sábado, 12 de maio de 2012

A VIDA NOS MUNDOS INVISÍVEIS - Parte I


PRIMEIRA PARTE





ALÉM DA VIDA



I.   Minha Vida na Terra
Quem sou não importa. Quem fui importa menos ainda. Nós não trazemos conosco para o mundo do espírito as po­sições que ocupamos na terra. Tudo isso ficou para trás, inclusive a minha importância terrena. O valor espiritual é o que importa agora, meu bom amigo, e esse valor está muito além do que seria ou poderia ser. É o bastante, a respeito do que sou. Quanto ao que fui, gostaria de transmitir algumas informações sobre a minha atitude mental, anterior ao meu passamento e entrada no mundo em que hoje vivo.
Minha vida terrena não foi difícil, pois jamais passei privações, se bem que fosse árdua em relação aos trabalhos de ordem mental. Nos meus primeiros anos fui atraído para a Igreja pelo misticismo em que ela se envolve e por ter sido eu mesmo uma personalidade mística. Os mistérios da religião expressos numa profusão de luzes, vestes e cerimoniais, pa­reciam satisfazer inteiramente o meu espírito. Muitas coisas, naturalmente, eu não entendia, mas a partir do momento em que passei para o mundo espiritual, elas deixaram de ter importância. Eram problemas religiosos provocados pela mente humana, e na verdade não tinham nenhuma signifi­cação no grande esquema da vida.   Mas a esse tempo, como tantos outros, eu acreditava totalmente em tais coisas, sem um vislumbre de entendimento, e se algum entendimento havia, era ínfimo. Ensinei e preguei segundo os textos orto­doxos, firmando minha reputação. Quando refletia sobre uma futura existência, eu pensava — e muito vagamente — naquilo que a Igreja me havia ensinado e que era infinitamente pequeno e mais falso ainda. Eu não compreendia a proxi­midade dos dois mundos — o meu e o vosso, — embora tivesse uma ampla demonstração disso. As experiências que tive em ocultismo foram acontecimentos espontâneos, e, pen­sava eu, provenientes de qualquer extensão de leis naturais; julguei-os antes incidentes ocasionais, do que ocorrências normais.
O fato de ter sido um sacerdote não me impediu de receber visitas daqueles que a Igreja preferiu chamar de­mônios, se bem que jamais tivesse visto, devo confessar, qualquer coisa que remotamente se parecesse com tal. Nunca entendi como pudesse ser e o que era afinal, na esfera terrestre, aquilo que denominam um sensitivo, um psiquista — uma pessoa dotada de poderes de visão, ainda que em grau limitado.
Eu considerava perturbadora essa intromissão de facul­dades psíquicas em meu ministério sacerdotal, visto como se chocava contra as minhas idéias ortodoxas. Procurei, então, aconselhar-me entre os meus colegas, mas eles sabiam menos ainda que eu e apenas decidiram rezar por mim, a fim de afastar os demônios de meu caminho. Suas preces em nada me beneficiaram, o que seria de se esperar — como agora o sei. Fossem minhas experiências desenvolvidas em alto plano espiritual, eu teria sido consi­derado um verdadeiro santo. Mas, na realidade, não foi assim, pois essas experiências ocorriam com qualquer outro dotado dos mesmos poderes. Tratando-se, porém, de um sacerdote da Santa Igreja, elas eram entendidas como "ten­tações do demônio", tratos com o diabo e, por outro lado, como alguma forma de aberração mental, caso ocorressem com leigos. O que os sacerdotes meus colegas não entendiam era que tais poderes podiam ser considerados um dom — um precioso dom, segundo os compreendo agora — e de caráter inteiramente individual, tanto no meu caso como em todos os outros, e que rezar para que fossem removidos seria tão insensato como rezar para que se removesse do artista o dom de tocar piano ou de pintar. Não seria apenas uma insen­satez, mas incontestàvelmente um erro, visto que esse dom de ver além do véu celeste fora outorgado para ser exercido em favor da Humanidade. Posso pelo menos regozijar-me de que jamais orei para que tais poderes me fossem retirados; pelo contrário, orei para que maior luz se fizesse em meu entendimento.
A grande barreira a quaisquer novas investigações a respeito dessas faculdades, era, e é, a atitude da Igreja: insensível, inflexível, estreita e ignorante. As investigações, ainda que por caminhos longos, ainda que exaustivas, rece­biam, invariavelmente, o mesmo julgamento final: "Tais atividades têm sua origem no demônio". E eu estava amar­rado pelas leis dessa Igreja, administrando seus sacramentos, divulgando seus ensinamentos, enquanto o mundo do espírito batia à porta de minha própria existência, tentando mostrar--me, para que eu mesmo visse, o que não poucas vezes havia contemplado — a nossa vida futura.
Enunciei em meus livros muitas de minhas experiências psíquicas, torcendo porém as narrativas no sentido da re­ligião ortodoxa. A verdade estava lá, mas o sentido e a finalidade foram deformados. Num trabalho mais amplo achei que devia defender a Igreja contra os assaltos daqueles que acreditavam na sobrevivência da alma após a morte do corpo e julgavam possível a comunicação dos espíritos. Nesse trabalho atribuí ao demônio — contra o meu melhor julga­mento — aquilo que eu realmente conheci como sendo a atividade de leis naturais, acima e independente de qualquer religião ortodoxa, e não de origem maligna.
Para seguir as minhas próprias inclinações, eu teria que infligir à minha vida, uma completa revolução, a renúncia às idéias ortodoxas, e, muito  provavelmente, um grande sacrifício material, visto que eu possuía também boa reputação como escritor. Tudo quanto já havia escrito iria perder o seu valor, desde então, aos olhos dos lei­tores e além disso eu seria olhado como um louco ou herege. Assim, deixei passar a maior oportunidade da minha vida. Quão grande foi essa oportunidade e quão grande o remorso dessa perda, eu fiquei sabendo ao trans-ferir-me para este mundo, cujos habitantes já vira tantas vezes e em tão diferentes ocasiões. A verdade estivera ao meu alcance e eu a deixei escapar. Entregara-me à Igreja, e seus ensinamentos estavam fortemente aderidos a mim. Via que milhares de pessoas pensavam como eu, e isto me enco­rajava de tal forma, que não era capaz de pensar que tanta gente poderia estar errada. Tentei separar minha vida religiosa das experiências psíquicas que sucediam comigo, tratando-as como dois fatos completamente estranhos um ao outro. Era difícil, mas dirigi os acontecimentos de tal modo que houve menor inquietação mental, e assim prossegui até o fim, quando, então, vi-me no limiar daquele outro mundo, de que já tinha visto manifestações. Do que sucedeu comigo ao deixar de ser um habitante da terra, passando para o grande mundo dos espíritos, espero a seguir dar-lhes alguns pormenores.


PARTE II - PASSAGEM PARA A VIDA ESPIRITUAL



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