Primeira Parte
Se
fôssemos aquilatar a responsabilidade do homem presente, pela soma
das Revelações recebidas ou enviadas pelo Diretor Planetário,
teríamos de apostrofá-lo com as mais veementes taxativas. Tal é,
como posso encarar o homem histórico, aquele homem-humanidade que
se apresenta hoje, em face das questões inerentes ao seu problema
fundamental, que é a emancipação espiritual, arcado sob o jugo de
infindas obrigações e quase que desprovido de valores despertados
ou virtudes ativas.
Que fez o homem no uso de si
mesmo perante os ciclos vencidos e as verdades ensinadas pelo Céu?
Com que poderes internos despertados enfrentará o ciclo futuro?
Nem
mesmo a tanto se precisa atingir; basta observar os elementos de
vigor moral com que defronta a fase transitiva presente, toda inçada
de mil e um percalços, toda plena de vicissitudes as mais
convulsivas e dolorosas. Afora um número diminuto, ínfimo, que se
detém nas práticas salutares da fé consciente, quase tudo é mole
que ondula e sacoleja por entre as trevas sinistras da incerteza e do
pavor.
Em tempo algum houve tanta
necessidade dos melhores valores expostos, das melhores marcas
registradas no quadro vasto das virtudes íntimas e desenvolvidas; no
entanto, a imensa maioria não está de pé, não está em guarda,
pouco ou nada faz pelo esforço equilibrador, pela movimentação
evolutiva no âmbito da ordem, do regime de harmonia. O findar de um
ciclo evolutivo, de ordem universal , apanha o homem humanidade menos
provido, quase totalmente desprovido de recursos combativos à altura
do momento e da importância histórica e clássica concernentes.
Buda já ensinava, seis séculos
antes do Cristo:
“Todas as coisas compostas
são sujeitas à corrupção; não poderia ser de outra maneira”.
Mas o nosso homem-histórico tem
dado muito mais importância ao que é transitório, ao que é
mutável e aleatório; os bens do espírito ficaram para trás e o
momento renovador mais intenso, mais brutal e universal, apanha-o
quase que inteiramente desprevenido. Menos do que isso ou com alguns
recursos espirituais a mais, formando na linha defensiva moral, e
esta fase transitiva não seria tão violenta, assim carregada em
extremo de sinistros prognósticos.
Ao tempo que Buda ensinava
diferenciar entre os bens aleatórios e aqueles de fato, com a
seguinte e lapidar sentença:
“
De tudo que teve uma origem causal, aquele que achou a Verdade
mostrou a causa; e de todas estas coisas o grande asceta explicou a
cessação”; nesse tempo, sem dúvida, bem menor era o montante de
zelo espiritual necessário, por ser o fenômeno menos intenso e
amplo. Portanto como não se deve agora portar, aquele que vive
paralelo ao mais crítico momento cíclico-histórico?
Temos certeza de que não
estamos falando por acaso; de outras esferas partem determinações a
esse respeito. Nossa missão é alertar, é lembrar a necessidade
inadiável da melhor vigilância, da melhor estacada em face do
monstro avassalador que tudo procura minar e destruir, atirando nas
garras da degradação milhões de seres, tornando-os vítimas da
própria negligência.
Esta hora devia ser de ação e
prudência por parte de todos. Quando menos fosse, pelo menos por
parte da maioria, a fim de que o anti-Cristo, que é o inverso de
tudo quanto é do Cristo, jamais pudesse cantar alto o seu hino
cavernoso através da humanidade e defronte ao Céu. No entanto,
prevaricações de toda espécie e monta têm lavrado parada no
caráter da humanidade, vinculando-se a ela de maneira arrasadora,
minando-lhe os mais penhorosos recursos espirituais, diminuindo
nalguns casos toda e qualquer capacidade de resistência ao mal.
Fatos tidos como acidentais
ontem, hoje valem pela mais desbragada e fatal lesão de caráter.
Erros simplesmente admitidos como sendo superficiais, tanto se foram
acumulando, somaram-se ao extremo no curso de ciclos e mais ciclos,
vindo agora a formar peso incrível no dorso encurvado da humanidade,
expondo-a aos golpes terríveis da adversidade, dos ventos pútridos
que sopram de todos os quadrantes terrestres, principalmente os de
ordem político-econômica. A má política religiosa forçou a
debacle no plano econômico espiritual, por conclusão lógica temos
o irrisório teor psíquico vigente. Reina a fraqueza onde o poder
íntimo devia comandar. Quer isto dizer que, por dialética ou
ambivalência, o fracasso dos jogos espirituais fez carunchar o
edifício temporal, vindo este, agora, a pressionar tremendamente o
já enfraquecido alicerce daquele.
O homem-humanidade deste século,
portanto é um desnutrido de corpo e de espírito. Não me refiro a
totalidade, mas ao grande número.
Também não penso em levantar o
dedo, em apontar e incriminar; lamento, deploro, lembro e se
possível, aviso. Nada mais, pois eu também palmilho a senda comum,
a trilha normal, tendo o histórico cheio de altos e baixos. Não sou
quem possa falar de dedo em riste, por estar acima das contingências
terrícolas, por ser alguém cujo teor evolutivo paire nas alturas da
consonância UNITÁRIA. Eu ainda não me fiz uno com o EU INFINITO –
Deus.
Outrossim,
como narrador, quero acentuar minha tendência doutrinária budista,
comprovante de minha formação intelecto-espiritual, pois as minhas
vidas carnais tiveram curso entre as paragens onde os oito Budas
viveram e ensinaram. Terei oportunidade no desempenho da narrativa de
expor e fixar minhas concepções sobre Jesus, a quem reconheço como
Cristo Planetário e batizador em Espírito. Devo assentar aqui minha
bateria mental e dizer, também, o quanto venero outros elevadíssimos
vultos da história religiosa ou verdadeira. Para mim prefiro falar
em verdade e não em religião, pois este último termo se presta a
múltiplas confusões, havendo bastos conventículos humanos que, por
ignorância espontânea ou proposital, tudo fazem a fim de confundir
para subtrair fartos proventos materiais.
Há que fazer distinção entre
o indivíduo e o seu caráter. Melhor seria dizer , distinguir a
origem divina, a individualidade e o caráter. Por que, afinal, as
duas primeiras instâncias, embora sendo aquelas que dão origem à
terceira, por serem fundamentais, nada poderiam representar ou
constituir, na apresentação do homem clássico, do homem presente
ou prático.
Lembro esta necessidade em
virtude de minha formação espiritual búdica; quero acentuar a
minha repulsa a um dos axiomas da filosofia búdica, pois o seu
radical abstracionismo, propulsor do mais acendrado abstencionismo,
constitui erro clamoroso. Ninguém surtiu de Deus, da Divina
Essência, como individualidade e comportando valores divinos em
potencial, com a sagrada obrigação de fazê-los ter manifestação
patente, e, ao mesmo tempo, numa flagrante manifestação de
contradição, com o direito de sepultá-los, de renegá-los. Este
conceito da filosofia budista é terrivelmente clamoroso, é
aberrante, pois a Lei determina que haja, da parte do indivíduo,
todo o esforço a bem do máximo desabrochamento.
Faz-se mister trabalhar,
aprender, organizar. A santidade é conseqüência lógica de um
longo e trabalhoso processo íntimo de afloramento dos poderes
latentes. E isto quer dizer, então, que o budismo, pelo menos nesta
parte, carreia volumoso contingente de conceitos falhos. A Lei exige
esforço construtor e não abstração e contemplação. Renunciar a
determinadas atividades é perder experiências, é se entregar a
prejudiciais atrofiamentos. E a prova que damos, para o caso, é que
ninguém jamais foi levado a sério pelo Céu, pelo fato de se ter
feito negação em face de obrigações temporais. O que se não deve
fazer, em circunstância alguma, é proceder mal em caso qualquer.
Afora isso, cada qual cumpra com o seu dever, não fuja da luta a
pretexto de querer ganhar o Céu mais depressa.
Também por estarmos tratando do
assunto, vamos dizer alguma coisa a respeito do ofício de ser
clérigo, de viver a custa da fé. Abandonar a casa, e com ela as
obrigações, a fim de viver do ofício religioso, ganhando os meios
de subsistência, ou pedindo esmolas, isso não é decente, fica dito
de uma vez por todas. Se alguém chega a ter alguma coisa, para
subsistir, e essa coisa foi ganha desse modo, afirmo que nisso está
errado, não andou bem perante a Lei e terá que com ela ajustar suas
contas.
De um modo geral, convenhamos,
ato espiritual construtivo não é aquele que se dá foros de
espiritualidade ou religião, pois o Céu não se move e nem comove à
custa de fantasias, de formalismos e de idolatrias. Podemos dizer que
a humanidade perdeu, nesse mister, até hoje, muito mais tempo do que
todo o tempo somado em outras atividades perdidas. De todos os
quadrantes da fé repontam aqui os elementos, equipados de materiais
os mais extravagantes, atulhados de pretensos merecimentos, saturados
de mil formas de pseudo validades, amuletos a que o Céu não confere
sequer atenção. É vir com eles e largá-los no primeiro encontro
com os planos de paz! Nalguns casos, tanto custaram para serem
adquiridos, de tal maneira foram acumulados, que o seu dono ou
proprietário, ao invés de vir bater nas esferas de Luz, toma o rumo
das regiões trevosas. É que o castelo feito, em lugar de ser
edificado pelas diretrizes divinas, foi erguido sobre os mais
peçonhentos conceitos e preconceitos humanos, quase sempre filhos de
conventículos clericais, de elementos de mau ofício.
De toda e qualquer
forma, porém, há uma diferença muito grande entre o que é Verdade
por Deus e o que é conceito humano. De
cima
surgem determinações impolutas, diretrizes inabaláveis, regras de
absoluta segurança; de
baixo
procedem os conchavos, as maquinações, as espertezas e os tribofes.
Quem se agarra ao que determinam os conceitos humanos, principalmente
quando filhos de conventículos exploradores, aqui chega e se vê
aniquilado, derrotado e até envergonhado. Percebe o engano, porque
reconhece que empregou em obras de formalismo vazio o tempo e o
esforço que devia empregar na aquisição do Amor e da Ciência. Não
trabalhou para obter conhecimentos superiores, nem fez da decência
de conduta e da caridade o baluarte supremo. Pensou em ser esperto,
julgou estar lidando com a muito elástica justiça do homem…
Enganou-se todavia, pois estava defrontando aquela Justiça Imaculada
cujo tribunal é por excelência íntimo à criatura!
Estas questões são de caráter
, não são de fundo originário e nem de natureza individual. Estão
na alçada organizável, devem ser tratadas com todo o rigor
intelectual, merecem todo o esforço mental possível. Afinal, se não
fosse para isso, para o indivíduo levantar sobre a origem divina e o
direito de individualidade o seu caráter, a sua construção
científico-moral, para que serviriam aquelas bases, aqueles
alicerces?
Todo indivíduo deve proclamar –
“Sou de origem divina! Sou uma individualidade eterna! Devo
organizar meu caráter à custa de meus esforços!”
Em poucas palavras essa é a
tabela fundamental, sem a qual tudo mais é aleatório, se não
absolutamente falho e comprometedor. Quero convir, no entanto, em que
essa tabela, para ser executada ou levada a termo de prática,
demanda coragem e trabalho, virtudes que, infelizmente, em muitos
elementos, já sofrem longa e pertinaz acuação, estando, portanto,
recolhidas aos rincões mais afastados da personalidade. O vício da
idolatria e o comodismo devoram, quase sempre, os melhores florões
do espírito. E quando a hora chega de se apresentar perante o
tribunal íntimo, onde a Lei através da Justiça exerce a função
que lhe compete, então surgem o arrependimento, as amarguras, tudo
quanto é doloroso e triste, com aquele terrível acréscimo de
nulidade com o pior dos sentimentos negativos – o quebramento
moral. A criatura sente estrugir, em toda sua estrutura sensitiva, a
mais voraz arremetida do remorso. Mas é tarde… Depois de penar o
devido, um dia voltará ao plantel carnal e tentará vencer a prova.
Esse fiasco, devo
dizer, colhi por conta do budismo. Fiz-me partidário do
abstracionismo, entreguei-me ao culto das abstenções, caí em cheio
no culto da contemplação.
Era fácil cair em êxtase, ver a Luz Excelsa, gozar o Céu… Mas
com a separação do corpo, embora não fosse culpado, um sofredor,
era um vazio. Tinha paz, estava em ordem, mas num plano bem inferior,
bem rente ao homem carnal. Foram vidas e mais vidas, todas elas
repassadas de místico fervor, mas num campo onde as flores do bem e
os frutos do trabalho faltavam por falta de cultivo prático. A terra
era fértil, as nuvens derramavam água e eu respeitava essas e as
demais dádivas da natureza; mas respeitava em teoria, não
trabalhava, não ocupava não punha a produzir para ter e para dar.
Conseqüentemente, fui pedir
esmolas, fui viver da caridade. Isto é, comecei a explorar o
próximo, a extorquir do trabalho alheio, pois quem come de esmola
também come o produto de algum trabalho. Como pode caber,
confessemos, que um Deus de Verdade concorde com tal prática? Então
a pretexto de religião, ou de culto espiritual, alguém tem o
direito de ser vagabundo e comer do trabalho de terceiros? Num mundo
cheio de misérias, de doenças, de faltas em geral, tem cabimento
que, a título de fé ou de amor a Deus, viva alguém a vida do
parasita?
O verdadeiro credo se comprova
depois de passar para este lado, quando a passagem é feita em
condições de poder aquilatar fatores qualitativos. Por isso mesmo,
combata quem quiser minha assertiva, mas eu afirmo que o melhor modo
de se saber como viver na carne, é saber como se poderá aqui ser
recebido conforme o que aí se obrou. Quem puder estudar as nossas
informações, que o faça com inteireza de ânimo e aproveitamento,
porque o dia chegará de fazer confrontação prática.
A Revelação Védica data de
quase uma centena de milhares de anos. Em seguida a ela, muitas
outras se somaram, algumas de atitudes soberanamente sublimes. Dentre
elas considero as búdicas, cuja origem se perde na profundeza dos
milênios, embora contenham exclusivo acento humanista, mesmo que não
tenham por objetivo transformar seus crentes em adoradores de Deus,
isto é, adoradores à maneira das crenças cujos programas
litúrgicos valem por verdadeiras resmas de formalismos e comércios
temporais. Apesar de tudo, principalmente de seus erros filosóficos,
e do seu nenhum teor científico, o budismo, sendo humanista, por
isso mesmo revela o mais reto caminho à paz. É, como pode ser, um
verdadeiro programa decentista, uma barreira levantada contra os
estorvos do vício e de todos aqueles conceitos e preconceitos que
mais dividem os homens.
Depois
de ressaltar a estrutura e a contextura dos trabalhos de servidores
do estofo de Hermes, de Zoaroastro, de Apolônio; dos Patriarcas
hebreus , de Moisés, dos profetas, do Cristo; enfim, de todos os
grandes vultos centrais, eu me pergunto o motivo de só agora, no
século vinte da era Cristã, ter havido ordem para se ir revelando
estes planos e as suas variantes condições e modalidades de vida e
realizações. Quero crer no fator merecimento, mais ainda na ordem
preventiva, pois a Terra ingressará em grau hierárquico
imediatamente superior. Mas não quero aceitar aquela alternativa que
fala na falta de melhores condições intelectuais das gerações
pretéritas. Humanidades que tiveram aqueles supra-citados mestres,
por certo podiam comportar estas afirmativas, tudo isso que se há
dito a respeito destes planos e sua mesologia complexa.
De
toda e qualquer forma, o século vinte encerra uma das marcas que
assinalam grandemente a lenta caminhada humana sobre a espiral
evolutiva. Tendo sido eu convidado a relatar fatos, formando na fila
extensa de narrativas onde o matiz individual se entrosa
implicitamente na ordem geral, nada mais quero fazer que objetivar
aquele triúnviro básico, fora do qual ninguém jamais conseguirá
subtrair a si mesmo vantagens quaisquer – origem divina,
individualidade e organização do caráter. Tudo gira em torno
desses pilares e só se poderá subir ou descer em seu bojo. Aí se
volta a criatura aos píncaros do Amor e da Ciência, se fizer por
isso, como aí se projetará aos abismos da mais variada ordem, se
também a isso quiser dedicar-se. O pêndulo é o sagrado direito de
livre arbítrio, o órgão motriz cuja capacidade cessa quando se
atinge a fronteira das faltas ou o seu limite máximo.
Nisto
é que há necessidade de muita atenção – saber como usar tão
responsável instrumento, elemento de tamanha magnitude, através do
qual tanto se pode construir o Céu como se pode chafurdar nos tredos
abismos. Quem meter o livre-arbítrio a funcionar no rumo da Lei,
muito bem; esse terá encontrado o caminho certo e a estrada límpida.
Mas aquele que fizer em si, através das obras, serviço de
contradição, esse terá que se entender com os rigores da
judicatura básica. Tudo poderá ser esquecido, menos a vigência da
Lei no plano das obras em geral. Nunca cessará a vida espiritual e
jamais deixará de ser presente a Lei. Julgar certo ou errado, bom ou
ruim, bem ou mal, antes de agir, tal é a máxima obrigação da
criatura que atingiu o grau de consciência individual. Em última
hipótese, deve compreender que será sempre juiz em causa própria,
que jamais poderá se furtar à responsabilidade do ato praticado,
bom ou ruim, a fim de ser recompensado.