vida em ativos trabalhos de investigação, procurando a
VIDA MAIOR, o porquê da infinita vida relativa que se estende pelo
Cosmo Infinito. Um grande naturalista, um meticuloso dissecador,
anotador de termos técnicos, etc.
Se
todos os homens, sábios ou ignorantes, lembrassem de que há uma
Ordem Moral nos fundamentos de todas as demais ordens, todos
procurariam manter em dia a obrigação máxima, o sagrado respeito
pela vida, a ponto de elevar esse respeito aos extremos da
misericórdia. Entretanto, como em todos os departamentos de serviço
é possível que os trabalhadores se desvirtuem, em nome da Ciência
e da Arte muitos erros e crimes são cometidos. E a Lei de Harmonia,
uma vez ferida, reagirá no curso do Espaço e do Tempo, colhendo o
faltoso nas malhas de acontecimentos para ele estranhos e dolorosos.
A
mania do complexo atrai as mentes novatas, assim como o gosto pela
síntese coroa o pensamento dos espíritos mais evoluídos.
Toda
e qualquer investigação deveria partir, portanto, da premissa de
que em Deus tudo é Eterno, Perfeito e Imutável, nada havendo que
possa conferir ao filho de Deus o direito de se julgar juiz de Deus
ou da chamada Criação.
O
direito de evoluir, de procurar e de encontrar as Causas
Determinantes, para saber como tudo funciona, do Micro ao Macrocosmo,
não é proibido por Deus, visto que Seus filhos deverão,
normalmente, crescer e participar da Ordem Divina, como colaboradores
do Pai Divino.
Existe,
porém, muita diferença entre empregar ou não devidamente o
trabalho de investigação. Orgulhos e vaidades podem prejudicar o
bom êxito, bem como a rudeza no trato para com os seres vivos,
pretextando austeridade científica.
Nada
deve ser encarado como apenas formal, quando se trata de manusear a
vida, seja em que sentido for. A matéria inorgânica é uma, a
orgânica é outra e as centelhas espirituais são ainda mais
respeitáveis. Antes de mais nada, os termos técnicos do homem ou as
suas concepções sobre a vida, não foram usados pelo Emanador, para
manifestar de Si Mesmo a Emanação. Portanto, ninguém lida com o
que é Emanado, sem se comprometer perante as leis regentes da
Emanação.
E
o nosso irmão dissecador, exagerado dissecador, além de ser apenas
isso, porque a sua religião era sujeitar-se aos formalismos
litúrgicos, ainda rompia em blasfêmias horripilantes, por causa das
dores que sofria. As cãibras o levaram aos fortes medicamentos, e
estes à intoxicação, e esta ao desencarne. E tudo ficaria por aí
mesmo, se o espírito fosse mortal...
Por
força das atenuantes, foi recolhido a um local de tratamento, porém
sofrendo ainda horríveis ataques cãibrinos. E até a nossa visita,
o tratamento ordenado fora o passe magnético, o sedativo passe
magnético, nada mais. Que fosse lendo os bons livros de nossa
biblioteca, nas melhores horas, pois devia muitos sofrimentos, que
impusera a inocentes irmãozinhos, a título de encontrar a VIDA
MAIOR no bojo das vidas infinitamente múltiplas.
Há
uma promessa do Senhor Deus Onipresente, Onisciente e Onipotente, no
Velho Testamento, sobre retirar da Terra o espírito imundo e os
animais daninhos, quando os homens se tornarem mansos e humildes. E
nós, por aqui, chegamos a conhecer lições tremendas, quando
encaramos a vida e suas manifestações, pelo prisma da Ordem Moral.
De tal modo a vida é respeitável, por aqui, que podemos afirmar que
o respeito que a Ciência da Terra confere à vida é apenas formal e
exterior, havendo quase nada de restrições em contrário. Portanto,
a palavra da Revelação fica de pé, de modo algum estando aqui
alguém que pretenda julgá-la!
E
o quadro, naquele momento, era estarrecedor, porque as dores
cãibrinas interiores forçavam o sábio a caretas e trejeitos
exteriores.
—
Venham!...
Venham!... Eu morro!... Morro!...
Solano
informou, pela milésima vez:
— Já
morreu, já morreu... Mas, como sabe, a morte é aparente...
—
Raios!
Mil raios... Dez mil raios!... Quinhentos mil!...
Solano
ordenou colocar as mãos na cabeça do sábio, projetando sobre ele
tudo quanto fosse possível dos eflúvios benéficos individuais. E
dentro em pouco estava bem, estava livre, sorria e conversava muito.
Foi
então que Solano avisou-o:
—
Hoje,
irmão... é um grande dia para você; vai ver coisas de si mesmo, de
sua vida, findando as dores cãibrinas...
Por
aqui é muito fácil rir ou chorar, porque a sensibilidade aumenta
tremendamente. E quando ouviu dizer que ia sarar, assim como
praguejava fácil, também facilmente começou a render graças a
Deus, derramando copiosas lágrimas, pronunciando palavras de
agradecimento.
Três
servidores trouxeram um aparelho, colocaram-no ao lado do enfermo e
logo mais ligaram-no à corrente elétrica. Nós fomos colocados ao
redor, com a incumbência de fornecer elementos fluídicos para as
imagens que deviam ser refletidas no painel.
Assim
acontecendo, o sábio viu ele mesmo a fazer dissecações,
torturantes e longas dissecações, observando os tremores, as
repulsões, os desmaios, tudo aquilo que as torturantes dores
causavam nos pobres animaizinhos. Havia nele um bem acentuado gozo
por aquilo tudo, chegando a fazer tais experiências, mais por
sadismo do que mesmo por gosto e por finalidade científica.
Ao
término, cabisbaixo, murmurou:
—
Quanta
tortura, meu Deus, causei aos pobrezinhos!...
Solano
comandou:
—
Repitam
o trabalho!
E
tudo começou de novo, porém com um acréscimo, que era penetrar
mais nos fatos, pois os espíritos eram vistos sair dos corpos, com a
morte, depois dos tremendos sofrimentos. Eram coelhos, lebres, tatus,
sapos, répteis, ratos, jacarezinhos, peixes, aves, etc. Todos tinham
algo de essencial, de espiritual, que abandonava os respectivos
corpos, saindo alegremente, correndo, disparando, etc.
O
sábio tinha o rosto banhado em lágrimas, quando fomos embora,
deixando-o entregue aos pensamentos, com a certeza de que não mais
sofreria ataques de cãibra. E como era de supor, Solano foi-nos
dizendo muito em termos doutrinários, sobre a vida essencial e as
realidades de Deus, que não dependem de tecnologias humanas, e da
Paz e da Ventura que viremos a usufruir um dia, quando soubermos
colocar o Amor acima de tudo, para jamais causarmos uma dor, seja em
quem for, maior ou menor na escala evolutiva.
Apesar
das lições, comentei o fato de ser a Lei muito rigorosa em suas
cobranças, razão por que Solano lembrou-nos:
— As
verdades doutrinárias fundamentais são sempre as mesmas, desde
milênios; isto é, desde que foi sendo possível ministrá-las. Por
exemplo, considerem o que ensinavam e ensinam as tradições hindus,
às quais estamos profundamente ligados, nós do Brasil, em virtude
da Atlântida. E por lá diziam e dizem, que a Verdade é cortante
como o fio da navalha, e que o verdadeiro por ela anda, sem se
cortar.
— Isso
diz respeito à Perfeição que o espírito deve atingir? –
perguntei.
Solano
sorriu, dizendo após:
— Sim,
à Perfeição que ainda está bem distante de nós, que ainda
palmilhamos os rincões menos evoluídos da vida. Assim sendo, como
viram e como vêm em nós mesmos, a Justiça Divina não nos pede
nada em sentido absoluto. Não temos a Perfeição realizada e não
sofremos pelo que ainda não temos de dívidas. A Justiça Divina,
portanto, age em nós e para conosco relativamente, sendo forçoso
dizer que é bem-aventurado quem conserva o menor resquício de boa
vontade em suas obras, pois por esses resquícios virá a ter a sua
dose de compensação.
—
Então,
ainda estamos ensaiando andar sobre o fio da navalha?
— Sim
– respondeu ele – creio que andamos sobre largos trilhos, por
ora, como exercício ou treinamento, para irmos aprendendo a andar
sobre o fio da navalha, isto é, para vivermos segundo a Reta
Suprema, que é a Verdade que livra. Tudo, portanto, em caráter
relativo, tanto os méritos como os débitos, e por conseguinte o
plano de Paz e Ventura em que nos encontramos, que virá a ser, com
os progressos contínuos, de plena Paz e de plena Ventura, assim como
nenhuma palavra humana pode interpretar.
Quando
chegamos ao Departamento, havia um aviso para mim, ordenando
comparecer à sede da Governadoria, assim que os trabalhos
permitissem; e a permissão veio de Solano, que me liberou por alguns
minutos.
*
* *
Chegado
à Governadoria, fui informado de que Noêmia estava com a volta
marcada para breves horas, tendo o Governador nomeado uma comissão
de recepção, pois Noêmia saíra de sua esfera de vida espiritual,
que era muito acima daquela em que nos achávamos, onde ele
desempenhava a função de Governador da Região. Todos já devem
saber que muitos são os que desempenham funções em esferas
inferiores, por variantes fatores; mas é de salientar que os
Governadores o são por indicação de Autoridades Superiores,
visando a influência vibratória, o tom hierárquico indispensável.
Um Governador é mais do que um simples administrador formal, porque
os visos da Divina Paternidade se escoam pelos elos decrescentes, a
começar do Cristo Planetário, passando pelos Seus Imediatos e por
aí adiante, até chegar ao que diríamos ser o último da escala
administrativa.
Na
face da Terra as coisas se passam de modo diferente, porque a
brutalidade da matéria densa encontra apoio na inferioridade moral
dos espíritos; e assim sendo, em tudo se curvam ao imediatismo das
formas, dos rótulos, das aparências, de modo a truncar a influência
essencial, os méritos da Verdade, do Amor e da Virtude, que são
aqueles que deveriam tutelar todas as atividades humanas, a fim de
criar, conseqüentemente, um ambiente realmente cristão.
Todavia,
como o ideal é a Perfeição, ainda no erro se encontram os
vestígios do que é Certo, pois quem pensa em depor uma autoridade,
pensa de antemão em colocar uma outra no lugar. O mal é que tudo
parte do imediatismo formal, objetivando vantagens materiais, ou
mesmo despeitos e desforras, quando tudo deveria visar os supremos
destinos do espírito. E é por isso que vemos nos abismos da
subcrosta e nos umbrais, elementos fartos de sabedoria formal,
autoridades em política e terminologias científicas. Não é que o
mal esteja em querer ser sábio ou administrador, pois todos terão
que aprender de tudo, que essa é a Finalidade Sagrada do espírito;
porém, sem partir do Amor como premissa, jamais alguém atingirá o
Divino Epílogo.
Desta
sorte, qualquer mente pode imaginar a função do Cristo quando
encarnado, ou de Sua conduta, pois sendo o Administrador Planetário,
renunciou a todos os títulos e dispensou todas as prerrogativas do
Reino do Mundo, em troca do Reino do Céu, que Lhe custou a
crucificação. É que sabia muito bem para onde costumam ir os
mandatários do Reino do Mundo, em sua imensa maioria, que é para as
regiões de sombra e de dor, de pranto e ranger dos dentes!
Tudo
pode servir de ferramenta perante as realizações que nos cumpre
colimar, porém é bom lembrar o quinteto máximo: Bolso, Estômago,
Sexo, Orgulho e Egoísmo. E como ninguém poderá atingir o Grau
Crístico, sem usá-los a todos, devemos estar sempre alerta, para
controlá-los, e não para sermos controlados por eles. A Lei de Deus
e o Divino Exemplo do Cristo, somente disso é que tratam, nada mais
e nada menos, embora os traficantes de mercadorias religiosistas
possam dizer em contrário o que bem quiserem, para defender suas
traficâncias. Mas, lembrem-se, também a respeito deles podemos e
devemos afirmar que as regiões de treva funcionam em benefício do
Reino do Céu. Eles, mais até do que outros, costumam fazer longos
estágios nos lugares tenebrosos!
Entretanto,
vamos ao caso de Noêmia, que afinal de contas não trocou a
primogenitura do espírito pelo prato de lentilhas, como fazem muitos
daqueles que pretendem passar por sábios e poderosos do mundo.
Se
Noêmia sempre fora dócil aos preceitos do Céu, a meu ver, enquanto
estava eu encarnado, muito mais disso me convenci, depois de haver
desencarnado. E com a minha desencarnação, tendo ela procurado a
velha lavadeira, tudo subiu de monta, pois começou a distribuir
dádivas aos pobrezinhos, como melhor podia, mesmo enfrentando a má
vontade dos parentes, que a chamavam de discípula do Diabo,
instigados pelo novo padre. Foi em frente, ouviu o Consolador que
adverte, ilustra e consola, tendo atingido a hora final rodeada de
muito carinho de ambos os lados da vida.
Espírito
bastante tarimbado, tendo tido vidas em companhia da Grande Mãe
Maria, ela sonhava com Maria freqüentemente, assim dizia. O certo é
que trabalhava sob a sua orientação, como acontece com muitos
milhares de seres encarnados, pois a Grande Mãe, como a denominam
por aqui, comanda as legiões que socorrem nas trevas, usa bastante
os fluidos humanos para fins de serviço nos lugares tenebrosos.
Fui
ao encontro de minha esposa, mas a princípio fiquei acanhado, porque
suas companhias espirituais, que vieram beirar o leito dito de Morte,
embora reduzidas em suas luzes e maravilhas espirituais, deixavam
muito longe a minha pobreza de espírito. Mas como o Reino do Céu
vai em Medidas de Amor para muito além das concepções que dele
fazemos, eis que me vejo, num repente, envolvido pelas comandadas de
Maria. A simplicidade gloriosa dos espíritos maiores é impossível
de ser descrita, mas é fácil observar que a grandeza de luzes e
graças corresponde ao montante de simplicidade com que se portam.
Quando
tudo parecia transpor os limites de minhas idéias, pois eu todo
fremia de envolvimentos celestiais indizíveis, o Céu vem sobre mim
na pessoa maternal de Maria, com os braços estendidos, os olhos
feitos de amor e o sorriso de Mãe a convidar para o banquete das
harmonias que somente as minhas lágrimas traduziam, e os meus
joelhos prontos a se curvarem, o que não fizeram porque ela ordenou
em contrário, dizendo:
—
Filho
meu querido... Todos somos iguais perante o Pai Divino e a Divina
Direção Planetária do Cristo... Uns teremos avançado mais, outros
menos, porém a Origem é a mesma, o Processo Evolutivo é o mesmo e
a mesma é a Sagrada Finalidade de todos os filhos do Pai
Amantíssimo... Queremos amor e não exaltação... Desejamos chegar,
mas vocês nos repelem, julgando-nos filhos especiais do Pai...
Eu
queria falar, mas as palavras não saíam, tal a profundidade da
emoção que a sua maternal presença me causava; e foi ela quem
apanhou a minha direita, dizendo:
— Vai
tirá-la do cárcere, meu filho... Eu quero que sejas tu o libertador
de Noêmia...
Ela
fez tudo, eu nada fiz, pois estava aturdido, inundado de amor, as
faces regadas de lágrimas quentes, escaldantes, ferventes. E quando
menos esperava, tive Noêmia nos braços, mas não a Noêmia da
encarnação, a Noêmia da carne e ossos densos, porém uma Noêmia
angélica, feita de luz e deslumbrantes graças.
A
caravana partiu, subiu, entre cânticos de boas-vindas e alegrias
inenarráveis. Subi com aquela embalagem celestial, aquele ouro e
azul divinos, sem saber ao certo como. Foram depositar Noêmia na
presença de um Grande Mestre, Imediato do Cristo, que lhe passou as
palavras do mesmo Cristo, felicitando-a pela vitória e prometendo
Sua visita, assim
que estivesse refeita
das emoções do momento. E a Grande Mãe veio a mim outra vez,
singela e gloriosa, para informar:
—
Noêmia
vai dormir um pouco, muito pouco, meu querido filho; e tu a esperarás
algumas horas. Vai e trabalha, faze o que podes pelos pequeninos,
pois o Pai assim quer e nós só podemos crescer quando realmente
fazemos pelo crescimento de nossos irmãos...
Ainda
assim, assaltado pela emoção divinal, não pude falar, não pude
agradecer. Ela chegou-se, beijou-me a testa e admoestou, com aquela
carícia vocal que parecia um dilúvio de amor maternal:
—
Quero
que me ames, filho, pois é da Vontade de Jesus, o Verbo do Pai neste
Planeta, que eu represente nele a Gloriosa Maternidade; mas não
deves portar-te assim, exaltando-me desse modo... Virei a ti dentro
de poucos dias, mas espero que te portes como filho do Pai Único,
vendo em mim a irmã, apenas a irmã que evoluiu mais, sem ter porém,
afora isso, nada mais do que todos os filhos d'Ele. E podes estar
certo, também, que o mesmo é o pensamento e a palavra de Jesus, o
nosso Diretor. Qualquer outra consideração, portanto, será de
ordem hierárquica e administrativa, mas fundamentalmente somos todos
irmãos, filhos Daquele Pai que a ninguém emanou especialmente.
Procura amar bastante, filho, mas deixa a exaltação de lado, que
ela muito nos separa, e isso muito prejudica...
Creio
que vi uma réstia de tristeza em seu meigo olhar, naquele momento, e
a prova tive-a na sua palavra, pois ela afirmou, em seguida:
— O
amor aproxima e a exaltação separa, filho meu... Dize a todos os
filhos do Pai Divino, a todos os comandados de Jesus, que a ordem é
muito amor e nenhuma exaltação... Onde quer que alguns já estejam,
na hierarquia planetária, para ali todos terão que ir, porque essa
é a lei. Vai, filho, e espera trabalhando o bom trabalho, que dentro
em breve irei ao teu encontro e ao encontro de todos aqueles que
desejarem a minha companhia...
Já
foi dito que as Glórias Divinas são manifestadas pelos Espíritos
Divinizados; é o que podemos reafirmar, e reafirmando queremos
respeitar o fator hierarquia sem, de modo algum, julgar que o Pai
Divino tenha emanado filhos especiais. A emoção que tive de
enfrentar, muitíssimos já enfrentaram e todos os espíritos em
processo evolutivo a enfrentarão, porque as luzes espirituais são
como forças tremendas, potencialidades energéticas que parecem
transformar-se em amor, mas em amor divinizado, que só se pode
reconhecer o que seja ao senti-lo. E assim mesmo ressalvamos que o
sentir depende do grau de penetração de cada um. Quem não
sintoniza não sente, e ninguém sintoniza com o que quer, porém com
o que pode, conforme o seu grau de evolução íntima. E esta, bem ao
contrário do que afirmam os negocistas do religiosismo terrícola,
retrato fiel do paganismo retrógrado, filho retardado das eras
primevas, só se consegue com as boas obras, só se adquire com o bom
procedimento social, que é como o afirmam a Lei de Deus e o Divino
Exemplo do Cristo.
Ao
retornar aos meus afazeres, deslumbrado por tamanhos acontecimentos,
sentia em mim estranhos sentimentos; é que vivia em um plano
intermediário, tendo os filhos na crosta e a esposa em planos muito
superiores. Dentro de mim havia como que uma estação telefônica,
com suas ligações diametralmente opostas, porém controladas por
uma central poderosa, que era representada por um amor maciço,
poderoso, confiante e capaz de remover montanhas.
— Isso
é normal – disse-me Silvestre, quando lhe contei o que vinha
acontecendo nos meus domínios emocionais.
E
entrou em detalhes:
—
Afinal,
Artur, é fácil observar a Sabedoria de Deus nisso tudo, pois
estando ligado para baixo e para cima, pelos laços de família, está
apenas dando seguimento ao Plano Divino, que misturando maiores e
menores, favorece a uns e a outros, uns crescendo pelo fato de
ensinarem, e outros tendo com quem aprender. É o maravilhoso
mecanismo da lei que, sem falar alto, pois Deus não faz discursos, a
todos envolve e favorece com as sagradas oportunidades da vida, da
grande mestra.
Depois
de considerar bem a questão, comentei:
— Se
os homens soubessem como tudo é divinamente simples!
Ao
que Silvestre aduziu:
—
Enquanto
a Verdade Única força à união, os homens se dividem por causa de
múltiplos interesses subalternos... Enquanto a Moral, o Amor, a
Revelação, a Sabedoria e a Virtude conclamam à unidade, o Bolso, o
Estômago, o Sexo, o Orgulho e o Egoísmo proclamam as separações...
São cinco contra cinco, que a evolução há de obrigar ao
entendimento, para funcionarem a bem do espírito, pois os fatores
positivos e os negativos, conjuntamente, ou bem usados, terão que
produzir todas as vantagens imorredouras dos filhos de Deus. Isto
porque, entenda bem, nenhuma força deve ser destruída, mas sim bem
orientada! Aquele, pois, que mais depressa transformar a fase
negativa de uma lei em fase positiva, esse torna-se maior. A grande
questão não é apenas jogar, mas sim jogar bem!
E
nos despedimos, porque tínhamos o que fazer, em setores diferentes
na aparência, mas iguais na realidade, porque ambos lidávamos com
irmãos sofredores, uns de certo modo, outros de outros modos, porém
todos eles por causa de íntimas desarmonias, de marcantes desajustes
em face da Lei de Deus.
*
* *
Em
face da Lei de Deus não quer dizer em virtude de ter um credo
religioso ou deixar de tê-lo; e isso se verá adiante, através de
fatos, mas de fatos inapeláveis, apresentados diante da Justiça
Divina, nestas plagas de Luz e Realidade, onde as burlas do mundo não
podem influir.
Silvestre
convidou-nos, dias depois, para auxiliar no recolhimento de um irmão,
que se encontrava a quinze anos e poucos meses nos umbrais, para onde
se baldeara pelas obras que praticara.
A
partida do grupo deu-se entre alegrias, até atingirmos a fronteira
das trevas, a algumas centenas de quilômetros da crosta, para fora
da crosta. Ali foi colocada, na boca de um dos cães amestrados, uma
peça de roupa, a parte astral, do irmão a ser de lá retirado.
E
a descida foi sendo feita, com aquela prudência que caracteriza os
trabalhos em tais lugares. Uma vez soltos os três cães, no lugar
adequado, imediatamente tomaram direção a uma vala escura, muito
mais escura do que o normal do ambiente, e que além de mais escura,
emitia uivos e fumaças mal cheirosas.
Dentro
em pouco vinham os cães arrastando um fardo, uma carga esfarrapada e
mal cheirosa; era o tal irmão, ex-funcionário de rendas públicas,
que em companhia de outros, um grupo coeso, traficava com a função,
vendia o dever, etc., se bem que fosse categórico afirmador das
verdades espíritas.
Depois
de conduzi-lo a lugar melhor, claro mas não muito, de dar-lhe banho
e roupas limpas, fomos com ele ao Centro Espírita onde ainda, muito
velhinha, funcionava a velha lavadeira. Embora quase centenária,
estava bastante forte e suas maravilhosas faculdades em plena ação.
E ao seu redor, como que agrupadas por mãos celestiais, pessoas de
bom quilate moral e esplêndidas faculdades também.
Assim
que demos entrada, não no local material, a sala muito pobre, mas
sim no ambiente psíquico, luminoso e serviçal, alguns videntes
anunciaram a presença de todos nós, “conduzindo um irmão que
tinha tudo de muito sofredor”.
E
sobre a Mesa Astral, farta em apetrechos e instrumentos socorristas,
como sói acontecer nos bons Centros Espíritas, foi colocado o irmão
sofredor, deitado em branco lençol também astral, ou feito de nossa
matéria. Após, o Guia do Centro retirou dos corpos três espíritos,
pô-los ao redor e comandou:
—
Vocês
já sabem que os espíritos encarnados, onde quer que vão, fornecem
elementos fluídicos animais, altamente magnetizados, mormente quando
devidamente comportados perante o Senhor Deus. Vocês, felizmente,
estão de boa conduta perante a Lei... Portanto, uma vez mais,
estendam as mãos na direção da cabeça desse precisado filho de
Deus, nosso irmão.
Dos
componentes da Mesa saía uma faixa nebulosa, onde se misturavam o
azul, o verde e o vermelho vivo, que atravessando os três corpos,
vinham também passar pelos respectivos espíritos ou seus corpos
perispiritais, saindo pelas pontas de seus dedos, em forma de jorro
avermelhado brilhante, que essa é a cor do fluido vital. E entrando
pela cabeça do irmão, se distribuía pelo corpo todo, vendo nós
que atingia as células mínimas, como se fosse vida, algo por demais
fluídico para ser considerado como matéria fluídica.
O
ambiente todo, o astral, era uma poderosa oração endereçada ao
Senhor do Infinito, por isso mesmo que sendo Onipresente, Onisciente
e Onipotente dá a cada um segundo as obras e o merecimento.
—
Basta!
– comandou o Guia do Centro, a certa altura.
Todos
desviaram as atenções, os três encarnados retornaram aos
respectivos corpos e o irmão foi por nós retirado, havendo-nos
retirado também, depois de agradecer ao Guia do Centro a cooperação.
Silvestre
foi até a velhinha, envolveu-a com as mãos luzentes e beijou-lhe a
testa enrugada, com uma ternura que não se pode descrever. E ela,
que via tudo, com outros que também viam tudo, rendia graças a
Deus, a Jesus e a Maria, por tamanhas e “imerecidas alegrias”.
Observando
aquilo tudo, lembrei-me de Jesus, quando louvou a Deus pelo fato de
revelar as grandezas do Céu aos simples e humildes, escondendo-as
aos que se julgam grandes. Aquela pretinha encarquilhada por fora,
brilhava por dentro e por fora, revelava um coração imenso que se
desfazia em ondas multicores, enquanto que, feliz ou infelizmente,
temos visto os rotulados do mundo, os que se presumem donos da
Verdade, porque levantam paramentosas instituições e encarapitam
sobre elas rompantes estatutos, temo-los visto, repito, fardados de
cores escuras e acompanhados de menos felizes companhias espirituais.
O
Reino do Céu continua e eternamente continuará a pertencer ao Amor;
e quando os homens, que se acreditam sábios, reconhecerem que a
sabedoria do homem é de fato estultícia perante Deus, como ensina a
Escritura, então tratarão de tomar o rumo certo. Mas, ao chegarem
tardiamente ao Templo do Amor, lá encontrarão aquelas crianças de
que falou Jesus, e aqueles simples e humildes a quem o Pai Divino
desde muito revelara Suas Glórias, Glórias que não respeitam os
tratados humanos, empanturrados de mil e um pernosticismos
terminológicos, com os quais tudo fazem para acobertar a falta de
Amor, do Amor Vertical de Deus, que desconhece as rompâncias dos
preconceitos humanos.
Quando
saímos com o irmão socorrido, fomos colocá-lo à beira de
maravilhoso lago; e Silvestre fê-lo dormir, aplicando-lhe passes
magnéticos.
—
Quando
acordar – disse – terá a impressão de ser outro, tal o estado
de saúde em que se irá encontrar.
— E
deverá sentir-se feliz! – exclamei, julgando a coisa a meu modo.
Silvestre
abanou a cabeça e observou:
— Isso
é outro problema, pois ele terá que se lembrar, enquanto não
reencarnar de novo, que foi um funcionário altamente corrupto... E o
fará, ainda, sob a noção de que conhecia as verdades espíritas...
Compungido,
fiquei olhando para Silvestre, e foi ele mesmo quem, ponderoso e
sentido, comentou:
— O
Espiritismo é a Igreja do Caminho restaurada, que montada sobre a
Revelação generalizada por Jesus, adverte, ilustra e consola. Isso,
apenas isso, nada fora disso!
—
Realmente,
irmão Silvestre – concordei.
Algo
severo, erguendo a mão direita em sinal de alerta, volveu:
— Lá
está afirmado, no capítulo final do Apocalipse, que a cada um será
dado segundo as obras que praticar; e como mais será exigido daquele
a quem mais haja sido dado, bem podemos saber que somos obrigados a
ser juízes de nós mesmos, através de nossas mesmas obras.
Portanto, a saúde foi devolvida ao nosso irmão, mas a saúde
exterior... A saúde do espírito, da consciência, ele terá que
arranjá-la à custa de trabalhos ressarcitivos, no Espaço e no
Tempo!
— Bem
compreendo agora, irmão Silvestre, que andar em dia com as letras
bíblicas, apenas em teoria, nada mais representa do que aumento de
responsabilidade.
Ainda
sob forte impressão, Silvestre acrescentou:
— Sim,
buscar a Verdade que livra, na expressão do Cristo, não é procurar
o exterior da Verdade; porque ela, apenas conhecida, já meteu, mete
e meterá muita gente nas trevas exteriores, muitos
espíritas também,
pois a Justiça Divina é acima de sectarismos quaisquer.
E
como viessem ao encontro dois guardas da campina, fomos andando com
os mesmos, aproveitando eu para aspirar aquele ar maravilhoso. Demos,
após, com as vistas numa estela alvíssima, plantada entre rosas e
lírios, brancos e rosa em suas cores, emprestando ao local um
sentido superior, um misto de mais beleza ambiente e mais um toque de
espiritualidade.
— Leia
a inscrição – disse-me Silvestre.
Em
letras douradas, ressaltando do branco alvíssimo do material de que
era feita a estela, estava lembrada a sentença do Cristo:
“E o que quereis que vos façam a vós os homens, isso mesmo
fazei-o vós a eles”
Silvestre
acompanhou o meu gesto, observou a minha reação e ficou aguardando
a minha opinião; como me calasse, perguntou:
— Que
mais te impressiona nessa recomendação do Cristo?
Pensei
e respondi, sem ter a pretensão de analisar totalmente o seu
sentido:
— O
sentido de Justiça Universal, irmão Silvestre.
Ele
assentiu com um movimento de cabeça, acrescentando:
— Sim,
sim... Fala ao sábio e ao ignorante com a mesma absoluta
regularidade, lembrando a obrigação de exercitar a Justiça
Elementar, que a todos atinge e responsabiliza, menos aos mentecaptos
ou dementados.
E
fazendo silêncio, encarou-me com agudeza, indagando:
— Quem
colocou isso aí e por quê, Artur?
— Não
sei, irmão Silvestre.
Abraçou-me,
com emoção profunda, informando a seguir:
—
Fomos
nós dois, faz alguns séculos! Essa estela marca o nosso reencontro
com a Paz e a Ventura, irmão Artur. Foi aqui, nos Céus do Brasil,
que dois juízes venais, vindos da Europa, tornaram a ver as benditas
claridades e se rearmonizaram com a Paz de Deus! E o irmão que
recolhemos hoje, Artur, é um dos comparsas de velhos crimes, que
ainda não está melhor recuperado... Foi então meu pai carnal e teu
tio... E eu desejo que ele também venha a ter em grande conta este
marco plantado no seio desta campina florida!
Estava
com o rosto banhado, em sua testa vincos profundos se mostravam, mas
o semblante, em seu todo, era de muita alegria; ele sentia que mais
uma vez estava festejando o reencontro com a Lei de Deus, que não
faz discursos nem inventa rituais, porque é acima de ginásticas
humanas.
— Hoje
é, para mim, um grande dia! Embora Francisco tenha falhado no mesmo
sentido, traficando com a função, já mereceu socorro e logo mais o
teremos entre nós, trabalhando para ressarcir as faltas e lutando
para desabrochar o Cristo que tem dentro de si mesmo.
Eu
nada mais fazia do que fitá-lo, sentindo dentro de mim que muito o
estimava, principalmente porque ele, acima de tudo, desejava melhorar
e fazer melhorar.
Depois
de enxugar o rosto, apanhou-me pelo braço e fomos caminhando;
enquanto íamos pisando o maravilhoso tapete, ele comentava:
— O
Infinito, se é problema, é para o Nosso Pai Divino... A nossa
parte, Artur, que é muito relativa, ninguém a fará por nós! E se
nos lembrássemos sempre de uma palavra que é composta de apenas
quatro letras, quanta dor de menos, para nós e para os nossos
queridos!
— Sim,
grande amigo, os homens em geral fazem questão de ser sábios ou
complexos, e isso fá-los esquecer do Amor, da única medida
redentora, pois que os Grandes Mestres ensinam, mas não podem
realizar por ninguém.
E
quando chegamos ao Departamento, um bom aviso nos esperava; é que
Noêmia estaria à minha espera, em hora certa e lugar certo, para
onde eu seria conduzido por uma pessoa que me viria buscar.
*
* *
Há
uma questão que todos levantam, quando a lembram, assim que chegam a
estes rincões de Paz e Ventura; é perguntar em que paragens da
erraticidade maior estariam, se não tivessem cometido erros e
crimes. E foi nisso que andei pensando, depois de pensar no irmão
socorrido, pai carnal de Silvestre e meu tio. Todos nós,
funcionários venais, onde estaríamos, sem o peso das venalidades?
— Quem
poderia aquilatar isso de modo exato? – respondeu perguntando
Silvestre, quando lhe formulei a pergunta.
— Bem,
não é certo que somos, nesta região, espíritos em ressarcimento?
— Nem
há dúvida! – retorqui.
— Isso
até parece “psitacismo”! – lembrou alguém, que estava
conosco.
— Que
bicho é esse? – perguntou um outro, curioso, rindo-se a valer.
E
o pai da questão explicou que era um assunto que não é assunto,
uma explicação que não explica, um fato que não tem sentido de
fato, uma farra em matéria de falta de bom senso e lógica.
—
Então
é sabedoria humana! – gritou alguém, cujos sofrimentos lhe
garantiam o direito de assim dizer.
Graças
a Deus, naquela hora vieram chamar-me, para ir ao encontro de Noêmia,
que me esperava. Se eu estava ansioso, com o aviso tornei-me nervoso,
excitado e acho que até perturbado mental. Os grandes espíritos
vivem para as questões coletivas, morrem carnalmente pelos ideais
universais, gozam até o sofrimento pelas causas que hão de
frutificar nos milênios porvindouros; mas eu, que vinha das
enxurradas do crime, apenas sentindo que devia ser o mais honesto
possível, sentia que tinha na minha querida Noêmia, o meu Anjo
Guardião de todos os momentos.
Quem
me veio buscar era uma jovem deslumbrante de beleza espiritual, um
pedaço bem grande das Altas Esferas, isso eu podia compreender, pois
se tudo nela se caracterizava pela beleza exterior, muito mais fluía
nela a beleza interior, que os seus olhos feitos de absorvente
irmandade obrigavam a sentir. Era uma bela jovem, porém muito mais
uma poderosa força mental, que obrigava à convergência de seus
elevadíssimos pensamentos.
—
Comande
como bem quiser, senhora! – disse-lhe eu submisso.
Com
aquela meiguice que caracteriza os espíritos das Altas Esferas, ela
me apanhou pelo braço, sussurrando:
— Sou
sua irmã... Apenas sua irmã... Venha comigo e partilhe francamente
da minha irmandade simples e humilde...
Ela
devia saber o que ia pelo meu pensamento, tremendamente arrebatado
pela sua deslumbrante simplicidade e humildade, bem diferente das
pessoas que eu lembrava do mundo, que até das patifarias faziam
alarde e motivo de orgulho.
—
Ainda
me ressinto das formalidades e, também, das grosserias do mundo,
minha doce irmã – disse-lhe eu, procurando vencer minha inibição.
Com
aquela graça infinitamente simples, que se tornava som vocal, ela
disse:
— O
mundo terrícola, onde muitas vidas vivi, e ao qual ainda pertenço
como cidadã de uma faixa astral, marcha muito lentamente no rumo da
Perfeição; mas os que fizerem força para evoluir, isto é, os que
confiarem nas obras de Amor, certamente avançarão, rumando para as
vizinhanças do Plano Crístico, onde a vida é imensamente distinta
dos planos inferiores. Há um sentido de Paz e de Ventura em toda
parte, nos Reinos de Luz, mas a variação das intensidades se afirma
cada vez mais, caracterizando a sublimação do meio ambiente,
eterizando a matéria astral, até atingir o Plano Crístico, onde
nada mais há que se caracterize pela forma ou pelas construções
formais.
— Que
fazem os habitantes do Plano Crístico, irmã? Nem sei como perguntar
isso, mas a mim parece que é justo perguntar, pois um pouco mais de
elevação me embaraça a mente e parece me afogar o coração...
Eu
notava que íamos subindo, não verticalmente, mas em boa
porcentagem, pois os lugares eram cada vez mais belos, mais ricos em
tudo, salientando-se as flores e as águas, as vestimentas dos seus
habitantes, a policromia geral, o sentido de penetração das
faculdades espirituais.
Antes
de responder, ela me envolveu pela cintura, enlaçou-me com o braço
direito, e eu senti que ganhei uma nova energia, um certo poder de
harmonia, dessa harmonia que vinha perdendo, com a subida gradativa,
com o aumento das luzes e dos esplendores locais.
— Os
Cristos ou espíritos cristificados, irmão, são as Potências
Celestiais que infundem a vida e coordenam o movimento das galáxias,
dos sistemas, dos mundos, de tudo quanto tem sentido material, essa
matéria complexa que é a ferramenta dos espíritos em processo
evolutivo. Embora tudo seja em Essência manifestado pelo Ser
Absoluto ou Deus, as comunidades crísticas comandam o Cosmo, vigiam
e controlam os movimentos universais. E dizem, porque eu ainda estou
longe dessa ordem vibratória, que o Cristo Planetário é o Elo que
liga a humanidade planetária às comunidades crísticas, e estas,
por sua vez, ao Ser Absoluto, que embora sendo Onipresente, é
essencial demais para ser atingido pelos Seus filhos de menos
extensões vibratórias.
—
Todavia
– disse-lhe – por aqui podemos sentir a Presença Divina com uma
facilidade enorme. Sentimos Deus até sem querer!...
— Sim,
muito relativamente, irmão Artur... Cada um vai, ou cada habitante
de cada faixa, até onde pode... Eu não suportei, faz dias, um
forçamentozinho de alguns graus. Todos chegaremos lá, sem dúvida,
mas o trabalho de burilamento individual é indispensável.
— Sim,
eu compreendo isso; mas, mesmo assim, tudo por aqui é muito mais
fácil de sentir. E como seria mais fácil ou prático, para avançar
mais no sentido da Divindade Onipresente?
Parando
na marcha lentíssima, porque a viagem estava sendo feita lentamente,
por motivo que ela devia saber perfeitamente, e que eu creio que
fosse para facilitar aprendizados, ela falou-me:
—
Sobre
os planos superiores ao meu, nada digo, mas para a gente do meu plano
de vida, o melhor modo de atingir mais no sentido da Divindade
Onipresente é uma questão de atingir mais sobre os mais elevados
espíritos que nos visitam. É comum dizerem que o brilho dos Altos
Mentores é o reflexo que eles já conseguem manifestar do Divino
Brilho de Deus. Assim sendo, cada um reflete Deus ou filtra-O,
segundo o seu grau de evolução. E é reconhecido, também, que nada
pode mais refletir o Deus Onipresente do que os Seus filhos, os
espíritos. E se você quiser experimentar, eu lhe servirei de
instrumento de experiência... Tanto basta olhar para mim, que irei
me revelando mais como realmente sou, até que suporte, quando então
tornarei a me restringir...
E
assim foi feito. Ela começou a brilhar de modo estranho, depois a
perder a forma humana, depois tomou a forma de brilhantíssima
estrela... Mas quando a estrela foi aumentando o brilho, não mais
suportei, e não só pedi que parasse, como senti que meus joelhos
queriam dobrar-se, o que ela não permitiu, afirmando que somos todos
irmãos, sendo o Pai um só, que é Deus.
Quando
tudo voltou à ordem anterior, falei-lhe:
—
Você,
querida irmã, já é um grande refletor do Nosso Pai Divino!
—
Existem
outros, irmão Artur, diante de quem eu ainda nem simplesmente posso
ficar... Entretanto, lembremos, todos vamos para a Unidade
Vibratória, todos marchamos, lentamente, na direção do Grau
Crístico, que é a Sagrada Finalidade do espírito.
E
chegamos ao ponto de encontro, um plano azulino doirado, uma cidade
onde as flores e as águas cintilantes e multicores tomavam conta da
paisagem. De longe em longe havia um grande edifício, em forma
piramidal, sendo os arredores uma verdadeira exposição de
maravilhas, com aves lindíssimas, coloridas, enchendo a paisagem e
os ares de vida, mas de vida altamente sublimada, como se o Bom Deus
estivesse oferecendo uma festa de Graças a Seus filhos muito
queridos.
— Este
– disse a doce mensageira – é o Céu de Noêmia.
Aquela
palavra informativa estava me assustando, mas logo acrescentou, numa
expressão de ternura maternal comovente:
— Não
se importe com a diferença, querido filho do Céu, que se você
ainda não pode viver aqui, Noêmia pode viver onde você habita. É
da Vontade de Deus, e Vontade que os Cristos representam e fazem ter
execução, que o amor entrelace os Seus filhos, maiores e menores,
para que todos cresçam. E como quem tem mais, pode e deve dar mais,
Noêmia irá, de hoje em diante, cumprir tarefa junto dos que, no seu
plano de vida, estão aprendendo a ser amorosos, estão procurando
subir na escala dos valores íntimos.
Paramos
defronte a imenso prédio, parece que feito de alabastro e pedras
preciosas, porém de material vivo, vibrante, e não como na Terra,
nem como no meu plano de vida, onde tudo é ainda um tanto opaco.
Entretanto,
fomos dar em vastíssimo salão, havendo no centro uma mesa ovalada,
como nunca pensara ver de tamanho igual; e ali estavam sentadas, em
pequena parte da mesa, umas oitenta pessoas, entre homens e mulheres,
estando Noêmia entre as mesmas. Assim que chegamos, todas se
levantaram, tendo sido a Grande Mãe a primeira que veio ao meu
encontro, apanhou-me pela mão e me conduziu até ao lado de Noêmia,
onde me colocou, indo após para o seu lugar, e lugar que ficava na
ponta ovalada.
Um
som maravilhoso se ouviu, provindo parece que das profundezas de nós
mesmos. Entretanto, toda aquela gente gloriosa olhou para a porta, se
assim se poderia dizer, que dava para o lado direito, feita em forma
de triângulo, toda entalhada e cravejada de preciosidades
reluzentes, representando cenas da vida de Jesus Cristo.
A
Grande Mãe foi para a entrada maravilhosa, ansiosa e simples como as
simples e ansiosas mães, e no umbral de entrada abraçou um jovem
esplendoroso de vida e de felicidade, tão contagiante em suas graças
e virtudes, tão simples e tão puro, tão irmão e tão igual em
essência, que todos se inclinaram como que forçados por
encantamento divinal. Com ele vinham dois outros, bem se via que
menores em hierarquia, porém muito acima do que podemos supor.
Eles
foram para a outra ponta ovalada daquela mesa enorme, e ao sentarem
um vozerio se fez ouvir, entrando para dentro do salão imenso uma
multidão de jovens de ambos os sexos, esplendentes de luzes e de
alegria, vestidos com roupas parece que esponjosas, coloridas e
farfalhantes, musicalmente farfalhantes.
A
Grande Mãe falou, ecoando aquela voz musical pelo imenso salão, ou
de modo a se sentir que a voz tinha saído de toda a sua grandeza:
—
Irmãos
queridos, aqui estamos para dizer boas-vindas a cinco de nossos
concidadãos, que depois de cumprirem tarefa na crosta, voltam a nós
como felizes servidores do Pai Divino. E como o Pai Divino
recompensa, sem tornar Suas recompensas alardeantes, pedi ao Nosso
Senhor Planetário, que com a sua presença nos cumulasse de graças.
Estando ele presente, a ele passo a palavra, para que fale o que
desejar a cada um dos recém-vindos.
Sem
nenhuma formalidade, muito familiarmente, o jovem de olhar meigo e
cintilante falou:
—
Traga-os,
mãe, um por um até mim.
Ela
foi ao encontro de uma velhinha muito encurvada, segundo como saíra
dos laços carnais, apanhou-a pela mão e conduziu-a à presença
dele; e ele, que era muito mais alto, colocou-lhe a mão sobre a
cabeça, disse algo em linguagem que não entendi e fez a velhinha
transformar-se numa jovem esbeltíssima, coroada de luzes multicores,
parece que algo maravilhoso transformado em uma pessoa.
Assim
fez com três mulheres e dois homens, sem falar com eles; mas quando
todos tinham retornado a seus lugares, ele disse, em tom singelo:
—
Irmãos
e amigos queridos, o nosso Planeta ainda é dolorosa moradia, cheio
de estorvos e perigos; mas o Pai não falta jamais, enviando a Seus
servos o Divino Auxílio. Eu me regozijo convosco, os recém-vindos,
pelo exemplo deixado no mundo, pois ele servirá de roteiro de luz a
muitos outros irmãos nossos. Se, em verdade, a Lei e o meu exemplo
são conhecidos, nem sempre os que vão a ele, nas condições de
mensageiros encarnados, dele voltam triunfantes. O bom exemplo
reclama simplicidade e renúncia, e o mundo arma ciladas com o
egoísmo e o orgulho... Mas vós triunfastes, e aqueles que fracassam
terão que triunfar um dia, e o Pai Nosso a todos nos recolherá...
Elevemos ao Pai Nosso, irmãos queridos, o nosso pensamento de
gratidão!
Não
saberia dizer o que aconteceu: muito menos, como aconteceu; mas sei
que o prédio sumiu e todos nos elevamos, pairando nos ares
ofuscantes de Luz e Glória, cânticos e votos de felicidade a todos,
a todos nós das esferas inferiores, os que ainda estão com o Reino
do Céu interior quase todo por despertar.
O
jovem cintilante foi sumindo no Infinito, deixando grupos no caminho,
até que ficou sozinho entre dois outros. Aquele incêndio de Luz e
de Glória foi se apagando, apagando, apagando...
A
Grande Mãe entregou, ainda nos ares, cada um dos cinco aos entes
queridos, apontando o caminho de volta. Olhando para baixo, vi o
imenso prédio no mesmo lugar, engastado no seio de um painel feito
de águas e flores cintilantes e musicais. E como cada um tinha um
guia, ela comandou o retorno, augurando a todos muitos e felizes
trabalhos.
— Que
o Pai nos abençoe, meus queridos, e que na obediência de Sua Lei e
do Seu Ungido, estejamos prontos ao trabalho fraterno. Todos fomos
destinados a uma Ressurreição Final, e todos a atingiremos, se nos
amarmos como nos ama o Nosso Divino Modelo, que, como vistes, é
simples e humilde.
Quando
a esbelta jovem nos colocou no chão do meu plano de vida, para ter
em mente o nome de mais uma irmã superior na escala evolutiva,
perguntei-lhe:
— Como
se chama a doce irmã, a quem tanto devo?
Ela
parecia feita de um sorriso estelar, e foi sorrindo que respondeu:
—
Maria
de Magdala.
Quis
beijar-lhes as mãos alvíssimas e benfeitoras, mas foi ela quem o
fez, dizendo palavras de carinho, lembrando Jesus durante a
encarnação e oferecendo sua ajuda, quando quiséssemos dela o
auxílio, para os trabalhos de socorro. E posso afirmar, por tamanhas
provas armazenadas, que é muito difícil agradecer aos maiorais da
espiritualidade, porque eles nos antecedem e fazem tudo primeiro do
que nós, e melhor do que nós, porque colocam tamanho Amor nos atos,
que ficamos augurando para eles a paga de Deus e não a nossa.
*
* *
Enquanto
não for ultrapassada a obrigação reencarnacionista, deve contar o
espírito com a volta à carne, de tempos a tempos, cumprindo função
e adquirindo luzes internas. É o coscorão em desgaste, para que a
gema pura cintile perante o Sol da Divindade Absoluta.
Muitas
vezes, infelizmente, o Reino do Mundo fala mais alto do que o Reino
do Espírito, e o candidato à Sagrada Finalidade resvala, vai parar
nos abismos da subcrosta ou nos umbrais, isto é, no sentido inverso;
mas, ainda assim, estará sob o controle Divino, pois tudo é pesado
e medido, nada foge à Ordem Divina, que é em tudo Lei, Amor e
Justiça Absoluta.
Uma
coisa é encarnar para fim absolutamente expiatório; outra coisa é
fazê-lo para fim absolutamente missionário; outra coisa para
enfrentar trabalhos ou provas evolutivas normais, e, ainda outras,
quando se mesclam todos esses fatores.
De
qualquer forma, porém, os menos evoluídos reencarnam mais, sendo
que muitos, das mais altas esferas, passam até milênios sem
reencarnar.
Verdade
a saber, também, é que nada tem que ver involução com crimes; o
criminoso é quem transgrediu a Lei, e o involuído é apenas um
involuído. Este é como a gema que dorme no seio do coscorão,
enquanto aquele, o criminoso, é como a gema que se deixou manchar
por um impacto menos feliz, e de cuja mancha terá que se livrar
através dos próprios esforços.
E
assim como a encarnação fornece dezenas de milhares de almas, todos
os dias, aos planos erráticos, também os planos erráticos
fornecem, todos os dias, dezenas de milhares ao plano carnal; e,
infelizmente, o grande número não vem com as recomendações em
dia, sendo certo que, dentre os infelizes, contam-se muitos elementos
categorizados que se deixaram envolver pelos enganos do mundo.
Conta
o Evangelho que Jesus, no fim de Seus dias terrícolas, agradeceu aos
amigos fiéis o fato de terem estado com Ele nas horas de tentação;
é bem de aquilatar o exemplo do Mestre dos Mestres, para ressaltar o
quanto é perigoso encarnar em um mundo como a Terra, onde o bolso, o
estômago, o sexo, o orgulho e o egoísmo, em lugar de ferramentas de
uso, passam a ser os senhores absolutos da criatura. Quando assim se
passa, a Moral, o Amor, a Revelação, a Sabedoria e a Virtude ficam
por baixo, isto é, a Lei e o Cristo são relegados a plano inferior,
e, conseqüentemente, a Morte vem pilhar o espírito em tristes
condições. Muitas vezes estão forros de bens e glórias do mundo,
mas o túmulo faz imediata separação e o destino é a subcrosta,
por dezenas, centenas ou mesmo milhares de anos, quando a mente do
indivíduo não muda de rumo, nem mesmo com a dor!
Temos
corroborado nos serviços reencarnacionistas, bem como observado com
um imenso respeito, o reencarne de alguns maiorais da
espiritualidade; e como deveis conhecer de sobra, que a cada um é
dado segundo as obras, tudo é na mesma ordem, para vir como para ir.
É um desses fatos que vamos relatar, porque a volta de Noêmia
coincidiu com o reencarne de uma nossa diretora, a chefe geral dos
serviços de relações interplanos da região. Enfim, um órgão
simples, controlador do movimento entre os de cima, os de baixo e os
das regiões pertencentes à mesma faixa ou subcéu. Divide-se, é
claro, em departamentos, chefias e subchefias. A diretora, afora a
competência técnica, deve dispor de certos recursos psíquicos, de
certas extensões mediúnicas. O fato de ser uma mulher, e de tê-la
substituído outra mulher, não quer dizer que não possa ser homem o
tal funcionário; é mera coincidência, pois.
Primeiro,
houve o tempo de ensaio de Noêmia, até ficar apta ao desempenho da
função. Foram dias, apenas, mesmo porque os funcionários
componentes da organização eram capazes e de uma dedicação a toda
prova. Eram e são, pois nestes
planos o coração manda muito
e tudo é feito para mais e não para menos, quando se trate do
simples servir ou do gosto de fazer o bem. A brutalidade que se
observa na crosta, a incompreensão da importância do trabalho, pois
todo ele representa uma grande parte das obrigações coletivas de
cada filho de Deus, isso por aqui não se encontra. Se os bons
elementos encarnados sabem que a grande
oração é o cumprimento do dever,
por aqui essa realidade sobeja, porque aquele que trabalha ganha
méritos ou acumula direitos, e tem em si mesmo a graça
imediatamente recebida, numa condição emotiva sublime, que não
saberia como definir.
Para
muitos, na crosta o trabalho é como dolorosa obrigação, em virtude
de haver a exploração de uns sobre o trabalho de outros, por
variantes motivos, talvez bem explicáveis uns, mas jamais
explicáveis outros, do ponto de vista da Vontade de Deus, isto é,
das leis fundamentais que regem o Universo Infinito. É como se uma
fera comesse outra, é como se o trabalho fosse a expressão mais
vibrante da luta entre os concorrentes pela vida ou direitos de
subsistência, orgulho, vaidade, prepotências, etc. Até nos cultos
ditos de fé, nos religiosismos, porque Religião com inicial
maiúscula globalmente na Terra ainda não há; até nisso qualquer
um pode encontrar quem, por malícias ou expedientes que tais,
inventando rituais e manobrismos formais, transforme o seu irmão em
coisa sujeita, em menos do que ele, para muitos fins e todos bastante
repugnantes.
É
muito comum e fácil, nos mundos inferiores, os maliciosos usarem
verdades fundamentais, nomes e leis, acontecimentos e fatos, para
deles fazerem arapucas ou instrumentos de negociatas e truculências
contra seus irmãos. Os abismos da subcrosta, os umbrais e as
teratologias que falem!... Mas nos planos de Paz e Ventura, ainda que
em tom mínimo, o trabalho é feito de irmão para irmão, de um para
outro filho de Deus. É o espírito quem vê outro espírito e lhe
tem prazer em beneficiar. E como tudo é tremendo em respeitos
hierárquicos, observai como a ordem funciona. Porque a autoridade
não vai parar em mãos indignas ou incompetentes, e porque, também,
quem manda, o faz com o coração, colocando até mesmo nas
advertências o toque da mestria real, necessária e digna de
agradecimento, porque há um objetivo pairando acima de tudo, que é
filtrar, nos atos, o sentido da Verdade nos conhecimentos e do Amor
nas aplicações.
Mafalda,
a ex-diretora, tinha méritos e escolheu
uma família espírita para o novo meio carnal; isto que pode parecer
uma nonada, representa muito, porque nos verdes anos a criatura é
como a terra preparada, que tudo oferece à semente, para germinar,
crescer e logo produzir os melhores frutos. Era uma alma grande
conduzindo um corpo frágil e pequenito, pois não fora reduzido em
tamanho e consciência.
Com
a entrada de Noêmia para aquela diretoria, e por causa dos “tempos”
que estão marcados nos Livros Proféticos, principalmente no
Apocalipse, as coisas tomaram lentamente novos rumos; porque todo
o século vinte e mais a metade do vinte e um
significam o fim de um período de transição bastante violento, com
vistas à Nova Era, que dos meados
do século vinte e um
irá até às divisas do século
sessenta.
Grandes movimentações, portanto, na subcrosta e nos umbrais, e como
é sabido que pertence à Grande Mãe o comando das legiões
socorristas, em torno dela tudo girou, em matéria de novas
disposições de trabalho. Não pense alguém que tenha havido
descuido de Deus, em algum tempo, para com o funcionamento das trevas
purgatoriais; apenas, em virtude da transição cíclico-histórica,
ou da chegada ou contagem dos “tempos”, o que passou a se dar foi
um maior emprego de recursos, forçando a movimentação de legiões,
no sentido de apressar a melhora e servirem, as tais legiões, em
benefício do bem em geral.
Muito
reduzido é, ainda, o número daqueles encarnados que cooperam
conscientemente nos serviços de socorro; e dizer mais não seria
vantagem, porque os recursos empregados para tais descidas
socorristas, não cabem na mente de quem está por demais embutido
nas grosserias do mundo físico. Mormente quando se trata da
interferência direta da Grande Mãe e das suas legiões, e que o
Filho Ungido jamais deixa de participar com o Seu Divino Influxo,
através de Seus Poderes de Ubiqüidade, desta Graça Divina de que
fazem uso tais Elevados Espíritos, e que de nada adiantaria falar,
desta Divina Graça ou Lei, porque excede de muito ao que dela
poderiam pensar, aqueles que não a possuem ainda. Porque as Graças
Divinas são como medidas impossíveis de serem analisadas pelo
simples raciocínio, e só quem nelas vai tomando parte, delas podem
sentir e fazer uso, mas não sei eu como poderiam falar ou explicar.
Outra
medida tomada foi a procura de ambientes encarnados apropriados ou
sintonizantes; porque aparências existem e de sobra, mas o real
valor psíquico e mediúnico é reduzidíssimo,
causa espanto e dor. Entretanto, alguns grupos foram localizados e o
trabalho, com a participação de algumas dezenas de encarnados, foi
tendo curso e se está estendendo aos poucos.
E
com isso, temos tomado contato com o diagrama terrícola, temos
subido por medidas de graça e temos descido muito, para forçar a
retirada de quantos se revelem, desejosos de arrependimento e
recuperação, e deles após fazer uso em trabalhos socorristas de
menos responsabilidades, ou assim como possam ir servindo, de acordo
com as próprias melhoras. E se é doloroso dizer que certos filhos
de Deus não querem, de modo nenhum, atender aos nossos convites, é
maravilhosamente grato observar que verdadeiras legiões deixam os
lugares de pranto e ranger dos dentes, em busca de alguma Paz e de
alguma Ventura. E como é sabido que a Paz e a Ventura dos Cristos
começaram também assim, o que vemos é irmãos nossos, filhos como
nós do Eterno Pai, fazendo a escalada cristificadora, tomando parte
no esforço comum pela Ressurreição Final, que para todos está
destinada.
Se
o trabalho de levantar legiões de irmãos da subcrosta e dos umbrais
é enorme, convém lembrar que é quase um mínimo em face dos
tratamentos posteriores. Para as colheitas maravilhosas valem os
empregos vibratórios de quem já vos falei, mas para certas
reconstituições perispiritais devem valer os esforços de cada um
dos recolhidos. Feliz daquele cuja capacidade mental atinja o ideal
de Deus, da Verdade, do Amor e da Virtude, porque ele lutará de
igual para igual com as tristes marcas do passado, não se deixará
intimidar pela lembrança dos erros e crimes perpetrados, levando aos
poucos tudo de vencida. Principalmente quando chega a hora de entrar
em serviço, de ganhar seu bônus, suas regalias, tudo muda mais
depressa, porque a alegria é moto tremendamente propulsor.
No
mundo espiritual as coisas se passam de modo bem esquisito, se formos
comparar com o mundo carnal; porque a quem tem, de fato tudo pode
aumentar com certa facilidade, mas a quem não tem, tudo pode custar
tremendos esforços. As vantagens do Bem empregado são como juros a
render juros, e tudo é no sentido do mesmo Bem; mas a ignorância e
o atraso, as manchas negras e as visões macabras, só para isso
mesmo tendem, retardando as melhoras e dificultando a entrada nos
serviços que distraem e amealham regalias.
As
religiões, se é que merecem tal título as organizações ditas
assim, cometem graves faltas quando amedrontam as criaturas, e sobre
tudo apresentando, como medidas de libertação, rituais e
fingimentos, além da venda de certas mercadorias que, em verdade,
nem no mundo carnal passam de tribofes grosseiros. Não se pode
compreender, depois de se chegar aqui, como conseguem tais
organizações ludibriar tantas criaturas, impondo comércios
vergonhosos, contra o ideal de Verdade e de Amor, que seria tão mais
simples e mais fácil de ser executado, além de ser o único que por
Deus é determinado e aceito. Reconhecemos que homens há que vendem
artigos podres, que falsificam os bons, que corrompem tudo, com o
fito de aumentar as respectivas fortunas; mas como conseguem enganar
tanta gente, vendendo séculos a fio suas corrupções e iniqüidades?
Se respeitamos a falsa vantagem dos que vendem patifarias, como
pensaremos, todavia, dos que as compram, apenas?! E se dissermos que
os vendilhões de idolatrias usam os nomes de Deus, da Verdade, do
Amor e da Virtude, para impingir suas pecaminosas mercadorias, por
que, então, os estultos compradores não usam dos mesmos nomes, para
descobrir que são tolos, que Deus não Se convence com tais
ridículas transações?
Temos
visto, apesar de tudo, que a quase totalidade dos que vêm das trevas
foram bons compradores de mercadorias religiosistas; e como a praga
dos vícios idólatras e sectários cristaliza as mentes pelo
comodismo
criminoso,
depois de iludir com o ópio sacramentista, foi criado um campo de
repouso, em uma área vastíssima que compreendia imensas planícies,
(ou que compreende, pois eu deixei a função há tempos, mas o
trabalho continua) montanhas, rios, florestas frutíferas e fartura
de aves belíssimas, etc. Nessa área de repouso foram ou são
colocados, aqueles que vão melhorando, que vão conseguindo meditar
melhor. Porque, se é fácil atingir certa cura por fora, não é tão
fácil curar alguém do seu fanatismo sectário.
Também
é necessário considerar a complexidade do caráter humano, ao
dar-se a mudança e aos primeiros toques de melhora; porque, em
muitos casos, a criatura se revela revoltada contra tudo quanto foi
ou é passado, entregando-se aos novos e simples aprendizados com
muito empenho, auxiliando grandemente a melhora geral e o avanço no
rumo do Céu interior.
Em
virtude de ser necessário, na maioria dos casos, esperar pela
compreensão lenta dos elementos socorridos, foram colocadas algumas
estelas com inscrições doutrinárias pela campina e pela montanha;
e assim o enfermo de corpo e de espírito encontra de tudo, frutos e
ensinos, enquanto faz estágio, enquanto vai ajustando a mente a
outras e reais verdades, deixando para trás os feios vícios que
lhes minaram a mente e o coração, encaminhando-os aos lugares de
treva.
Uma
estela se achava postada ao lado de uma espécie de cerejeira e
dizia: “É
HORA DE MUDAR DE CONHECIMENTOS, CONCEITOS E PRÁTICAS.”
Outra
se encontrava junto a uma cristalina fonte e dizia: “ASSIM
COMO A ÁGUA JORRA DO SEIO DA TERRA, ASSIM MESMO EU, A ESSÊNCIA
DIVINA, JORRAREI DE DENTRO DAQUELES QUE ME PROCURAREM ATRAVÉS DA
VERDADE, DO AMOR E DA VIRTUDE.”
Outra
ficava junto a um pico de montanha e dizia:
“AQUELE
QUE É ALTO DE VERDADE, ENXERGARÁ LONGE, MESMO QUE ESTEJA NUM
ABISMO, PORQUE A VERDADEIRA ALTURA É A DO ESPÍRITO.”
Perto
de um templo derribado, assim feito propositalmente, uma estela
dizia:
“ASSIM
COMO EU, O VOSSO PAI, SOU ACIMA DE MATÉRIAS E DE PAREDES, ASSIM
QUERO QUE VENHAIS A SER. DERRIBAI POIS, TODOS OS FORMALISMOS, QUE EU
APENAS ESPERO DE VÓS O BOM CONHECIMENTO E AS BOAS OBRAS.”
No
centro de um pomar de amoras, outra estela dizia: “VÓS
SOIS CENTELHAS MINHAS E TENDES A MIM NA ORIGEM; BUSCAI-ME NO ÍNTIMO
E EU VOS DAREI A MINHA PAZ E A MINHA VENTURA.”
Junto
a uma fruteira que tinha muitas cascas, ou a casca escamosa, e um
miolo saborosíssimo, outra estela dizia: “ESTAIS
NO CENTRO DE SETE COROAS ENERGÉTICAS E DEVEIS REDUZI-LAS A UMA SÓ,
PARA VOS TORNARDES A GEMA SABOROSÍSSIMA. EU, QUE DOU A VIDA, ASSIM
ESPERO.”
Junto
a um poço sem fim, um infinito profundo, outra estela dizia:
“EU
MESMO SOU A VIDA, A LEI, A JUSTIÇA E A GLÓRIA; QUEM PODERÁ VENCER
ESTANDO CONTRA MIM? OU QUEM ME ENCONTRARÁ, PARA COMIGO DISCUTIR?”
Numa
das saídas, uma estela lembrava: “VÓS
ENTRAIS
E SAÍS, MAS EU SOU O ETERNO PRESENTE, ONISCIENTE E ONIPOTENTE, QUE
TUDO EMANO, SUSTENTO E DESTINO.”
Era
e deve ser muito fácil encontrar muita gente sentada na relva,
defronte a tais estelas, em profunda meditação. Os trabalhadores do
campo de repouso, quando inquiridos, respondem apenas:
“NÓS
TAMBÉM VIVEMOS PERGUNTANDO SOBRE AS LEIS; MAS NÃO PERGUNTAMOS SOBRE
O DEVER DE AMAR COM TODO O FERVOR POSSÍVEL, PORQUE JÁ
ENTENDEMOS
QUE FORA DO AMOR NÃO HÁ PAZ NEM VENTURA.”
Em
linhas gerais, penso que mostrei o plano de trabalhos que está sob a
chefia da Grande Mãe, com vistas ao que deverá suceder no Planeta
Total, a partir dos meados do século vinte e um; isto é, entrar
para um ciclo algo melhor, preparando campo, conseguintemente, para
outros ainda mais avançados, até que o Grau Crístico, a JERUSALÉM
CELESTIAL, tenha feito infusão com o Planeta Total, e a antiga Terra
nunca mais seja encontrada.
*
* *
Quem
vive sobre a Terra, sobre o chão terreno, poucas vezes lembra de
quantas graças lhe oferece Deus, através das multidões de alegrias
que as circunstâncias da vida conjugam. Porque, se o homem ainda
continua revel aos ensinamentos fundamentais, ou pronto a corromper
os ensinamentos e a estabelecer na Terra o império da maldade, certo
é que a vida carnal é cheia de oportunidades e alegrias. E se
considerarmos que os grandes espíritos têm motivos de queixa,
porque se ressentem das diferenças vibratórias e das companhias
menos sintonizantes, também podemos afirmar que o número deles não
dá para formar a regra geral, ao passo que os demais, os
noventa e cinco por cento restantes,
se a isso podemos atingir, devem dar graças a Deus de poderem estar
encarnados na Terra.
De
tal forma as condições do encarnado são favoráveis, pela falta de
valores psíquicos ou vibratórios, ou das qualidades de libertação,
que aquele número acima indicado, mal desencarnando, procura meios
de voltar à carne, assim que se coloca em condições de ponderar a
diferença entre altos e baixos. Se durante a encarnação se julgava
uma vítima dos erros de Deus, pois é assim que muitos grandes
errados se imaginam, logo que se compenetram dos fatos, procuram
movimentar meios, amizades e fatores, para novas e benditas
oportunidades entre os laços da carne.
E
quando dizemos que escalões imensos formam
filas, aguardando com angústia
até a hora do ingresso no mundo físico, apenas estamos dizendo uma
parcela da realidade, pois o drama é muito mais complexo, abrange
questões e pormenores muito mais profundos e carecentes de
acuradíssimos estudos. Aqueles que se julgam vítimas durante a
encarnação, quando se retratam no espelho de nossas realidades, se
reconhecem os grandes verdugos!
Não
bastam os quadros comprovantes de que falharam nas mínimas
obrigações da última passagem, sendo pais, cidadãos, governantes
ou governados incapazes de melhor conduta; é que sobram as marcas do
passado criminoso, pois entre uma centena de espíritos apanhados a
esmo, dos que podem ser considerados apenas involuídos é mínimo o
número, sendo a grande maioria constituída de elementos altamente
endividados!
E
como a pressão da Lei de Harmonia, ou atividade da Justiça Divina,
se torna logo patente, a ex-vítima, segundo suas impressões,
procura movimentar recursos para uma nova oportunidade. Lembra o chão
prodigioso, os melhores irmãos de jornada, os entes queridos que
foram mal servidos, os deveres falcatruados, o ar, o sol, a lua, a
chuva, etc. No caleidoscópio que a vida espiritual lhe apresenta, a
ele que muito pode ir para baixo e nada tem para ingressar nos planos
superiores, vê o quanto foi ingrato para com a grande escola carnal,
desprezando as dádivas do Bom Deus, que fluíram generosamente
diante de suas liberdades, e liberdades de uso que
não soube aproveitar!
Grande
soma das culpas cabe aos religiosismos,
que por falsa interpretação se dizem religiões; porque nunca
faltaram ensinos fundamentais nas Grandes Revelações ou Iniciações
Fundamentais, ensinos que foram sempre adulterados, corrompidos,
transformados em comércios clericais, com profundas penetrações
nos movimentos político-sociais-econômicos, por onde ainda mais
vieram a prejudicar a evolução normal da humanidade!
Observando
as bases deixadas pelos Maiores, ou Grandes Reveladores, encontramos
aqueles ensinos fundamentais apontados no texto intitulado
“LEMBRA-TE”, com a preponderante influência da Revelação, da
comunicabilidade dos espíritos. E no Divino Modelo vamos encontrar a
máxima advertência em que sentido? Não é sobre o Sagrado
Ministério da Revelação ou do Consolador?
Sim,
a grande realidade salta ao entendimento de qualquer um, quando
quiser usar o seu entendimento, para analisar as Linhas Mestras
Doutrinárias e a gloriosa função da Mensageiria Divina,
advertindo, ilustrando e consolando os encarnados. E que diremos de
quem ignora as Linhas Mestras Doutrinárias e ainda por cima blasfema
do Sagrado Ministério do Consolador?
Diríamos,
ainda, com coroa de louros, que o toque final para o estabelecimento
da Revelação Generalizada, deu-o Jesus Cristo, abandonando o corpo
num madeiro infamante, para em retornando
como Espírito,
deixar o Pentecoste Imortal. O Imortal Pentecoste que, quase dois mil
anos depois, volta a ser reposto no lugar pela vinda de Elias, a cujo
arcabouço doutrinário deu o nome de Espiritismo. Porque, entenda
quem tenha inteligência de entender, Jesus não prometeu Consolador
algum para vinte séculos depois, mas sim a generalização imediata
e a restauração no devido tempo.
Lembramos
com alegria os setenta profetas de Moisés, com os quais pretendeu
começar a generalização da Revelação, pois o seu desejo era que
todo o povo comungasse com o plano espiritual e profetizasse.
Lembramos
com amargura o trabalho do clero levita, que truncou a obra de Moisés
valendo-se da ignorância de Saul, chegando a queimar os documentos e
a matar os Profetas ou Médiuns, além de, posteriormente, falsificar
os documentos que foram apresentados por Esdra.
Lembramos
com alegria ímpar a vinda de Jesus, o Cristo de Deus e não feito
por homens, entre cujas funções estava a de derramar do Espírito
sobre a carne, aquilo que tanto prometeu em vida, e que cumpriu
integralmente, depois de alguns dias, deixando na História o
Glorioso Pentecoste.
Lembramos
com profunda amargura o crime de Roma, truncando o Batismo de
Espírito, ou Derrame de Espírito, ou Generalização da Revelação,
afirmando serem os fenômenos mediúnicos ou proféticos de autoria
do Diabo, para assim forjar uma igreja sua, defensora do Império
despótico e sanguinário, e ato criminoso esse que mergulhou a
humanidade na ignorância das coisas do espírito e na terrível
brutalidade em que ainda vive.
Lembramos
com alegria cristã a volta de Elias, o trabalhador da reposição
das coisas no lugar, pois além de se cumprir nele uma profecia do
Cristo, é fato que esta se revela como restauração da Excelsa
Igreja do Caminho, Igreja Viva porque edificada sobre o Consolador
Generalizado por Jesus Cristo!
Quero
lembrar também, ó Pai Divino, em nome do Teu Ungido Jesus Cristo,
de ter a oportunidade de usar a minha presunção, pelo fato de me
terdes concedido a santa oportunidade de dizer estas palavras aos
meus irmãos; porque, Senhor e Deus meu, ainda que venha eu, algum
dia, a errar muito, ainda assim terei, como medida bonificadora, a
graça de ter dito a mais lucilante verdade aos meus irmãos de
jornada evolutiva. Graças, Pai Santo, pela Graça que me concedeste!
E
assim dizendo, volto ao assunto do capítulo, para focalizar um dos
maiores criminosos da História, que permanecera mil e duzentos e dez
anos nos abismos da subcrosta, pelo fato de ter sido fiel aos ditames
de Roma, que se dizia a Guarda dos Ensinos de Jesus Cristo Perante a
Humanidade.
Este
irmão, crente do que lhe diziam os donos do Vaticano,
tendo poderes nas mãos, comandou legiões, ferros e fogos, semeando
o vandalismo, o sadismo por todas as partes, contanto que tivesse a
seu favor a possibilidade de pensar que estava protegendo a Vontade
de Deus, pelas validades que Roma lhe oferecia. Arrastou rios de
sangue após de si; e veio a mergulhar nesses rios de sangue, por
todo aquele tempo, em companhia de legiões de comandados e de
comandantes!
Depois
de retirado de uma das mais baixas das subfaixas da subcrosta, foi
submetido a tratamento por mais de três anos e meio, do vosso tempo,
para ter a oportunidade de passear pela campina. Seu perispírito, ou
coisa que possa valer por isso, estava completamente deteriorado... E
se é verdade que, Deus querendo, a restauração pode dar-se
prontamente, também é verdade que a Justiça de Deus é coerente ao
infinito...
Ele
devia ter que meditar muito, enquanto o seu exterior estivesse em
fase de rearmonização; isto é, que fosse, também, rearmonizando a
mente!
Depois
de tudo, quando alguém lhe lembrava os tristes fatos, ele dizia:
— Se
cometi o erro de acreditar nos homens, por que não cometi o acerto
de confiar na Lei de Deus? Se um Jesus Cristo afirmou que não veio
para derrogar a Lei de Deus, por que acreditei em homens que se
julgavam mais do que o Cristo?
Enfim,
esse irmão está entre vós e trabalha como pode nas hostes do
Consolador... É um, dentre muitos, que pode até julgar-se vítima
da vida que arrasta sobre a crosta... Entretanto, saiba ele e quantos
estiverem interessados pelo próprio destino, que é melhor
aproveitar o tempo produzindo o Bem, do que discutindo os méritos da
Excelsa Justiça!...
*
* *
Não
nos parece possível que a Eterna Bonança vigore para algum
espírito, desde a sua hora de manifestação da parte da Essência
Divina; ninguém afirma isso, e todos dizem em contrário, isto é,
atestam que muitas tempestades se intercalam entre o começo e o fim
da jornada evolutiva. Portanto, bonanças e tempestades se
intercalam, até que o espírito se instale de uma vez para sempre na
Eterna Bonança.
Outro
ponto digno de atenção é saber se Jesus Cristo chegou a se
arrepender do que fez e do que disse. Ninguém ousa dizer, por aqui,
que tenha se arrependido. Portanto, os hipócritas e ladrões, os
raposas, os mentirosos e assassinos, os túmulos caiados por fora e
podres por dentro, os cães e os porcos, toda essa legião de
representantes do anticristo, ou contraventores da Lei, continua
recebendo aos ouvidos os impactos da Eterna Advertência. E, pois,
devem andar errados aqueles que se dizem arautos da Verdade, enquanto
apresentam como conduta em geral bem estudadas
maneiras e atitudes
perante os mais evidentes e chocantes procedimentos de certas
criaturas. O Divino Mestre disse tudo na hora certa, disse certo e
bem alto, ainda que sabendo que iria receber a crucificação por
prêmio. Não usou falsas bondades, fingidas tolerâncias e muito
menos fantasiou a covardia de resignação, quando viu a Lei
afrontada, a Verdade espezinhada, o Bem calcado aos pés pelos
poderosos do mundo, a Virtude escandalizada e a Pobreza vilipendiada!
Mais
uma faceta do Eterno Bom Senso nos diz, também, que nunca é em
benefício da Eterna e Absoluta Verdade, que certos homens ou certos
grupos de homens dogmatizam ou fazem cristalizar pontos de doutrina
bem relativos, muito carecentes de contínuos progressos. Alguém,
mais ou menos coletivo, está atrás disso tudo, com os seus
interesses subalternos a proclamar o “não
passem adiante!”.
Da
parte de Deus não havendo ordem de parada, para o progresso de Seus
filhos, toda parada forçada pelos homens é criminosa. A voz de
Jesus se levantou neste sentido: “AMAI A DEUS COM TODA A FORÇA DO
CORAÇÃO E DE TODA A INTELIGÊNCIA”.
Estas
e muitas outras aparentes simples falhas, ou nonadas na ordem dos
atos cotidianos daqueles que peregrinam o mundo carnal, nos fazem
pensar com acurado zelo, pois no amanhã seremos nós a substituir
alguém, como parcela da demografia terrestre. Quanto ao campo de
colheitas experimentais, tivemos os tempos de trabalho junto às
legiões da Grande Mãe, bem como agora, estudando programas
pré-encarnacionistas, sopesando fatores, empregando o pouco de Senso
de Justiça que a profissão terrestre nos favoreceu, no estudo dos
contras e dos prós que residem no histórico de miríades de irmãos
candidatos à encarnação.
Como
já é bem conhecido, as registrações são duas: uma é intra,
é feita pelo espírito em si mesmo, como a psicometria o prova
facilmente; a outra é extra,
é um relatório dos fatos mais salientes, contra e a favor, que pode
ser lido a qualquer espírito, sendo conveniente. E para os espíritos
embrionários em evolução, o mais importante é o relatório
escrito, com os máximos fatos apontados, pró e contra. As miudezas
devem ser observadas pelos maiores, aqueles a quem cumpre andar sobre
o fio da navalha, sem se deixarem cortar...
Portanto,
encaremos um irmão a mais, enquadrado como milhões de outros nas
divisões terríveis que separam os homens; numa vítima a mais dos
divisionismos que a moral humana, a lógica humana, a cívica humana,
o patriotismo humano, as ditas religiões e outros preconceitos
humanos endossam e sustentam, sob a égide granítica daquelas
dignidades ou daqueles brasões que, por fim, por ferirem de frente
os ditames da Lei de Deus, arremetem seus cultores para as trevas,
onde o pranto e o ranger dos dentes fazem a vez das recomendações
infernais.
Porque
ficará de pé uma advertência: ninguém responderá pelos seus
atos, frente a uma comissão de encarnados ignorantes, forrados de
preconceitos, pernósticos ou encarapitados no cômoro das
protuberâncias convencionais do mundo; mas terá de fazê-lo perante
a Divina Justiça, que ninguém vê e que não aceita argumentos,
porque age
de dentro para fora das criaturas,
em termos de rearmonização! A medalha que, ao teor do mundo,
apresentava uma face, passará, com a Morte, a apresentar a outra,
não havendo injunções de posses, nacionalismos, religiões,
políticas ou coisas semelhantes, que tenham como intervir, para
fazê-la mudar!
Perante
Deus, já disse alguém, ninguém consegue usar rótulos!
Poderá
ser como o joio, que cresce com o trigo, até certo ponto, mas na
hora da colheita será separado e lançado ao fogo!
O
irmão Karl, antigo Burgomestre, foi chamado à observação, para
efeito reencarnacionista, isto é, para tratarmos do seu esquema da
vida; delinear as linhas gerais, pois os pormenores entram
normalmente e a parte de boa ou má vontade, a parte do encarnado,
por isso ele responderá, quando retornar.
Focalizado
Karl, o aparelho psicométrico, o painel das imagens refletidas,
envolveu um grupo de irmãos, todos de projeção nobiliárquica,
todos tremendamente articulados em fatos históricos criminosos.
Portanto, o chefe da comissão de estudo recomendou:
—
Convoquemos
o grupo todo; quem sabe se poderemos enquadrar todos num mesmo plano
de ação renovadora? Se isso ocorrer, nós ganharemos tempo e eles
terão pela frente valiosa oportunidade de confraternização.
O
Departamento de Noêmia funcionou e oito irmãos foram colocados
defronte ao aparelho psicométrico. O Burgomestre, o Juiz, o Bispo,
um Barão, um Padre, dois Advogados e duas Mulheres que serviram de
isca em alguns casos, formaram o centro de ação de uma tragédia
que envolveu milhares de pessoas, obrigando umas aos martírios
redentores e outras aos desvios tenebrosos.
Tudo
começou com a palavra de um Barão no ouvido de um Burgomestre;
porque a coisa cresceu, envolveu, corrompeu cada vez mais e a Morte,
fiel cumpridora de seus deveres, foi aos poucos juntando todos. Os
primeiros a desencarnar foram ligados imediatamente aos que ficaram
na carne; mas quando o grupo se reencontrou no plano astral, a luta e
a permuta de acusações foi aumentando, crescendo, criando condições
eletromagnéticas dantescas. Uma nuvem de fumo, negra e fétida,
aumentou tanto que parecia cobrir a cidade, que de fato acabou
cobrindo. E então passou a descer, a procurar o caminho da
subcrosta, até parar num determinado ponto, determinado este pela
lei do peso específico. E no seu bojo, aquela nuvem negra conduziu
aquele grupo infernal, que por sua vez arrastou milhares de outros,
todos pertencentes ao mesmo padrão vibratório.
O
inacreditável começou a se apresentar diante de nós, diante
daqueles que se encontravam diante do aparelho psicométrico, para
efeito de revisão e estudo da programação necessária. Porque as
discussões levaram às unhadas, às mordidas, aos devoramentos, ao
macabro!
Uns
comiam os outros, depois ficavam mostrando os ossos descarnados; e a
configuração áurica da legião macabra começou a apresentar as
piores deformações, e a mentalização começou a criar formas
densas à custa da matéria astral, até que se revelavam como
imensos monstros, dinossauros, jacarés, serpentes, tudo
transformado, tudo reduzido a horrores.
Dois
séculos e meio depois, o trabalho comandado pela Grande Mãe os
atingiu, e vimos um grande raio de luz penetrar nas trevas abismais.
Lá do alto, um Sol Divino, tendo o semblante de Jesus Cristo no
centro, atravessava três vultos femininos brilhantíssimos com Seus
raios maravilhosos, comandando mais em baixo as legiões socorristas,
inclusive os cães amestrados.
Tudo,
de alto a baixo, era um maravilhoso cone de luz, formado de anéis,
que perdia em brilho quanto mais descia, até facilitar identidade
com a legião que devia ser levantada. Uma grande parte, não todos,
pois a Lei de Harmonia é funcionária rigorosa!
Vimos
a legião levantada ficar em determinado plano, de pouca luz, mas já
em plano socorrista, perto do Terceiro Céu. E vimos a Grande Mãe,
com suas legiões amigas, volitando sobre aquele amontoado de ruínas,
fazendo cair sobre ele umas torrentes de neblina verde-azulada, que o
cobria e obrigava a despertar para novas idéias e novas proposições.
Assim foi acontecendo, dias e dias se repetindo a mesma operação,
até que foram se destacando, destacando, cada elemento se tornando
distinto, pensando por si, etc.
Um
dia, diria uma gloriosa hora, lá em cima estava outra vez o Sol
Divino, e o semblante do Mestre no centro. As Marias um pouco abaixo,
depois em sentido decrescente os demais milhares de trabalhadores. O
glorioso jato de luz focalizou a legião levantada, que se espraiava
agora por imenso terreno, mas ainda ensombrado. E começou a deslizar
para outro local, com um tremendo poder de locomoção, arrastando
aquela gente toda para a beira de um imenso lago. Gente por dentro,
porém revestida de brutas formas animais por fora.
Aos
poucos, começaram a se banhar, notando que a água tinha um poder
maravilhoso, além de ser deliciante ao contato, pois produzia
cintilações belíssimas. E dentro de horas, todos estavam dentro
daquele curativo lago, onde as formas densas exteriores se derretiam,
deixando as pessoas perfeitamente humanizadas.
O
Céu, para testemunhar a palavra certa, fez um Evangelista aparecer
bastante reduzido diante deles, mas revestido de um eletrizante
arco-íris de luzes policrômicas; e tendo um livro nas mãos, leu em
voz tonitruante:
“Varões
galileus, que estais olhando para o céu? Este Jesus, que se
afastando de vós foi assunto ao céu, assim mesmo virá, tal como o
vistes subir ao céu.”
Depois
fechou o livro, apertou-o sobre o peito com as duas mãos e disse,
com uma simplicidade terrivelmente penetrante:
“A
Lei de Deus e o Divino Exemplo de Jesus Cristo já estão de novo no
mundo, restaurados em forma de Espiritismo. E a Revelação dará,
para os confins dos tempos, o testemunho que lhe compete. Voltareis
ao plano carnal, pois o Pai Divino vos concederá nova oportunidade.
Observai a Lei! Imitai o Cristo Modelo! Cultivai a Revelação!
Jamais forjeis novas clerezias!”
Todos,
nas alturas, foram se afastando... O espaço ficou azul, límpido,
mas um vislumbre celestial pareceu permanecer na imensidão... E nós,
rente ao chão, vimos que grupos de outros trabalhadores vinham, do
horizonte à nossa direita, e com eles alguns aparelhos de
transporte. À frente vinha um, muito alto e com divisas nos braços,
como insígnias militares. Chegando-se, falou àquele que na ocasião
comandava os trabalhos, dizendo daquilo que lhes competia fazer,
distribuindo aqueles irmãos todos pelos diferentes centros de
aprendizados, etc.
A
psicometria mostrara tudo quanto havia acontecido.
O
painel permanecera claro, em função, motivo por que ficamos
olhando. E um rosto lindo, meigo ao extremo, apareceu, ordenando:
—
Aqueles
que estão no vosso plano astral, que voltem à carne o mais breve
possível, nos mesmos grupos familiares, porém na América do Sul,
principalmente no Brasil,
que será o bastião espiritual no Novo Ciclo,
e Novo Ciclo que entregará o Planeta inteiro a um bem mais elevado
nível vibratório.
Daqueles
olhos infinitamente maternais saíram graças indefiníveis, e o
painel se foi apagando, apagando, até ficar escuro.
Os
oito irmãos estavam entregues a um misto de comoção e
deslumbramento, e disseram não ter visto, durante os trabalhos
socorristas de que foram objeto, as maravilhas que o painel
psicométrico lhes fizera ver agora. É assim mesmo que ocorre, pois
raramente os muito inferiores podem ver os muito superiores, pois a
vista, o ouvido e outras penetrações derivam de graus vibratórios
distintos. Para tudo é preciso estar nivelado ou capacitado
sintonicamente.
Eles
já estão encarnados, sendo irmãos e primos, para que se encontrem
durante a romagem carnal. Queira Deus que o Consolador, generalizado
pelo Cristo, corrompido pelo Império Romano e restaurado pelo
Profeta Elias, com o nome de Espiritismo, lhes entregue a sua
mensagem de advertência, ilustração e consolo, para que não
voltem em más condições para este lado da vida. Como é sabido,
cada qual, ao transitar pela vida carnal é atingido pelas
influências do passado, por ordens de vibração e de elementos
deste plano. Assim sendo, quem deixou para trás marcas ou
registrações menos felizes, é comumente atingido por influências
tais. Cumpre reconhecer isso e fazer questão de estar ligado, pelas
orações, conduta e amizades, quer aos nossos planos, quer aos
melhores elementos encarnados. E se assim o novo aluno não quiser
pensar, fazendo tudo em contrário, pode estar certo de que os reinos
de treva também trabalham em benefício do Reino do Céu... Porque
tudo é parte e relação de um Divino Mecanismo!
*
* *
“Em
nome e sob as graças do Senhor Deus, e do Seu filho Ungido Jesus
Cristo, vai e faz o Bem aos teus irmãos.”
A
Revelação, o Consolador ou Espírito da Verdade, funciona nos
mundos e intermundos e não se poderia dizer, com absoluta certeza,
de quantos recursos lança mãos e a que montantes pode atingir, em
sua maravilhosa simplicidade. Porém, como medida de ordem técnica,
deixamos para os encarnados o direito de conceituar como
complexidade, precisamente aquilo que dizemos simplicidade.
Os
encarnados partem de premissas um tanto contrárias, partem dos
fenômenos e dos conceitos materiais, dos escolasticismos, da
terminologia científica ou pseudo-científica, dos efeitos para as
causas, enquanto nós aprendemos e bem depressa a começar do começo,
de Deus e das leis causais. Sendo assim, quando os conceitos de algum
encarnado chegam aqui, todos sob medidas formais, escolásticas,
lastreados pelos importantes — Fulano disse, etc. —, nós vamos
às verdades-chave, ao centro de gravidade, aos princípios. E
podemos, então, de dentro de nossa crassa ignorância, compreender e
sentir que a realidade tabelada pelos encarnados fica muito melhor
quando livre das tabelas...
E
quando as tabelinhas vêm dos quadros religiosistas, temos por
obrigação tomar medidas imediatas, porque as tabelinhas que na
crosta funcionam em nome de Deus, da Verdade, do Amor e da Virtude,
ou do Cristo Verbo que a tudo isso representa, verdadeiramente
funcionam em benefício de grupos que tais, de súcias mercantilistas
e politiqueiras, na maioria das vezes. Porque outras vezes funcionam
em nome de simples fanatismos sectários, porém puros de intenção,
o que já representa uma boa quantia de valores dirimentes.
Dito
isso, vamos ao fato.
William,
o pastor, saíra da carne embalado e forrado pelos conceitos
luteranistas; e tinha seus grandes méritos! Porém, tinha horror a
respeito de muitíssimas leis ou verdades que jamais poderiam ser de
fabricação humana.
Mudaria
Deus ou mudaria o ex-pastor William?
Por
causa disso é que a Mensageiria Divina funcionou, enviando o homem
cheio de boas prendas, de modo encantador; ele veio como que do Céu,
através de graciosa faixa de luzes, onde se misturavam três cores,
o verde brilhante, o azul-prateado brilhante e o lilás muito claro e
também brilhante. Um presente do Céu, diremos, que ficaria ao nosso
encargo entregar a um novo instrumento carnal, para os devidos
efeitos progressivos.
Pisou
o solo do nosso jardim, todo sorridente, trazendo na mão direita um
bilhetinho. Entregou-o ao chefe dos serviços e este leu aquilo que
está encimando o capítulo.
Diante
do irmão assim afeito aos tratos bíblicos, o chefe indagou:
—
Fomos
avisados de sua vinda; mas, perguntamos, que gostaria de fazer, até
a hora de tomar conta de novo fardamento carnal?
Sem
perder tempo, respondeu:
—
Estar
sempre em contato com o mundo carnal, pois durante a vida cometi o
erro de condenar a Revelação.
—
Entretanto,
irmão William, veio muito bem, pois não?
— Sim,
porque o Senhor Deus, nosso Pai, observa as obras e não as manias
sectárias de Seus filhos.
— Que
mais o encantou no mundo espiritual, assim que chegou?
—
Antes
já de abandonar de vez o corpo, vi ao redor do chamado leito de
morte, dezenas de irmãos conhecidos, que haviam partido antes de
mim, estando entre eles alguns desconhecidos, deslumbrantes de luz,
que me convidavam a acompanhá-los. Isso foi, para mim, uma graça de
Deus que jamais teria esperado. Depois de estar por aqui, a maior
graça foi ter visto Jesus Cristo, de muito longe, tendo ouvido Dele
algumas palavras... Só Deus sabe como me senti!...
— Que
lhe disse Ele? – perguntou-lhe o chefe, curioso.
—
Ouvi-O
dizer perfeitamente: “Tu estremeces diante da minha visão.
Todavia, terás que ser como eu sou... Volta ao mundo carnal, sê um
verdadeiro profeta, progride e faz progredir a teus irmãos...”
O
chefe disse-lhe:
—
Reencarnar
é por nossa conta, como já sabe; entretanto, como pensa que se
sairá, no mundo?
William
meditou um pouco e respondeu:
— Isso
depende de vários fatores... Se Deus me conceder faculdades
psíquicas, e se eu vier a ter em Deus e em Jesus Cristo a fé que já
tive, tenho certeza de que regressarei, um dia, com os meus deveres
fielmente cumpridos.
—
Dentre
as faculdades, qual a que mais lhe agradaria possuir?
Prontamente
respondeu:
—
Gostaria
de ser um bom clarividente!
— Por
quê? – perguntou-lhe o chefe.
— Quem
tem a visão do mundo espiritual, certamente pensa, sente e age com
mais elevação de caráter. Lendo após a morte o Evangelho, tive
oportunidade de apreciar muitas particularidades. Jesus, que tinha os
anjos subindo e descendo sobre a Sua cabeça, tendo tudo isso diante
de Sua visão psíquica, ou de quem tinha o Espírito de Dons e
Sinais sem medida, não teria encontrado nessa maravilhosa faculdade
a Sua maior força? Está escrito, também, que Ele tinha, diante de
Si, os céus abertos; e podemos aquilatar, mais uma vez, o que isso
pode significar, como fonte de coragem e resignação.
O
chefe apontou para um dos presentes, dizendo:
— Você
vai hospedar William, até o dia em que deva reencarnar; e,
lembre-se, ele tomará parte em quantos trabalhos quiser, mormente
aqueles que tenham de ser feitos junto aos encarnados, para se ir
ambientando.
Cada
qual foi para seus destinos; e no dia seguinte, à tarde, havendo
sessão em determinada residência terrestre, lá estava o grupo
todo, inclusive ele, o irmão William, que revelava bastante
curiosidade. Nem poderia ser de menos, porque os encarnados eram
poucos, menos de quinze ao entrarmos, porém dotados de intenções
mui nobres, sendo que alguns eram dotados de poderosa clarividência,
razão por que foram avisando da chegada dos mentores espirituais,
com uma precisão encantadora.
Mal
sabia ele, William, que ao iniciar-se o trabalho, vários daqueles
encarnados poderiam deixar seus corpos, invadir o mundo espiritual,
trabalhar ao nosso lado e estarem dando todas as informações aos
demais componentes do ambiente.
Outra
realidade, para ele maravilhosa, é que estando o grupo de encarnados
mui ligado aos trabalhos da Grande Mãe, por fatores históricos e
laços de sangue nas encarnações pretéritas, para aquele humilde
ambiente viriam, logo mais, elementos de alta hierarquia, para
comandar serviços em lugares tenebrosos, isto é, socorrer criaturas
que muito desceram, por muito terem errado.
E
lá pelas tantas, com os serviços em curso, na hora de suspender
legiões de abismos horripilantes, quando a Grande Mãe, do alto da
espiral luminosa invocou os poderes de Jesus Cristo, enviando aos
altos uma faixa de luz dourada; e quando, das alturas cintilantes
agora, foi aparecendo o Sol Divino, que chegando mais perto revelou o
semblante do Divino Mestre, William atirou-se ao chão e desandou a
chorar convulsivamente, dizendo-se indigno de ver o Mestre.
Quem
poderia limitar os poderes de Jesus Cristo?
Quem está apto a negar que Ele,
que pode o máximo, não pode o mínimo?
Quem é mais do que Deus, para dizer que em essência somos iguais,
havendo apenas diferenças hierárquicas entre uns e outros de Seus
filhos?
O
Sol Divino foi descendo, descendo, reduzindo o Seu brilho cada vez
mais e chegou bem perto de todos nós; era Ele, o Divino Mestre, tal
e qual como vivera há dois mil anos quase, que estava à nossa
frente. Apesar de reduzido
a um homem, Sua Presença causava um não-sei-quê de celestial,
impunha um respeito inexplicável, diria divinamente terrificante,
porque nos fazia pensar e sentir numa convergência infinitamente
absorvente, como se o próprio Deus, o Ser Infinito, ali estivesse,
reduzido a um simples homem, para testemunhar que é o Pai de todos.
Chegou-Se,
colocou as mãos alvinitentes sobre a cabeça de William e chamou-o
pelo nome, com uma voz que parecia feita de carinho celestial.
William levantou a cabeça, viu-O, estremeceu e caiu a Seus pés,
dizendo palavras sem nexo, derramando lágrimas abundantes.
Jesus
foi subindo, subindo, endereçando olhar magnânimo a toda aquela
multidão maravilhada; quando parou, a grande altura, as três Marias
maiores também subiram, tendo aparecido alguns grandes espíritos
mais perto, e multidões de seres a se estenderem pelo espaço
esplendente de Luz e de Glória.
Antes
de sumir na profundeza do espaço, enviou a mensagem seguinte, que
ecoou pela imensidão, parecendo a mim que tinha o poder de se fazer
ouvir até pelas águas, flores, chãos e tudo quanto havia por ali,
emanado por Deus:
“Nunca
estive longe de minhas ovelhas e peço que nenhuma esteja longe de
mim. É da vontade de nosso Pai, que nos amemos como verdadeiros
irmãos, os maiores e os menores, até chegar a hora de formarmos uma
só Unidade.”
Quem
foi colocar as mãos na cabeça de William foi uma jovem, um espírito
encarnado, que estava trabalhando fora do corpo em plena consciência,
e enviando à mesa de trabalhos os informes que achava mais
proveitosos.
Terminado
aquele serviço, a comitiva de encarnados e desencarnados voltou ao
recinto da sessão, tendo William visto, ao redor da mesa, uma jovem
igual àquela que o erguera.
— E
aquela, tão igual, meu anjo querido? – perguntou ele, comovido.
—
Aquele
é meu corpo, apenas, meu irmão – respondeu sorrindo.
William
ficou mudo, pensativo, triste e alegre ao mesmo tempo; mas quando a
jovem disse que ia tomar conta do corpo, havendo-lhe estendido a mão,
para a despedida formal, tal como fazem os encarnados, ele segurou-a
com muito respeito, osculou-a e gaguejando disse-lhe:
— Diga
aos irmãos encarnados, minha querida irmã, que Jesus Cristo é quem
tem a inteira razão... E diga, também, que a razão de Jesus não é
aquela que os religiosos da crosta usam ou afirmam diante da
humanidade.
Depois
que ela havia tomado conta do corpo, mas permanecendo em plena
clarividência, disse-lhe o mentor da sessão:
— Não
te preocupes, que essa irmã desceu de grandes alturas, para
reencarnar, estando freqüentemente em contato com o seu plano de
vida espiritual. Ela é mensageira superior e, apesar de encarnada,
não perdeu a função, porque o seu coração funciona paralelo com
o coração amantíssimo do Cristo Planetário.
William
encolheu os ombros, abraçou fortemente o guia da sessão e disse:
— Nada
mais direi das graças de Deus, que fluem sobre Seus filhos através
de Jesus Cristo, neste Planeta. Quero começar a pensar de outro
modo, para não estar levantando
fronteiras e barreiras entre
o Poder Divino e os Seus filhos, como fazem as religiões... Sendo
Deus Onipresente, Onisciente e Onipotente, por que devemos pensar em
separações e distâncias incomensuráveis? Por quê?!...
Tarimbado,
falou o mentor da sessão:
— A
Terra ainda é um mundo infantil; só as crianças, como nós, pensam
que o Pai usa os nossos conceitos. Por isso mesmo, irmão, não pense
que descobriu essa verdadezinha elementar, pois já a descobriram,
antes de você, milhões, bilhões ou trilhões de outros irmãos
nossos. Mas, e aqui está a complicação, assim que voltam às
plagas terrestres, voltam logo ao estado de burrice anterior,
recomeçando as práticas ignorantes, erradas e até mesmo
criminosas.
William
fitou-o bem e depois baixou a cabeça, entristecido; mas o mentor da
sessão falou-lhe, confidencialmente:
— Este
seu amigo é useiro e vezeiro nessas faltas, compreende?
—
Também
foi pastor protestante? – perguntou William, curioso.
O
mentor sorriu alto, bem a seu gosto, rematando:
— Já
negociei em todas as espécies de balcões religiosistas... Já
pratiquei, em nome de Deus, todas as formas de asneiras, compreende?
E é por isso que ainda estou trabalhando rente ao chão terreno!...
—
Rente
ao chão terreno!... – comentou William, pensativo.
E
o mentor, fitando-o bem, explicou:
—
Todos
os Planetas são apenas casas cósmicas, nada mais, onde humanidades
fazem sua evolução. Portanto, têm eles a parte interior ou
subcrostiniana, a parte que é a crosta, onde vivem os encarnados e
aqueles que ficam ligados a eles por vários motivos, e as partes
exteriores. Quanto à Terra, tem ela uma faixa umbrosa de mil e
duzentos e tantos quilômetros, ao redor, começando depois as faixas
de luz. Ora, ninguém atinge o extremo exterior, a zona crística,
enquanto arrastar consigo falta de Verdade, de Amor e de Virtude,
entendeu?
William
disse que sim, que havia visto o mapa diagramático do Planeta logo
que deixara a carne; e o mentor da sessão falou-lhe:
—
Muito
bem! Então você já sabe que o Reino de Deus é uma questão de
Verdade, Amor e Virtude, e não uma questão de fanatismos
religiosistas. Eu também sei disso e muita gente o sabe! Mas,
infelizmente, quando se toma um novo corpo, a fim de conseguir mais
libertação espiritual, os estreitismos humanos, sectários e
outros, fazem o serviço do cupim, isto é, minam a planta pela raiz!
E voltamos do mundo cheios de rótulos, porém vazios de verdades
libertadoras...
William
perguntou ao mentor da sessão:
— Já
teve alguma visão do Divino Mestre?
—
Claro!
O Divino Mestre nunca deixou de vir a nós, de modos os mais
diferentes. Sua Presença, no Planeta, é um fato e não uma lenda.
Mas, caro irmão, também aí as coisas se passam de modo menos
feliz, pois endereçamos os fatos ao rol da exaltação,
enquanto Ele, o Divino Amigo, quer apenas imitação
e realização,
de nossa parte, do Cristo que em nós aguarda manifestação. Nós,
todavia, mal instruídos pelas ditas religiões, pensamos em
programas de reverência e adulação, com fitos muitas vezes de
comércio ou meio de vida para determinadas súcias, e os convites do
Grande Amigo ficam para trás... Isto é, nós ficamos para trás,
porque ao fim de milhares de anos e de encarnações, estamos ainda
rentes ao chão terrícola...
William
assentiu com breve sinal de cabeça, balbuciando:
— Há
muito vasilhame e bem pouca essência, na Terra, em matéria
espiritual!
O
mentor ventilou, de pronto:
— Veja
o seu caso, por exemplo: não é certo que, como pastor protestante
pensava ter engolido a Verdade? Não é certo que, trepado na sua
importância interpretativa, até ao próprio Deus seria capaz de
impor seus pontos de vista? E no entretanto, em quantos assuntos, e
bem relativos, veio a compreender que estava bem errado?
William
baixou a cabeça, entristecido, e o mentor comentou, com muito
carinho em suas expressões:
— Tu
és como nós todos somos, irmão William!... E assim como te
atiraste ao chão, na presença do Irmão Maior, assim todos temos
feito, contrariando a Sua Vontade... Ele quer que vejamos Nele o Grau
Crístico, a que todos devemos atingir... Ele não quer de nós
exaltações nem traumatismos terrificantes, porque o ponto atingido
por Ele, é o mesmo que deve ser atingido por todos os filhos do
mesmo Pai Divino.
William
levantou a cabeça, menos embaraçado, argumentando:
— Bem,
a Igreja do Caminho está restaurada... A Lei de Deus e o Divino
Exemplo do Cristo estão de novo no mundo, límpidos e fulgurantes,
convocando os homens ao Divino Banquete da Fraternidade, tendo na
Revelação, no serviço da Mensageiria Divina, o traço de união
entre os filhos do mesmo Deus. Portanto...
O
Mentor sorriu bem expressivamente, interrompendo-o:
—
Portanto,
o quê, irmão William?... Pensa que os homens vão deixar assim a
boca torta pelo cachimbo?... Ora! Ora!... Lembre-se de que, sob
pretextos vários, hão de levantar novas clerezias, com menos
fantasias, talvez, porém tão criminosas quanto aquelas que, após
as Grandes Revelações, sempre levantaram no mundo. Começam falando
em organização, direção, cimentação, pureza doutrinária,
necessidade de movimentação coletiva, etc., etc. Mas, no fundo de
tudo, não é o exemplo de boas obras que os domina, porém os
vaticanismos e papismos que arrastam no arcabouço cármico; é o
desejo de serem juízes e fiscais dos irmãos, a mania de quererem
ser os donos da consciência alheia, querendo olhar de cima para
baixo os seus irmãos, porque julgam que o Bom Deus os fez
especialmente para dominar os outros! Puro regime de falsa observação
doutrinária, pura mistificação na ordem dos deveres fraternais!
Assim começaram todos os vaticanismos e papismos e assim o
Consolador restaurado também correrá o mesmo risco, se não é que
já está bastante minado pela praga dos mandonismos ditos
especializados.
—
Então
– perguntou William – em que vamos confiar?!...
Desaprovante,
o mentor respondeu:
— Essa
pergunta não se faz, irmão William!
— Por
quê?...
—
Porque
a Verdade nunca será engolida por ninguém! Porque a Doutrina do
Caminho é em si mesma igual para todos os filhos de Deus! E porque
as instituições e os estatutos pernósticos e prepotentes, que
certos homens possam inventar, jamais controlarão as mediunidades e
o movimento dos espíritos mensageiros!
A
vastíssima assembléia prorrompeu em aplausos, gritando alguns o seu
“VIVA!” à Excelsa Doutrina do Caminho, que jamais será escrava
de preconceitos humanos quaisquer. E ali findou a sessão, tendo nós
visto que das alturas, uma Grande Amiga fazia jorrar luzes de suas
benditas mãos, luzes que, chegando a nós se convertiam em
alvíssimas e perfumadas pétalas de rosas.
*
* *
“Aqueles
que forem representantes da Verdade, do Amor e da Virtude, certamente
darão provas individuais disso, através das obras que praticarem,
sem se importarem com aqueles que não são e com aqueles que apenas
parecem ser.”
William
chegava ao término do seu estágio entre nós, beirando cada vez
mais a residência daquela gente simples e humilde que lhe iria
contribuir para a encarnação, oferecendo-lhe o bendito instrumento
carnal.
Sílvia,
que lhe seria e é a mãe, era e é, jovem dotada de boas faculdades;
e o pai, modesto funcionário público, embora sem muitas letras no
plano carnal, conta nos registros cármicos com excelentes conquistas
em geral. E não pena com o fato de ser inculto, pois no passado, com
a mania das terminologias complicadas, querendo e fazendo para
aparecer mais, contraíra alguns débitos. É até bem feliz, pois
sendo incapaz de melhores assimilações pseudo-científicas, vive
procurando fazer o bem, vive para dilatar as imortais importâncias
do coração. Também, em abono de seus méritos antigos e do bom
comportamento presente, o guia de sua esposa vive a repetir: “A
sabedoria que vale diante do mundo, pode não valer diante de Deus”.
Ele
não tem a menor noção dos porquês de tais palavras, mas elas lhe
fazem o bem devido; e farão a todos aqueles que tiverem vontade de
viver vida ajuizada, já que a sabedoria enfeita o espírito, mas a
consistência que garante a Paz e a Ventura, essa jamais deixará de
pertencer ao Amor!
É
por isso que (embora pareça esquisito aos homens, principalmente aos
que se nutrem de pseudo-importâncias), muitos pequeninos voam aos
altos planos da erraticidade, enquanto eles, cheios de rótulos do
mundo, fazem longos estágios entre a carne e os planos inferiores do
mundo espiritual. Lembramos, para efeito de juízos quaisquer, que
não estamos fazendo a apologia da ignorância... Apenas queremos
dizer, e dizemos, que a verdadeira Sabedoria é aquela que se deixa
envolver e penetrar pelos santos ungüentos do Amor, para juntamente
subirem e se apresentarem unidos em face dos planos onde a Paz e a
Ventura dominam absolutamente, por estar ali exposta de modo
inenarrável, e acima de individualismo, a Presença Divina, o Ser
Infinito, Aquele que É tudo em todos, e que todos O trazemos dentro
de nós, sabendo ou sem saber, amando-O ou não.
Falando
d'Ele, cuja Paternidade é igual, lembramos aos que se dobram cheios
de medo, e terrores até, na presença de Grandes Irmãos, que é
necessário, o quanto antes, perder muito de beatismos falsos, de
pieguismos repugnantes, para ganhar simplicidade, podendo assim
manter uma conduta harmoniosa em face de todas as entidades,
questões, condições e situações. Quem se sabe um filho de Deus,
por insignificante que seja no campo evolutivo, é no campo
individual um filho de Deus, alguém que tem por obrigação honrar a
Divina Paternidade. Se os Grandes Irmãos não precisam de curvações
e babujas, que os menos evoluídos não se comportem como se fossem
réprobos, porque para isso ninguém foi emanado!
Quem
for simplesmente involuído ou iniciante na escala hierárquica,
lembre-se que deve trabalhar
para progredir,
sendo que seus irmãos maiores poderão auxiliá-lo, com ensinos e
algumas outras ajudas, nunca porém realizando aquilo que é devido a
cada um; e quem for devedor de faltas, por erros cometidos, lembre-se
de que a Justiça Divina é Absoluta, porém flexível nas
aplicações, muito oferecendo aos que se fizeram penitentes... Mas,
lembre-se bem, aquela penitência que se caracterize pelo fazer bem
ao próximo, porque aquela penitência piegas, idólatra, ritual,
exterior ou formalista, de nada adiantará.
Os
preparativos de William foram muitos e práticos; quase um ano de
trabalhos e de observações locais, por força de sua vontade, que
foi no sentido de auxiliar e de aprender ao mesmo tempo. E com isso,
como é fácil conceber, ele se permitiu felicíssimas registrações
mentais e emocionais, registrações que, no curso de sua vida
carnal, hão de vir à tona, em termos de intuição.
Há
na maternidade um quê de imensamente imponente!
Se
é certo que, nas piores condições, iguais se atraem e irmãos
portadores de vibrações inferiores se reencontram em todos os
campos de atividade, inclusive o reencarnacionista, dando-se
portanto, acontecimentos assustadores; se, em função das leis
sintônicas, nascem criaturas em meios os mais hediondos, o certo é
que, na maternidade, há sempre alguma coisa que enternece
profundamente. Queremos dizer, pelo que sabemos, que os filhos de
Deus podem desonrar seus direitos e suas oportunidades, suas regalias
e suas funções, mas o mérito das leis fica de pé!
Porque
o poder emanador é exclusivo de Deus, Seus filhos usam de leis Suas,
e o fazem bem ou mal, porém sem jamais poderem tocar, de longe que
seja, na santidade intrínseca das mesmas! Concludentemente, o mais
feliz é aquele que aprende as melhores lições da vida, acumula
experiências, tudo fazendo para não usar mal ao que o Bom Pai fez
para ser bem usado. E como leis são leis, todos responderão pelos
maus usos feitos, porém muito mais, ou em maior porcentagem, aqueles
que o fizeram com mais conhecimento causal.
Os
três casos que aqui vão relatados, podem fazer pensar em legiões
deles, tanto bastando que se aplique a lei das proporções a cada um
deles.
O
primeiro foi o de um espírito de ordem bastante inferior,
encomendado por um homem abastado e sem filhos, por ser sua esposa
estéril; encomendou-o por intermédio de uma mulher de más
recomendações. Ela teria o filho e lho entregaria, recebendo, no
momento, uma boa quantia em dinheiro, afora o já recebido. E tudo
sucedeu, inclusive a indicação de um espírito, pelos encarregados
deste lado.
Apesar
do ambiente infeliz em que vivia a futura mãe, foi-lhe dado guarda
até o dia de ter o seu bebê, quando passaria às mãos do pai,
através de outra pessoa. A comitiva entregou o espírito ao colo
materno, no devido tempo, em sua residência, depois de haver muito
trabalho de limpeza. E houve oração, rogo ao Pai Divino feito pelo
chefe da comitiva e palavras de ensino a alguns novatos em matéria
de trabalhos dessa ordem.
Partindo
do princípio que ensina ser a chamada Criação a Bíblia de Deus,
tudo é escola e tudo traz proveitos, mais tarde ou mais cedo, sem
sofrimentos, com mais ou com menos sofrimentos. A questão é a
seguinte: saber, pensar, sentir e proceder do melhor modo. Mas quando
isso não for possível, as leis terão curso e a responsabilidade
terá que ser de alguém, porque mistérios e milagres não existem
na Ordem Divina. E como com a Justiça Divina ninguém jamais irá
discutir, porque nunca virá a encontrá-la como um indivíduo, eis
que, nos dédalos do Espaço e do Tempo, todas as contas serão
ajustadas até
aos mínimos detalhes.
Para os homens os fatos podem se revestir de farto enigmatismo; mas
não há disso na Justiça Divina e em coisa alguma que derive de
Deus. Abram os homens suas mentes, procurem focalizar as Verdades
Eternas, Perfeitas e Imutáveis de Deus, porque a parte de Deus não
depende de cogitações humanas.
O
segundo caso foi de uma beleza singela; uma jovem esposa inaugurava a
maternidade, e, como era procedente de plano espiritual apreciável,
foi para lá que foram remetidos, os dois, ela e ele, o esposo, para
voltarem ao recinto familiar com um belo presente do Céu — uma
pequenita luminosa!
Em
virtude de um acidente, certa mãe perdera a filhinha alguns dias
antes de nascer; e como o programa do espírito reclamava urgente
encarnação, foi endereçado o mesmo ao jovem casal de que falamos.
O corpo perispirital, assim como saíra, assim fora deixado. A jovem
mãezinha, estuante de felicidade, recebeu a bonequinha nos braços e
sobre ela ensaiou, também, as primeiras lágrimas de sentido
maternal.
Quando
falamos em Ordem Divina, queremos dizer o TODO e suas leis também
totais; num lance de pensamento, num apanhado geral que permita, ao
ser relativo, a idéia do TODO, eis o que chamamos, para nós, a
Ordem Divina. Porque ela é como é, e ninguém poderia negar, mas,
para nós, ela é como o nosso relativismo permite focalizá-la. No
seio desse conceito maravilhoso do TODO, as pequeninas questões e os
mínimos fatos atingem grandezas inenarráveis. Assim foi a entrega
de um espiritozinho àquela mãezinha, no interior de um templo, na
esfera de vida de onde partiu ela, a mãezinha, um dia, para
reencarnar.
A
Revelação funciona nos mundos e intermundos da Infinita Casa do
Pai; portanto, funcionou ali, também, naquela hora sublime. O globo
de cristal, colocado no local onde no mundo formam as exposições de
idolatrias comercializáveis, em dado momento começou a revelar
farta e policrômica iluminação. As cores menos claras foram dando
lugar às mais claras, até que tudo ficou entre ouro e prata, porém
de um brilho impossível de ser descrito. E a Grande Mãe apareceu,
rodeada de milhares ou de milhões de pequenitos sorridentes e
brilhantes, tendo endereçado à jovem mãezinha palavras de
incentivo. Mas cada um de nós ganhou alguma coisa, porque ela disse,
emprestando à flexão de voz um poder tremendo de penetração:
“...
Porque em um mundo inferior como a Terra, não pode triunfar aquele
que não pode renunciar...”
O
terceiro caso foi a entrega de William aos futuros pais; e também
com ele o Céu quis dar-nos a graça de uma viagem a plano bastante
superior. Portanto, uma falange de mais altos servidores veio a nós,
para nos emprestar auxílio vibratório, sem o que a nossa presença
ali seria difícil, por tempo algum tanto prolongado.
Acertado
o local da reunião, trouxeram da crosta o casal de pais, e, uma vez
o conjunto realizado, a falange superior nos envolveu, formando
círculo em torno de nós. Feito isso, o chefe da falange comandou a
viagem, dizendo que bastava a cada um, para cooperar, ligar o
pensamento a Jesus Cristo. E a comitiva se elevou nos ares, entre
sons maravilhosos.
De
onde saímos, pelo menos vinte e duas fronteiras vibratórias
atravessamos, para chegarmos ao local de destino. E se tudo tinha
mostras do mundo terreno, com edifícios, jardins, aves, flores,
fontes, sons, etc., a verdade é que o sentido de divinização
deixava e muitíssimo longe as belezas de nossos planos menos
iluminados e venturosos.
Entramos
para um imenso edifício em forma de pagode, feito de alabastro
brilhante e ornado de cravejamentos maravilhosos. O salão para onde
fomos, de um caráter grave em tudo, tinha ao centro uma mesa enorme,
de cor escura porém viva ou vibrante, como todas as cores por aqui o
são, sendo natural que, quanto mais se sobe, tudo mais e mais se
torna lucilante e glorioso.
O
chefe da falange colocou cada um em seu devido lugar, deixando
intervalos que, a seguir, completou com irmãos de seu comando. Disse
que assim devia ser, para os de esferas inferiores, e os encarnados,
receberem o necessário auxílio vibratório. Na ponta da mesa, e no
centro dela, pois era muito grande, colocou os futuros pais de
William, deixando uma vaga entre eles. Feito isso, mandou a sobra de
elementos seus formarem círculo em torno. E quando tudo pronto,
avisou:
—
Estamos
informados de que seremos visitados por alguns irmãos de mais altas
esferas; e embora seja comum isto, mormente neste salão, dedicado à
recepção de encarnados e candidatos à encarnação, é sempre com
elevado júbilo que recebemos os avisos, os convites e as ordens,
para organizar as reuniões. Estando nós prontos, manifestamos o
nosso agradecimento ao Pai Divino, ao Divino Mestre que é Jesus
Cristo e ao Sagrado Ministério do Consolador. Que se faça a Vontade
Suprema, através dos Santos Escalões, que a nossa rende graças de
poder servir.
Clarins
soaram primeiro. Feito silêncio profundo, profundíssimo, vozes se
ouviram, vindas de um dos lados. E um grupo de irmãos apareceu, cada
um deles vestido singelamente, simplesmente, como os nazireus ou
essênios. Tudo neles denotava a marca do profetismo hebreu e a
rigorosa simplicidade dos altos seres, aquela simplicidade que
penetra, comove e causa profundo respeito, porque contém de cada um
o que realmente é, sendo que esse “é” revela o infinito
respeito que revelam ao Senhor do Todo!
Digo
aqui, abrindo parêntese, que os religiosismos da crosta e dos planos
inferiores do astral, como não podem ser derretidos, para se
apresentarem de modo diferente e conveniente, devem tratar de se
modificar quase que totalmente; porque, diremos, fazendo parábola,
que aquilo que aqui é simples, porque mostra o lado de dentro das
pessoas, na crosta e planos inferiores não é simples, não é puro,
não é decente, porque mostra o lado de fora, mostra a aparência ou
o rótulo das pessoas. Direis que tudo deve evoluir e que é normal
ser assim... Mas eu digo que os tristes vícios e as deturpações
favorecem maquinações bem engendradas e fortemente conservadas...
Uma coisa é ser normalmente involuído, e outra é ser
propositalmente capcioso, politiqueiro e negocista das coisas do
espírito!
Um
dos do grupo passou à frente, sentou-se entre os futuros pais de
William e disse, com voz harmoniosa, vigorosa e meiga ao mesmo tempo,
assim como quem é o irmão, o amigo, o mestre, o veículo da Divina
Paternidade e a expressão da Sua Divina Justiça:
“Os
mundos físicos são escolas e as humanidades são classes de alunos,
como bem o sabeis. O destino fundamental é a glorificação integral
dos filhos do Pai Eterno. E para que as humanidades alunas tenham
sempre com que contar, em matéria de aprendizados, vamos nós,
executando a Suprema Vontade, enviando professores aos mundos
físicos.
Como
a parte de livre arbítrio não pode ser tirada, muitos professores
têm invertido a ordem da realidade, mais aplicando de seus mesmos
conceitos, do que refletindo, em seus ensinos e obras, a Vontade
Suprema.”
Volveu
o olhar amigo e severo a William, sorriu, um convite feito sorriso, e
chamou-o:
“Venha
buscar este aviso, para que leve nas mãos, durante todos os dias de
sua passagem pela encarnação.”
William
levantou-se, foi até ele e fez uma inclinação de cabeça, mas bem
se viu que dobraria os joelhos automaticamente, se ele, com o seu
olhar, não o proibisse de fazê-lo. E recebeu um pedacinho de papel,
ou parecido com isso, cor de ouro, com letras azuis, tudo brilhante,
mas de um brilho divino. E quando tinha o papel entre as mãos, as
duas, recebeu uma ordem, um doce convite:
“Quer
lê-lo para nós?”
William
leu-o, em voz alta, e com aquele timbre que não era o seu normal,
parece que penetrado daquele poder maravilhoso que envolvia a todos
ali. Aquilo que está dito no cimo do capítulo foi o que leu. E o
presidente da reunião, diremos assim, tendo-se erguido foi
colocar-se atrás do futuro pai de William, e depois atrás da futura
mãezinha, tendo orado, direi que tendo conversado com o Pai
Onipresente, Onisciente e Onipotente, porque a LUZ DIVINA atingiu a
uma tal intensidade, que causava divino assombro, se assim se pode
dizer, para logo mais vir voltando ao natural daquele plano
espiritual, acrescido, é claro, com a presença daquela celeste
comitiva.
Terminado
tudo, o presidente mandou todos ficarem à vontade, bem se percebeu
que para dar a todos oportunidade de trocar conversação amiga. Ele
mesmo ficou à disposição de todos quantos quiseram falar-lhe,
perguntar-lhe, dizer-lhe de suas preocupações e desejos de novos
empreendimentos.
De
minha parte, tinha a impressão de que, se não fosse o tremendo
auxílio da falange auxiliadora, rebentaria pela pressão
intensíssima de algo que tinha no coração, me parecia um mundo de
fogo, de amor descomunal, coisa que, se de lá de dentro saísse,
invadiria o Infinito e banharia tudo com o seu poder de expansão
divinizante.
Não
ousei ir ao presidente, porque tinha e tenho certeza de minha
pequenez; mas ele, na sua celestial simplicidade, foi varando entre
os grupos de presentes e me veio tocar no ombro. Quis vê-lo de
perto, e vi que seus cabelos e tudo o mais, principalmente os olhos,
o retrato de sua majestade pessoal, pareciam feitos de Céu
materializado... Sei que não me entenderão, porque eu não sei o
que isso quererá dizer totalmente, mas peço que assim me aceitem e
que confiem nele, porque gloriosa é a Finalidade da Vida.
Minutos
depois, convidou os seus para a viagem de volta; houve como que uma
alegria banhada de tristeza, porque ele nos deixaria, se bem que ele
não é quem se afasta de seus irmãos menores. Não falou com a
boca, mas falou muito alto e forte, e penetrante, lembrando a todos
que, durante a jornada evolutiva, as amarguras passam e as eternas
venturas permanecem, porque o Pai Divino assim o quer. E foram se
retirando, depois de encantadora inclinação de cabeça, tão
simplesmente como vieram, como grandes amigos no vai-e-vem dos dias
da Eternidade.
O
chefe da falange auxiliadora falou, agradeceu a todos e comandou a
viagem de volta, para os nossos planos, os inferiores. E quando
chegamos ao nosso plano de vida espiritual, entregou ele os futuros
pais ao chefe do departamento competente, dizendo que William devia
reencarnar conservando aquele papel na mão direita, pois sempre que,
durante as dormidas do corpo, pudesse estar livre e ler o conteúdo,
receberia o grande aviso.
*
* *
A
regra é e será eternamente, a cada um segundo as obras que
praticar; e como praticar é se representar perante a Justiça
Divina, assim funcionará, no seio das comunidades irmãs.
Simplesmente assim, normalmente assim, porque aparências e sofismas
não prevalecem perante Deus, que é infinitamente íntimo a tudo e a
todos.
Quem
ainda não atingiu o Grau Crístico, por certo estagia num grau
inferior, seja ele qual for. E, sendo assim, tem para trás aquilo
que já foi, tendo para a frente aquilo que terá de vir a ser. Bom
seria, portanto, que ninguém jamais olvidasse o Sagrado Elo que une
tudo e todos, e principalmente a Origem Divina à Sagrada Finalidade,
pois esse, que se portar assim, muito poderá se avantajar nos
caminhos da evolução.
Enquanto
encarnados, muitos sonham com regras e tabelas miraculosas, não
sendo mais do que isso os ritualismos e sacramentismos
comercializados pelas religiões ou pelos seus proprietários; mas
tudo isso é falho,
e muitas vezes falso e pior ainda, porque diante de Deus, ninguém
jamais deveria comparecer fantasiado ou revestido de aparências. Os
atos perante o chamado Criador e os irmãos, esses é que representam
realmente, nada mais havendo que os substitua, de modo algum. E
falamos com inteiro conhecimento de causa, porque vemos, aos milhões,
caírem por terra as fantasias e os galardões trazidos do mundo. É
confrangedor, é terrível, e é por isso que recomendamos boas
obras e não religiosismos.
Como
padrão, ou média geral, a humanidade terrícola é, moralmente,
fato bem chocante, bem deprimente; o grande número se importa com o
mundo, com aquilo que pode ser visto pelos semelhantes, deixando de
parte aquilo que só Deus vê bem, e, conseguintemente, só Ele pode
recompensar. Além de não cooperar para a melhora do mundo, com tais
imprudentes atitudes, todos deveriam saber que os hipócritas não
herdarão o Reino de Deus. Cumpre, pois, custe o que custar, dizer e
fazer o que é certo, na hora certa!
Do
ponto de vista doutrinário fundamental, todos deveriam saber o
seguinte, para efeito de autoconduta: que jamais alguém poderá
atingir os altos planos da erraticidade, e muito menos o Grau
Crístico, sem enfrentar situações decisivas, sem ter que tomar
medidas de fato, em certas horas. Aqueles, portanto, que pretendem
ocultar verdades ou desleixar deveres, alegando interesses
subalternos ou possíveis opiniões alheias, não se esqueçam de
que, com isso, jamais conseguirão convencer a Justiça Divina. Quem
não tem caráter para afirmar a Verdade não tem merecimento para
subir aos altos planos!
Foi
preleção assim, caros irmãos, que vimos ser endereçada ao
espiritista José, dois meses e meio depois de sua passagem, quando
foi recolhido a um plano de muito relativa luz e para ser medicado
num de seus hospitais.
Que
fazia o irmão José, com as suas faculdades e os seus trabalhos
mediúnicos, com o jogo de suas conveniências materiais e as suas
responsabilidades para com a Justiça Divina?
As
faculdades, pensava, eram o produto de suas boas realizações
pretéritas, e podia usá-las à vontade e livremente, porque
propriedades são propriedades! Como ferramentas, pelas quais teria
que responder, ao desencarnar, não pretendeu jamais encará-las.
Portanto, recebeu muitas pagas, presentes e tal, pelos trabalhos
prestados.
Suas
conveniências materiais, em geral, fizeram-no passar por cima dos
Mandamentos da Lei, em muitas ocasiões e para fins bastante
comprometedores, chegando às raias da imoralidade, abusando da
confiança que lhe atribuíam. Mal sabia, que, em tempo algum, alguém
passará por cima da Lei!
Entre
a melhor conduta perante a Verdade, tal como a conhecia, e algumas
injunções humanas, deixou a Verdade debaixo do alqueire e defendeu
falsa moral humana. Teve o que dizer, muitas vezes, para dar o
testemunho certo, mas os presentes e as festinhas que lhe fizeram nos
ouvidos, autorizaram-no a silenciar, até mesmo a mancomunar com o
erro!
Em
grau bastante elevado, portanto, foi apenas um mercador de práticas
mediúnicas. Como, porém, seus conhecimentos foram maiores, muito
mais ao pé da Verdade, em confronto com os de outros mercadores da
fé, eis que foi chamado em tempo antecipado, e para enfrentar
situação menos agradável.
O
mentor indicado naquele posto de socorro, que ficava bem nas divisas
das faixas trevosas, disse-lhe:
—
Agora,
irmão José, que sabe porque desencarnou antes do tempo, e que sabe
quanto tempo irá trabalhar neste posto de socorro, para adquirir
méritos, a fim de encarnar de novo, procure ser um esforçado
trabalhador. Aportam aqui irmãos em estado desesperador, vindos das
faixas inferiores. É um campo de trabalho, é um instrumento de
ressarcimento, é uma graça de Deus!
Entristecido,
José perguntou:
— Não
voltarei ao meu antigo plano de vida, antes de reencarnar?
— Não,
tal é a ordem que está no seu relatório. Voltará daqui mesmo para
o novo corpo, depois dos muitos anos que terá de aqui trabalhar,
para ressarcir os erros cometidos por culpa de suas leviandades.
José
pertencia a um plano muito mais elevado; ninguém poderia negar o
fato; mas ao
mais conhecedor mais será exigido!
É
muito fácil ler o que se encontra na Lei de Deus, no Código de
Conduta; é muito fácil ler sobre a significação do Divino Exemplo
do Cristo; porém muito mais fácil é acreditar nos próprios
conceitos, exaltando os próprios méritos, pensando que a Justiça
Divina é apenas um sócio igual e nada mais, com quem se pode
discutir à vontade e talvez até mesmo desfazer o compromisso!
A
honra do profeta está no compromisso para com a Verdade, o Amor e a
Virtude, que são acima de religiosismos e conchavismos humanos
quaisquer; para ser apenas um mercador de posições e vantagens,
aparências e rótulos, o Céu não remete ao plano carnal criaturas
com salientes faculdades medianeiras.
Quando
José saía, levado por um outro servidor, para iniciar longos anos
de trabalho árduo naquele posto de socorro, o mentor indicado
comentou:
— Em
nenhuma parte do mundo o Consolador restaurado atingiu a amplidão
que atingiu no Brasil,
a Atlântida redescoberta, o rincão que encabeçará o movimento
espiritual da Nova Era, entregando a humanidade a um nível muito
mais elevado na ordem vibratória; mas, é pesaroso dizer, que a
todas as horas recebemos elementos de volta, cujos índices estão
muito longe do esperado.
Sempre
desejando saber, perguntei:
— Por
quê, bondoso irmão?
Ele
invadiu o meu ser todo com aquele penetrante olhar, para depois
responder, com um profundo acento de mágoa na entonação de voz:
— Eu,
pelo menos eu, que também errei no mesmo sentido, tenho certeza de
que o maior dos males, irmão Artur, é a mania de querermos
doutrinar os outros, enquanto deixamos para trás a própria noção
de conduta.
— Foi
um médium relapso?
Assinalou
que não com a cabeça, tendo murmurado:
— Não
fui apenas um médium, mas um fundador de Centros e organizador de
estatutos. Cuidei muito dos templos de matéria e não soube
compreender muito bem os templos espirituais... Fixei programas para
várias casas, mas não tracei melhor conduta para mim mesmo, em face
da Lei de Deus e do Divino Exemplo do Cristo, Daquele Divino Homem
que fugiu dos templos e foi praticar a Santa Vida Exemplar entre as
gentes, até a hora de ser preso, espancado, falsamente julgado,
insultado de todos os modos e por fim crucificado.
— Tudo
isso faz pensar muito! – disse-lhe eu.
Levantou
ele a cabeça, fitou-me bem e aduziu:
— A
humanidade não precisa de mais umas igrejinhas, irmão Artur... Não
é a falta de outras modalidades clericais que o mundo reclama, para
aquelas modificações que visam entregá-lo a plano superior de
vida... Sem que cada um se compenetre da edificação pessoal no seio
da VERDADE MAIOR, tudo serão igrejinhas, tabelinhas, pílulas e
teorias engarrafadas!
—
Concordo,
irmão, e levo em conta o seu cabedal de experiência própria, mas
pondero que, em virtude da tamanha falta de cultura geral que
avassala a humanidade, bem pouca coisa poderá fazer o Consolador
restaurado, mesmo que alguns abnegados façam da vida um campo de
sacrifícios...
Interrompeu-me
ele, para observar:
— Sim,
sim, irmão Artur. Nesta fase histórica da humanidade terrestre,
dois terços dela sofrem de analfabetismo e de fome!... As
divergências de ordem econômica, disfarçadas em ordem política,
construíram o maior monumento bélico, aguardando a hora propícia
para o desencadeio do maior massacre de todos os tempos!... As
crianças e a juventude, o fermento da humanidade adulta, que no
amanhã deveria produzir o bom exemplo, está contaminado pelo gérmen
do religiosismo idólatra e brutalizante!... E, enquanto isso, os
representantes do Consolador restaurado só sabem fundar igrejinhas,
pensar em filas de necessitados nas festas de fim de ano, repetir
dentro de Centros as sentenças do Cristo e, como iguais, formarem na
rançosa coluna dos que acham que Deus deve providenciar as reformas
sociais da humanidade...
— Como
deveriam pensar e agir os espíritas, então? – perguntei.
Vi-o
sorrir, abanar a cabeça negativamente e dizer:
— Como
deveriam, isso não vou dizer... Mas eu sei que uns fundam igrejinhas
e tabelinhas, para serem os de cima, e outros procuram as igrejinhas
e as tabelinhas, para terem onde e com quem passar umas horas ou para
pretenderem que os espíritos lhes consertem a vida!... As grandes
reformas íntimas e as necessárias reformas sociais, em termos
cristãos, isso
dá muito trabalho!
Já não digo que custe martírios, como em outros tempos, pois se
assim fosse, os tais modernos profetas abandonariam a arena antes de
haver perigo! Tudo, portanto, irmão Artur, é questão de tirar
proveitos pessoais... E o Reino de Deus, que é questão de Verdade e
não de acomodações religiosas, também para os espiritistas já
deixou de ser importante, para ser apenas um item do vasto programa
da vida medíocre...
Eu
e dois outros, que fôramos entregar José àquele plano e posto de
socorro, fomos logo embora, levando nos ouvidos aquelas palavras
candentes, aqueles agravantes conceitos. Como cada um pensa como pode
e não como quer, e tem dentro de si os seus problemas a resolver,
melhor julgamos registrar os fatos, sem ajuizar sobre seus méritos
ou deméritos. Apenas, como medida de prudência, afirmamos aos
espiritistas, que há muita diferença entre falar ao mundo em
religiosismos e falar ao mundo em termos de VERDADE. Ninguém
confunda a VERDADE com os rançosos religiosismos, se não quiser
enfrentar tristes situações ao desencarnar.
Se
tudo fosse a mesma coisa, Aquele que deixou a Igreja Viva do Caminho,
edificada sobre o Imortal Pentecoste, ou Consolador Generalizado, não
teria ido em linha reta da Manjedoura ao Calvário! Portanto,
Espiritismo
não é um religiosismo a mais,
somando entre os conchavismos do mundo, e um espiritista,
conseqüentemente, arrasta consigo muitas responsabilidades a mais.
Conversinhas
humanas podem afirmar o que bem queiram ou possam, mas nos altos
planos da vida errática, todos sabem que o Pai Divino jamais deixou
faltar no mundo a Tocha Iluminadora que é a Revelação; todos sabem
o que foram os Grandes Iniciados, os Grandes Profetas que bradaram ao
mundo os avisos do Céu; todos sabem da Divina Exemplificação do
Cristo; e como, então, na hora em que cumpre à Revelação, ao
Consolador reposto no lugar, o tremendo serviço de esclarecimento da
humanidade, ter alguém que o transforme num formalismo como os
outros?
Aquele
que não saiba separar entre uma questão de VERDADE e uma questão
de religiosismo formal, que se não diga espírita! Uma escola de
conscientização, que não se estriba em dogmas e formalismos
inventados por homens, porque afirma diante do mundo as Verdades
Eternas, Perfeitas e Imutáveis de Deus, é digna de melhores
arautos!
*
* *
De
um modo geral, cumpre aos homens deixarem para trás essa mania de
pensar que Deus deve reger o Universo Infinito pelas suas tabelinhas
sectárias, pelos estreitismos conceptivos de seus fanatismos
religiosistas; devem reconhecer que a Terra é um planetazinho muito
pequeno e atrasado, engastado no seio de bilhões de bilhões de
mundos, diríamos melhor dizendo bilhões de bilhões de galáxias, e
que os homens mais se parecem com formigas insignificantes, em
virtude do atraso intelecto-moral de que são portadores.
E
se em outros tempos, mais atrasados, idolatrias e superstições
vogaram à vontade, fizeram praça e pareceram verdadeiros cultos
superiores da fé, chegada
é a hora de tudo modificar.
Já não tem mais cabimento a Fé, a Esperança e a Caridade, porque
o CONHECIMENTO, a CERTEZA e a BONDADE, desde muito que podem tomar a
vanguarda das movimentações humanas, à custa de quanto o
Consolador restaurado tem ensinado.
Os
enigmatismos das iniciações antigas, com as suas carradas de manias
ocultistas e misteriosas; tudo isso, enfim, que cheira a
terminologias eufêmicas, e mais as posturas físicas e as presunções
iniciáticas, quando realmente são vazias ou apenas cheias de
ilusões ocultistas e pretensiosas. Isso tudo é asneira querer
conservar ou passar adiante, porque o Consolador restaurado, a
Revelação tornada ostensiva, por ser absolutamente prática, ao
alcance de todos e a par da vida dos filhos de Deus, tudo isso jogará
por terra, queiram ou não os discípulos de todos os enigmatismos
arcaicos ou modernos.
A
mania dos templos, das vestes fingidas, dos sacramentismos, dos
rituais e das súcias clericais, com suas profundas influências nos
domínios político-econômicos, produzindo o retardamento evolutivo
da humanidade, tudo isso também já poderia estar nos depósitos de
lixo da História. Embora os documentos oficiais provem que, neste
meado do século vinte, dois terços da humanidade sofrem de fome e
de analfabetismo, afirmamos que um terço da humanidade, sendo
letrada, bem poderia conduzir os restantes dois terços para fora
daqueles ignorantismos e atrasos.
E
aqueles que acham o Cristianismo nos longos discursos bíblicos e nos
cânticos, pouco caso fazendo da Lei de Deus e do Divino Exemplo do
Cristo nas suas obras sociais, esses também precisam mudar e bem
depressa, pois o Consolador vai assaltando a humanidade com os seus
FATOS, dando da Lei e do Cristo o devido testemunho.
Estes
conceitos, nós os manifestamos em virtude de um aviso recebido e dos
últimos dois trabalhos levados a termo, antes de terminar esta
narrativa, da qual fomos incumbidos por um mensageiro de muito alta
hierarquia, que veio em nome da Grande Mãe.
O
convite foi de Silvestre, para que estivéssemos em sua residência
na hora indicada. Lá estando, disse ele:
—
Artur,
a narrativa está a findar; o pensamento da Grande Mãe, ou daquela
que simboliza a Maternidade, ou tudo que é Feminino neste Planeta,
está radicado em letras de forma, para constituir graciosa mensagem
de aproximação entre os homens e as altas esferas da vida
espiritual, tudo com vistas ao Novo Ciclo. Portanto, tenho dois casos
a lhe apresentar, para que com eles encerre a obra mensageira. Terá
apenas que observá-los e descrevê-los, para que a lição fique nos
ouvidos e nas consciências, nada mais. Como já lhe foi dito, nossa
obrigação é lançar a semente na terra, para que esta, conforme
seja melhor ou pior, favoreça a germinação, o crescimento, a
floridura e a produção. Isto é, nós temos apenas a obrigação de
falar às mentes e aos corações, ficando eles responsáveis pelos
resultados positivos ou negativos.
—
Muito
bem, tal é a sentença do Cristo.
—
Vamos
hoje, então, ao primeiro caso.
E
fomos observar a saída do corpo do mais alto dignitário clerical,
de quem a imprensa em geral falou muito, tendo-o chamado de “Santo”
para cima. Todavia, ninguém o amparou, depois do corte do liame
fluídico que o prendia ao corpo. Como que atingido por uma força
invisível, foi parar numa capelinha humílima, em um interior da
Itália, sem saber que desencarnara e sofrendo terrível geleira pelo
corpo, que ele não sabia que era o do espírito. E com ele se
trasladou uma tremenda multidão de outros clérigos e de outras
gentes, formando uma nuvem horrenda, um cortejo macabro.
— Que
monstruoso espetáculo! – exclamei, assustado.
Silvestre
encarou-me, assentiu com breve aceno de cabeça e murmurou:
— A
justiça humana é vesga, mas a de Deus nunca o será!...
—
Quando
sairá dali?!... E que acontecerá com essa legião igual a ele?!...
Sem
perder tempo, Silvestre aduziu:
— A
Justiça Divina é absoluta e todos os fenômenos se desenvolvem no
Espaço e no Tempo, nada mais. Apenas, como conseqüência de tudo,
ele virá a dizer que serviu a Deus, enquanto os mensageiros
socorristas lhe provarão que ele foi apenas muito bem servido,
adulado, festejado, mimado, obedecido e tido como autoridade temporal
e espiritual... Provarão a diferença entre ele e seus títulos e o
Divino Exemplo do Cristo, que títulos não aceitou e terminou a
carreira carnal crucificado, por outros tantos falsos ministros de
Deus!... E por fim, lhe mostrarão o caminho de trabalhosas e
difíceis jornadas carnais...
No
dia seguinte, na hora certa, estava eu a postos, aguardando o momento
de verificar outro acontecimento, sem ter a menor idéia do que
fosse.
—
Vamos
embora! – comandou Silvestre, todo feito alegria, planando em faixa
vibratória que não tinha coisa alguma que ver com os umbrais.
Num
abrir e fechar de olhos, estávamos dentro de uma casa singela,
repleta de gente chorosa, povoada de multidões espirituais
maravilhosas. Entre as lágrimas dos encarnados e as alegrias do
mundo espiritual, somente pairava a fronteira carnal, a parede
formal; menos isso e todos, encarnados e desencarnados, festejariam o
desencarne de uma velhinha muito magra, encarquilhada ao máximo.
Silvestre
fez um gesto de reverência, diante das grandes almas presentes e se
disse o mensageiro da libertação. Todos abriram alas e ele chegou,
elevou a sua mente, no que foi acompanhado por todos, tendo havido,
então, uma profusão de vozes, palmas, cânticos, sorrisos de
boas-vindas, uma verdadeira tempestade de glórias!
Solta
entre milhares de braços amigos, formando uma nuvem azulino-dourada,
a velhinha foi subindo, subindo... Mas ela foi deixando a velhice
para trás, foi passando por uma transformação celestial, até que
lá nas alturas, para nós, vimos a Grande Mãe vir e envolvê-la com
a vastidão do seu manto brilhante, tão brilhante que, mesmo de
longe, ofuscava as nossas vistas espirituais.
— Que
espírito maravilhoso! – exclamei.
Silvestre
sorriu e corrigiu:
— Que
trabalho maravilhoso, isso sim, pois espíritos maravilhosos todos o
somos, já que o Pai Divino nos fez semideuses!
— Que
trabalho fez ela? – perguntei.
— Mãe
de onze filhos, avó de setenta e nove netos, bisavó de centenas de
bisnetos... Lavou muita roupa, cozinhou muito, distribuiu seus dotes
de coração a milhares de irmãos... Deu conselhos a vida inteira e
quantos exemplos pôde... Em lugar de pretender absolver os outros,
com suas palavras simples orava e dizia ao Bom Deus que lhe perdoasse
as faltas... Mesmo que lhe quisessem oferecer títulos e rótulos do
mundo, ela os não aceitaria, porque o bom trabalho não lhe deixou o
tempo para tais comprometedores devaneios... Enfim, Artur, essa
velhinha, anônima para o mundo, foi bem lembrada pela Suprema
Justiça... Portanto, diga aos nossos irmãos encarnados, que Deus
não usa as viseiras do rotulismo humano.
Retornando
aos pagos espirituais, parti para um lugar isolado, entre as
montanhas da nossa região, para meditar sobre muitas questões. Meu
cérebro estava abarrotado de idéias e meu coração minado de
sentimentos profundamente estimulantes. Queria, pois, ficar sozinho,
para lembrar e reviver uma porção de fatos.
Estava
meditando, olhando de cima daquela cadeia de montanhas a planície
que se estendia ao longe, onde a cidade sede da região estava
localizada, com seus enormes prédios, hospitais, escolas, centros de
estudos, etc. E uma sonolência me foi invadindo, invadindo, até que
adormeci...
Naquela
sonolência gostosa e embaraçosa ao mesmo tempo, porque eu sabia que
dormia e sabia de mim ao mesmo tempo, senti que viajei e que visitei
a Jerusalém dos dias de Jesus Cristo. Tenho certeza que vi a
trajetória do Cristo, da Manjedoura ao Calvário. Estive perto de
todos, amigos e inimigos, confiantes e desconfiados, indiferentes e
chorosos. Eu sentia as reações de cada um, como se fossem aparelhos
de registrar, cada um vibrando numa faixa diferente, reagindo de modo
diferente, em face do mesmo acontecimento, em face da mesma tragédia
imortal, que se inscrevia de modo rigoroso na História do Planeta.
Depois
vi três magnatas da clerezia levítica, os três maiores inimigos de
Jesus Cristo, que de alguns metros de distância, muito desconfiados,
observavam os movimentos do Cristo, na cruz. Vi as Marias, vi e
focalizei bem a Salomé, a sobrinha de Herodes, que desde a morte do
Batista, se fizera uma das acompanhantes do Cristo, e que também
pranteava aos pés da cruz.
E
quando, num esforço tremendo, vi Jesus bradar ao Pai que em Suas
Mãos entregava o Seu espírito, vi-O deixar o corpo, ser recebido
por uma corte maravilhosa que tinha o Profeta Elias na frente, e
subir, sumir no Infinito feito de luzes e de esplendores celestiais.
Depois, não sei como, apesar de ter sol tudo escureceu, ficou noite,
tremeu, causou muito pânico!...
Mas
vi que um dos três era eu... Um dos grandes algozes do Cristo era
eu...
Portanto,
irmãos meus, filhos do Altíssimo, eu vos convido às obras
nobilitantes, ao abandono dos rótulos do mundo, porque o túmulo os
enterra também, ficando o espírito cheio de responsabilidades, nada
mais. Tende a vossa mente ligada à Mente Divina e o vosso coração
ligado ao Divino Coração; se assim fizerdes, irmãos, estareis com
Jesus Cristo e Ele, nessas condições, será realmente o Caminho, a
Verdade e a Vida, porque representa a Lei e a Justiça Divina.
Quanto
ao mais, com a evolução dos espíritos os intercâmbios aumentarão,
porque é o normal dos mundos e das humanidades; jamais alguém
conseguiria obrigar o processo evolutivo a estagnar para sempre.
Portanto, que se emendem de uma vez para sempre os adversários do
Cristo Planetário, porque o Seu Batismo de Revelação marchará e
triunfará.
De
todos os movimentos ditos espiritualistas, é o Espiritismo aquele
que se estriba nas Verdades Eternas, Perfeitas e Imutáveis de Deus,
não tendo motivo algum para escravizar-se a instituições e a
estatutos humanos, visto não ter grupos parasitas ou clericais, não
admitir formalismos e idolatrias, vestes fingidas ou títulos
nobiliárquicos, pois é notório que ninguém é proprietário da
mediunidade e dos espíritos comunicantes.
O
Espiritismo vale pelo que é, como expositor das Verdades
Fundamentais, não
tendo coisa alguma com religiosismos quaisquer,
antigos ou modernos; pelo contrário, ele coloca o filho de Deus
frente a frente com a Realidade Total, deixando-o livre para agir,
segundo o seu alcance intelecto-moral, em função de sua união
vibratória com o Pai Divino, a Essência Divina Onisciente,
Onipresente e Onipotente.
O
espírito missionário que devia vir repor as coisas no lugar, ou dar
à restauração o caráter organizado que tem, não poderia inventar
Verdades Doutrinárias e não as inventou; ademais, acima de todos os
conceitos humanos, prevalece a condição universal da Excelsa
Doutrina, tão universal quanto o próprio Deus. E por isso devemos
afirmar que os homens vieram, por motivos cíclico-históricos, a
conhecer o Espiritismo, mas o Espiritismo data da Eternidade, sempre
conheceu os homens!
O
Espiritismo é Realidade Fundamental, é Cósmico e Anímico, queiram
ou não os homens, crédulos ou incrédulos; se forem incrédulos, no
Espaço e no Tempo terão que se apresentar perante a Realidade; e se
forem crédulos, ataviados com os mil e uns aranzéis dos formulismos
religiosistas ou supersticiosos, terão que se compenetrar de que o
Pai é Espírito e Verdade, assim querendo que Seus filhos venham a
ser. Isto é, fora de quaisquer fantasias e exteriorismos.
E
as duas testemunhas, fiéis e verdadeiras, continuam a testemunhar;
quem é inteligente sabe o que elas querem. Porque a Lei de Deus é o
Código de Conduta e o Cristo é o Modelo Divino, sendo as duas um
misto de Moral, Amor, Revelação, Sabedoria e Virtude.
Portanto,
antes de um filho de Deus pensar em fazer trejeitos e aparências,
pretendendo com isso agradar a Deus, lembre-se de que a
Era da infantilidade já se foi.
Viva socialmente como convém, como bom filho do Pai Divino e fiel
irmão de seus irmãos. Ninguém atingirá o estado de plenitude, em
PAZ e VENTURA, fora dessa linha de conduta.
F
I M