OSVALDO POLIDORO
CONFISSÕES
DE UM
CORRUPTOR
INDÍCE
CORRUPTOR é adjetivo e substantivo masculino, é o que corrompe, é o que altera textos, é o que suborna. É, enfim, o que desvirtua e põe fora de ordem, seja o que for. (Dicionários).
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Osvaldo Polidoro revela, através desta obra, a história de um corruptor. Não se trata de corrupção, no sentido usual entre nós, de costumes e de usos pessoais, ou de licenciosidades no trato moral; a coisa é muito pior, porque se trata de um corruptor doutrinário.
Quando o Divino Mestre peregrinou, pela face da Terra, e, como Celeste Ungido ensinou, através da Excelsa Doutrina, o que eram o Caminho, a Verdade e a Vida; quando, por isso mesmo, afirmou que não é possível ir ao Pai, senão pela Excelsa Doutrina, de que Ele era o Exemplo Vivo, fê-lo na plenitude do Saber Crístico.
Já não era a Lei a reger um simples homem, mas era um homem divinizado a ser o filtro da Lei! Em Jesus, a Moral, o Amor, a Revelação, o Saber e a Virtude estiveram e estão no máximo grau imaginável pela humanidade presente, sendo que as gerações futuras irão conhecer esplendores divinos cada vez maiores!
Dois mil anos são quase passados, sobre aqueles fatos clamorosos, onde consciências as mais contraditórias intervieram – iniciados, místicos, almas simples e gente do povo aqui; gentes negadoras, pervertidas, brutas, mais ali; e os senhores do povo, principalmente os algozes das almas, os clérigos, os fariseus e os saduceus, enciumados de seus cargos e validades, temendo perder os galardões do mundo. Uma caudal tremenda, contendo em si os mais contraditórios fatores, as mais expressivas altitudes e baixezas. Rasgos de amor divino a par de erupções as mais terríveis de ódio e vingança!
O Divino Ungido, entretanto, passou, trabalhou e venceu; de tal modo funcionou o Pai Divino através d’Ele, que as ondas de ignorância, ódio e vingança, nada mais fizeram do que consolidar a Obra.
Do meio do vendaval se levanta, dos pórticos do segundo quartel do século quatro, a figura egoísta e guerreira de Constantino. Vencendo a Maxêncio, procurou forçar a tudo e todos no sentido de soerguer o império em decadência. E o Caminho do Senhor perdeu, através de um Edito e de uma perseguição de morte, o seu caráter profético ou mediúnico. Adeus línguas diversas, adeus sinais e prodígios em virtude do Espírito Santo ou Consolador! Adeus Excelsa Doutrina, fundada na grandiosa eclosão mediúnica do Pentecostes!
Pelo mundo foi lastrando, mesclada de fingimentos, idolatrias e inquisições, a corrupção assim forjada; em nome de Deus, do Cristo, da Verdade e dos vultos do Caminho do Senhor, foi ela marchando e fazendo esquecer que o Celeste Ungido viera ao meio dos Seus tutelados, para exemplificar a Lei e derramar do Espírito sobre a carne; para deixar uma Doutrina Excelsa, edificada sobre a comunicabilidade dos anjos, espíritos ou almas; para que todos, encarnados e desencarnados, a Humanidade Planetária inteira, tivesse um só Pastor Divino!
Este livro trata de um dos corruptores da Excelsa Doutrina; mas não aponta apenas o erro cometido e por tantos séculos continuado; porque, antes de mais nada, como soem ser as obras de Osvaldo Polidoro, a Essência Doutrinária é vastamente documentada e exposta.
Como em Deus a ordem é movimentar no sentido da Finalidade Sagrada, haja em todos um sentimento de perdão para com os grandes errados. Basta, enfim, ao culpado, o pesado fardo que é a própria culpa. A lei de carma de tudo se encarrega! Lembrando a eles, e fazendo votos pela redenção de todos, vai este livro publicado ao bem do LAR DE RAMATIS PARA CRIANÇAS. Que as crianças orem por eles, a fim de que, pela válvula redentora e evolutiva que é a lei de encarnações sucessivas, venham os mesmos a se tornarem soldados de Jesus Cristo.
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Osvaldo Polidoro doou esta obra ao Lar de Ramatis para Crianças.
Rodolpho dos Santos Ferreira.
O título da obra – CONFISSÕES DE UM CORRUPTOR – sugere alguém que corrompeu e vem confessar ; de fato, nada mais do que a obra representa. É a narrativa de quem ajudou a fazer desaparecer o cristianismo do Cristo, para implantar uma religião a gosto de um império territorial e político.
O movimento havido em Roma, no século quatro, tendo Constantino por vértice de tudo, e que fez desaparecer as razões da vinda de Jesus à carne; o acontecimento que em nome de Deus, da Verdade e do Cristo, e também dos vultos iniciais do Caminho do Senhor, isso é do que trata o Autor, pelo fato de ter estado no seu torvelinho, como agente corruptor, como um dos responsáveis.
Sem detalhar nomes, o que muito convém, porque os erros representam os tristes patrimônios da Humanidade, o autor conduz o leitor ao conhecimento da Excelsa Doutrina transmitida por aquele que o Emanador apresentou como Divino Modelo. É a Humanidade quem erra através de alguns homens, bem assim como é a Verdade que triunfa, quando a Excelsa Doutrina triunfa. A Humanidade é eterna e a Verdade é o seu objetivo final; portanto, para aqueles homens que puderem saber, sentir e viver, a Verdade é a Religião e a Religião é a Verdade!
Já disse alguém, com inteira propriedade, que se tivessem permanecido no mundo as Grandes Revelações, se nunca tivessem aparecido os cleros e as religiões, a Humanidade desde muito estaria espiritualizada e em boas alturas em matéria de decência e de conduta. E essa realidade assomará a razão de quem quer que se dê ao trabalho de estudar a Essência das Revelações.
Seria erro apresentar um corruptor em ação confidencial, com o fito de alertar seus semelhantes, corruptos doutrinários já, ou possíveis candidatos a corrupções futuras, sem apresentar os pontos fundamentais da Excelsa Doutrina. É por eles que o leitor perguntará, a si próprio, como anda em matéria de conduta sobre a Verdade.
As dez verdades fundamentais, que sempre andaram nas cogitações de todos os Grandes Reveladores, foram estas – Essência, Existência, Movimento, Evolução, Imortalidade, Responsabilidade, Reencarnação, Comunicação, Habitação Cósmica e Sagrada Finalidade. Segundo o Grau evolutivo de cada um, surgirão as considerações sobre tais pontos fundamentais, eles que fazem referência ao Emanador, à Emanação espiritual e material, penetrando os rincões incomensuráveis da infinidade fenomênica. Não há o que de fora esteja, por que tudo aí está contido, ainda que homem algum possa dizer de suas profundidades e matizes, em essência e manifestações.
A Excelsa Doutrina, em seus fundamentos está representada em cinco palavras ou em sua inteligência – Moral, Amor, Revelação, Saber e Virtude. A Moral harmoniza e dignifica; o Amor sublima e diviniza; a Revelação adverte, ilustra e consola; o Saber caracteriza a autoridade; e a Virtude sintetiza a união com a Soberana Vontade de Deus.
As três verdades que jamais devem ser esquecidas, porque nunca o eram pelos Grandes Reveladores – Origem, Processo Evolutivo e Finalidade. Tudo começando em Uma Divina Essência, tudo a se movimentar em Uma Divina Essência, tudo em Uma Divina Essência atingindo a Sagrada Finalidade. Aqui está a Emanação, espiritual e material, no seio de Deus existindo, movimentando e atingindo o seu objetivo. Aqui estão os Reinos, Espécies e Famílias; aqui tudo está, em matéria de Gêneros, Graus e Números.
Muito singelamente ensinavam que só Um é Deus, o Pai Divino, de tudo e de todos; que Uma só é a Casa, o Cosmo, o Infinito; e que Uma só é a Família, a Humanidade cósmica. Tudo se resumia em fugir de egocentrismos e de geocentrismos.
Ensinavam que a matéria toda no Éter Cósmico está confundida; isto é, que há um elemento substancial, primordial ou energético, contendo em si tudo, sendo capaz de todas as manifestações, em suas variantes densidades e intensidades. E por mais que se negue ou afirmem nomes, ou que se os queiram trocar, em essência a realidade é sempre a mesma, porque a parte de Deus é Eterna, Perfeita e Imutável. No Infinito do Espaço e do Tempo, para os homens, tudo movimenta e muda de aspecto; para Deus, sempre ensinaram, no Eterno Presente tudo é. A função da Matéria, sempre ensinaram, é servir ao Espírito, seja em que campo dimensório for. Por isso mesmo, os fundamentos doutrinários sempre foram anti-idólatras.
O Espírito, sempre ensinaram, é uma centelha de Deus, uma partícula de Deus, tendo que, por evolução, manifestar as virtudes divinas de que é senhor ou herdeiro. Começa inconsciente e termina consciente. O Grau Crístico é a centelha em seu brilho divino, é muito mais do que qualquer sol material.
Sempre afirmaram que Deus não é especial para ninguém, ninguém também o sendo para com Deus. O que uma centelha chega a ter, todas devem vir a ter, mas por evolução. Aqui, o sentido de fraternidade, tão bem demonstrado por Jesus, revela o seu poder de instrumento de elevação. Quem mais auxilia a seus irmãos, no sentido evolutivo, tanto mais a si mesmo se auxilia.
O Saber e a Virtude, portanto, sempre foram os testemunhos da verdadeira evolução. O Saber das coisas de Deus e as Virtudes fundamentais ou espirituais. As clerezias e as religiões encaminharam à ignorância e ao erro, porque depuseram contra as Verdades Fundamentais, contra os ensinos dos Grandes Reveladores. Tudo transformaram em formalismos e idolatrias, dogmas e simulacros, carreira nobiliárquica, meio de vida e discursos falazes, além de terem feito lastros de imperialismos político-econômicos.
Em Jesus, o Cristo Planetário, quando encarnado, tivemos a um tempo o batizador em Revelação e o Divino Molde. Para quem tiver entendimento de entender, os dois pontos fortes são a Ressurreição do Espírito e o Pentecostes, isto é, o testemunho da Imortalidade e da Comunicabilidade. A obra de Osvaldo Polidoro é um repositório de comunicação bíblica, de ensinamentos histórico-proféticos.
A encarnação do Cristo Planetário é o testemunho da lei geral de encarnação, do fenômeno que na repetição significa reencarnação. Nascer, Ressurgir em Espírito e Batizar em Espírito ou Revelação, eis os três pilares do testemunho de Jesus em face da Humanidade. Conhecendo a lei de encarnar, reconhecendo a imortalidade e cultivando a comunicabilidade, todo e qualquer filho de Deus chega a ter caminho livre para atingir o conhecimento de outras leis fundamentais. Por isso é que a Excelsa Doutrina, até o quarto século, tinha por nome – O CAMINHO DO SENHOR!
Resta agora perguntar:
A- Por que afirmou Jesus que somente no conhecimento e cultivo da Verdade está a libertação?
B- Pode haver Religião, com inicial maiúscula, fora do conhecimento das verdades fundamentais?
C- É da Soberana Vontade de Deus que se unam as religiões, ou é da Soberana Vontade de Deus que se integrem os homens em geral na Verdade, para que venham a ser Sábios e Virtuosos, colocando-se acima de conchavismos de homens e de grupos?
D- Fica bem a um espírita, conhecedor das verdades fundamentais, que resumem a Verdade Total, o fato de recomendar e defender aquelas seitas ou aqueles agrupamentos, que a pretexto de religiosidade, ou de falar em Deus, na Verdade, no Cristo e nos vultos cristãos, negam aquelas verdades ou atiram-lhe conceitos blasfemos?
Assim pergunto, irmãos, para vos lembrar os corruptores em geral, sem escolher entre os antigos e os modernos, sem perguntar como se conceituam, sem pretender saber se virão um dia a confessar ou não os seus respectivos erros.
No Brasil do século vinte, por força da Vontade de Deus, expressa através do Cristo Planetário, e Deste através de Seus Servidores encarnados e desencarnados, a Excelsa Doutrina está Consolidada, não apenas Restaurada, como ficou até há um século atrás, em terras francesas.
E se entre outras coisas, mandaram encher o Brasil de literatura espírita, ou contendo aquelas informações fundamentais, sem as quais não pode haver respeito pela Verdade Síntese, cumpre que se pergunte aquilo que acima se perguntou, para que todos os obreiros do Consolador procedam a um exame íntimo. Porque uma coisa é tolerar o erro, enquanto que outra coisa é recomendá-lo!
Para quem tiver ouvidos de ouvir, para aqui mais uma vez lembrar o Cristo e as palavras do Anjo Relator do Apocalipse, digo que Jesus foi com toda a resignação possível à cruz, precisamente para não ceder ao erro. Quem, portanto, quiser falar em Deus, na Verdade, no Cristo, no Bem e no Bom, trate de em obras fazê-lo, interior e exteriormente, para si mesmo e depois para com o seu próximo, a fim de que suas palavras e seus atos não venham a constituir traições às suas mesmas palavras e a seus mesmos atos.
Assim sendo, a Religião do espírita é o conhecimento e o cultivo da Verdade, o que ele deverá recomendar a seus irmãos, sem jamais perguntar se eles gostam ou deixam de gostar. De impor ninguém tem o direito, mas de recomendar o erro deve o espírita safar-se. Fale quando deva falar, em tempo oportuno, lembrando que a Verdade em si mesma contém a sua autoridade. Ela precisa de apóstolos na Terra e em todos os mundos em evolução; mas não precisa de quem, por comodismos e falsas bondades, viva a se mancomunar com o que sejam negações ou blasfêmias contra as verdades fundamentais que sintetizam a Verdade Total.
Quem ler a confissão de um pobre irmão, que teve a desdita de usar mal o seu direito de livre arbítrio, vindo assim a depor contra a Excelsa Doutrina deixada pelo Divino Molde, que se pergunte ao menos isto – “Estarei sendo realmente melhor do que ele o foi?”.
M.E.B.
A primeira perseguição em massa, oficialmente levada a efeito contra os cristãos novos – relata-nos a História – teve lugar no reinado do truculento Nero (ano 64 D.C.). Acusado o imperador pelo povo de haver ateado fogo à cidade de Roma, para se inspirar na poesia, pois fora visto, na ocasião do sinistro, de lira em punho a entoar um hino sobre o incêndio de Tróia, e já manobrado por elementos clericalistas, lançou toda culpa desse crime contra os seguidores do Nazareno (os do Caminho do Senhor). Daí o motivo para que o poviléu, açulado como a hiena bravia, exigisse o trucidamento sumário e impiedoso desses mártires, ora nas arenas à sanha dos leões, ora untados com pez para servirem de archotes vivos em dias de festa nos jardins do famigerado César.
Foi esse , realmente, o primeiro golpe assestado contra o verdadeiro cristianismo nascente, nas pessoas dos seus ardorosos e sinceros sectários. Todavia, foi Décio, dos imperadores romanos (anos 249 a 251 D.C.), ainda e como sempre, de conivência com elementos do clero, o primeiro a empreender uma perseguição sistemática e oficializada contra os neófitos da doutrina cristã. Iniciada nesse reinado, ela se desdobrou até atingir o seu clímax no governo de Diocleciano (anos 303 a 311 D.C.). Caracterizada pela sua violência sanguinária, foi, entretanto, o marco inicial de uma completa transformação tática e política, no reinado do imperador sádico, transformação essa visando a nova seita. Como os métodos violentos aplicados contra essas vítimas inermes não surtiram o efeito desejado, havia portanto, mais do que nunca, necessidade de mudança dessa atitude drástica para outra mais inteligente e eficaz, uma vez que logo nos dois primeiros séculos de vida, o cristianismo havia aumentado consideravelmente o seu raio de influência; no terceiro, avassalara todo o Império Romano e no princípio do quarto século estendeu-se também por todo o Oriente. Era um fenômeno que força alguma poderia jamais deter. O sangue dos mártires era, assim, como que a essência generosa e providencial, que conferia à doutrina a consistência vigorosa e tenaz do cacto bravio a desafiar a aspereza do chão piçarrento e crestado pelo sol equatorial.
No dizer de diversos historiadores, Constantino era um homem relativamente iletrado, porém sagaz, de uma acuidade espiritual inimitada; percebeu ele, desde logo, a inutilidade daqueles processos de perseguição aberta, calculada e fria, movida contra os nazarenos, como eram então chamados. Por outro lado, ante seus olhos, processava-se rapidamente o desmoronamento do Império, pela falta de unidade, coesão e moral. A sociedade romana deixava-se empolgar e corromper-se ante as pompas e ociosidades do viver oriental. De promiscuidade com os elementos bárbaros de invasão, os súditos não obedeciam mais ao governo central. Os desregramentos morais, as incontinências, a lascívia e outros vícios que prognosticam sempre a deterioração social, roíam surdamente o pedestal das instituições romanas, anunciando o fim próximo desta civilização decrépita e doentia.
Tudo isso passou como um relâmpago , pelo cérebro de Constantino. Urgia, pois, uma providência eficaz para evitar a catástrofe iminente.
No seu leito de morte, corroído pelas úlceras, Galério, aquele mesmo potentado que antes arrancara das mãos de Diocleciano o famoso edito de perseguição aos cristãos, entregava aos seus executores outra ordem, mas esta, de complascência à nova doutrina. Remorso ou não, quiçá – quem sabe? – os mesmos fundamentos que despertaram os cuidados e a preocupação de Constantino, o tetrarca moribundo via no seu último gesto o passo fundamental dado no sentido da solução de um grande e importantíssimo problema, eis o edito:
“Entre os importantes cuidados que ocuparam o nosso espírito em prol do bem e da preservação do Império, foi nossa intenção corrigir e restabelecer todas as coisas de acordo com as antigas leis e disciplina pública dos romanos. Fomos particularmente insistentes em chamar ao caminho da razão e da natureza os iludidos cristãos que tendo renunciado à religião e cerimônias instituídas pelos seus pais e desprezado, presunçosamente , a prática da antigüidade, intenderam de inventar opinião e leis extravagantes em harmonia com os ditados de sua fantasia, para, dentro delas, constituir como elementos das diferentes províncias do nosso Império, uma sociedade heterogênea. Os editos que publicamos para reforçar o culto dos Deuses, tendo exposto muito dos cristãos a perigo e aflição, muitos tendo sofrido a morte, e muitos mais que ainda persistem na sua ímpia loucura tendo-se visto privados de qualquer exercício público de religião, achamo-nos dispostos a estender a esses infelizes homens os efeitos da nossa habitual clemência. Damo-lhes, portanto, permissão para professar livremente as suas opiniões privadas e reunir-se em seus conventículos sem receio ou molestamento, desde que mantenham sempre o devido respeito pelas leis e governo constituído. Por um outro rescrito, manifestaremos as nossas intenções aos juizes e magistrados; e esperamos que a nossa indulgência estimule os cristãos a oferecer as suas orações à divindade que adoram pela nossa segurança e prosperidade, pela sua própria e pela república” (H. Universal – H. G. Wells).
Anos depois, subia ao trono Constantino, o Grande. O “ato de clemência” do seu antecessor, mais ainda avivou no espírito do novo imperador a necessidade de uma outra medida acertada para a salvação do império e das suas instituições seculares. Romper definitivamente com estas para salvar a unidade política da pátria seria um sacrifício caro demais para ser posto em prática. O paganismo tinha de continuar vivendo, ainda que camuflado por qualquer modo e a qualquer preço.
Um clarão diabólico iluminou, então, num átimo de tempo, o cérebro do filho de Constâncio Cloro: entraria em entendimentos com o clero e, mais tarde, simularia uma conversão sua ao novo credo; desse modo, estaria perfeitamente garantido o plano que concebera para manter a hegemonia do Estado em solapar os alicerces da novel religião em proveito das instituições romanas. Desse conchavo resultou o edito de Milão e a convocação, pelo poder temporal, do famoso primeiro Concílio de Nicéia (ano 325). Constantino fez da igreja uma instituição prepotente, autoritária, absoluta, porém sempre um instrumento dócil aos interesses políticos do Estado, ainda que, para isso, fosse necessário derramar, como derramou, o sangue generoso de tantos mártires.
Assim entronizada pelo braço forte do poder estatal, iniciou a Igreja a sua jornada fatídica, pontilhando as páginas da história de crimes horripilantes e lançando sobre os povos uma imensa cortina de trevas. Ninguém tem o direito de opinar contra a Igreja Católica Apostólica Romana; o Papa é infalível...
O segundo Concílio de Nicéia, fiel as tradições do paganismo, assegurou a adoração das imagens condenada pelos evangelhos. O “cristianismo” emergido dos decretos forjados nos concílios nada tinha de comum com a pulcra doutrina pregada e vivida por Jesus; em nada diferia dos cultos de Serapis, Amon ou Bel-Marduk, no dizer de Wells. Fez do Papa um deus e da verdade um mistério inviolável e proibido à argúcia dos fiéis. E é esse, infelizmente, o desfigurado arremedo de cristianismo que ainda hoje vige entre grande parte de nossa sociedade, se bem que apresentando já sintomas indisfarçáveis de um próximo colapso.
De todas as ofensas, porém, dirigidas contra a pureza dos elevados ensinamentos de Jesus, a mais ignominiosa é aquela que proíbe, que sufoca e procura ainda hoje sufocar o exercício sagrado e fundamental do Espírito Santo ou mediunidade, conforme foi estabelecido em I Epístola de Paulo aos Coríntios, cap. XIV. Esse foi, sem dúvida nenhuma, o maior cisma cometido pelos falsos cristãos, embora conhecessem a terrível advertência:
“Portanto vos digo: todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens, porém, a blasfêmia contra o Espírito Santo não lhes será perdoada. E todo o que disser alguma palavra contra o filho do homem, perdoar-se-lhe-á ; porém, o que a disser contra o Espírito Santo, não se lhe perdoará, nem neste mundo, nem no outro.” (Mateus, XII, 30 a 32).
Perseguidos e espezinhados por todos os lugares pelo feroz anti-Cristo, esses médiuns outrora conhecidos por advinhos, oráculos, pitonisas, áugures, etc., foram paulatinamente desaparecendo pela falta de exercício, enquanto a besta 666, ao contrário, ia consolidando os seus tentáculos em todos os quadrantes do mundo profano. O materialismo, como conseqüência dessa apostasia, desenvolveu as suas raízes; as qualidades morais foram subvertidas e em seu lugar imperam o ódio e o egoísmo.
Cumpre-nos, todavia, o dever de saber fazer a distinção devida entre Catolicismo e Cristianismo, hoje tão lamentavelmente confundidos. Assim, enquanto advertia o profeta Jeremias: maldito o homem que confia em outro homem, o Papa se fazia entidade infalível. Enquanto recomendava Jesus : “A qualquer que te ferir uma face, dá a outra; quem quiser apossar-se da tua roupa, dá-lhe também a tua capa; ama aos vossos inimigos, etc.”, a bula do Papa Nicolau II proclamava:
“Anátema eterno e excomunhão ao temerário que não tenha em conta o nosso Decreto e que em sua perseguição tentar submeter ou perturbar a igreja romana. Que nesta e na vida futura prove a cólera (!) de Deus e a ira dos apóstolos, cuja igreja ele tenha tentado derrubar; que sua casa fique deserta, que seus filhos fiquem órfãos e viúva sua mulher; que seja desterrado e seus filhos obrigados a mendigar seu pão e expulsos de sua casa; que toda terra combata contra eles e que todos os elementos lhes sejam hostis!”
Que belíssimo exemplo de amor fraternal! Quanta diferença da mansidão e humildade de Jesus!
O Mestre dizia:
“Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim” – mas a Igreja diz: “Se não for por mim, vai para o inferno”...
Também foi dito:
“Guardai-vos dos que querem andar com vestidos compridos e gostam de ser saudados nas praças e de ter os primeiros assentos nos banquetes, os quais devoram as casas das viúvas a pretexto de longas orações. Receberão uma condenação severa”. ( Sem comentários... ).
Eis aí, pois, a que ficou reduzido, em breve resumo, o pretenso “cristianismo” da besta 666: lobo disfarçado de cordeiro...
A chamada conversão de Constantino não era, como se vê, mais do que uma reação para sobrevivência do politeísmo pagão da Grécia e de Roma dos primeiros tempos. Todavia, as profecias de Jesus já previam a futura restauração da verdade antes do ano 2000; e hoje vemos o Espiritismo sacolejando vigorosamente os alicerces falsos dessa máquina diabólica que não tardará a se desmantelar e a igreja de Jesus, fundada no Pentecostes, a irradiar benditas verdades para a salvação dos povos.
São de Emanuel as seguintes palavras:
“Em vão o mundo esperou as realizações cristãs iniciadas no império de Constantino. Aliada do Estado e vivendo à mesa dos seus interesses econômicos, a Igreja não cuidou de outra coisa que não fosse o seu reino perecível. Esquecida de Deus, nunca procurou a evolução do homem físico à do homem espiritual, prendendo-se a interesses mesquinhos da política do mundo. É por isso que agora pairam-lhe sobre a fronte os mais sinistros vaticínios”. (A Caminho da Luz ).
Como, perguntamos nós, haver realizações cristãs à margem do Consolador, que tão bem deixara Jesus expresso nos capítulos quatorze, quinze e dezesseis, de João?
Como, perguntamos ainda, haver cristianismo no anti-Cristo, no movimento político que tinha e teve por fim truncar a marcha do Batismo de Revelação, que levaria presto a Humanidade à máxima consciência da Verdade, assim como podemos ler nos Atos, capítulos um, dois, sete e dezenove?
Como, perguntamos, pode haver cristianismo, dando truculento fim ao sistema de reunir dos Apóstolos, conforme podemos aprender na Primeira Epístola aos Coríntios, capítulos doze, treze e quatorze? Seria, então, pelos caminhos da corrupção que deveriam triunfar os ensinos do Divino Mestre?
No primeiro capítulo dos Atos, está afirmado que o Consolador, a Revelação, seria o veículo transmissor da Excelsa Doutrina; equipados assim, escudados na comunhão com as Legiões do Senhor, os seguidores de Cristo levariam de vencida as trevas da ignorância, do erro e suas conseqüências, fazendo marchar o mundo para os santos desígnios do Senhor. E se estamos com um retardamento de quase dois mil anos, a quem o devemos?
Todavia, convenhamos, os tempos de reposição das coisas no lugar chegaram. O Espiritismo está aí.
A onda de fenômenos psíquicos em crescente intensidade invadiu toda a terra e já não há mais quem tenha o poder de sustá-la. Nesse crescendo constante e rápido, ao som do tropel fragoroso dos quatro cavaleiros apocalípticos, enquanto o mundo velho se esboroa irremediavelmente, os raios brilhantes de um novo sol começam a despontar no horizonte da vida. Em meio desse caos, o surdo rumor da velha Igreja que se desmorona afugenta, espavoridos, os escravizadores do homem.
Iniciada foi, pois, a restauração da igreja revelacionista. O ciclo agora vive a sua fase sintética e, assim, tudo procura seguir a senda da unificação.
O livro de Osvaldo Polidoro é mais um documento histórico de relevada importância para o ressurgimento da igreja cristã.
Heráclito Carneiro
Sendo parte integrante do Cosmo infinito, cada espírito é, pelo direito de individualidade, um centro desse mesmo infinito Cosmo. Antes de saber o que é, durante o tempo que vaga pelos sendeiros da inconsciência individual, desde antes de habitar o reino mineral, onde começa a sua marcha logo que emanado da ESSÊNCIA DIVINA, tem muito cabimento e justiça o fato de ser irresponsável, de viver por conta dos automatismos instintivos. Até mesmo depois de haver feito sua relativa escalada, assomando ao pórtico humano, porém em suas mínimas expressões, que é como primitivo ou silvícola, tem por direito decorrente não atender aos reclamos da valorização psíquica, das excelências conceptivas do homem civilizado.
Quem desconhece a sua Origem, o seu Plano Evolutivo e a sua Finalidade, tem o direito de ser inatacável em seus mandos e desmandos; quem já chegou a ter alguma noção de seus direitos individuais, tem por obrigação reconhecer e respeitar os direitos alheios, na mesma proporção pelo menos; e quem se acha arvorado nas alturas do chamado Senso Cósmico, paira sempre embutido na mais excelente obrigação religiosa. Não tem o direito de alegar desconhecimento de causa; a sua responsabilidade se acha definida, pela mesma consciência cósmica de que é senhor por evolução.
A base religiosa, desde que tenha informe histórico, é a Lei! Ela data dos mais antiquíssimos tempos, ela vem dos primórdios védicos, tendo sido muitas vezes retransmitida no curso dos tempos, no seio dos tempos e das eras, das raças e dos povos. E quando cumpriu à tarefa histórico-evolutiva apresentar ao mundo o mais alto Dignatário e Divino Portador da Graça e da Verdade para toda a carne, o testemunho desta assertiva foi dado por Ele, quando disse que veio para cumprir a Lei e não para derrogá-la.
De algum modo, feliz daquele que chega a ter conhecimento da Lei; é sinal que atingiu o grau evolutivo para tanto, é prova de que já venceu a multimilenar carreira através dos reinos inferiores. De certo modo, porém, ou em face de certas infelizes atividades melhor fora que não se soubesse de sua existência. Porque o grau de conhecimento de causa é argumento fundamental, que nenhum álibi jamais conseguirá derrubar ou neutralizar.
Fala-se muito no relativo livre arbítrio; mas bem poucas vezes temos medido através das próprias obras, a extensão de sua tremenda capacidade registradora. Ao se considerar a vigência da Lei, em tom fartamente teórico, bem poucas vezes compreendemos que praticamente estamos desmentindo as nossas mesmas falas e proclamações. Na maior das vezes, reconhecemos os fatos legais para na prática podermos esquecê-los, quando não aborrecê-los frontalmente.
E é por isso que, ao que por Deus foi feito centro do Cosmo infinito, cumpre sujeições amargurosas. Se lhe é devido crescer nas Divinas Virtudes Íntimas, até planar nos cômoros das clarinadas psíquicas, tornando-se vazador da Excelsa Vontade, filtro ou refletor da Luz Divina, por usar mal o direito de relativo livre arbítrio, o que lhe acontece é ter que se sujeitar às condições e situações mais infelizes, tragando nas vascas da existência o fel das culpas acumuladas, e por vezes acumuladas com todo o rigor do malsinado devotamento aos fastos iníquos.
Em que pese parecer ironia vertente dos paradoxos em que é rica a messe humana, verdade é que comumente convertemos em realidade viva, aqueles mesmos fantasmas infernais que tanto proclamamos a conveniência de estarem para sempre mortos. Bem disse o Profeta, que a sabedoria do homem é falsa e traidora. Ele não quis, é evidente, desmerecer os verdadeiros recursos do cérebro e do coração humano; ele quis e fez, com perfeição, escandalizar a sua virtude. Ele sabia que a verdadeira sabedoria é aquela que se torna o reflexo da Divina Sabedoria, que é aquela sabedoria que sintoniza com a Divina Sabedoria. E tanto prova que sua razão estava certa, o fato de ter vindo o mais alto Dignitário a dizer, que não tinha outra vontade a pôr em prática, que não fosse a Vontade do Pai.
Bem sabemos nós, espíritos de alguma desenvoltura experimental, não quero dizer senhores de alguma sabedoria espiritual, que a missão progressiva do filho é tornar-se reflexivo das Virtudes Divinas; bem o sabemos, repito, que é para ser assim. Longe vem o tempo, no entretanto, em que estaremos aptos a semelhante função. Nossa condição é, ainda e infelizmente, a de quem, estando faminto, ser, todavia, sabedor de que excelentes manjares existem e foram preparados para serem ingeridos à farta.
E por que, direis, tanta fome em quem sabe de tamanhas farturas? Como podem os percalços do caminho vedar a entrada aos que conhecem de fato as regalias do celeste banquete? E por sobre tudo isso, para agravo de quem sabe e não pode conseguir de pronto, e nem tão pouco em breve, tendo por cúmulo da desdita saber que o banquete é de origem íntima, é no Ego que se deve manifestar. Eis aí o quanto é e pelo quanto responde o filho de Deus – trazendo consigo mesmo as clarinadas celestiais, porém submissas, porém sujeitas aos tredos envoltórios do erro, aos truculentos assaltos da falsa e traiçoeira sabedoria do homem.
Quanto seria limpo o caminho a palmilhar, quanto seria fácil a andadura pelas trilhas do progresso, se jamais os parvos conceitos arrogantes do homem quisessem fazer pose e alarde nas glebas onde um pouco de liberdade pode vilegiar! Ao menos que, desconfiado de suas plumitivas presunções, atendesse aos arroubos infalíveis de suas necessidades fisiológicas imediatas, para julgar-se o que é e pelo que é, homem cheio de protuberâncias animalizadas, cativo de trastes atávicos, escravo de lastros pecaminosos. Ao menos que a isso fizesse notório; capaz de aliciar nos alicerces do caráter cauterizado, os elementos de falha e de culpa com que se advertir dos maiores males, com que se desviar das piores vielas.
Entretanto, esquecido de suas fraquezas, entregue ao desvario das liberdades malsinadas acumuladas, eis que, seguindo qual animal de brida solta, avança e atira-se pelas brenhas do que a Lei adverte e proíbe. Eis o que é ter consciência da evolução feita, pela vivência dos recursos da inteligência, e com isso invadir a esfera de práticas criminosas, de onde logo mais surtirão as pronunciações cominativas, os veredictos inapeláveis. Porque assim é, em vista de ser fundamental e inderrogável, simples e exeqüível ao infinito
Que prenda celestial é o espírito! Que de glórias divinas contém o filho de Deus! Quem poderia, em seu estado de embrião psíquico, como podemos qualificar o homem padrão, dizer das luzes que no âmago lhe conclamam ao ensejo libertador? E, todavia, eis que se agarra aos entraves do caminho, parece que num esforço terrível, para se tornar escravo das vagas duendes, com quem partilhar das paragens sombrias, dos sítios escuros onde agouros infernais recordam fastos macabros e cenas bestiais. Como se atira nas lamas e nos gemidos o filho de Deus, pelo simples fato de pensar que a Lei é apenas composição decorativa, enquanto pensa com orgulho e mil empáfias, que sua passageira liberdade poderá um dia afrontar os Divinos Alicerces do Universo Infinito!
Tendo por natureza a Divina Paternidade, faz o troco do imbecil e agarra-se de unhas e dentes aos títulos, aos brasões e aos bazóficos institutos humanos. E por mais que se pense com repulsiva intensidade agora, que bem se sabe quanto deseja Deus e aquilo que podemos nós, a bem de todo o esplendor íntimo, não podemos esquecer que, naqueles dias, com a boca torta pelo cachimbo vicioso, a ninguém poderíamos ter ouvido, a pretexto de que, eventualmente, poderia estar com o mínimo de alguma possível e fugidia razão. Eis porque, companheiros de Origem, de Plano Evolutivo e de Finalidade, temos por obrigação máxima auscultar os ditames da Lei, para, confrontando os atos, aquilatar das responsabilidades futuras e das conseqüências do porvir.
Porque o futuro é, saibamos ou não, queiramos ou não, a seara onde no presente vivemos a semear; tal e qual a semeadura, assim será no porvir a colheita. Se com ou sem Lei, se contra ou se a favor, isso nos compete vigiar e a mais ninguém. Ao filho deu o Pai, de todos os tempos, as graças fundamentais e o conhecimento da Lei, quando é chegada a hora. Haja, pois, em cada filho de Deus, a melhor noção daquilo que é e para o que foi destinado. Acostumando a focalizar seus interesses pessoais pelo prisma das leis cósmicas, por certo virá a trilhar a senda harmoniosa, a via luminosa que o entregará, quando menos esperar, ao Luzeiro Íntimo, ao Pai Comum de tudo quanto existe.
Importa, entretanto, que no âmago do homem se trave a luta titânica entre o que está para trás e o que está na frente; importa, segundo a linguagem antiga, que o Anjo sujeite o animal; que o espírito vença a impetuosidade vegetativa da carne e das infelizes tendências inferiores, tendências que se foram recalcando, registrando durante a viagem que se fez pelos reinos anteriores. Se o instinto foi a arma com que pudemos vencer noutros tempos, cumpre agora que a inteligência lhe apare as arestas, a fim de que essa força primitiva se converta aos poucos no maravilhoso poder intuitivo dos tempos porvindouros. Quem não luta para transformar o primitivo em força subliminal, claro que ficará sujeito a seus guantes; a regra é simples, embora demande esforço pertinaz. E que a vantagem é de imediato patente, disso podemos dar testemunho, nós que temos acreditado no milagrismo das falsas musas ritualísticas, motivo de não termos tratado com denodo das intransferíveis e inadiáveis tarefas, razão por que ainda vos estamos aconselhando, não como senhores de poderoso coturno hierárquico, mas apenas como culpados sobrecarregados de angustiosas experiências, de fartas exemplificações tangentes.
A nossa vinda não foi para outro fim; foi para falar aos fracos a linguagem da lei de Causa e Efeito, ou dos efeitos que as práticas causais reclamam. A mensagem é de igual para igual, salientando-se apenas a importância dos bons avisos, de acordo com o programa de Jesus, de que outro seria aquele que de Seus divinos exemplos daria testemunho – o derrame de espírito sobre a carne.
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O derrame de espírito sobre a carne, como sabeis, no Espiritismo se restaura e atinge os extremos da Terra, consoante as palavras que os dois primeiros capítulos do Livro de Atos proclamam ininterruptamente há quase dois mil anos. Porque o Livro de Atos força ao conhecimento desta realidade – a Excelsa Doutrina deixada pelo Cristo se alicerça na Lei, no Amor e na Revelação.
Em seguida ao Pentecostes era comum dar-se isto, era natural perguntar se aos novos já se havia manifestado o intercâmbio com o mundo espiritual:
– “Vós recebestes já o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?
– Antes nós nem sequer sabemos se há Espírito Santo.
– Em que batismo, logo, fostes vós batizados?
– No batismo de João.”
E depois de ouvir Paulo essa resposta negativa, mas naturalmente cheia de pruridos esperançosos, prontificou-se a passar adiante a Graça e a Verdade trazidas por Jesus Cristo. Eis como está no décimo nono capítulo do Livro de Atos:
“E havendo-lhes Paulo imposto as mãos, veio sobre eles o Espírito Santo, e falavam em diversas línguas, e profetizavam. E eram ao todo algumas doze pessoas.”
E que aos agraciados com o derrame de espírito cumpre discernir, compete analisar as comunicações, di-lo João Evangelista no seguinte texto, que se acha na sua Primeira Epístola, capítulo quatro:
“Caríssimos, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque são muitos os falsos profetas que se hão de levantar no mundo”.
Estava tudo dito, feito e em pleno curso de andamento; os Profetas estavam em dia, Jesus saldara a Celeste Promessa e os discípulos da Excelsa Doutrina viviam na plenitude da graça consoladora. Barrados pelo mundanismo, que se vazava pelos brasões temporais e seus beleguins, os discípulos da Verdade estendiam o círculo de suas atividades sob a égide dos emissários de Jesus; teriam que respirar o ar infecto dos porões mal cheirosos, mas visitava-os ali o esplendor das legiões servidoras, concitando ao cumprimento dos deveres, ainda que correndo riscos fatais, pois que se a isso fossem levados, além dos pórticos tumulares estaria o Príncipe dos homens, para recebê-los com a merecida coroa de vitória.
Assim foram triunfando, na vida e na morte, através de felizes intercâmbios e de fúnebres perseguições os primeiros transmissores da Revelação trazida para toda a carne. Convencidos pela Verdade, emancipados pela Graça, aos milhares, foram escandalizando a morte através do Circo, das cruzes e dos cutelos, dos espancamentos e das pedradas. A plévia humana encontrou sempre de pé a consciência espiritual dos seguidores de Jesus; é que a Revelação mantinha alerta os cérebros e os corações, transformando simples homens em heróis. Reconhecendo a realeza do além-túmulo, os emissários encarnados do Cristo sorriam diante das ameaças do ignorantismo arvorado em autoridade.
A Lei, entretanto, registrava os fatos. A cada um estava sendo marcada, para efeito de responsabilidade, nos registros íntimos, a função do momento. Alguns se aureolavam com as luzes do Amor e do Saber; outros, entretanto, faziam-se vítimas de si mesmos, tomando parte na chacina que as trevas promoviam em louvor dos abismos. Se em todos os tempos houve quem cometesse crimes contra a Virtude, certo é que nos dias do desabrochamento cristão tais práticas ganharam foros de galhardia em favor do Céu. Perseguir e matar aos que falavam em Jesus e viviam tendo contato com os chamados mortos era bem servir aos altos interesses de Deus, mesmo que a Lei fosse vinda pela Revelação e que ordenasse não matar. A concepção trevosa do homem podia estar adiante da maior advertência que jamais o Céu enviara aos homens.
Que poder conseguiria ter a Lei, naqueles dias, perante homens que somente conheciam e se curvavam diante dos rituais e dos manejos inventados pelos homens? Deus quer assim? Mas quem é Deus diante do imperador e dos padres vendedores de salamaleques pagãos?! Acaso saberia Deus, mais do que pretendiam saber os políticos e os senhores dos templos? Tinha alguém certeza, de não mancomunar o Criador com as batoteiras de Suas criaturas inconscientes?
E, se bem seja verdade constrangedora o fato de ainda viver a humanidade mergulhada nos mesmos chavascais ronceiros e revéis a Lei, o exato é que as coisas assim foram rompendo através dos dias, até que ao findar o primeiro quartel do século quatro, já finava por todas as partes, nas voltas do Mediterrâneo, sobre os impulsos romanos, a Graça e a Verdade trazidas pelo Cristo. A grande eclosão mediúnica do Pentecostes, que os primitivos discípulos faziam questão de estender pelo mundo a fora, até as extremidades da Terra, teve fim precisamente onde o catolicismo romano teve começo. Iniciada a vigência de Constantino, caducou a vigência do batismo de espírito.
Foram dias de treva, de conturbação na crosta e de agonia nas esferas espirituais; o martírio de Jesus e de milhares de abnegados da Verdade ficou soterrado sobre os impactos imperialistas do novo imperador e de sua linha política. Onde se encontrassem cultores do mediunismo, ali haveria a reação da novel Inquisição; a glória do Pentecostes se transformara no vinco denunciador, dos que deveriam morrer em benefício do sadismo imperialista. Trevas desceriam sobre a Humanidade, nuvens negras envolveriam o mundo! O Profeta havia dito, importava acontecer:
“Eis a que vem os dias, diz o Senhor, e enviarei fome sobre a Terra: não fome de pão, nem sede de água, mas de ouvir a palavra do Senhor. E eles se comoverão desde um mar até outro mar, e desde o aquilão até o oriente; eles andarão por toda parte buscando a palavra do Senhor e não a encontrarão” – Amós , cap. 8.
A palavra do Senhor jamais foi a letra; ela sempre foi a Revelação. Com o advento do Cristo, a Graça e a Verdade, que viviam no círculo das Fraternidades Esotéricas, foram entregues a toda carne. Do Cenáculo Essênio, Jesus transplantou a Revelação para meio da rua, e dali para o Pentecostes, da onde que teria que grassar pela Terra a fora. Surgindo a corrupção, seca a Fonte Informativa e a treva começa a ter o seu reinado estabelecido. Foram séculos de idolatrias, de mercâncias vergonhosas, de negociatas entre os usurpadores do Nome de Deus e do Seu Cristo.
Um pouco de clerezia levítica, um pouco de paramentações jupiterianas e bastante força imperialista; eis a nova ordem imposta no lugar do batismo de espírito. Nada de documentos, nada de informes básicos. Ninguém teria direito a ler e a se informar. Tudo adstrito aos rituais e aos salamaleques, que deveriam render ao Império a sujeição e o dinheiro dos reis e dos povos. E para quem quisesse dizer inversamente, procurando livros, ou a própria Revelação às ocultas, teria sobre si a chama das indefectíveis fogueiras. Assim findou o batismo de espírito, motivo de assim ter começado a era das trevas e de idolatrias, era que um dia deveria findar, quando fosse chegado o tempo da reposição das coisas no lugar.
Eu lá estive, eu também meti o meu pulso de romano imperialista entre as forças corrosivas que deitaram por terra a Graça trazida pelo Cristo. Fiz muita força para ganhar o mundo, esquecido de que, na razão inversa, perdia o Reino de Deus. Pretendia saber muita coisa, mas não sabia que estava lavrando a segunda crucificação do Cristo. Que pela segunda vez, desabavam sobre a humanidade as trevas do mundo espiritual inferior. Pior ainda, pois descia aos piores rincões, chafurdava nas trevas interiores, de onde teria que ir saindo um dia, à custa de arrastar a alma e as carnes pútridas por entre as lameiras de sangue e de terrores inenarráveis.
Ao ver o Império triunfante, tendo na corrupção do Caminho do Senhor, a maior fonte de sujeições, e uma das maiores cornucópias de todos os tempos, fui também sentindo na alma o peso de fantasmagóricas tormentas, de alucinantes perseguições. Os dias finais foram tremendamente sofridos e as noites povoadas de sonhos tenebrosos. Atribuía as febres a visão de macabros quadros, onde me via arrastado pelas hordas infernais, arrastado e posto a mergulhar em putrefatas sangueiras, de onde emergiam, de quando em quando, homens e mulheres, moços e crianças, feitos de terror e de acusações, vertendo pragas e reclamando de Deus o meu justiçamento, a minha condenação ao fogo eterno.
Não me foi dado ensejo a que conhecesse a transição, a libertação do invólucro carnal; tudo continuou, o mergulho foi integral, sem a menor sensação de haver eu transposto a barreira entre os continentes dimensórios. A morte fatal, o seccionamento abruto , segundo as conceituações tradicionais, não existiu de modo algum, não figurou, para mim, no canhedo das sensações diferenciais ou sensitivas, nem mesmo para intelectualmente vislumbrar a possível traslação, pois tudo foi questão de, a meu ver, cair doente e submergir num mundo de febre e de visões macabras infindáveis. A noção de infinidade, essa tinha presença marcante, avassaladora e soberanamente reinante; vinham-me das profundezas íntimas a dolorosa certeza de que estava perdido nas vascas da mais infernal tragédia, arrastado pelo carrilhão das psíco-físicas desgraças em desencadeio pleno.
Nunca poderia supor, naquelas condições, que me entregavam às situações mais degradantes e dolorosas, através da sucessão de quadros medonhos e de envolvimentos monstruosos, que todo aquele amontoado de causticastes estados fosse apenas o produto dos desequilíbrios íntimos, da inversão da ordem moral. Tudo mais não era, como nunca poderia ser, do que desarranjo psíquico, do que acúmulos de faltas ou pecados. Estava em desarmonia com a Lei Geral de Equilíbrio, eis a tabela vigorante. Em lugar de, pelas práticas virtuosas, soltar o anjo, nada mais fizera do que edificar o reinado das trevas infernais. Tudo passado dentro, nas raias onde o Reino do Céu devera ter predominância, viver à farta, a espargir em derredor as fulgurâncias benditas do Amor e da Sabedoria.
Assim foi que, convertido em túmulo fantástico e nauseante, fui abalançado aos séculos de lancinantes expiações. Hoje penso no que pode ser um espírito, em que autofabricante de estados pode converter-se; penso e considero que é sempre uma força, que é sempre um engenho, que nunca será menos do que um autocriador de estados, de condições e de situações. Nem poderia ser de menos, sendo alguém que contém, por natureza, poderes espirituais formidáveis, capacidade criadora sabe Deus até que ponto. É mesmo de se aquilatar, o quanto vale e representa o relativo direito de livre arbítrio, para ser bem ou mal empregado; é mesmo de se aquilatar a montante humana de autojudiciado. Porque temos os poderes, porque dispomos de liberdades e porque conhecemos a Lei que manda não agir mal, que ordena, portanto, a que se faça todo o bem!
Depois de atingir a fase evolutiva de consciência individual e de saber, por inteligência e raciocínio, por Revelação e por interesse pessoal, que temos obrigação de executar determinado e fundamental comportamento, como fugir ao dever de juiz em causa própria? Dentre dois caminhos, o certo e o errado, tendo pleno conhecimento daquilo que são e para que conduzem, como pretender a desculpa, pelo fato de espontaneamente escolher mal? Não é graça de Deus ter valores assim e não ignorá-los? Na hora amarga, por que pretender dizer o contrário, somente para arrazoar contra seus próprios direitos fundamentais?
Todavia, se vai bem ostentar tais direitos básicos, nem só por isso temos desejado as melhores realizações internas. Entre saber e proceder tem havido muita distância, tremenda separação. Como naqueles dias, a receita é esta – “Faça-se tudo em nome de Deus e do Cristo, mas reverta-se tudo em benefício do Império”. É esse, ainda, o retrato do filho em face do Pai, na maioria dos casos e das vezes. Fala-se no Céu, mas viva-se o interesse mundano; tenha-se a Lei na memória, mas pratique-se tudo quanto serve ao animal e à fera. E enquanto assim marcha a Humanidade, chafurdando nas plagas sombrias e nos chavascais tenebrosos, cresce de monta a riqueza dos templos, alastram-se os galardões hierárquicos da fauna que se acredita existir em função das verdades eternas e inderrogáveis. Bem cabe, aos quadros de tais e tão tristes verdades, o rifão popular – “Por fora bela viola e por dentro pão bolorento”.
Quem quiser o testemunho dessa assertiva, que venha observar o que despeja a morte nestas paragens; porque, a todos os minutos, gente que no mundo andou falando muito em Deus, e comprou bastantes salamaleques aos credos, deixa o corpo e nada entende das verdades e das vantagens da nova situação. Quase sempre, infelizmente, além de ignorar os fatos mais corriqueiros, ainda despenha nos baixios e passa tempos e mais tempos uivando e gemendo, gritando Senhor! Senhor! E é assim que vimos a ter certeza de que as realidades da vida comum viriam dar testemunho das afirmativas singelas do Cristo. Falando hoje, reporto-me aos dias e aos ensinos de Jesus, dando-me por honrado de Lhe estar servindo; em tudo quanto estamos fazendo, nada mais acrescemos, sem ser o trabalho transmissor, curtindo a pena de ter que dizer o seguinte: bem tarde, Senhor, nos capacitamos de Tua Divina Exemplificação!
Em outra vez, lembro-me da Lei, que tendo por veículo a Revelação – a Revelação que era patrimônio das Fraternidades Esotéricas – a nenhum credo clerical e formal ordena que se sujeite o filho de Deus, concitando no entretanto a que a viva nos quadros da decência e nos moldes emancipadores do bem. Para mais distinguir a Vontade Soberana, em Seus chamamentos ao Amor e à Sabedoria, acrescento a Graça da Revelação trazida por Jesus para toda a carne, Graça que tanto mais concita a que se abandonem todos os falsos recursos da simulação e dos mercantilismos. Embora seja eu apenas um exemplo vivo dos erros acumulados, erros que por mim bradam conclamando ao viver simples e justo vertente das constantes da Lei, reafirmo todavia aquela necessidade de perdoar pelo menos setenta vezes sete, porque é natural que segundo o seu grau evolutivo o indivíduo e as comunidades podem pertencer a estes ou aqueles crivos religiosos. Paira de pé, infelizmente, aquele ditado saturado de verdade: “Dize de tua religião e dir-te-ei de tua evolução”.
Evidentemente, concordareis, quem sabe mal sente mal, fala mal, age mal e para mal se encaminha. Embora, pela renovação, os odres e os panos velhos tenham de fazer-se novos, a fim de receberem vinho e remendo novos, o senso comum indica que os recursos básicos de forçamento cabem a Deus. Ele, que a tudo origina, que a tudo oferece valores fundamentais, recursos e meios, oportunidades e situações, falará mais alto do que nós, e convincentemente, pelos escaninhos da vida e do sofrimento. Nós apenas avisamos, cumprimos o dever de testemunhar a Graça da Revelação; Ele porém, através das leis, fará que cada um tome suas devidas providências. Quem não ouve os ditames do Amor e da Sabedoria, certamente ouvirá o zunido cortante das guascas dolorosas
Eu também aprendi assim. Tendo sido mau aluno ou mau filho, deambulei pelos ermos negros e putrefatos, vindo a merecer hoje as valias de bom mestre. Para o serviço em vista, pela função a cumprir, somente gente como eu poderia merecer a honra das precedências. Fora para outras lições e, naturalmente, seriam convocados outros elementos.
Rogo, no entanto, o favor desta observação – quem já teve a voz clamante dos Grandes Reveladores, que precursaram ao derrame do espírito sobre a carne; quem já teve a dita de conhecer a Celeste Mensagem do Cristo e de fazer-se herdeiro da Graça trazida para toda a carne; e quem está tendo a ventura de ser aquinhoado com os anúncios derivados da mesma Graça, que ao menos se faça digno, para seu próprio bem, de toda essa ventura.
Nos albores do século sete, depois de me arrastar pelos lameiros nauseantes e de estar como que a sentir a morte pela segunda vez, pude ver ao longe que uma fagulha pequenina tremeluzia. Fixando bem o que me restava das vistas, das vistas que tinham nas amargurosas lágrimas a única lavagem constante, notei que a fagulha as vezes se aproximava, num real ou aparente convite para que a seguisse. E foi como tive a coragem para me arrastar, pois desde muito que, sentindo os ossos dos membros inferiores descarnados, nada mais intentava, certo de que nenhum recurso poderia jamais valer-me.
Foi assim que cheguei a um local ensombrado, porém ofertante de boa visão; foi assim que observei, em mim mesmo, a tremenda, a hedionda e tétrica devastação. Os ossos estavam a mostra, apenas cobertos de barro, de lodo endurecido, e lodo feito ou argamassado com sangue e com pedacitos de carne humana!
Estava acostumado a gemer, a lancinar, a transfundir-me em lágrimas dolorosas. Diante daquele apavorante quadro, penetrei os confins de mim mesmo, recolhi-me de maneira tal, fiz-me o repasto de minhas próprias mortas angústias. Já não havia como chorar, porque a secura provocada pelo fogo íntimo, secou de todo aquele espectro que eu era! Espectro seco, mudo, liquidado a mais não poder ser. Encurvado e atirado ao solo, um areião bolorento e quentíssimo, sentia apenas a mim mesmo, a mente espiritual, que não deixava de funcionar, de clamar e proclamar a sua existência!
Hoje recordo, revivendo tal acontecimento, a grandeza do fenômeno que é a existência. De dentro, do seio miserável de toda aquela tétrica devastação, emergia a consciência de mim mesmo, fulgurava a chama da imortalidade. Da imortalidade e da responsabilidade! Da responsabilidade e de todo seu glorioso esplendor!
Porque eu era, porque eu existia, porque eu continuava a ser mais do que toda aquela hedionda e tenebrosa devastação! O germe sacrossanto da vida ali estava, ali presidia ao estado em que me achava, ali se mantinha para fazer reagir, para exigir o soerguimento fatal, justo e necessário, assim que fosse chegada a hora!
Reduzido a mais não poder ser , ainda assim palpitava a alma imortal, vibrava tremendamente a criatura de Deus! Das profundezas de tamanha miséria, emergia o testemunho da vida eterna! Sumido nas vascas de tanta dor moral, infernalmente amesquinhado em face de mim mesmo e do meu corpo de espírito, era o Ego eterno que ali estava e se impunha sobranceiro a todas aquelas tormentosas vicissitudes.
Não sei quanto tempo, ao certo, terei ficado ali, auscultando a vida que se fartava nos farnéis lutuosos do crime e das chagas conseqüentes; sei que em dado momento, ouvi ao longe um como assobio cortante, penetrante até o íntimo da alma. Ele vinha de muito longe, parece que do horizonte, como se fosse um assobio qualquer; mas ao chegar ao meu ouvido, tomava a feição de um instrumento penetrante, acutilante, formidavelmente assustador. Fui alertado por ele, que entrando pelos meus recônditos, com tudo remexia, tudo punha em polvorosa, como se me estivessem esvoaçando por dentro milhões de vespas!
Cheguei a me sentir naquela hora, a partícula de vida mais odiosa de toda a chamada Criação! Por cima de tamanha miséria, depois de estar reduzido a um espectro fedorento, ainda aquela tormenta insuportável, ainda aquele assobio mortal!
– Deus!... Meu Deus!... Ó meu Pai... – exclamei, aterrorizado, olhando para o alto, onde somente divisei fumaças e formas animais fantásticas, que tremulavam e deslocavam lentamente.
Como reinava ali silêncio sepulcral! Como ecoou por aqueles mundos quietos a minha exclamação impetrante! De todos os lados chegava a minha própria invocação, cheia de terror, povoada de angústia, eivada de anseios flamejantes!
O assobio desapareceu, sumiu, perdeu-se na imensidão desolada e quieta; apesar de tudo, depois de julgar-me o mais miserável de todos os seres criados, cheguei a me sentir feliz pelo simples fato de haver desaparecido aquele assobio terrível, aquele mortífero ruído que veio dos confins do horizonte. Erguido sobre meus ossos, montado naquela fartura de ossos recobertos de lama fedorenta, por um pouco que não rendi, graças a Deus, por ter sumido aquele assobio infernal.
Ciente daquele ecoar formidando, lancei novo apelo:
– Deus meu!... Senhor, socorrei-me!...
E a quietude imensa, ampla sombria, trouxe de volta o rebôo de minha exclamação. Cessada esta, tudo volveu ao tredo abandono, tudo caiu na mais ampla e soturna solidão. Que quadro medonho estar ali, isolado, entregue a toda aquela vastidão cruciante! Sentei-me, antes atirei-me ao solo, fazendo ranger os ossos. Nem aquela chamazinha, nenhuma esperança. Estava certo de ser espírito, de estar submerso nos reinos da morte e entregue aos tentáculos da Justiça. Foi nisso que me abalancei a meditar, recordando a vitória de Constantino, comentando comigo mesmo as ordens emanadas do novo Imperador, para que se desse término às reuniões dos cristãos, da gente do Caminho, cujo fim era comungar com os espíritos, cujo objetivo era erigir o Reino de Deus no âmago das criaturas.
Porque, conforme todos sabíamos, eles minavam pela base os alicerces do Império; eles nada queriam com o reino do mundo, bastando que tivessem o que comer e o que vestir, para se darem por felizes. Roma não encontrava neles os homens de que carecia, os políticos, os soldados e os dominadores em geral; Roma virava de pernas para o ar, Roma encolhia, Roma estava situada entre as presas fáceis de qualquer conquistador que lhe batesse as portas. Urgia, pois, liquidar Maxêncio e dar fim aos homens do Caminho, aos que davam curso ao batismo de espírito; e foi isso o que se fez, depois da vitória de Constantino, havendo sido criado o novo credo, em nome de Deus e do Cristo, tomando-se por base humana os primeiros discípulos, criando-se o ritual, forjando os sacramentos, liquidando a Revelação e impondo a nova ordem de coisas através do Santo Ofício da Inquisição, a polícia secreta imperial que, para ter cunho de integral autoridade, funcionava como se fosse a instituição guardiã da fé.
Lei, Amor e Revelação, essa era a base doutrinária dos homens do Caminho; a seguir, entretanto, as práticas mudaram de feição, tomaram rumo totalmente diferente. A festa do pão e do vinho, que era a da confraternização anual, criada pelos antigos Essênios como sendo a da igualdade, pois comer do mesmo pão e beber do mesmo vinho simbolizava a fraternidade comunal, essa foi transformada em instrumento subordinante em meio de compressão, obrigando a sujeições diante dos beleguins do Império. O mundo ajoelhar-se-ia diante de Roma, através de seus novos funcionários; e os novos funcionários agiriam em nome de Deus e do Cristo, embora a corrupção doutrinária levada a termo. Clerezia, ritual, sacramentos, hierarquia, pompa e rigorosidade funcional.
Outra prática que os do caminho cultivavam era aquela fundamentada na exclamação do Batista, sobre a necessidade de conduta irrepreensível: “Que os vossos atos, confessados em público, não vos envergonhem”. A Igreja de Roma, substituta violenta da Igreja do Cristo, transformou essa prática em divisa coercitiva. Criou a confissão auricular, outro meio de vasculhar a vida íntima dos indivíduos e de executar as mais prontas e violentas eliminações. Essa corrupção doutrinária converteu-se, no curso dos tempos, na maior fonte de crimes e de vergonhosas práticas. Até ao presente, coisas afrontosas passam-se mormente em relação ao sexo feminino, sujeito a perguntas realmente imorais, verdadeiramente escabrosas, ofertando margem a que homens recalcados de certas proibições, e tarados de certas necessidades instintivas, tenham campo para invadir aquela esfera de recato e de sentimentos que jamais deveriam estar assim franqueadas.
Em minhas rememorações, vi-me nobre, terrivelmente cumulado de apreensões, esmagado pelo desmoronamento imperial, sujeito a perder todas as valias e prerrogativas; revivi o chamado imperial, para que me apresentasse e tomasse função entre a nova ordem religiosa. Devia ser autoridade, cumpria-me tomar posto na luta e na vitória, assumindo a seguir o comando da reforma doutrinária, reforma que teria por base a eliminação das comunicações e a ereção do clero a ser criado, com base na mais irrestrita proteção aos direitos do Império. Que tudo se fizesse em nome de Deus e do Cristo, porém em benefício do Império.
Recordei os dias, o triunfo sobre Maxêncio, e a fundação da Igreja Católica Apostólica Romana, em detrimento da Igreja Viva de Jesus Cristo, edificada sobre a Revelação, sobre o derrame de espírito, o Pentecostes que jamais devia ter fim. E senti calafrios, revivendo os atos de perseguição, a caça aos do Caminho, que preferiam morrer no Circo, sobre flechadas ou massacrados, antes que se converterem em traidores de Jesus, o Crucificado. E como a ordem imperial devia ser cumprida a rigor, sabe Deus ao certo quantas mortes custou a fundação do Catolicismo. Os discípulos do Crucificado, por causa da Revelação, da comunicação dos espíritos, não temiam a morte! Sabiam que eram imortais e que morrer pelo Crucificado seria alcançar a maior glória, seria conseguir a coroa final, a libertação espiritual.
Os dois poderes travaram luta de vida e morte; os discípulos do Cristo entraram com a sinceridade elevada ao grau de martírio, os beleguins de Roma concorreram com a chacina feroz, com frenesi sanguinário, sonhando com o domínio do mundo, esquecidos de que a função da vida é entregar o homem imortal ao além túmulo, onde o esperam a Lei e a Justiça.
Dentro em pouco, salvo casos isolados, Roma e toda a volta do Mediterrâneo estavam conforme os desejos do Império; não havia quem desejasse cultivar os contatos mediúnicos, quem ousasse falar no batismo de espírito. Passada a refrega violenta, começaram a ser feitas as maquinações teóricas, deram-se início à corrupção dos manuscritos. Surgiram, então, as interpolações e os desvios de sentido. O simples batismo de espírito sobre toda carne, a abertura das portas iniciáticas, transformou-se em batismo de “Espírito Santo”. E este, como convinha ao Império, que não podia admitir a comunicabilidade dos espíritos, porque estes ordenavam a que se observassem os exemplos do Cristo, aquilo que seria a morte do Império, este, o “Espírito Santo”, passaria a ser uma terça parte de Deus, coisa que estava longe de se comunicar. Assim terminou a Igreja do Cristo, edificada sobre a Revelação; e assim começou a era das trevas, da idolatria e dos mercantilismos vergonhosos, acrescidos de sangueiras tremendas.
Atirado ao chão, curvado sob aquelas tremendas avalanches de tortura, considerei como teria passado para os reinos da morte. Em que tempo? Em que condições? Que coisas se estariam passando em Roma? Que destino teriam dado ao credo inventado pelos homens, em nome de Deus e do Cristo, para servir aos exclusivos interesses do Império? Em que ano estaria vivendo? Quanto tempo ficaria entregue ao domínio da treva absoluta? Quanto tempo ficaria ali, naquela região sombria, sujeito àquele areião vermelho, quentíssimo e fedorento? Aquela fagulha luminosa, tremeluzente, onde teria ido parar? O que seria?
Depois de tanto meditar, comecei a pensar no que seria eu, se mais aquele corpo espectral, se mais uma alma imortal, se um conjunto de tudo entregue aos tormentos eternos do inferno. E como existia, porque pensava e sentia vigorosamente, girava sempre em torno da mesma tese, sem de nada valer, sem adiantar coisa alguma.
Veio-me à idéia pensar na fome e na sede, criando em mim o anseio desenfreado, a indomável necessidade de comer e beber! Havia estado sem ter essas necessidades por quanto tempo? E como sentia, agora, o desejo violento de comer e de beber? Como iria me arranjar, depois de tamanhas torturas, ainda com essa outra por sobrecarga?
Se aquele areal vermelhão e quente não fosse fedido, eu teria comido areia. Água, entretanto, nem por sonho poderia cismar em encontrar. E foi assim pensando que criei em mim o maior, o campeão dos infernos! Eu todo me converti no medonho inferno que engendrei; eu todo era fome e sede! Era desespero mortal, se é que tem cabimento considerar a morte nos âmbitos da imortalidade.
O delírio foi subindo de intensidade, foi me alucinando; convertido em alguma coisa febril, desbragadamente febril, atirei-me em correria sobre o areal escaldante! Não sei de onde veio a força, o poder, a vontade fantástica, naquele momento. A idéia era de febre, de terror alucinante. Entretanto, eu corria, gritava, chamava, invocava o Criador e o Cristo!
Não sei quanto terei andado, não sei os dias ou os tempos que terei empregado naquela corrida macabra; sei que vi, em dado momento, bem ao longe, qualquer coisa que se me afigurou ser vegetação, árvores mirradas. Foi uma nova luta, outra alucinante corrida, a busca daquilo tudo. Eram mesmo arbustos mirrados, porém verdes, seivosos, para mim opíparos alimentos! Comi o quanto pude, sendo exato que o gosto acre me fez bem, deu-me sentido ao paladar e ânimo ao estado geral. Até os ossos, dos membros inferiores, que estavam de fora, parece que tiveram sua cota de revigoramento.
Lembrei-me de que andando mais, correndo mais, poderia chegar a melhor lugar. A natureza deveria prosseguir em melhora, avançaria no sentido de opulência, de outras farturas. Foi então que subi um pouco, galguei uma elevação próxima, tendo vislumbrado ao longe campos verdes, árvores maiores, paragens férteis. Todavia, quando quis correr não pude fazê-lo. Estava melhor, mas não podia correr, como havia corrido até ali. Por que? Não sabia, não tinha a menor idéia sobre aquele impedimento. Não estava pesado, não me sentia empanturrado; estava bem, estava num paraíso, em vista do estado anterior, daquela febre de comida e de bebida, que aqueles ramos mirrados haviam saciado fartamente.
Fui caminhando vagarosamente, observando que tudo melhorava; e foi com alegria delirante que acariciei os primeiros tufos de erva, o capim verde que se esparramava pelo chão úmido e fresco, qual graça de Deus a se ofertar prodigiosamente. E dali em diante, apesar dos muitos percalços que tive que passar, tudo foram graças a Deus! Eu sei o quanto devemos respeitar a lei das intensidades... Ao diminuir a dor mais potente, aquela fraçãozinha diminuída representa uma dita celestial trazida pelos ares da misericórdia.
Ao atingir outra pequena elevação, deparei ao longe com horizontes mais claros e convidativos; andando mais, comendo aqui e ali ervas e ramos, fui sentindo que pruridos de paz, emergiam de minhas entranhas esfogueadas e ressequidas. A claridade que ia aumentando, a cada lanço da caminhada, a cada dia que passava, trazia consigo alguma coisa de suave, de acariciante. O sentido de paz e de ventura era evidente, era patente. E ao ter pela frente outra visão do horizonte, vi que montanhas havia, não muito altas, e que manchas brancas a elas se apegavam. Pensei que fossem habitações, casas pequeninas, tendo acertado. Quando estive a centenas de metros da primeira casinhola, notei que uma mulher perambulava pelo quintal, mexendo em roupas, o que muito me chocou, pois eu não tinha a menor idéia do que fosse o mundo astral, cópia exata do mundo carnal, e cópia que se desdobra em matizes variantes e incontáveis, desde o mais rude e sórdido até ao mais deslumbrante e divino que se possa imaginar.
Fui chegando e, como era de esperar, pensei estar na Terra dos encarnados, julgando mil e uma coisas de mim e do meu estado. Tantas pensei, tantas engendrei, que não tive coragem de falar com aquela mulher. Passei a olhar muito para mim mesmo, para meus ossos expostos, para o pasto dos infernos em que me fizera. E não pude chegar à conclusão alguma, porque tinha certeza de haver estado centenas de anos ou milhares de anos naquelas trevas absolutas. Como é que estava, agora, frente a frente a um local, todo ele terrícola, diante de uma casa e nela estando uma mulher a cuidar de suas roupas? Onde estava eu afinal de contas?!
Sentei-me debaixo de uma frondosa árvore, procurando atinar com a situação; e como tudo parecia e era mesmo denso ou material, tudo terrícola, absolutamente terrícola, fiquei sem nada saber, vagando pelos ermos da quase estupidez. Tive o desejo de me julgar louco, varrido, porque só a loucura poderia admitir toda aquela tremenda alteração na ordem das coisas e da minha situação em geral. Quando me lembrei do céu-espaço, fui espiá-lo, notando que o sol pendia já e que era apenas mais vermelhão do que o sol terrícola. Talvez que fosse muito mais vermelho, com o que eu não atinaria muito bem, por haver estado em contato com uma natureza de todo vermelho-opaca, roxa e por vezes quase de todo negra. Acostumado ao tom de cor, não saberia distinguir de todo até onde seria aquele sol mais vermelho que o da Terra dos vivos.
Nada, porém, foi além de meditar muito e a nenhuma conclusão interessante chegar. Meus pensares nada adiantavam, nada mudavam a natureza local. Meus cálculos, minhas cogitações, eram como se nada fossem; o problema estava ali, para ser conhecido e respeitado, não para ser julgado e modificado por mim. Essa é que era a verdadeira situação a enfrentar. E foi pensando nisso que me dirigi à casinha encravada na encosta, para falar à mulher que remexia suas roupas, que lidava em favor de suas obrigações, terra a terra com as necessidades rudimentares e afetas à vida carnal.
Temeroso de assustar, de horrorizar, detrás de um arbusto exclamei:
– Ó senhora, eu necessito de socorro!... De amparo!...
Ela deixou suas roupas, tendo vindo a mim, encostada a uma cerca feita de paus espetados. Assim que esteve mais perto, propôs:
– Por que não vai ao posto de socorro, do outro lado da montanha?
– Eu nada sei disto por aqui, minha senhora... Que lugar é este? Estou empenhado em saber, mas não posso chegar a conclusão alguma, porque tenho a cabeça cheia de cismas e de concepções contraditórias.
A mulher olhou-me com olhar penetrante, como quem atravessa corpos com a vista, para depois dizer-me, em tom de imensa compaixão:
– Pobre irmão!... Pobre irmão!...
– Pobre... De todo pobre... Miserável, isso sim!... – repeti, angustiado, envergonhadíssimo, ferido em minha vaidade.
Encolheu os ombros, como quem concorda com tudo, avisando:
– O senhor, segundo me estão dizendo, tem três séculos de trevas nas costas! Deve ter feito coisas terríveis, deve ter sido grande inimigo da virtude!
– Estou mesmo no mundo espiritual? Já morri para a vida humana?...
Ela assentiu com a cabeça, balbuciando:
– Decerto que está... Por que duvida? Não sente que há por aqui um sentido de paz e de amor que a vida carnal não pode oferecer, embutida que está na densidade material, densidade que retém as expansões naturais do espírito?
– Senhora – falei-lhe – eu nada disso entendo... Estou até sem carnes... A senhora teria medo de saber o que ocorre comigo. Acho tudo isto muito contraditório, muito sem coerência... A senhora tem estado a lavar roupas, não é isso? E por que lavar roupas se já morreu?...
Ela sorriu, um sorriso brando, pensativo, consultando-me:
– Continuamos vivos, não é verdade? A vida espiritual jamais termina e nestas regiões tudo acompanha o grau de adiantamento do espírito. O grau real e não o aparente, compreende? O que realmente é, e não aquilo que poderíamos pensar que somos, entende o senhor? Porque uma coisa verdadeiramente somos, enquanto que podemos pensar de nós mesmos aquelas maravilhas que não somos. A morte situa as almas por suas respectivas valências vibratórias; logo, de que adianta pensar em grandezas que não nos pertencem? Demais, meu senhor, as verdadeiras grandezas, o verdadeiro valor é por natureza espiritual e ninguém consegue enganar a Deus. O senhor deve saber isso, pois não?...
Enquanto eu estive meditando verdades dolorosas, sem responder, ela ordenou-me que esperasse, pois iria buscar um pano com que cobrir minha seminudez. Ao voltar, transpôs a cerca de paus espetados, entregou-me o pano alvo e grande como um lençol, dizendo:
– Cubra-se, vá em busca do posto de socorro... É o que mandam dizer-lhe...
– Quem? Quem é que manda dizer, minha senhora?
– Os guardiões do deserto... Aqueles que vigiam o areal solitário e triste, por onde o senhor andou, a fim de chegar aqui.
Informei-a:
– Há pouco falou a senhora em haver por aqui um sentido de paz e de amor, que eu infelizmente não sinto bem, ou não sei se o percebo, em virtude de ter vindo de lugar tenebroso, e de estar na situação em que me encontro, a pior que poderia imaginar. Agora diz-me a senhora de guardiães, de gente que vigia o deserto árido, vermelhão e solitário por onde andei caminhando, correndo mesmo feito louco, movido não sei por que delírio incentivador. Pode me dizer, senhora, onde está essa gente? Gostaria de encontrar alguém, alguém que me fizesse companhia, que me pusesse a par de coisas que eu não posso compreender.
Ela respondeu-me:
– Em primeiro lugar, os guardiões são invisíveis ao senhor, porque o senhor é ainda muito culpado, por ter sido um traidor de Jesus Cristo, de Sua Doutrina; em segundo lugar, o senhor está por isso mesmo embrutecido, impossibilitado de captar as melhores vibrações do ambiente, podendo quando muito, beneficiar-se da claridade e das graças que a natureza por aqui oferece; e em terceiro lugar, deve ir em busca do posto de socorro, que é o local justo para onde ir. Ali o senhor encontrará todos os recursos; isto é, conforme os merecimentos... Não se esqueça desta realidade: O mundo espiritual tem de tudo, das trevas abismais aos altos planos de gloriosa luz e majestade. E cada qual recebe segundo os seus merecimentos. O senhor, por exemplo, recebendo as carnes que lhe faltam, já se deve dar por muito feliz... Afinal, deve compreender, é do número dos que corromperam a Excelsa Doutrina, que se estriba na Lei, no Amor e na Revelação. É um grande criminoso!
– Um grande condenado! Condenado!... – emendei, sem saber como, parece que movido por íntima e estranha força.
– Não é o primeiro, meu senhor; outros já passaram por aqui, e eu fiz por eles o que estou fazendo pelo senhor. Deve caminhar, deve ir em busca do posto de socorro. Eu também faço parte dos que zelam pelo areal e seus viajores... Esta casa e algumas outras, que estão esparramadas por aí, por essas encostas, pertencem ao serviço de socorro. Procure compreender, portanto, que há ordem na Emanação e que devemos, se quisermos ser felizes, acompanhar o ritmo da Harmonia Geral.
Depois de pensar um pouco, falei-lhe:
– Reconheço que sim... Mas é tarde, é muito tarde... O mundo me absorveu, o mundo me abocanhou por inteiro!... Pensei no Império exterior, nada fiz para engrandecer o império interior... Lembro-me do que diziam os do Caminho, quando se entregavam à morte sem o menor receio, alguns bradando vivas ao Cristianismo, glorificando a Deus pelo fato de poderem morrer pela Causa do Messias. Por acaso, senhora, eles também passaram por aqui?... A Senhora os viu?...Porque foram muitos milhares atirados a morte, por causa da fé que depositavam no Messias, no Cristo que os batizara em espírito.
Ela assentiu com a cabeça, murmurando em tom maternal:
– Nenhum deles, que eu saiba, passou por aqui. Embora eu esteja por aqui há poucos anos, sei que nenhum deles por aqui passou. Isto é para criminosos, não é para virtuosos. Eu disse ao senhor que o mundo espiritual tem de tudo, desde as máximas trevas até os altos planos de luz e de glória. Certamente, como deve entender, o inferno é para os infernais e o Céu para os celestiais. E como variam os graus de merecimento, assim variam os locais de estar.
Fazendo breve estacato, olhou ao longe, apontando e dizendo:
– Lá vem outro, seguindo o mesmo rumo... Também aquele, saiba o senhor, virá cheio de crimes, de trevas, de dores e de dúvidas. Também ele gostaria de fazer o mundo a seu gosto, a gosto de sua estultícia, por não concordar com a Sabedoria Infinita de Deus!
– Devo ir-me, então, minha senhora?
Ela abanou a cabeça negativamente, esclarecendo com carinho:
– O seu verdadeiro interesse está em procurar o posto de socorro; eu já fiz a parte que me tocava, meu senhor, meu irmão.
– A senhora é um anjo de bondade... Falar consigo foi um prazer muito grande, que eu jamais esquecerei. Por que está aqui, sendo tão amorosa como é?
Sorrindo e abanando a cabeça, repetiu:
– Por que julga a Sabedoria Divina, em lugar de acatá-la e vivê-la? Eu também vim das trevas, eu também matei alguns, não querendo ser mãe... Depois de recolhida e instruída, escolhi um posto de serviço, a fim de fazer pelos filhos de outras mulheres o que não soube e não quis fazer pelos meus. O senhor está em condições de andar e de se cobrir, não está? Saiba, porém, que aportam aqui aqueles que carecem de outros cuidados, antes de poderem seguir o rumo do posto de socorro. Eu e mais duas mulheres, temos feito desta enfermagem o instrumento de redenção, compreende? E se quer saber mais, saiba que meu esposo foi quem o fez atingir esta casa; eu e ele erramos muito, mas ele veio primeiro e me amparou na hora certa. A seguir, vim ter aqui, onde ele já trabalhava desde muito tempo. E lhe asseguro que estimo bastante a minha função, pois de quando em quando sinto que cresce em mim a capacidade de penetrar nas leis e de auscultar melhormente as graças de Deus. Quando para aqui vim, por exemplo, eu não enxergava ao longe, eu não conseguia divisar uma pessoa além daqueles primeiros outeiros. Agora, sendo necessário, posso ver até através dos montes mais distantes; o senhor, por exemplo, foi visto por mim desde que aportou naquela região de arbustos ressequidos, onde se pôs a comê-los, para satisfazer o desejo de comer e de beber alguma coisa.
– Sabia, então, que eu vinha nesta direção?
– Meu esposo avisou-me, como de costume, e eu fiz orações para que o senhor tivesse ânimo e viesse o mais depressa possível. Quando se chega a perceber que o Amor é a Lei que de fato engrandece os filhos de Deus, sente-se todo o interesse possível pelo bem próximo; e quando se sabe que se tem culpas no sentido de ausência afetiva, tanto mais se procura servir. De qualquer modo, saiba, devemos muito trato fraternal uns aos outros. E nós, os grandes errados, tanto mais temos que nos apegar aos trabalhos de solidariedade. Falo assim, para que não me julgue alguma coisa melhor, capaz de altos rasgos de renunciação expontânea. O que faço, lembre-se, é mais por inteligência e menos por elevação de sentimentos; é mais por obrigação e menos por devoção, embora reconheça que tenho sentido em mim o despertar dos melhores sentimentos.
– De minha parte, senhora, agradeço tudo quanto fez por mim. E gostaria de saber uma coisa: a senhora é cristã?
Encarou-me com gravidade no olhar, enrugou a testa e perguntou-me:
– Não sei, ao certo, o que pensa o senhor do Cristianismo. Poderia dizer-me, com segurança, o que é o Cristianismo? Saberia compreender a distância que medra entre a Doutrina Pura e o culto leigo que vinga pelo mundo?
– Creio que não, minha senhora. Todavia, gostaria de saber como a senhora interpreta a religião, o serviço de culto espiritual, a fim de eu poder meditar pelo caminho. Terei, assim, em que pensar; e pensando bem, terei muito que aproveitar desde já.
Fez ela um sinal de concordância, afirmando:
– Então, lembre-se daquilo que já lhe disse: Cristianismo é Lei, é Amor e é Revelação. Como tudo isso é parte integrante da vida universal, temos aí que Cristianismo é sociologia integral. Se, porém, quiser que religião seja o culto das fórmulas e das idolatrias, dos rituais e dos comercialismos inventados pelos homens, então estará militando em gravíssimos erros. Porque aquele que se entrega a simulacros, certamente não cultiva o trabalho de iluminação interior; cedendo ao que é material e formal, nunca chegaremos a ser essenciais. E ato de fé, ou religioso, como virá a saber, é trabalho de sintonia, é serviço de união com Deus, aquilo que nos ensinam ser a ESSÊNCIA DIVINA, a FONTE EMANADORA e onipresente. Se nos capacitarmos de que Deus é infinitamente presente, estando em tudo e em todos, nos princípios, nos meios e nos fins, poderemos então compreender que tudo e todos formamos uma só Emanação, estando todos ligados, nunca podendo ser menos do que parte e relação. Assim é que nos ensinam, aqueles que vindo de mais altas esferas e regiões, falam das esferas e das regiões onde a LUZ DIVINA brilha intensamente, fazendo brilhar aos que já se elevaram a tais merecimentos.
– Devemos ser, então, apologistas do Panteísmo?...
E antes que eu terminasse o meu pensamento, ela aparteou-me:
– Panteístas não, mas Pantiteistas sim; sabe a diferença que há entre uma e outra concepções?
– Sei, minha senhora, que o Panteísmo é a Doutrina da unidade total, portanto da volta absoluta para a ESSÊNCIA ORIGINÁRIA, perdendo a criatura todo e qualquer resquício de individualidade. Quanto ao Pantiteísmo, é a Doutrina de que Deus tudo fez, em tudo está, garantindo o direito de individualidade eterna.
– Aí está, senhor – disse ela – como convém pensar e viver; isto é, procurar comungar tanto quanto seja possível, com a ESSÊNCIA ORIGINÁRIA ou Deus, para crescer nos valores íntimos e para cada vez mais funcionar como agente próprio de Deus. Nós temos aprendido, senhor, que os espíritos crísticos são aqueles que já se elevaram tanto, a ponto de se tornarem executores da Excelsa Vontade de Deus. Como pode observar, o Pantiteísmo é a Doutrina perfeita, é a Doutrina de Jesus e sempre foi a de todos os Grandes Reveladores.
Estaquei por um pouco, compreendendo que lhe tomava o tempo; foi ela que continuou a fala, explicando como pensava, sentia e vivia:
– E para se saber que as formalidades inventadas pelos homens são crimes de lesa-espírito, basta atender para este fato: sendo Deus o Fundamento Sagrado de tudo, e a tudo regendo por meio de leis sábias, não poderá ficar satisfeito com aqueles que O trocam por algumas patacas, e que O julgam através de simiescas atitudes, além de O figurarem como se fosse escravo da matéria. Como vê, para lhe dar a resposta melhor possível, sobre se sou cristã e como sou, devo antes saber o que o senhor de fato quer conhecer; isto é, se sou adepta da Igreja Romana ou se sou do Caminho do Senhor, da Doutrina que se fundamenta na Lei, no Amor e na Revelação, sendo portanto inteiramente acima de clerezias e de formalismos ou de paganismos. Sou essencial, não quero ser formal. Procuro Deus onde está, nas bases de Sua Emanação, sem apelar para simulacros e idolatrias. Demais, podemos compreender com muita facilidade, a matéria é para servir ao espírito e não para ser adorada como se fosse senhora do espírito. A importância, com relação à matéria, é saber usá-la, é saber aplicá-la. Mais do que isso é paganismo e idolatria.
Estive a meditar mil e uma questões, pelo caminho, depois de agradecê-la e haver partido. Apesar de toda aquela tremenda destruição que me dominava, ou por estar acostumado, cauterizado pelo sofrimento, consegui sopesar a responsabilidade da corrupção praticada, dos desvios assumidos pelo Império, acima de tudo pela adulteração dos documentos e pela proibição das leituras, a fim de que o novo Instituto, oficialmente imposto como estatal, pudesse funcionar a rigor e tivesse com que informar o Estado de tudo quanto ocorresse. Pela hóstia todos se ajoelhariam diante de Roma e pela confissão todos informariam de suas práticas; e quando alguns pudessem ocultar suas intenções, outros muitos poderiam fazer o contrário, informando as autoridades através do Instituto religioso.
Quando cheguei defronte ao posto de socorro, uma grande construção toda pintada de azul-claro, que se achava no meio de amplo jardim, minha idéia principal era saber como estaria funcionando na Terra o Instituto, o instrumento de moderação do Império, o melhor órgão de controle que se poderia desejar, uma vez que contava com todos os recursos de autoridade do Estado; isto é, uma vez que estava capacitado para tomar qualquer decisão, de vida ou de morte, desde que em defesa do Império.
Ao ser apresentado ao chefe, disse-lhe o seguinte:
– Senhor, eu fui um dos principais corruptores do Caminho do Senhor, da Doutrina do Crucificado; tenho sofrido muito, tenho pensado gravemente sobre a questão. Se me fosse possível, gostaria de saber como se acha funcionando o Instituto forjado pelo Império, sob as ordens de Constantino, para remediar ou mesmo fazer retornar tudo ao estado anterior.
O chefe, um homem de semblante grave, cujo olhar penetrante e investigador causava apreensão, meneou negativamente e aconselhou:
– Ninguém, por aqui está capacitado para dar semelhante resposta; ninguém por aqui, tem autoridade para informar e, menos ainda, para movimentar ação de tamanha envergadura, monta e conseqüências. Sabemos, apenas, que o tal Instituto que é a Igreja Católica Apostólica Romana, funciona à base de fé, de clero, de rituais e de sacramentos, caminhando a ser grande dominadora do ocidente, encouraçada com a força do Santo Ofício. Ainda agora, que saibamos, vem de se consolidar o papado, a chefia da Igreja por um homem. Nós, por aqui, nada sabemos sobre tais questões; isto é apenas um posto de socorro, nas divisas do reino das trevas, cujo fim é recolher aqueles que se vão chegando, saindo dos lugares de dor, onde andaram purgando suas faltas e seus crimes.
Fiquei acabrunhado, ao saber que aquele chefe nada tinha a dizer e nem a fazer a tal respeito; minha idéia era que os bons, no mundo espiritual, deviam estar a par de tudo, conhecendo perfeitamente todas as questões referentes ao mundo dos homens. Foi um choque ouvi-lo falar assim, pois se ele nada sabia dos movimentos terrícolas, mormente de ordem religiosa, de que devia saber tratar? Fiquei calado, pensativo e triste, diante dele e de um grupo de médicos e de enfermeiros, de gente que me olhava com intenções diferentes. Por notar a tristeza de que me fiz presa, ou lá pelo que quer que fosse, o chefe do posto volveu à palavra a fim de me dizer:
– O Crucificado dirige a Terra, bem o sabemos, pelas informações dos maiores da espiritualidade. Portanto, se o senhor cometeu semelhante erro, em companhia de outros e sob as ordens do Imperador, faça seus apelos a Ele. Mesmo sabendo o pouco que sabemos, temos a certeza de que nenhum crime vingaria no mundo, sem o conhecimento de Jesus e sem que houvesse motivo. Dizem os mais capazes, que a morte por assassinato, do Messias e de Seus discípulos, devia acarretar para a Humanidade um longo e penoso tempo de trevas e de tormentas. Logo, como poderá imaginar, não pode ser de tudo culpado, a não ser pelas mortes que tenha determinado e pelos assaltos que tenha levado a termo, sob pretextos vários.
– Sabe o que fiz, então?
– Temos alguma documentação, o suficiente para conhecê-lo um pouco e tratá-lo segundo os nossos recursos. Aqui quase ninguém pára, pois é um posto de socorro, devendo os já melhorados tomar seus devidos rumos. A seu respeito, sabemos apenas que devemos pensá-lo, enviando-o a seguir para a região imediatamente ligada a esta, onde não sabemos o que irá fazer e nem como. Por conseguinte, cremos que o senhor deve procurar a sua cura, sem pensar em coisa alguma, ciente de que Jesus de tudo sabe e pelos escalões direcionais tomará providências justas em tempo.
– Meus erros não me permitem sossego, meu senhor... Na Terra, ou quando por lá estava, o Império significava mais do que a minha vida e do que o meu destino de espírito. Agora, que tenho passado por tamanhas tormentas, que tenho meditado amargamente nos meus erros cometidos, tudo se me afigura diferente. Não sei como pude ser tão cruel, tão errado e tão indiferente aos problemas da imortalidade e da responsabilidade! Parece que tudo foi um terrível e trágico sonho.
Ele apontou para os presentes, esclarecendo:
– Eles todos e eu, também fomos grandes errados; se o senhor, pelo Império, truncou o andamento da Igreja de Cristo, edificada sobre a Revelação, nós fizemos coisa mais ou menos igual com os discípulos de Numa Pompílio, o iniciado sibilino, que pretendeu para Roma um governo à base de orientação espiritual. Como vê, também somos grandes errados... Mas não queremos dar término aos erros, individuais ou coletivos, assim de um salto. Mesmo porque, faltas há que demandam grandes programações ressarcitivas. Aquelas faltas que tomam caráter coletivo, que passam a movimentar grandes massas humanas no mesmo sentido, demandam reparações individuais com grandes influências coletivas. Sobre isto, que lhe estou dizendo, temos ouvido e lido bastante. Os grandes errados penam suas faltas e preparam-se para agir, no devido tempo, no círculo dos grandes movimentos renovadores.
Mudo e quêdo, ali fiquei a fitá-los, sem saber o que dizer. Minha vontade era chorar, derreter-me em pranto, transformar-me em angústia e deixar de pensar. Todavia, como estava na presença de um grupo de pessoas que me fitavam com ares de curiosidade, mantive a melhor conduta possível; esperei que me dessem a devida e necessária direção.
O chefe ordenou a um dos médicos, depois de passar-me detidamente as vistas:
– Leve-o, senhor, para ser tratado.
Quando eu ia acompanhando o médico, ouvi-o chamar-me; ao olhar para trás, disse-me ele, em tom bastante fraternal:
– Empregue o tempo lendo o Evangelho, ouviu? Auxilia muito na cura, quando as pessoas são bem intencionadas; isto é, quando se fazem pecadoras penitentes.
Eu nada sabia de haver, por ali, documentos e livros. Mas fiquei com aquilo na mente, perguntando a mim mesmo se eram os livros iguais aos da Terra, tal e qual como haviam escrito os discípulos do Crucificado, ou se eram iguais aos falsificados, pelo Instituto defensor do Império, por sinal que expressamente proibidos de leitura, a fim de que ficasse como obrigação máxima o culto dos rituais e a obediência aos mandatários da Igreja Romana.
Meu tratamento começou com o agravamento das dores. Foi um tratamento geral, à base de extratos que deviam ser tomados, de emplastros feitos com ervas e de aplicações magnéticas ou passes. As dores foram passando quando as carnes foram cobrindo os ossos.
O livro de João, o Evangelista, era uma cópia exata do escrito pelo vidente. E as leituras foram feitas a rigor, tendo eu feito centenas de perguntas, pois havia no posto gente cujo fim era ministrar lições religiosas e aplicar as mãos, tal e qual como faziam os do Caminho do Senhor, antes de serem liquidados ou transmudados em sacerdotes da nova instituição imperial. E como as Revelações foram várias, umas sucedendo a outras, por vezes uma pergunta curta importava numa digressão longuíssima, que ia começar nos Vedas, atravessando os Budas, transitando pelos seguintes Reveladores e vindo parar no Cristo, o que tinha vindo para batizar em espírito e, portanto, deixar uma Igreja Viva, baseada na Revelação de portas abertas, sem esoterismos e sem iniciações complicadas.
Quando estava curado, recebi convite para ficar por ali alguns meses, contrariando a disposição inicial. Disse-me o chefe que assim pedira aos superiores, a fim de que eu ensinasse religião; teria, portanto, oportunidades para dizer dos acontecimentos havidos, dos erros perpetrados pelo Império, com o fito de garantir sua sobrevivência, ainda que sacrificando a pureza da Doutrina de Jesus, Doutrina isenta de cleros e de formalismos pagãos, toda ela direta e cabalmente dirigida ao espírito, à consciência e ao cérebro dos filhos de Deus, por isso mesmo que fundamentada na Lei e na Revelação, as verdades básicas que concitam à Moral, ao Amor e à Ciência, transformando as criaturas em iluminadas e gloriosas, dignas servas do Soberano Poder, do que Jesus é o Modelo ou Exemplo.
Como vim a saber mais tarde, o Universo Criado é regido por leis, por uma Lei de Equilíbrio. As meta-galáxias, as galáxias, os sistemas planetários e os mundos, formam partes de incomensuráveis organizações, criadas e sustentadas pelo Criador, melhor é dizer DIVINA ESSÊNCIA, e conduzidos pelos Excelsos Cristos, ou espíritos cuja intensidade em Amor e Sabedoria ultrapassam de muito o poder concepcional dos homens terrícolas. A Terra, portanto, com as esferas astrais que a circundam, esferas concêntricas e superpostas, ou Céus, formam um todo, uma unidade habitável, oferecendo meios e recursos variadíssimos, onde os espíritos pertencentes aos mais variantes graus evolutivos vão realizando sua programação evolutiva, cujo ápice resume o Amor e a Ciência.
Entretanto, para quem como eu saiu da terra sólida em tamanho estado de atrofia e dores, era como um sonho estar numa esfera astral, onde tudo parecia ser a mesma Terra dos encarnados, havendo condições de vida que nada diferiam das da crosta, assim como havendo aquelas que constituíam extremos condicionais e situacionais. Eu, que vinha das trevas e dos maiores tormentos, nada sabendo das gloriosas esferas, que estavam para o exterior, (para não falar para cima, que é errado), devia considerar as melhores expressões pelo que de melhor revelavam ser as criaturas do local. Não tendo visto e nem vivido realidades superiores, devia aquilatar dos fatos pela melhora dos habitantes do local. Estes, por sua vez, diziam dos melhores ou mais evolvidos que os visitavam, com o fito de trazer ensinamentos, através de palestras que proferiam, em recintos apropriados e para aqueles que se fossem tornando merecedores.
Este conceito, o de merecedor, andou perambulando pela minha idéia por muitos dias. Por fim, cansado de tolerar minha própria indecisão, pedi para falar ao chefe geral; e quando fui admitido à fala, disse-lhe de tudo quanto me vagava pela mente, achando que era justo que me ofertassem oportunidades de aprendizados, pois eu era um grande errado, porém altamente compenetrado disso e fartamente penitente. Desejava conhecer, a fim de triunfar sobre as torturas de ordem moral que me azucrinavam dia e noite.
O chefe geral, apenas um espírito também endividado, cumprindo função ressarcitiva em ambiente bisonho, lidando com elementos portadores de muitos erros e sobrecarregados de traumatismos psico-mentais, nunca dava uma resposta certa, curta e concisa, suficiente para fazer calar ou falar mais; ele mantinha a disciplina, sendo que os trabalhos específicos, de medicina, enfermaria e instruções gerais, eram executados por outros, pelos diferentes departamentos. Não havia como prevalecer confusões, desde que as secções funcionavam normal e estritamente para aquilo que eram destinadas. E os necessários e obrigatórios entrosamentos, esses eram feitos rotineiramente, nunca havendo motivo de alteração, porque havia também e deve haver ainda, um departamento de programação, cujo fim era preencher as lacunas, suprir os elementos, quando por ventura surgisse um caso.
Apenas estabelecido em sua condição de administrador disciplinar, respondeu o chefe, como sabia e como podia:
– Você pertence ao quadro dos instrutores histórico-religiosos, pelo simples fato de ter sido um dos corruptores do Caminho do Senhor; lendo um pouco, como de fato tem lido, pode falar alguma coisa sobre os Grandes Reveladores, precursores do Messias, devendo ainda falar mais sobre o Messias e Sua Doutrina, toda ela estribada na Lei, no Amor e na Revelação. Isto mesmo, Proclo, em caráter transitório, pois a sua estada por aqui é favor que me fez o nosso regente superior. Eu não posso, portanto, deliberar nada a seu respeito... Não tenho elemento algum para fazê-lo. Caso você queira mesmo ir-se, agradecerei ao regente o favor que me fez, remetendo-o para onde ele designar.
– Eu – obtemperei – não pretendo ir-me; nada sei sobre coisas deste mundo, que não sejam os fatos que se deram e que estão ocorrendo: estive nas trevas e sofri horrores e terrores, até perder as carnes, mesmo sendo um espírito. Eu nem sequer sabia que espíritos ou almas do outro mundo tinham corpos carnais! Depois de muito sofrer, vi uma luzinha e procurei segui-la, dando com a vida em lugares mais claros, até vir parar aqui, graças a Deus. Agora que estou aqui, com o corpo são, por mercê de vossos cuidados, desejaria saber mais e prosseguir nos trabalhos de reparação. Devo tremendas faltas e quero repará-las, nada mais.
Como de costume, respondeu-me:
– Eu também gostaria de melhores sítios e oportunidades!... Entretanto, Proclo, ordenam que vá ficando por aqui... Já pedi transferência várias vezes, mas a resposta é sempre a mesma: “Cumpra ali com os seus deveres”.
– Não posso compreender certas coisas que se passam por aqui, meu senhor. Temos saúde e não podemos galgar melhores postos de conhecimento e trabalhos! Ora, se não nos permitem trabalhos, como poderemos alcançar o resgate de que tanto alarde fazem os livros doutrinários? O evangelho não tem mais, não manda fazer mais do que compreender menos de uma dúzia de verdades básicas: reconhecer o Emanador, a Emanação, a Lei, a Virtude, a Imortalidade, a Responsabilidade, a Evolução, a Comunicação ou Revelação, a Reencarnação e a Pluralidade dos Mundos. Isso contém tudo, tudo quanto já podemos conceber e aquilo que está além de nossas possibilidades de concepção. Entretanto, na hora de querer avançar, conhecer mais e trabalhar pelos resgates necessários, nada nos oferecem, tudo nos proíbem!
Sorriu o chefe, o seu breve e cético sorriso, para murmurar:
– Bem, nós também truncamos o andamento da Verdade, não é isso?
– Mas agora queremos reparar a falta... – balbuciei, com forçada mansidão, já que o meu desejo era gritar, berrar, estrilar violentamente.
Novo e alvar sorriso, para nova e simples murmuração:
– A Verdade que foi por nós truncada, envolvia e envolve criaturas dedicadas e merecedoras de todo o respeito; nós, todavia, nunca procuramos saber isso e reconhecer os seus méritos e direitos. A Lei, no entanto, maneja a Justiça, com o seu devido critério... Ainda bem que não estamos mais nos lugares de treva e de tormentas!... Ainda bem que o senhor, um simples traidor do Messias, está todo forradinho de carnes perfeitas!...
Admirado de suas palavras, que pareciam ocultar conhecimentos respeitáveis, anuí:
– Sou reconhecido a Deus e a todos por isso, meu senhor.
– Então – emendou ele – vá cumprindo com as suas funções de instrutor histórico-religioso... Mais tarde, quando for tempo, segundo o que tiver para dar em capacidade evangelizadora, terá outras funções. Por enquanto, saiba, eu também tenho os meus grandes desejos de aprendizados e de reparações, sem deixar de reconhecer que ainda não mereço semelhantes oportunidades. E o senhor, como é do seu conhecimento, não traiu apenas um Numa Pompílio...O senhor traiu o Maior Ungido, Aquele que tomou carne para derramar do espírito sobre toda a Humanidade; Aquele que teve por função missionária abrir as portas dos Cenáculos Esotéricos. E mais do que isso, cooperando na obra traiçoeira, fê-lo metendo a mão no sangue de muita gente! Eu já lhe disse, Proclo, que a Doutrina do Messias é Lei, é Amor e é Revelação. Portanto, sem muito cogitar de minúcias, de exegeses meticulosas, vá pondo bastante Amor em suas palestras, vá procurando reconhecer os recursos informativos da Revelação, não esquecendo que reentrar na Harmonia é problema sério, é programa recuperador que demanda longas etapas, impondo à condições e situações rigorosamente justas e necessariamente intransferíveis.
Observando minha circunspecção, depois de breve pausa, concluiu:
– Não fale, apenas, aos seus ouvintes; transmita certezas imorredouras, passe adiante sentimentos deveras amorosos e fraternos. Não se esqueça de que falar em Deus e no Messias é muito simples, sendo mais fácil ainda comentar as lições de Harmonia, de Paz e de Progresso. Eu, pelo menos, custei muito a concordar com a Lei, reconhecendo que devia, antes de mais nada, ser obediente e ser fiel cumpridor dos deveres que me foram impostos. Creio que o senhor está passando pelo mesmo crivo psicológico, pois não?
– O senhor pensa assim? – perguntei, impregnado de incertezas.
– Eu sei assim... Tenho pena, por si e não por mim, de não lhe poder fazer alguma coisa... Todavia, lembre que já é um funcionário da Verdade, que deve a graça de estar falando aos outros sobre as leis regentes do Universo Criado. É bem possível que os outros, os seus ouvintes, saibam e possam menos... O senhor devia amar e prezar muito a sua função, creio eu...
Eu estava desmantelado; sentia-me como que posto no avesso; dentro de mim, entretanto, fervilhavam idéias de renovação. Por isso mesmo, perguntei-lhe:
– Quem me poderia informar sobre o meu futuro?
– Vá ao departamento de organogramia ou programação. Meu poder vai somente ao ponto de indicar os departamentos de serviço. Todavia, quando há algum caso de rebeldia, de prepotência contra a ordem geral de disciplina, então a mim é que cumpre agir. Em tais casos, como deve saber, não uso de meias medidas. Tudo por aqui é digno de respeito, porque estamos nos limiares da Grande Vida; mas o principal é a disciplina!
– A disciplina, senhor, pelo que tenho visto e sabido, é a base da vida, seja no rol do comportamento individual, seja nos círculos do funcionamento social. A Lei de Harmonia, sendo de alcance geral, fracciona-se em matizes de ordem particular, em nuanças disciplinares imprescindíveis.
Seco, embora em tom suave, o chefe observou:
– Então vá, Proclo, e mantenha alto o senso do dever... Se for capaz de se compenetrar do senso do dever, pelo simples fato de se compenetrar da valia das lições que dá, dentro em breve talvez seja transferido para lugar melhor.
– Talvez muito melhor! – exclamei, satisfeito, pelo que me dissera.
Abanando a cabeça afirmou, em tom ponderoso:
– Isso, não!... Evite manter tais ilusões de pé, amigo Proclo, que nós os corruptores da Doutrina Certa e derramadores de sangue, não temos o direito de pretender tais prerrogativas.
– Por que? – perguntei, impertigado, lembrando os séculos de tortura, as dores de toda ordem que andara sofrendo.
Desconsolado, tristemente desconsolado, esclareceu:
– Nossos erros, forjados e impostos, são fontes de erros coletivos que estendem seus venenos pelos tempos em fora... Verdadeiras caudais humanas, vivem trilhando os caminhos nefandos que nós abrimos na esteira do mundo e nas práticas religiosas. Há uma lição do último Buda, que afirma ser a melhor obra humana aquela que constitui de encaminhar o semelhante para o conhecimento e a união com o Emanador; logo, amigo Proclo, a pior obra humana é desviar a criatura do Reto Caminho. É o que nós devemos, não é?
Aleguei, julgando as coisas a meu modo:
– Apesar dos pesares, chefe, a Igreja Romana, se deu cabo do batismo de espírito, seu verdadeiro motivo de alastramento e de testemunhos irrefutáveis, também é certo que manteve as tradições do Deus Único e das lições morais e amorosas do Messias. Quanto ao morticínio, isso reconheço que foi além das medidas...
Antes que eu terminasse o pensamento, ele aparteou...
– Somos de muito baixo para julgar o que é de muito Alto; se o Deus Único, depois de tantas Revelações sucessivas, mandou Seu Maior Ungido batizar em espírito, abrir as portas dos Cenáculos Secretos para que todos possam conhecer as verdades fundamentais, que ser humano ou conjunto deles deveria meter-se a julgador e pervertidor? E a chacina levada a termo? Por que julgar sumariamente aos que cultivavam a comunicabilidade dos espíritos, se para isso o Messias contribuíra com o Seu próprio martírio na cruz? Como está escrito, Proclo?
Recitei o texto evangélico:
“ O que crê em mim, como diz a Escritura, do seu ventre correrão rios de água viva. Isto porém dizia ele, falando do espírito que haviam de receber os que cressem nele; porque ainda o espírito não fora dado, por não ter sido ainda glorificado Jesus” – João, 7, 38, 39.
O chefe emendou, cheio de unção:
“Mas o Consolador, que é o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito”. – João, 14, 26.
Quase que forçado, tangido por estranha imposição, avancei:
“Mas eu digo-vos a verdade: a vós convém-vos que eu vá. Porque se eu não for, não virá a vós o Consolador; mas se for, enviar-vo-lo-ei”. – João, 16, 17.
Elevado o chefe ao estado de frenesi, prosseguiu:
“Mas recebereis a virtude do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e me sereis testemunhas em Jerusalém, e em toda a Judéia e Samaria, e até às extremidades da terra”. – Atos, 1, 8.
Senti em mim a invasão de cruenta e indomável tristeza; parecia que todo o fel do mundo entrara num repente em minha alma. Fiquei calado, cabisbaixo, sem poder pronunciar o que quer que fosse. Enquanto isso, o chefe continuava a recitar:
“Assim que, exaltado pela destra de Deus, e havendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou sobre nós a este, a quem vós vedes e ouvis” – Atos, 2, 33.
Assim como ele terminava o recitativo textuário, lembrando as palavras de Pedro naquele inolvidável dia em que se dera a grandiosa eclosão mediúnica, eu me emborcava todo, sendo obrigado a rolar pelo chão, gemendo sobre o guante de terríveis dores, tão íntimas e tão profundas que eu não sabia o que pensar.
Quando dei acordo de mim, estava na enfermaria, deitado em um leito. Nada me doía, porém sentia em mim amargura tremenda. Ao primeiro enfermeiro que se me aproximou, perguntei:
– Que foi isso que eu tive?
Ele olhou de soslaio, fez um esgar e respondeu:
– O médico poderia dizer umas palavras complicadas... Mas isso é muito pecado que o senhor tem...
Demorou um pouco e emendou:
– Que nós todos ainda temos...
Apesar de tudo, tive vontade de rir; que mais fazer, diante de tantas realidades simples, porém vívidas ao extremo e patentes a toda a prova?
– Quer trazer-me o meu evangelho? – roguei.
– Está debaixo do travesseiro – respondeu.
– Você adivinhou? – estranhei.
Entressorrindo, esclareceu:
– O chefe e o médico acharam que é seu grande remédio...
– E você, o que pensa, Vitório?
– Eu penso que é o grande remédio, senhor Proclo. Na conferência de ontem, falou o instrutor, quando o espírito é brilhante o corpo não pode ser chaguento. E o Evangelho ensina isso tudo, sem complicações e sem fazer a coisa comprida, como o médico sempre repete.
– Você costuma ler, Vitório?
Ele me olhou com espanto, dizendo com solicitude:
– Nós, os enfermeiros e os médicos, temos obrigação de ler o Evangelho. Nosso trabalho demanda a posse de acúmulos energéticos curadores, e o Livro do Crucificado é uma fonte de eflúvios maravilhosos. Costumo ler, costumo colocar a mão direita sobre ele e fazer minhas orações. Aprendi isso na Grécia, quando fui para lá como soldado, com alguns discípulos do Caminho. Eles costumavam colocar o livro sobre a cabeça dos doentes, rogando a Deus que fosse feita a Sua Vontade acima de tudo.
– E os doentes saravam? – perguntei.
Olhou-me o enfermeiro com algum desdém, respondendo:
– Nem a religião e nem a medicina podem evitar que morra o que teve nascimento; entretanto, enquanto não for hora de morrer, tudo deve ser tentado; e o Evangelho faz bem para os corpos e para as almas.
– É isso mesmo, Vitório.
Tornou ele a me encarar, afirmando:
– Mais faz ele pelas almas!... Afinal de contas, já que os vivos devem morrer, que o façam nas melhores condições, não acha o senhor?
– Nem diga, Vitório! Logo a quem você pergunta isso?!...
O enfermeiro indicou a si próprio, batendo com a mão direita no peito, a fim de dizer:
– Eu também fiz das minhas... Matei e depredei por conta dos outros, até que dei em ser fugitivo e bandido dos mais bárbaros. Ganhei isto... Ainda agora estou folgado, porque trabalho e faço o bem que posso...
Calou-se por um instante, para logo mais recomeçar, tendo visto que eu lhe esperava o prosseguimento:
– Por aqui, senhor Proclo, não dá gente boa... É quase tudo a mesma coisa, é só gente que vem dos abismos!...
– Onde esteve você, Vitório?
– Eu vim das águas, pois a minha morte carnal foi por afogamento. Um companheiro traiu-me, preparou-me uma emboscada; depois de me haver ferido, ainda vivo atirou-me às águas, tendo eu deixado o corpo físico naquele estado, que ficou sendo a minha tortura por cento e quarenta e poucos anos. Passei tudo isso desesperado, gritando por socorro, berrando como um danado!...
– Como foi que se deu a sua libertação?
Encolheu ele os ombros, como quem não valoriza os meios, desde que os fins sejam aqueles determinados por Deus; mas falou, explicando:
– Um barqueiro passou e recolheu-me, nada mais. De tanta gente que por ali passava, ninguém me vendo naquele estado, somente aquele barqueiro me viu, quando chegou a hora indicada pela Justiça Divina. O problema, senhor Proclo, é tratar de não dever! Quem deve, certamente terá que pagar... Que adianta condicionar a vida aos efeitos, considerar tanto os seus pretensos valores, quando os verdadeiros valores pertencem às causas? Se tivéssemos sempre em mente as leis básicas, as virtudes fundamentais, por certo não teríamos tanto que pensar em recursos que por si mesmos nada valem. Desprezamos ao que é fundamental, quando é hora de pensar e de agir com seriedade, e depois ficamos por aí a tecer considerações sobre paliativos e outras coisinhas, não é isso?
– Você gosta de ler sobre filosofias, Vitório?
Ele sorriu francamente, respondendo:
– Meu fraco, senhor Proclo, era negociar; as guerras é que me tiraram do sério... Eu acho que na vida tudo é questão de saber transacionar, trocar de tudo, permutar sempre, nunca porém fazer negócios desonestos. Veja o senhor, como eu vivo agora : não é puro negócio? Dou a minha parte e os outros me dão o que lhes cumpre. Deus que é o Senhor de tudo, distribui por Sua vez aquelas pagas morais que não poderiam vir de outro modo e nem de outra Fonte. Não se resume tudo em colher na Fonte Divina e permutar de acordo com as leis de Deus?
– Deveras, Vitório, tudo é questão de viver o regime de permutas, lembrando a obrigação elementar de não sair fora das normas fundamentais de Harmonia. Todavia, não se aprende isso tão fácil assim... A falta de conhecimentos gera a falta de certezas e a falta de certezas gera a negligência e a queda, vindo por aí as dores e as necessidades de resgate.
– As vidas cheias de percalços e de sofrimentos – emendou ele, peremptório.
– Por falar em vidas, você conhece bem esse negócio, Vitório? – perguntei.
Vitório assentiu com seu habitual gesto de cabeça, anunciando:
– Depois de dois anos de serviço, mereci uma bela experiência demonstrativa; fui enviado à região acima, tendo lá visto umas tantas verdades a meu respeito, umas facetas do meu roteiro de vidas e de liberdades mal usadas.
Detendo-me em sua expressão incriminativa, indaguei:
– Liberdades mal usadas?
– Sim senhor. Quase que um roteiro de liberdades mal usadas e nada mais. Não sei o que fiz quando fui habitante dos reinos inferiores, porque então vi tudo em plena escuridão, sem imagens e sem a menor noção de coisa alguma. Ao entrar porém na esfera hominal, depois de ser conhecedor de algumas verdades fundamentais, quase tudo quanto fiz foi usar mal das liberdades que tive. Cometi erros e mais erros, descendo aos abismos do sofrimento e tendo que reencarnar em corpos terrivelmente defeituosos ou mesmo sobrecarregados de taras doentias. Minha última vida carnal, essa foi quase um programa completo de inversão da ordem moral. O abuso das liberdades mal usadas fizeram-me viver nas trevas e por entre vermes, gemendo ceitil por ceitil as maldades cometidas. Rendo graças a Deus por isto, isto que estou fazendo, porque assim consigo fazer o bem... Pensando feridas, enxugando lágrimas, falando sobre as leis de Deus; tudo isto benção que chove sobre mim, vinda dos altos planos de onde nossos maiores executam a Vontade de Deus. Para quem matou, roubou, gozou com a desgraça alheia e fez coisas que não se pode imaginar agora sem terríveis remorsos, tudo isto são as graças de Deus!
Naquela hora, chegou o médico, indagando-me:
– Dói-lhe alguma parte, Proclo?
– Eu todo sou uma só e perfeita tormenta, doutor... É minha alma quem se aflige e põe o meu corpo em dolorosa situação. Creio que foi isso, que foi pensar em minhas ações que me fez recair daquele modo terrível...
Tomou-me a dianteira, observando:
– Não senhor. É que a Inquisição funciona normalmente e vive assassinando os filhos de Deus, sob vários pretextos. E como aqueles que sofrem, pensam e clamam por justiça, os inventores do instituto criminoso são atingidos, uma vez que ainda se encontram em condições de inferioridade vibratória. Tenha cuidado com os seus pensares, procure viver cada vez mais para o trabalho edificante, pois do contrário ficará sujeito a muitos achaques tormentosos, quando alguma vítima do instituto criminoso lembrar com ódio e rancor dos seus inventores e algozes.
– Devo defender-me, então?
– Use do recurso exato com todo o rigor. Trabalhe e seja assíduo leitor do Evangelho. Eu pelo menos, não conheço terapêutica melhor. Para falar certo, digo que não existe outra, no seu caso.
– Muito bem, doutor; agradeço pelo aviso. Nem sequer imaginava tal coisa.
Tomou ares de rigorosa observação, advertindo:
– Proclo, você não valoriza o seu trabalho; não tem confiança nas lições que passa à frente, julgando ser apenas um modo de empatar o tempo, enquanto não for transferido para outra esfera e para outro serviço. Tenha em mente, porém, que o seu trabalho deve ser levado a termo com todo o rigor. Seus passos estão sendo vigiados e suas palavras estão sendo medidas. Elementos de fiscalização rondam ocultamente as nossas atividades, registrando as nossas reações emotivo-mentais. E você, lembre-se, já foi colhido em falta várias vezes. Decresceu, portanto, o seu poder defensivo; sua aura de revestimento está furada, está lesada, possibilitando a entrada de cargas mentais e de projeções energéticas perigosas.
Aturdido, fitei-o com atenção, desejando que falasse mais, que me informasse de outras verdades ou leis de mim desconhecidas; mas o médico afirmou, tendo a seguir todo o rumo de seus deveres:
– Algum dia, Proclo, você fará o seu devido resgate... Por ora, meta isto na cabeça: vá tomando pé na arte de ensinar as veredas do Senhor! Porque você sofreu pelas mortes e malvadezas, mas está com os deveres de reparação doutrinária em débito. Algum dia, não sei quando, o Caminho do Senhor será, em sua essência, reposto no lugar, cumprindo que seus antigos corruptores venham a produzir o que devem, trabalhando pelo resgate direto e objetivo. Repito, Proclo, que pagar pelas mortes e pelas trapaças é uma coisa, sendo outra a reparação devida aos erros doutrinários fabricados e impostos. Não se esqueça do que ora lhe digo.
Ali fiquei pensativo, até que apanhei o Evangelho entre as mãos, encarando-o como se fosse o único programa redentor; verdadeiramente, falando agora de fatos que ocorrem há mil e trezentos anos, repito a minha impressão, pois o Evangelho contém tudo para ser absoluto programa redentor. O livro que exemplifica a Lei, o Amor e a Revelação, de maneira como Jesus Cristo o fez, encerra o conteúdo geral. A questão é viver o Evangelho, não apenas comentá-lo ou dar-lhe feição exterior, em atos ou programações rituais. Jesus, em verdade, não quis jamais ser festejado como figurão ilustre, colocado em cima dos santuários de pau, de pedra, de ouro ou de matéria alguma, para aí receber elogios rasgados e festejos maquinais; quer o Divino Modelo, ser imitado, senão de um salto pelo menos de um pouquinho por vez, na razão direta das possibilidades de cada um.
Por falar nas possibilidades de cada um, relativamente ao Evangelho, que é o programa de trabalhos de Jesus, e não compêndio pomposo de reservas falazes e retóricas, e nem tratado de organização ritual ou idólatra, para usos clericais, devemos repetir o seguinte: se fosse possível à centelha, uma vez emanada do CENTRO GERADOR ou Deus palmilhar a estrada reta, o caminho justo, a via perfeita, sem se deter em superstições, em práticas idólatras, em adorações exteriores por meio de simulacros, seria isso o ideal. Entretanto, como a marcha de retorno ou de religação é lenta, laboriosa e cheia de percalços e de contradições, convém que cada qual se alerte contra as concepções ultra-sectárias, aquelas que sendo úteis e cabíveis até certo ponto, a seguir tornam-se vícios prejudiciais.
A evolução é por lances, bem o sabemos; mas se alguém fizer finca-pé em determinados conceitos, encravando-se neles, será como aquele viajor que, estacando em determinado local, nunca mais pode atingir o fim da jornada.
Assim mesmo se passa com as verdades fundamentais, ( com a Síntese da Verdade ) que devem ser estudadas, analisadas, vasculhadas, pois se desdobram em verdades infinitas, em matizes incontáveis de expressão. As religiões clericais ou formais tem sido pródigas em trancar portas e truncar o conhecimento. Converteram-se em fabricantes de misoneísmos e catadupas de molambismos interpretativos, a ponto de se converterem em assassinas de Profetas e em fautrizes de guerras e de inquisições.
Em um antiquíssimo documento nosso, lemos o seguinte, atribuído a um dos vinte e tantos Budas que ornamentaram o rol das Grandes Revelações orientais:
“Desde todos os tempos, ó discípulos, foi ensinado que tudo deriva de UM SÓ; que todos temos em nós mesmos as virtudes desse UM SÓ; que através da evolução devemos respeitar as virtudes do UM SÓ, que se encontram em nós; que melhor seria, portanto, que ninguém descuidasse das virtudes do UM SÓ, que se encontram em nós, e que esperam pela sua libertação.
Sabeis, portanto, que a libertação das virtudes do UM SÓ, significam a nossa mesma libertação?
É do vosso conhecimento, ó discípulos, que à Doutrina cumpre ensinar essa Verdade, ensinando, a seguir, todas aquelas verdades que lhe formam a coroa das complementações?
Dizei pois aos idólatras, àqueles que se valem de ídolos e de formas exteriores de culto, que o tempo passa, os conhecimentos crescem, as responsabilidades aumentam e o Senhor pedirá contas pelo uso de tais recursos viciosos. Dizei aos idólatras, que as idolatrias que até certo ponto são úteis e confortam, assim que exceda o tempo que lhes é permitido, pela simples e sincera aceitação do crente, passam a ser de grande prejuízo, porque dificultam na intimidade do espírito o serviço de ligação com aquele que é UM SÓ, de onde tudo sai, onde tudo permanece e para onde tudo converge em plenitude de harmonia, por causa das virtudes do UM SÓ que foram Desabrochadas”.
Feitas umas tantas leituras, enquanto cumpria minhas obrigações, chegou o dia de topar com a leitura do texto supracitado, entrando eu a meditar nos meus trabalhos, nas minhas pregações, tudo à base de conversa, de falatório, de comentações apenas teóricas. Dei-me a perguntar a mim mesmo: Isto é tudo quanto eu posso e devo fazer? Em que mais poderia aplicar-me, para evangelizar conforme os exemplos do Cristo?
Procurei o médico, expondo-lhe minhas preocupações:
– Doutor, eu tenho estado a meditar seriamente em assunto grave; gostaria de uma palavra sua, sobre tão magna questão.
– Naquilo que me estiver ao alcance, serei todo ouvidos, Proclo. Bem sabe o quanto faço questão de ser útil aos meus semelhantes.
– Eis aí – disse-lhe eu – o grande problema! O senhor faz questão de ser útil ao próximo. Eu, porém, o que faço? Não vivo a falar, a comentar, a ler os textos, apenas? O senhor acha que Jesus fez apenas isso, na sua função de Divino Exemplo? Deu-se a falar comodamente ou escreveu refestelado em alguma poltrona?
O médico encarou-me com viva simpatia, sorriu e perguntou-me:
– Que mais desejaria fazer, Proclo?
Estando cheio de cogitações recalcadas, saturado de meditações, expus os meus pensamentos:
– Em matéria de Lei, Jesus saiu pelo mundo e procurou vivê-la, torná-la programa social intensamente aplicado: em matéria de Amor, equipou-se de renúncia, a fim de enfrentar a lágrima, a chaga, o aleijume, o frio, a chuva, a calúnia, a mentira, o ódio, a prisão, a condenação e a crucificação; e em matéria de Revelação, além de ter tido Seus contatos com os espíritos, além de ter batizado em espírito, sabemos que teve o auxílio das legiões de Deus, para operar aquelas curas maravilhosas. Seria demais, doutor, que eu pedisse para tentar semelhantes atividades? Eu não poderia tomar parte no serviço de aplicações energéticas, de evangelização mais eficiente?
Pensou o médico por alguns segundos, para dar-me a seguinte resposta:
– Muito me alegra a sua disposição. Pode estar certo, Proclo, que apresentarei o seu pedido ao conselho terapêutico, que faz suas reuniões semanais, para tratar de vários assuntos clínicos, principalmente das questões atinentes ao uso das forças psico-energéticas. Como sabe estamos em região bastante inferior, cujos organismos densos oferecem resistência às melhores imposições vibratórias, pelo fato de não contarmos com elementos capazes. Nós, os que fazemos o serviço de cura e de doutrinação, somos apenas criminosos um pouco mais arrependidos e prepostos ao bem. Sucede, também, que quase ninguém pára neste posto de socorro, indo para a frente assim que vão ficando melhores. Talvez que, penso eu, para fazer a sua vontade, se for aceita, tenha que ser transferido. Por isso mesmo, vá orando com fervor, até que lhe dê a devida resposta.
Estive aguardando a reposta por alguns vinte e tantos dias, durante os quais trabalhei e orei intensamente, a fim de que a resposta me fosse concorde; e quando ela veio, foi-me transmitida assim:
– Foram consultados os seus documentos anteriores, informando eles que não comporta o seu Carma o direito de semelhante aquiescença. Como porém a sua vontade concorda perfeitamente com o serviço em exercício, constituindo complementação ideal e de efeitos práticos interessantes, concorda-se com a formação de um novo departamento local, cujo objetivo fica sendo a aplicação das forças psico-energéticas, em combinação com as lições evangélicas. O conselho terapêutico destinará para o novo departamento, todos aqueles casos oriundos da Inquisição, tantos quantos sejam passíveis de tratamento, a fim de que os trabalhos dos elementos componentes do mesmo se articulem com o padrão das faltas cometidas, e dos resgates a que se acham obrigados no porvir, quando soar a hora da restauração do Caminho do Senhor. Foi encaminhado o pedido de alguns elementos competentes, devendo comparecer, em breve, ao departamento terapêutico, aqueles instrutores iniciais, cuja permanência no departamento será apenas a estritamente necessária.
Ouvido isso do médico, senti em mim eclodir impetuoso anseio de render graças a Deus. Retirei-me e fui ao santuário do local, um templo que sustinha numa parede apenas uma cruz, simbolizando a necessidade de compenetração dos deveres e de renúncia ao máximo. Quando estava orando, senti que me colocaram as mãos sobre a cabeça, ouvindo a seguir que alguém dissera:
– Acha que Deus está aqui, mais do que junto aos irmãos que lhe carecem das palavras esclarecedoras e da piedade consoladora? Por que para merecer o acordo trabalhou e orou durante o serviço, e agora, para agradecer a Deus, vem debruçar-se diante do que é simplesmente matéria? Não leu tantas vezes, que a matéria deve ser apenas bem usada e nunca transformada em objeto de culto? Caso contrário, quando saberemos adorar a Deus em Espírito e Verdade?
Olhei para trás e vi, que um homem muito alto ali estava, observando-me. Levantei-me e encarei-o com respeito, porque ele evidenciava elevação que ultrapassava de muito aos habitantes do local, pelo menos aqueles que eu conhecia.
– É verdade... – foi o que disse eu, anuindo, quase que sem querer.
Antes que eu dissesse mais, ele acrescentou:
– O templo e a cruz aí estão, para quem, lendo, entende menos, compreendeu? O seu caso entretanto, obriga-o a mudar o rumo das aplicações religiosas. Tendo você cometido falta contra o batismo de espírito, que implica em cometer falta contra a Lei e contra o Amor, deve procurar com todo o rigor possível, para efeito de reparação doutrinária, ir lutando contra toda e qualquer forma de idolatria e de cultos exteriores, compreendeu?
– Já havia lido muito sobre isso meu senhor; mas não me ocorreu, no momento, que Deus não é escravo de templos e de formalismos inventados por homens. Creio que é o vício da idolatria, que faz a gente não saber respeitar pelo que é mais esplendoroso e infinito, para sujeitar-se ao que é mesquinho e rampeiro, com isso pretendendo também sujeitar o próprio Deus!
– Exatamente! – afirmou ele – Vamos então ao conselho terapêutico, pois vim mandado para iniciar neste local o departamento de aplicações psico-energéticas. Procurei-o em primeiro lugar, porque foi o reclamante, porque manifestou o desejo de assim proceder, para melhor servir ao próximo e mais se aproximar do Evangelho Vivo de Jesus Cristo.
Ouvindo aquilo, meu coração parecia querer arrebentar, saltar fora do peito. A voz ficou sufocada, nada pude proferir. O enviado superior, interpelou-me então:
– Que tal o corpo que continuamos a ter? Que tal os nossos órgãos?
Logo refeito, falei-lhe como de fato sabia e sentia:
– Depois de reconhecer como é o mundo espiritual, onde tudo continua a ser, onde nenhum salto se observa, nada mais estranhei. Compreendo que continuarão a existir novas Terras e novos corpos, sempre em conformidade com o merecimento de cada um, sempre no plano de gradação evolutiva lenta e laboriosa. Assim é que temos aprendido e assim é que reconhecemos que é.
Com doçura fraternal, observou-me:
– Muito temos lido, muito temos adquirido em teorias; devemos todavia, não esquecer as práticas, transformando as lições em atos vivos e comuns.
– Realmente, meu senhor; confesso que temos as grandes lições dos Grandes Reveladores, sobre as verdades fundamentais, que nos concitam aos atos, às práticas mais puras e simples, isentas de todo e qualquer artificialismo religioso. Entretanto, tenho notado, o vício da idolatria e dos cultos exteriores nos fazem esquecer os nossos mesmos fundamentos, e as nossas herdades em virtudes várias, que deveriam ser o objeto de nossas melhores diretrizes, pois temos certeza que as glórias do espírito derivarão do despertar interno, e nunca das práticas idolatradas e dos cultos supersticiosos e simulados.
Satisfeito, murmurou:
– Não se moleste aquele que, praticando a idolatria, cultua com o seu máximo alcance de entendimento; no entanto, não se faça acordo com aquele que, podendo cultuar melhor, faz questão de continuar idólatra. A cada um será exigido, segundo o seu conhecimento de causa; e a Lei não dormitará, para cobrar pelos feitos, em concordância com o grau de responsabilidade. Ai daqueles, porém, que fazem comércio idólatra, pretextando que todas as religiões conduzem a Deus, em igualdade de condições. Afirmamos que a evolução é gradativa e que ninguém tem o direito de truncar o progresso de seus irmãos, porque se julgue no direito de sustentar as suas tendências sectárias ou os seus interesses subalternos.
Chegados ao médico, dali fomos ao chefe geral ou disciplinar, a fim de providenciar o recinto, o local onde funcionar o novo departamento.
Para não me estender nos preparativos preliminares, digo que tudo foi instalado, sendo formado o seu corpo de serviços por uma vintena de elementos, principalmente os médicos e enfermeiros, sem deixar de merecer especial acatamento os pregadores religiosos, aqueles que, por função, estariam sempre ligados ao Plano Superior, ao Mundo Divino que está nos fundamentos de tudo.
Começaram a ser postas em prática, naqueles dias, as forças psico-energéticas, havendo a utilização de águas, sucos e alimentos. Tudo se resumia no emprego dos poderes mentais, que carream energias e fluidos. Quanto melhor o pensar e o sentir dos agentes servidores, e quanto mais acessíveis os pacientes, tanto mais os resultados seriam satisfatórios. Tudo em plano de ambivalência. E os agentes de outras esferas e regiões fariam o mais tudo, consoante a Lei permitisse. Os pecadores que se fizessem penitentes, que se tornassem dignos; caso contrário, nada feito.
O Santo Ofício da Inquisição foi produzindo seus assassinatos, foi oferecendo fartos elementos de trabalho. É que deixavam o mundo os inquisidores e as suas vítimas, havendo muito o que fazer, pois eram para ali conduzidos, uns e outros, quando chegasse a hora ou quando as necessidades determinavam. E assim foi que se passaram séculos, muitos séculos, sem que eu deixasse aquele local de trabalho, aquela fonte de ressarcimentos. Quando deixei o departamento, por volta dos albores do século quatorze, foi para tomar parte nas premissas reformistas encetadas por Wicliff, na Inglaterra. Desde então, como as etapas restauradoras obedeceram a fatores cíclico-históricos, tivemos a oportunidade de retorno à carne, tomando parte nos movimentos de Lutero e de Kardec, aquele conseguindo a liberdade de culto, a tradução da Escritura para o alemão e a sua disseminação, e este arrastando consigo a grande eclosão mediúnica, a renovação do Pentecostes em grande escala, transmitindo os livros básicos da doutrinária; isto é, tendo por base a Moral, o Amor e a Revelação, cujos reflexos práticos são a Ciência, a Filosofia e a Religião.
Desde então, conforme as ordens emanadas do Plano Crístico, o mundo espiritual entrou a comungar com os homens em escala cada vez mais ascendente, a fim de lhes ir ministrando o conhecimento das verdades fundamentais. A sociedade astral, complexa em seus valores hierárquicos, infiltra-se nos meandros humanos e oferece lições consoladoras, conclamando seus irmãos a que se devotem ao serviço da Sabedoria e do Amor, a fim de que a terra se torne um mundo de Paz e de Harmonia.
Como disse, minha última passagem pela carne foi visando colaborar na obra de Kardec; isto porque, como havia sido determinado pela injunção cármica, viria a coincidir com as faltas cometidas, contraditando a corrupção do Caminho do Senhor ou do batismo de espírito. Teria que acertar, naquele mesmo campo de atividade em que errara; se cumpria ao fator cíclico-histórico repor as coisas no lugar, cumpria aos indivíduos em particular fazer o mesmo. Assim sendo, as grandes movimentações coletivas importam em trabalhos de renovação individual; é o grande movimento a envolver as criaturas, forçando-as aos devidos reajustes.
A palavra de um mentor, nas vésperas de minha nova imersão carnal, foi a seguinte:
– Walter – disse ele – vais retomar o posto de trabalho que cumpre e compete, quer seja por motivo da lei ascensional comum, quer seja por causa das grandes faltas cometidas no tempo em que foste Proclo, um dos pervertores do Caminho do Senhor, no quarto século da Era Cristã, sob as ordens de Constantino. A tua função, preparado que estás, será a de servir de instrumento mediúnico; porque, estando as bases educativas mais ou menos preparadas, pelos trabalhos de Wicliff, Huss, Joana d’Arc, Lutero e Giordano Bruno, terá prosseguimento a obra de restauração do batismo de espírito, com a renovação em base de uma grande escala mediúnica. Um novo Pentecostes haverá, em maior escala, cujo seguimento nunca mais terá fim, nunca mais será truncado pelas disposições humanas. E o fim deste novo surto será, começando de maneira bisonha, ir aos poucos se transformando nos altos níveis de intercâmbio do porvir. Nos mundos superiores as relações entre os dois planos da vida se processam simplesmente, porque as faculdades se acham expostas em elevado grau de intensidade. O novo surto terá por objetivo essa colimação; irá avançando lentamente, elevará o teor psíquico das criaturas e forjará o intercâmbio fácil e glorioso da Terra do porvir.
Fez breve pausa, envolveu-me com o seu simpático olhar, prosseguindo:
– Não te esqueças, no entanto, que há uma verdade maior a ser encarada, verdade que diz respeito ao indivíduo em particular. Nenhuma coletividade será perfeita, se os seus membros componentes forem imperfeitos. Portanto, mais do que tratar das grandes questões externas, importa tratar da grave questão interna. O problema fundamental é o do Reino do Céu interior, é o da iluminação interior, é a lavratura do Amor e da Sabedoria no caráter do indivíduo.
Em face de outra pausa do mentor, anuí:
– Eu sei, bondoso mentor, que é assim. Estudei todas as lições, li tudo quanto foi dito pelos Grandes Reveladores. E em Jesus Cristo, não encontrei outros objetivos, sem ser a necessidade premente, inadiável e intransferível, de cada um trabalhar em si mesmo, a fim de se tornar melhor, cada vez mais espiritual, a ponto de se tornar ESPÍRITO e VERDADE, assim como Deus é.
O mentor continuou, satisfeito e paternal:
– Justamente, pois o sentido da UNIDADE é o ponto culminante da evolução, é o topo da escalada biológica. Coincidindo a evolução da criatura com a DIVINA UBIQUIDADE, teremos o filho integrado vibratoriamente no Pai, refletindo suas Glórias e Poderes. É o Esponsal Divino, é a Celeste Conexão. Por isso mesmo, Walter, não te ocupes de outros assuntos, não te faças objeto de outras aplicações durante a tua nova passagem pela carne. Deves um programa de trabalhos e terás que executá-lo; faze, pois, tudo em conformidade com as determinações cármicas, com as necessidades prementes que a tua conduta anterior criou e agora determina a solvência. Como estás preparado, pelo curso longuíssimo de trabalhos fraternos e de estudos levados a termo, não te será difícil vencer os obstáculos que naturalmente surgirão. O mundo irá dizer mil e uma asneiras, irá caluniar, irá atirar às tuas costas o peso de quantas incompreensões arrasta, por causa dos vícios idólatras, por causa dos interesses subalternos que a restauração do Cristianismo irá ferir frontalmente. Todavia, Jesus estará contigo através de Seus emissários, revigorando os teus ânimos, derramando em teus passos as luzes do Seu Amor.
Fui objeto, por muitos dias, de aplicações magnéticas assim dispostas; aqueles que me impunham suas mãos, preparando-me para o reencarne imediato, infundiam em meu subconsciente a vontade de ser fiel servidor mediúnico, sem outros intentos, sem a nada mais pretender. Servindo ao mundo espiritual e servindo à obra da Codificação, teria feito tudo em sentido perfeito, porque teria contrariado aqueles erros do tempo em que fora Proclo, em que tudo fizera para auxiliar na liquidação da Graça trazida por Jesus Cristo.
Felizmente, pelo que muito rendo graças a Deus, assim acontecera; o nascimento fez de mim um homem pobre, simples, inconscientemente agarrado a Jesus Cristo e à Sua função missionária. Se antes de saborear as graças mediúnicas era apenas um bom cidadão, sem outro sentimento religioso que não fosse ler muito a Escritura, depois de sentir em mim os primeiros sintomas espirituais exteriores, em tudo concorri para ser fiel servidor do mundo espiritual que me envolvia. A receita dos mentores espirituais era manter alto o padrão moral, atender com solicitude aos doentes que me procuravam e facilitar ao máximo as comunicações por meu intermédio. E foi assim que se cooperou na obra geral, contribuindo com a parcela mínima, com aquela vazação mediúnica que se me estava ao alcance. Porque foram muitos os contribuintes, aqueles que dos modos vários cooperaram na grandiosa obra que serve de base ao movimento doutrinário em geral. E nem poderia ser de menos, pois quando nasce um homem-símbolo, fadado a centralizar um novo surto, legiões de colaboradores formam-lhe a coroa de trabalhos, nos dois planos da vida. Jesus teve, no plano carnal, Discípulos e colaboradores; e no plano espiritual, aquelas legiões de anjos ou espíritos, às quais várias vezes fez referências. Se alguém quiser considerar o montante de colaboração havida, para os trabalhos restauradores, além de ter que sopesar as preliminares levadas a termo por Wicliff, Huss, Joana d’Arc, Lutero e Giordano Bruno, Kardec e outros, terá que acrescentar milhares de outros de menor graduação, todavia imprescindíveis.
Não quero dizer que não tenha tido minhas horas de fraqueza, de presunção e de saliências comprometedoras; felizmente, o mundo espiritual veio em meu socorro, alertando-me. Acredito que poucos médiuns passarão pelo mundo, sem se verem envolvidos pela peçonha da presunção, da vaidade mediúnica. Ciúmes e vaidades, e muitas vezes faltas ainda mais graves, derivam de provas pelas quais devem mesmo passar, pois todo aquele que pretende ser o iluminador das consciências alheias, deverá provar que para consigo mesmo não é menos vigilante... Alguns dos apóstolos, antes mesmo de imaginar sequer nos trabalhos e nas lutas porvindouras, pois tudo ainda pesava nas responsabilidades de Jesus, já faziam presunçosos pensamentos sobre qual deles seria o maior no Reino do Céu... Enquanto isso o Divino Modelo, afirmava que Sua obrigação era servir, e não ser servido.
Eu tive as minhas protuberâncias missionárias; cheguei a julgar que estava sendo um dos baluartes do trabalho informativo, pelo simples fato de receber comunicações que ofereciam oportunidade de estudos e catalogações, por parte do codificador. Graças a Deus, lembrou-me o mundo amigo que tinha no espaço, em tempo e com provas cabais, que não era mais que um grande culpado em trabalhos de reparação doutrinária. Foi através de uma jovem médium, que ouvi o seguinte aviso:
– Preste atenção, Pierre, naquilo que lhe vai ser mostrado.
– Quando? – perguntei, sem imaginar no que seria.
– O quanto antes, o quanto antes! – repetiu, forte e grave, aquele espírito que nem sequer quis dar o seu nome.
E foi naquela noite mesma; pela madrugada, aí pelas três horas, acordei em perfeito estado de saúde. Senti, a seguir, vibrarem ao meu redor pruridos de aproximação. Entreguei-me, forçando mesmo a manifestação do fenômeno. E assim foi que me encontrei na Roma dos dias de Constantino, perseguindo aos que cultivavam o Batismo de Espírito, com o fim de criar a Igreja Romana. Estive entre gente prisioneira e sacrificada, estive entre carnes podres e entre agonias tremendas. Andei alguns dias com o mau cheiro nas narinas, e nunca mais esqueci a tremenda revivescência do terrível e monstruoso drama. Daquele dia em diante, deixei de pensar que era um baluarte do novo surto espiritual, para viver a simples condição, de um simples errado em trabalhos de reparação. Estava sob o encargo de pesadas obrigações; não era nenhuma figura ilustre, coroada com os louros graciosos da devoção.
Quando se apagavam as luzes do século dezenove; quando nos horizontes da História os primeiros vislumbres do século vinte se faziam presentes, deixei o mundo das formas densas, para reentrar na esfera causal, no mundo espiritual. Fi-lo em bom estado, pois basta que se mereça o amparo imediato dos amigos, para que se considere a recompensa de Deus, pelo pouco que se haja feito. Depois de enterrado o corpo, fui conduzido para o lugar onde deveria passar por um bom e reparador sono. E depois de acordar, fui imediatamente entregue ao departamento que me colocaria em face da minha história. Revivi dias longínquos, aqueles que não conhecia desde os tempos em que fora Proclo. Naquela vida, os criminosos trabalhos em que me ocupei muito me prejudicaram, muito embotaram as minhas possibilidades evolutivas. Todavia, nunca fora um espírito assinalado com as marcas do bom sentido espiritual; vivera como político e como soldado, tendo sido também grande senhor de terras, além de duas vidas passadas entre gregos sábios e artistas. Lá mais para trás, tudo bastante bruto, tudo muito animal e egoísta ao extremo.
Após a graça de tais conhecimentos, fui devolvido ao trabalho de intercâmbio, pois os livros doutrinários passaram a produzir seus frutos imediatos, passaram a interessar grande número de criaturas nos mais distantes pontos da Terra. Ao observar as extensões atingidas pelo trabalho codificado, lembrei-me daquelas palavras de Jesus que se acham no primeiro capítulo dos Atos, sentindo em mim profunda alegria. É que, embora tendo sido um dos corruptores da Excelsa Doutrina, nos dias de Constantino, nem por isso deixaria de ser um dos mais humildes trabalhadores, na hora do novo surto mediúnico. A graça da Revelação se espargia pelo mundo, testemunhando a Verdade, consolando aflitos, enxugando lágrimas e advertindo consciências menos prudentes.
Estando agora o Espiritismo a completar cem anos de codificação, tanto mais observamos a grandiosidade da obra levada a termo sob as ordens de Jesus; se estamos, inclusive e infelizmente, diante de muitos casos em que a mediunidade não é cultivada nos moldes indicados pelo Evangelho, também é certo que o grande número que se movimenta pelo orbe, o faz com inteireza de propósitos, o faz com a mente e o coração voltados aos exemplos vívidos do Cristo e aos ensinos consecutivos deixados pelos Apóstolos. Quanto me é grato rememorar, ainda mesmo aqueles dias infelizes, desde que conseguindo a obtenção posterior de tomar parte no trabalho de restauração. As trevas se transmudaram em luzes! As aflições deram nos pórticos da sublimação! A retenção nos planos inferiores converteu-se em deslumbrantes extensões de liberdade! A compressão de consciência metamorfoseou-se na Paz de Deus!
Na situação em que me encontro, que mais poderia desejar? Bem sei que as virtudes de Deus jazem no meu íntimo, tão imensas que nem sequer posso imaginar ainda; bem sei que a Lei, o Amor e a Sabedoria, aguardam de mim outras e melhores realizações; bem sei que o porvir terrícola contará com os meus galardões a conquistar! Entretanto, eu sei que isso tudo, que eu ainda devo fazer, isso mesmo cumpre a todos fazerem, porque a Terra terá que vir a ser um mundo de esplendor e de glória!
A Lei adverte contra os erros básicos; concita ao cumprimento dos deveres para com Deus e para com o próximo. Estar fora da Lei é estar fora da melhor posição, podendo vir a estar enquadrado na pior, no mais ínfimo nível gradativo!
O Amor exemplificado pelo Cristo é o Amor Paradigma; é o caminho certo, é a estrada infalível que conduz à vivência da Lei, de onde surte a Harmonia. Quem não sabe amar, nunca poderá adorar a Deus em ESPÍRITO e VERDADE! É o Amor Paradigma quem faz a criatura abandonar as formas inferiores de culto e dedicar-se ao culto da verdadeira fraternidade universal!
A Revelação jamais deixou de ser o instrumento informativo por excelência. Nos dias anteriores a Jesus Cristo, obedecendo aos imperativos esotéricos, ela ofertou à Humanidade as chamadas Grandes Revelações. Com a vinda de Jesus, cuja função missionária fora derramar do espírito sobre a carne, devia tomar ela a dianteira dos trabalhos de espiritualização da Humanidade. Como porém houve a corrupção, o grande cisma perversor, prosseguiu a Humanidade na idolatria e no comercialismo das religiões clérigo-pagãs. Como porém a evolução planetária é por lei, eis que chegou o tempo de reposição das coisas no lugar, tomando ela a frente dos trabalhos espiritualistas; pois lhe cumpre, de direito e de dever, dar testemunho do Cristo, Daquele que para todos os efeitos é o Mestre e Diretor Planetário.
Se para efeito de ordem, de Lei e de Justiça, entre a criatura e o Criador paira a Força Equilibradora Fundamental, também é certo que, para efeito de orientação e de consoladoras atenções, entre o Diretor Planetário e Seus irmãos dirigidos paira a Revelação, o Seu batismo de espírito. Cumpre, portanto, não olvidar como se deve e para o que se deve cultivar a Revelação. Quem não esquecer a Lei e nem o Amor, certamente saberá como cultivar a Revelação.
Os riscos possíveis, decorrentes dos possíveis maus usos mediúnicos, correrão por conta do risco daqueles que olvidarem as advertências da Lei e das dadivosas bênçãos do Amor. Porque, falando que estamos a quem possa vir a cultivar a Revelação, implicitamente estamos falando a quem reconhece estarem a Lei e a Revelação constituindo uma unidade doutrinária, funcional e legal, visto como a Lei veio sempre através de fenômenos mediúnicos. Ao ler os Dez Mandamentos da Lei, ninguém olvidará que Moisés os recebeu no Monte Sinai, por via mediúnica; e há de se lembrar, também, que eles não mandam observar instituto sactário algum, antes proibindo a tudo quanto seja de caráter formal e idólatra.
Sabemos que espíritos inferiores praticam ações correspondentes; não pretendemos obrigar a quem quer que seja, para que nos ouça e ponha em prática; nem o Cristo proibiu que O pregassem na Cruz!... Estando, porém, a cumprir ordens superiores, diremos apenas o seguinte – estaremos sempre em nosso posto de honra, esperando que a vida e o tempo nos dêem o devido testemunho.
Nem se diga, também, que para abandonar formalismos e idolatrias sejam necessários grandes esforços. Para conquistar as ciências e as artes, cumpre atender a longos e persuasivos cursos; mas para deixar os farandulismos inventados pelos homens, basta um pouco de boa vontade e capacidade de algum esforço. Quanto às práticas harmoniosas, fraternas e até mesmo de elevada capacidade amorosa, até mesmo os mais egoístas poderão decidir de suas vantagens. Sem fazer paradoxo, diremos que um pouco de boa vontade, somada a algum egoísmo bem intencionado, levarão a criatura aos melhores conceitos e às melhores práticas. Até os irracionais, disse um pensador, se descobrissem que viver em paz é melhor, tudo fariam para não desmanchar a harmonia social. Não é muito, portanto, que o espírito se eleve em caracteres amorosos e sábios, a fim de ornamentar com os divinos florões da consciência cósmica. Afinal de contas, desde os Vedas, que são as bases da Verdade Revelada, ou a primeira Grande Revelação, a Humanidade conhece a chave de todas as demais verdades ou verdades complementares; porque a Revelação Védica ensina, desde muitas dezenas de séculos:
“Em Deus tudo tem Origem, Sustentação e Destinação; aquele que chegou a saber isto, e faz questão de crescer em suas próprias virtudes, presto entrará em estado de Plena Harmonia e ultrapassará o ciclo das reencarnações”.
Que mais poderia desejar, para saber com suficiência e poder realizar com eficiência, o mais exigente cidadão, uma vez capacitado das vantagens da Revelação tornada de alcance geral? Ela mesma não prova e comprova tudo, quer seja a infalibilidade de Lei, quer seja a oportunidade da Justiça, quer seja a força do Amor, quer seja a autoridade do Conhecimento?
Se, porém, tem alguém motivo de queixa contra as religiões ou seitas, que esse alguém dê tratos à palavra autorizadíssima do Cristo; Ele, assim como a Lei o ensina, a ninguém mandou cultivar sectarismos, idolatrias, rituais e formalismos. O caminho do Senhor, como Doutrina, era uma síntese de Lei, de Amor e de Revelação. O resto foi e é invenção de homens. Bem o sei, e infelizmente, tomei bastante parte nas corrupções que foram levadas a cabo e impostas com todo o rigor das forças politico-administrativas. Quem quiser voltar à Doutrina Pura, que retorne. Mais não terá que fazer, do que ser sincero para consigo mesmo. Pergunte-se como executa a Lei, como exemplifica o Amor e para o que cultiva a Revelação. Se estiver certo, continue; se estiver errado, procure acertar.
“Aquele que chegou a conhecer a Verdade no exterior, esse chegou a conhecê-la no seu íntimo; e aquele que realmente chegou a conhecer a Verdade no seu íntimo, e fez questão de se tornar Puro e Sábio, esse tornou-se acima de formas e de sujeições inferiores; tornou-se UNO e sua esfera de vida é com aqueles que constituem o Verbo de Deus. Eles administram os mundos e suas humanidades”- Dos ensinos essênicos.
Nossa pretensão é falar de um deles, do Verbo da Terra, que é o seu Cristo Planetário. Não Dele em si, que era desde antes que a Terra existisse; mas falar alguma coisa de seus ensinos. Usaremos os textos conhecidos, embora sabendo que Jesus não os escreveu e que foram passados por mãos humanas, tornando-se portanto eivados de falhas interpretativas e compilativas. Vamos aos textos:
“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele...” – João, cap. 1.
No princípio tudo é ESSÊNCIA DIVINA. A centelha espiritual, uma vez emanada, é preposta à evolução. Quando chega ao grau crístico, ou de UNIDADE, entra na esfera do Verbo, dos espíritos administradores de mundos e de Humanidades. Antes que a Terra existisse, Jesus já era pertencente ao plano crístico, já fazia parte do Verbo, Daqueles que filtram ou executam a Vontade de Deus. A Terra foi criada sob o plano administrativo de Jesus; e sua Humanidade é por Ele guiada. Acima dos Administradores o que paira é Lei Geral, é a Vontade de Deus. Existem questões que somente a Deus cumprem, existindo outras que são da alçada dos Cristos ou Verbos. De qualquer forma e em qualquer caso, a autoridade dos filhos deriva de poderes delegados pelo Pai. Ser ungido ou selado significa estar empossado na autoridade. Quando Jesus veio, os homens não o reconheceram; se O tivessem reconhecido como sendo o Diretor Planetário, por certo não O matariam.
“Houve um homem enviado por Deus, que se chamava João.” – João, cap. 1.
O Velho Testamento refere-se muitas vezes à vinda do Cristo e do Seu Precursor ou preparador do caminho. Elias deveria cumprir essa missão de preparador, bem assim como vir mais tarde, na hora dos trabalhos restauradores. Os serviços de esclarecimento demandam alicerçamentos, edificação e conservação. Para isso devem trabalhar os Cristos e Seus imediatos. Naquela ocasião, cumpria a João dar testemunho da encarnação do Verbo e da Sua função missionária. Foi o que fez.
“Mas a todos os que o receberam deu ele poder de se tornarem filhos de Deus...” – João, cap. 1.
Nada existe que não derive de Deus; tudo é filho de Deus; o que importa é sintonizar com o Pai por evolvimento vibratório. João Evangelista, que também era da Fraternidade dos Essênios, e votado ao Senhor ou Nazareno, jamais escreveria tal absurdo. Jesus veio viver a Lei, exemplificar o Amor e derramar o espírito sobre a carne, conforme estava nos Profetas, e não para fazer aquilo que não era preciso fazer, por ser feito de sempre. E se de fato assim escreveu, cometeu apenas um absurdo. Todavia, cumpre saber, de oitenta e sete livros escritos sobre Jesus, Jerônimo, o que fez a Vulgata Latina, escolheu vinte e oito, tendo resumido estes vinte e oito nos quatro conhecidos. O Evangelho de Jesus, por todos os modos puro e verdadeiro, foi a Sua vida, foram os Seus feitos. De resto, andaram metendo na boca de Jesus o que Ele não disse, assim como tirando o que Ele disse, por causa das corrupções e das maquinações que interessavam ao Império e a seus senhores.
“Que não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do varão, mas de Deus” – João, cap. 1.
A lei das reencarnações é fundamental e comum; portanto, o nascimento e a morte fazem o fenômeno dialético, a complementação cíclica, nada mais. O mundo material fornece o que deve, no quadro das leis, pura e simplesmente. O espírito nasce para três objetivos: ou para expiar faltas, ou para provar condições, ou para cumprir missão. Em muitos casos, misturam-se os fatores.
“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós; e nós vimos a sua glória, glória como de Filho unigênito do Pai...” – João cap. 1.
Não é unigênito e sim UNGIDO ou SELADO, conforme a linguagem esotérica, usada pelos Kabalistas, Essênicos, Órficos e Sibilinos. Espírito de alçada hierárquica Crística, sempre reencarna para fins messiânicos superiores – Verbo ou filtração em grau altíssimo da Vontade do Pai.
“Por que a Lei foi dada por Moisés, a Graça e a Verdade foram trazidas por Jesus Cristo.” – João, cap. 1.
As Fraternidades Esotéricas chamavam o culto da Revelação de Graça e de Verdade; Jesus tinha por função messiânica derramar do espírito sobre toda a carne; isto é, escancarar as portas dos Cenáculos Iniciáticos.
“Eis aqui o Cordeiro de Deus, eis aqui o que tira o pecado do mundo.” – João, cap. 1.
Maior erro não poderia ser proferido. A cada um será dado segundo as suas obras; cada qual é em hierarquia, aquilo que se fez por evolvimento. Todos temos o Reino do Céu dentro de nós mesmos e devemos desabrochá-lo à custa de trabalhos e de conquistas íntimas, amorosas e sábias. Jesus veio ensinar o Caminho Redentor, a Doutrina Certa. De resto, como Ele ensinou, quem errar terá que pagar até o último ceitil. Quem disse que João Batista, um Essênio e Nazareno, iria proferir tais palavras?
“Aquele sobre que tu vires descer o Espírito, e repousar sobre ele, esse é o que batiza no Espírito Santo.” – João, cap. 1.
O Velho Testamento está repleto de tais anunciações. Jesus receberia do Pai a promessa do espírito e o derramaria sobre a carne. Lede o livro dos Atos e as Epístolas, que tais escritos dão fartos testemunhos da missão cumprida por Jesus.
“Então os dois discípulos, quando isto lhe ouviram dizer, foram logo seguindo a Jesus.” – João, cap. 1.
João Batista foi enviado, quando menino ainda, ao Cenáculo Essênio que estava situado nas fronteiras do Egito. Porque fora o reencarne de Elias anunciado e as ordens cumpridas. Quando saiu anunciando a chegada do UNGIDO e a sua função messiânica, fê-lo com vários elementos Essênios e alguns outros que se viram atraídos pela sua personalidade, conduta e propósitos. Quando apareceu Jesus, vindo daquele Cenáculo que se achava às margens do Mar Morto, onde também João Batista estivera algum tempo, tendo João anunciado e apontado o UNGIDO, os seus discípulos foram-no abandonando e seguindo a Jesus.
“Na verdade, na verdade vos digo que vereis o céu aberto, e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do homem.” – João, cap. 1.
Jesus, que tinha o Espírito sem medida, que era médium completo, Verbo ou filtro perfeito da Vontade de Deus, iria dar provas de tudo quanto fosse atinente à Revelação ostensiva, que lhe cumpria deixar como base da Igreja. Os Essênios tinham pleno conhecimento de tudo isso; mas Jesus veio para tornar essa Verdade ao alcance de todos. Fazia então, três mil e duzentos anos que o Povo chamado Escolhido esperava o Cristo, Aquele que executaria a celeste promessa. Anjo e espírito, na linguagem bíblica, são termos equivalentes.
“O que é nascido da carne, é carne; e o que é nascido do Espírito, é espírito. Não te maravilhes de eu te dizer: importa-vos nascer outra vez.” – João, cap. 3.
Exposição em síntese, da lei das vidas sucessivas; a dialética Espírito e Matéria, agindo em processo ambivalente, como era do conhecimento das Fraternidades Esotéricas. Hoje, como naqueles dias, aceitam a melhor verdade aqueles que evoluíram a ponto de poderem fazê-lo. Ninguém pode ser condenado, pelo fato de ser involuído e incapaz de compreender as leis fundamentais.
“Em verdade, em verdade te digo que nós dizemos o que sabemos, e que damos testemunho do que vimos, e vós, contudo isso, não recebeis o nosso testemunho.” – João, cap. 3.
Nunca deixará de haver choque entre a Grande Verdade e as verdades pequeninas ou mentirosas que são do rol humano. Por isso mesmo, quem tiver melhores verdades para expor, que se prepare para ser até mesmo martirizado. Antes foi assim; naqueles dias foi assim; posteriormente continuou assim. Até quando continuará assim?
“Porque aquele, a quem Deus enviou, esse fala palavras de Deus; porque não lhe dá Deus o espírito por medida.” – João, cap. 3.
Ter o espírito de Deus, para os membros da Fraternidade Essênia, era ter dons mediúnicos ou ter faculdades proféticas. No velho testamento estava escrito que o Messias viria com o Espírito de Deus, sem medida. Nem poderia ser de menos, na Sua função de Verbo Divino ou Executor da Vontade de Deus.
Ninguém estranhe o fato de fazermos referências a certos textos; existem muitas contradições e afirmações absurdas, coisas que nunca teriam saído da boca de Jesus ou da escrita de alguns discípulos.
“Mas a água que eu lhe der, virá a ser nele uma fonte de água, que salte para a vida eterna.” – João, cap. 4.
A água de que Jesus foi o divino portador é a Excelsa Doutrina, constituída, como temos repetido, de Lei, de Amor e de Revelação. Quem seguir Seu Exemplo, certamente colherá seus frutos. Depois de entregar o que Lhe cumpria, Jesus espera que cada qual cumpra com o seu dever. Ele não é responsável pelas liberdades de quem quer que seja. Não veio remir pecados e sim ensinar o Caminho da Libertação. Não se façam confusões, pois ninguém abalará jamais os fundamentos da Verdade.
“Deus é Espírito: e em espírito e verdade é que o devem adorar os que o adoram.” – João, cap. 4.
Esse preceito encerra todas as verdades já conhecidas e por conhecer; é a chave geral, é a medida que abrange todas as medidas. Entretanto, ninguém de um salto irá a semelhante grau de adoração, de perfeição sintônica. Infelizes, porém, aqueles que se propuseram ao retardamento, próprio ou alheio, ou por fazerem da fé meio de vida e coisas piores.
“A minha comida é fazer eu a vontade Daquele que me enviou, para cumprir a sua obra.” – João, cap. 4.
Podemos compreender a ORDEM ADMINISTRATIVA DO COSMO, pensando assim:
1. Deus ou Essência Divina: Ponto de Partida de tudo e de todos e Lei Geral do Cosmo;
2. Os Cristos ou Verbos: espíritos de elevada hierarquia, cumpridores ou executores da Soberana Vontade;
3. Imediatos dos Cristos ou Verbos: os auxiliares dos Diretores de meta-galáxias, de galáxias, de sistemas planetários e de planetas, cuja gradação decrescente é vastíssima.
4. As humanidades planetárias em geral, cuja obrigação máxima é obedecer às leis e às Autoridades, a fim de se tornarem cada vez mais próximas da perfeição. Nos Cristos encontrarão os Modelos de conduta, e, de modo geral, a noção da UNIDADE EMANADORA E DETERMINADORA.
Com um pouco de bom senso e alguma prudência, fácil será reconhecer a posição dos Verbos e dos seus tutelados; o mais tudo é questão de viver o conhecimento.
“Vós, se não vedes milagres e prodígios, não credes.” – João, cap. 4.
A brutalidade da matéria empece o espírito; somente a evolução o fará capaz de saber e sentir as verdades sublimes e, por isso mesmo, torná-lo naturalmente afim com a UNIDADE. Sem crescer no íntimo, onde se deve dar o fenômeno de Celeste Conexão, ninguém poderá gostar das Verdades Divinas. O espírito bruto pede e deseja provas brutas.
“Foi este o segundo milagre que Jesus obrou, tendo vindo da Judéia para Galiléia.” – João, cap.4.
Na Ordem Divina não existem milagres e nem mistérios; existem poderes Divinos e ações espirituais que se estribam em leis fundamentais. Os fenômenos mediúnicos sempre foram tidos por milagrosos pelos indivíduos ignaros. Jesus tinha ao redor as falanges angélicas ou espirituais e fora o médium mais completo, O Sem Medida, como estava escrito nos profetas. Além disso, os Apóstolos e muitos outros forneciam fartos elementos de valor mediúnico, para a produção de tais fenômenos.
“Porque um anjo do Senhor descia em certo tempo ao tanque, e movia-se a água.” – João, cap.5.
A Bíblia inteira é uma seqüência de fenômenos mediúnicos, de testemunhos sobre as manifestações dos anjos ou espíritos. Somente os cegos propositais é que nunca enxergam coisa alguma. Resistir contra a comunicabilidade dos espíritos sempre foi o forte das clerezias idólatras e mercantilistas.
“Hoje é Sábado, não te é lícito levar a tua cama.” – João, cap. 5.
Para Deus e para os Verbos não existem dias e nem horas, porque tudo sabem e procedem à base de eternidade, de infinidade. Os espíritos medíocres é que vivem para formalismos e ronceirismos pagãos, sendo por isso capazes das maiores aberrações, até de crueldades, para satisfazer aos caprichos sectários e idólatras.
“Olha que já estás são; não peques mais, para que te não suceda alguma coisa pior.” – João, cap.5.
Testemunho dado por Jesus, sobre a lei da Causa e Efeito. Não existe o perdão, mas a paga até o último ceitil e a continuação no rumo da Pureza e da Sabedoria. Também não existe quem perdoe pecados por conta da Lei ou da Justiça de Deus. O Cristo veio trazer a Graça e a Verdade para toda a carne, e não para derrogar as leis fundamentais do Cosmo. Jesus não é o responsável de muita coisa que Lhe pretendem atribuir. Ele veio para Exemplo de Ordem e para cumprir a promessa do batismo de espírito. É Despenseiro Fiel e Prudente e não detrator de leis.
“Eu não recebo dos homens a minha glória.” – João, cap. 5 .
Ai de quem se fia nas glórias humanas! Ai daqueles que confiam nas benesses que findam no túmulo! E os Verbos, mais do que ninguém, sabem que só é verdadeira glória a que vem de Deus pelos canais evolutivos; isto é, o Reino de Deus que está dentro de cada um de nós, Reino que cumpre ser exposto por evolução. Quanto ao ser UNGIDO, ou armado de PODERES DELEGADOS, não Lhe deu crédito o mundo, mas não o abandonou o Pai. Importa é ter de Deus o apoio.
“Porque se vós crêsseis a Moisés, certamente me creríeis a mim, porque ele escreveu de mim.” – João, cap. 5.
Jesus foi anunciado a começar de Abraão; Moisés e os Profetas anunciaram a Jesus; e quando Jesus veio, em nome dos Patriarcas, de Moisés e dos Profetas, foi que O cravaram na cruz. Por que? Porque veio cumprir a vontade de Deus!... E quantos pretensos ministros de Deus ainda pensam em termos de Caifaz e Anaz?!...
“E entendendo Jesus que o viriam arrebatar para o fazerem rei, tornou a retirar-se para o monte, ele só.” – João, cap. 6.
Jamais um espírito, em função de Cristo ou Verbo, toma corpo carnal para executar funções terrenas; a função de tais espíritos é trabalhar, no Plano da Lei Geral, pela reintegração cósmica de Seus irmãos tutelados. Das coisas do reino deste mundo, espíritos inferiores é que tratam. Tudo é relativo.
“Porque ele é Aquele em quem Deus Pai imprimiu o seu selo.” – João, cap. 6.
Cristo, Verbo ou Ungido, quer dizer SELADO ou investido de função Altíssima. A Escritura, por causa dos erros interpostos, confunde entre UNGIDO e unigênito. A verdadeira vantagem está na verdade e não nos títulos inexatos e estultos, tanto mais estultos pelo fato de pretenderem encobrir verdades fundamentais, verdades que devem ser respeitadas. Adular é próprio de espíritos tacanhos, é comum nas pessoas inconscientes, que assim pensam iludir e fugir à Lei e à Justiça. Tende cuidado com aqueles que, por ganância e outras fraquezas, inventam dogmas e rituais, simulacros e práticas formais, cuidando que com isso alteram a ORDEM CÓSMICA ou subornam a Vontade de Deus, para receberem de favor aquilo que por justiça não merecem.
“Por isso eu vos tenho dito, que ninguém pode vir a mim, se por meu Pai lhe não for isso concedido.” – João, cap.7.
É lição comum das Fraternidades Esotéricas; ninguém chegará a ser da hierarquia dos Cristos, Delegados, Ungidos ou Verbos, sem crescer no Plano das Leis Gerais. Sem Lei ninguém desabrocha o Céu Íntimo e sem isso ninguém poderá ser jamais Excelsa Autoridade. Aos Cristos cumpre testemunhar as leis fundamentais, nunca porém derrogá-las, por isso mesmo que são os Exemplos Vivos do Amor e da Verdade, da Lei e da Revelação. Fora das leis de Deus, como haver elevação?
“A minha doutrina não é minha, mas é Daquele que me enviou” – João, cap.7.
Já dissemos que Jesus viveu a Doutrina que Deus Lhe deu o encargo de deixar no mundo; Ele foi, em verdade, o Divino Transmissor da Excelsa Doutrina. É muito fácil de compreender, porque a Lei, o Amor e a Revelação, derivam de leis de Deus e Senhor Total; o restante, quando pode ser, é Servo de Deus. Tais são os Cristos ou Verbos.
“Não julgueis segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça.” – João, cap.7.
Para julgar segundo a reta justiça é necessário crescer e estar a par da RETA JUSTIÇA; no mundo, por enquanto, e sabe Deus até quando, a melhor justiça é apenas facciosa, sectária, idólatra, formalista e mercantilista. Quanto aos que já aprenderam a harmonizar com a Lei, com o Amor e com a Revelação, esses já tomaram as devidas providências, julgando com piedade, com tolerância e perdão.
“Quando vier o Cristo , fará ele mais prodígios do que este?” – João, cap.7.
O povo assim julgava e com sombras de razão. Realmente, além de ser AQUELE QUE TERIA O ESPÍRITO SEM MEDIDA, como diziam os Profetas, era o mais categorizado espírito planetário e investido da maior função de todos os tempos. As legiões de Deus O rodeavam, para Lhe executar a vontade, no âmbito da Lei.
“Nunca homem algum falou como este homem.” – João, cap. 7.
Todavia, Jesus veio ao mundo para trazer a todos as verdades conhecidas pelos Cenáculos Esotéricos, com os acréscimos de Seus Poderes Espirituais, daquela parte que decorria de sua Alta Hierarquia e função missionária. Se tivessem deixado tudo como Ele disse, nunca haveria lugar para clerezias político-econômicas e outras farsas no seio do Cristianismo. Porque a Lei, o Amor e a Revelação eram dos cultos esotéricos, e , para serem vividas, não são necessários os cleros; estes, pelo contrário, a tudo corrompem e desonram, com suas falsas aparências de culto.
“Eu sou a luz do mundo; o que me segue não anda em trevas, mas terá o lume da vida.” – João, cap. 8.
Nem poderia ser de menos, visto como os Cristos ou Verbos, Ungidos ou Selados, nascem para serem os Exemplos da Verdade, do Caminho e da Vida. Não existe planeta que não tenha o seu Cristo ou Verbo, e todos eles representam a Verdade.
“Eu sou o princípio, o mesmo que vos falo.” – João, cap. 8.
O mesmo que, por determinação da ESSÊNCIA DIVINA ou Deus, contando com Suas legiões de Imediatos, presidiu à formação da Terra; O mesmo que, nas mesmas condições, é o Diretor Planetário, sem ser o perdoador dos pecados e sem ser o responsável pelas liberdades individuais. Porque, no Espaço e no Tempo, a Lei prevalece e a cada um será dado segundo as suas obras. E a quem mais conhecer, é certo que mais será pedido.
“E conhecereis a Verdade, e a Verdade vos livrará” – João, cap. 8.
A Verdade a ser conhecida está fundamentada nas seguintes bases: o Emanador, a Emanação, o Espírito, a Matéria, a Imortalidade, a Responsabilidade, a Evolução, a Reencarnação, a Revelação, a Pluralidade dos Mundos, a Lei Equilibradora e a Virtude. Quem chega a conhecer a Verdade, pelos canais da Evolução, é aquele que se libertou. Ele formará com os Cristos ou Verbos, tomando parte na Administração do Cosmo. A lição de Jesus foi para todos os tempos; quando a Terra for aquela Jerusalém sem portas, então vereis até onde as palavras de Jesus foram completas e por demais extensas para aqueles dias em que foram proferidas. Porque uma coisa é conhecer em teoria e outra coisa é realizar no íntimo.
“Em verdade, em verdade vos digo que se alguém guarda as minhas palavras, não verá a morte eternamente.” – João, cap. 8.
Sentença de integral sentido esotérico; ficar com as palavras é ficar com as leis, que os Cristos ou Verbos representam. É ficar igual, é ser UNO COM O PAI, é ultrapassar os limites da lei de Reencarnação. Se nascer, como Jesus o fez, será por vontade própria e para ter integral certeza de tudo. Será Divino o Ato de Renúncia. Todavia, falar no Cristo não é guardar a Sua Doutrina... Muitos dirão Senhor! Senhor! e irão para as trevas exteriores... Por um Cristo que veio ao mundo e foi crucificado pelo mundo, milhões de negociatas e de malabarismos criminosos já se levantaram. Em nome da Verdade, a mentira faz livremente e endossada pelas ditas religiões clericais, toda praça de erros e de absurdos. Como, pois, não irem parar nas trevas os mesmos que exclamam Senhor! Senhor!?
“Este homem, que não guarda o sábado, não é de Deus.” – João, cap.9.
Tudo quanto é material e formal é para servir o espírito e não para ser senhor do espírito. Entretanto, isto não é do entendimento dos espíritos medíocres. Nem dos medíocres espontâneos e nem dos propositais; porque aqueles que inventam dogmas e idolatrias, formalismos e rituais, para disso fazerem mercado ou meio de vida, são medíocres propositais. Para a Lei de Deus, para o Amor dos Cristos e para a Revelação Consoladora, não existem sábados e nem formalismos.
“Dá glória a Deus; nós sabemos que esse homem é pecador.” – João, cap. 9.
A presunção dos proprietários de religiões é fonte de atos ridículos; a Verdade é para eles mentira e a mentira é posta no lugar da Verdade. Saíram do Templo os assassinos de Jesus, como continuam a sair dos Templos as perseguições contra a Verdade. Para haver Religião Pura, não se a pratique em benefício de orgulhos, de vaidades, de posições mundanas, do bolso e do estômago. Ainda assim, muito zelo pela Lei, porque vastos são os caminhos do erro e da mentira, quando querem mesmo arrastar o homem pelas suas fraquezas. Quanto aos crédulos em geral, melhor é que procurem conhecer por si mesmos, do que se entregarem às lábias e às maquinações daqueles que de tudo fazem comércio, pretendendo passar por aquilo que não são.
“Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas...” – João, cap. 10.
Contrariando os padres, ou senhores do Templo, Jesus marchava em linha reta na direção do Seu messianato. Daria mesmo a Sua vida pelo cumprimento do dever. Como porém o Seu pastorado não teria e não tem fim, ( enquanto a Terra não for o mundo perfeito que deverá vir a ser ) eis que voltaria como espírito, para dar início à Igreja Viva, edificada sobre a Revelação. Vide o livro intitulado“ LEI, GRAÇA E VERDADE”.
“Eu e o Pai somos uma mesma coisa.” – João, cap. 10.
Jesus nunca falou que era igual individualmente, e sim como REPRESENTANTE; é a função dos Cristos ou Verbos, Ungidos ou Selados. Em Doutrina, fora o Divino Transmissor, afirmando que nada fazia de si mesmo. Todos viremos a ser assim.
“Eu disse: vós sois deuses.” – João, cap. 10.
Jesus reportou-se ao que se acha escrito nos Salmos. A Sabedoria das Fraternidades Esotéricas ensinava perfeitamente. Um Emanador e uma Emanação; o que vem de Deus é semi-deus. Sem perder a individualidade, o espírito passa a ser filtro da Soberana Vontade. Tais são os Cristos e Verbos; isto é, UNIDOS COM O PAI. A única importância é a evolutiva, porque ninguém chega a ser UNO sem progredir. Não existem favores e nem desaforos em Deus e Suas leis regentes.
“O Pai está em mim e eu no Pai.” – João, cap. 10.
Sendo Cristo a Síntese Geral, simboliza a Emanação ou tudo que é filho ou derivado da ESSÊNCIA ORIGINÁRIA ou Deus. Portanto, o Emanador está na Emanação e vice-versa. Aliás, tudo é parte e relação, o Emanador, a Emanação, as leis e as virtudes. Nada é separado, tudo forma o TODO. Apenas, na vastidão incomensurável das manifestações, fracionam-se as mesmas manifestações, especificam-se os elementos e tudo revela suas valências, movimentações e finalidades. No Apocalipse está escrito que o Filho é figura de toda a Obra de Deus. Nem todas as verdades, no entanto, podem ser assimiladas por qualquer espírito; as crianças precisam comer mingauzinhos aguados...
“Eu sou a ressurreição e a vida; o que crê em mim, ainda que esteja morto, viverá.” – João, cap. 11.
Verdade simples o quanto justíssima. Síntese da Verdade e Reflexo do Divino Poder, o Cristo ou Verbo significa a emancipação realizada, a colimação espiritual ou a chegada evolutiva. Crer é viver e não apenas ter a certeza teórica; que se entregue o espírito trevoso ao Programa do Cristo, e verá que se plantará das trevas para a Luz Divina. Jesus salientou, porém o seguimento em obras e não em conversa fiada ou simulacros idólatras. O mundo está cheio de bodes que se fingem de ovelhas... Aquela gente de tiaras largas, de vestes fingidas e pomposas, e que aparenta muita autoridade espiritual, cópia exata dos Caifaz e Anaz, ainda vive crucificando a Verdade; isto é, crucificando a Verdade e passando por autoridade, recebendo festejos do mundo.
“Que fazemos nós, que este homem faz muitos milagres?” – João, cap. 11.
Assim ainda pensam todos os tribofeiros religiosos do mundo; se alguém faz alguma coisa, com os recursos do mediunismo e dos espíritos, esse alguém tem o diabo no corpo. Se nada faz e acompanha a cantilena da mentira e da ignorância, então é muito bom cidadão e filho de Deus, no entender deles.
“Nem considerais que vos convém que morra um homem pelo povo, e que não pereça toda a nação.” – João, cap. 11.
A mais vergonhosa das alterações feitas nos textos, ou corrupções, foi dizerem isso que segue ao texto transcrito, que Jesus morreria a bem do povo, e que Caifaz assim profetizou, por ser o pontífice do tempo. Muito ao contrário, ele e os demais achavam que se Jesus não fosse morto, poria a perder o que convinha a eles. Eles crucificaram a Jesus como feiticeiro, como está escrito no Talmud, livro de leis dos rabinos israelitas. A falsificação do texto deu para transformar a palavra assassina de Caifaz em profecia. É vergonhoso, mas é assim mesmo.
“O que ama a sua vida perdê-la-á, e o que aborrece a sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna.” – João, cap. 12.
Em primeiro lugar, Jesus não falava assim sobre a vida de aquém-túmulo. As referências sobre a eternidade da vida são uma coisa; as referências sobre merecer a paz e as vantagens decorrentes do bem fazer, são outra coisa. A vida é sempre eterna, mas cada qual vai recebendo sempre segundo as obras, não tendo jamais uma só encarnação o mérito de emancipar totalmente o espírito. Amar a vida é dever de todos, é por lei de Deus natural, justo e necessário. Viver porém para o bolso, o estômago, o sexo, o orgulho, a mentira, etc., isso não é amar a vida, é isso tripudiar sobre a vida. Jesus ensinava a aborrecer os vícios nefandos e a cultivar as virtudes emancipadoras. O resto é das falsas traduções!...
“Mas sendo tantos os milagres que fizera em sua presença, não criam nele.” – João, cap. 12.
Ninguém confunda, ao ler, entre o povo e os clérigos; estes é que viam em Jesus o fim das mercâncias vergonhosas, dos abusos que praticavam em concordância com os governantes. Tudo fazia Jesus na rua, no meio do povo, para onde traria o Batismo do Espírito, a Revelação para toda a carne; e os clérigos viam nisso fim de suas gordas mamatas, nada mais. O povo estava com Jesus; mas os donos do povo não podiam estar. É por isso que o caminho do Senhor viveu perseguido até o quarto século, tendo afinal sido corrompido de uma vez.
A seguir vem a ministração do pão e do vinho, que deviam ser tragados em igualdade de condições, pois os Essênios tinham nessa festa, a festa da Reconciliação ou da Amizade. Brigas e alterações, nessa festa deviam ter fim. Em sinal de fraternidade, deviam comer do mesmo pão e beber do mesmo vinho. O restante, que anda pelo mundo, foi inventado para ajoelhar o mundo diante dos beleguins de Roma. Demais, o que se come é para ser largado em lugar escuso... Ninguém deve pretender engolir o Cristo, para depois largá-lo na privada... O Cristo, o que deseja de nós, é que saibamos viver a Lei, o Amor e a Revelação. O resto é asneira. É sujeição a erros, crimes e escravizações.
Os capítulos quatorze, quinze e dezesseis, de João, estão muito referidos em quase todos os livros que constituem A SÉRIE DO CÉU. São fartos em palavras de Jesus sobre o derrame de espírito; isto é, edificação da Igreja Viva, sobre a Revelação tornada pública. O fim das Fraternidades Esotéricas. Tanto que, com o triunfo do Cristo, os Essênios integraram o Caminho do Senhor, guardando fartos documentos em lugares bastante seguros, para testemunhos no porvir.
“Eu estou neles, e tu estás em mim, para que eles sejam consumados na Unidade, e para que o mundo saiba que me enviaste, e que tu os amaste, como amaste também a mim.” – João, cap. 17.
Nenhum dos Grandes Reveladores, ou Precursores do Cristo, deixou de ensinar a LEI FUNDAMENTAL DE UNIDADE; não estamos falando em monoteísmo e sim na VERDADE UNITÁRIA. Não basta ser Monoteísta; é preciso saber que somos emanações da UNIDADE, que na UNIDADE nos movimentamos, evoluímos e viremos a ser plenamente conscientes. Viremos a ser Cristos ou Ungidos, chegaremos a refletir os Divinos Poderes e as Glórias de Deus. Jesus falou em tudo isso e muito mais do que Crisna, Hermes ou Pitágoras e Orfeu; apenas, quem tinha interesse na continuação das corrupções fez o serviço de alteração nas letras ou documentos. E quanto a Jesus, sabendo a Doutrina que deixaria, fundamentada na Revelação, não escreveu; à Revelação cumpriria dizer aquilo que, no tempo, não era possível a Ele ensinar. Roma retardou a expansão dos ensinos que deveriam vir, mas nunca poderia liquidar para sempre a fonte informativa mediúnica. No tempo, como se deu, tudo volveria a ser reposto no lugar. O Espiritismo, bem o sabeis, é o Caminho do Senhor; as bases continuam as mesmas – Lei, Amor e Revelação.
“E primeiramente o levaram à casa de Anaz, por ser sogro de Caifaz, que era o pontífice daquele ano.” – João, cap. 18.
Jesus já havia dito, que debaixo das tiras largas, das pompas exteriores e das aparências religiosas, estes tais escondiam os roubos, as corrupções e os assassinatos. Repetimos, o Céu quer que o homem se livre de toda e qualquer forma de idolatria; para isso lhe enviou o Divino Emissário, para viver a Lei, exemplificar o Amor e trazer para toda a carne a Graça da Revelação.
“Tu não terias sobre mim poder algum, se lá de cima te não fora dado. Por isso, o que me entregou a ti tem maior pecado.” – João, cap. 19.
Não existe autoridade sem responsabilidade. Quem alcança um posto de mando, seja lá de que ordem ou alçada for, na administração do mundo, que tenha muito e muito cuidado com as disposições que tomar. Anaz, Caifaz, Pilatos e muitos outros daqueles dias, como tantos outros de agora, não tiveram tempo, talvez, de pensar em tão grave problema. Poderão, os errados contra o Céu, ludibriar a si mesmos e ao mundo, porém jamais ao próprio Céu.
“Tira-o, tira-o, crucifica-o” – João, cap. 19.
Eis como exclamaram, aqueles que foram pagos pelo Sinédrio, para exigirem a crucificação do Maior Missionário que a Terra conheceu, o Portador da Graça e da Verdade para toda a carne.
“E baixando a cabeça, rendeu o espírito.” – João, cap. 19.
Não convém pensar no nascimento, sem ser para aquilatar dos deveres que cumpre levar a termo; e não convém pensar na chamada morte, sem ser para aquilatar das condições em que o espírito o faça. As falanges ou legiões luminosas envolveram a Jesus, indo Ele passar pelo sono reparador, para como espírito retornar a seguir e prosseguir nos trabalhos, pois Lhe cumpria ainda providenciar o batismo do espírito.
“Não me toques, porque ainda não subi a meu Pai, mas vai a meus irmãos, e dize-lhes que vou para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus.” – João, cap. 20.
Como diz o capítulo acima, Jesus retornou fazendo-se acompanhar de outros espíritos. Salientou a Sua condição de irmão de todos eles, de igual em ORIGEM, PLANO EVOLUTIVO e FINALIDADE. Sua condição de Cristo ou Verbo é pura questão de evolução e de capacidade funcional. Tratemos de crescer, para merecermos as mais altas funções dentro da Lei; nunca porém para perdoar pecados ou para derrogar o Princípio Fundamental de Equilíbrio. Jesus nunca proferiu certas palavras ou cometeu atos que Lhe atribuem. Ele veio para cumprir Ordens Divinas e não para alterá-las a Seu bel prazer.
Os outros narradores constituintes da SÉRIE DO CÉU, de uma vastíssima obra de esclarecimentos, fizeram completa exposição das verdades que deviam ser apresentadas, através do Consolador. Assim como eu, alguns foram grandes errados, havendo também narrativas de elevadíssimos vultos, que se ocultaram atrás de nomes sem as auréolas históricas. Quem ler a SÉRIE alcançará o conhecimento de muitas e interessantes verdades, além de algumas graças que se hão de revelar, pois foi-nos ordenado assim dizer, sendo exato que assim será feito, porque atrás das centenas de grandes vultos servidores, está a Palavra Impassável de Jesus Cristo.
É muito fácil reconhecer o grau de superioridade do Cristo sobre as Grandes Revelações anteriores:
1 – Ninguém foi tão anunciado como Ele, desde que a Terra existe, desde que Grandes Revelações foram enviadas à Humanidade terrícola. As Revelações vinham em caráter esotérico e em caráter esotérico permaneciam. Ele, entretanto, que foi anunciado desde remotos dias, e no seio dos mais diferentes povos, quando veio foi para trazer a Graça e a Verdade para todos e de maneira toda especial.
2 – Nenhum Emissário vindo, em qualquer tempo, teve um Preparador do Caminho nas condições em que Jesus o teve. Elias, também anunciado desde séculos antes, ( e os dois últimos versículos do Velho Testamento cabem a estas promessas do Céu ) fez-lhe o serviço de Assessor Messiânico, abalando as mentes de toda Israel em favor do Celeste Prometido.
3 – O Precursor e o Precursado surgiram da Escola de Profetas de Israel, a Fraternidade dos Essênios integrou-se no movimento denominado o Caminho do Senhor, vindo seus vultos a se tornarem os baluartes do movimento, enfrentando ódios e perseguições, prisões e martírios.
4 – Ao contrário dos demais e anteriores Reveladores, Jesus Cristo anunciou a Sua volta como espírito, pois somente como espírito é que selaria o cumprimento da promessa do Céu, de batizar toda a carne em Revelação. O acidente da morte foi ultrapassado na função Messiânica do Cristo, pois o Seu testemunho de batizador em espírito, começaria com a Sua própria volta depois da morte.
5 – O Pentecostes resume, a um tempo, a Lei, o Amor e a Revelação; resume a promessa cumprida, a Igreja Viva, instrutiva e consoladora, entregue à Humanidade através de algumas centenas de discípulos. Era a palavra de Jesus que se cumpriria, pois o testemunho da Graça e da Verdade aos poucos atingiria até às extremidades da Terra.
6 – O Espiritismo é, por ser a restauração do Caminho do Senhor, testemunha das verdades proféticas. É Jesus que volta, sobre as nuvens do Céu, para o serviço de espiritualização da Humanidade, antes que chegue a grande hora de separação entre cabritos e ovelhas. Porque haverá essa hora e muitos não herdarão a Terra do Porvir.
7 – Quem quiser prestar atenção verá, como dois fatos históricos se acham em tudo ligados. Em seguida à crucificação do Cristo, deram-se aqueles fenômenos e acontecimentos relatados no Livro dos Atos, pormenorizando os trabalhos iniciais, sendo a comunicabilidade dos espíritos o motivo essencial do movimento. A manifestação mediúnica alertava cérebros e consciências, fazendo avançar a Excelsa Doutrina, convencendo a ponto de fazer mártires, sobrepondo à perseguição e à morte as verdades eternas. E com o Espiritismo dá-se o mesmo, pois embora não mais sejam necessários os martírios, a comunicabilidade dos espíritos é a chave-mestra do renovo espiritual da Humanidade.
Eis alguns dados doutrinários e históricos, que fazem reconhecer em Jesus a Soberania Planetária, a Centralização Diretora, sem termos que fazer comparações de caráter individual, onde Ele teria a dianteira em todos os sentidos, pois ninguém veio autorizado a fazer aquilo que a Ele cumpriu – ser o Divino Portador da Graça e da Verdade para todos, vindo a ser, também, na hora da reposição das coisas no lugar, o Divino Distribuidor de Serviços, em concordância com a Lei, sempre a par com a lei de Causa e Efeito, reflexo pleno da Justiça Integral.
Há um sentido de plenitude, em Graça e em Verdade, que emana forte e sublime da personalidade de Jesus Cristo; é que, contrariando os antigos Grandes Reveladores, foi por Deus devolvido ao seio dos discípulos, para, vencida a morte estabelecer entre os dois planos, contato consolador e instrutivo. A linfa cristalina e pura verte maravilhosa da palavra imortal; em que outro se soube de semelhante estado de Graça e de Verdade? A quem foi conferida semelhante autoridade? Eis a palavra estuante de esplendor, cheia de consolo, que por tantas gerações fora esperada:
“Assim que, exaltado pela destra de Deus, e havendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou sobre nós e a este, a quem vós vedes e ouvis.” – Atos, cap. 2.
E para que não houvesse dúvidas, ou para que ficasse patente que a Doutrina Excelsa vinha para superar e ultrapassar a tudo quanto fosse de todos os tempos oferecido à Humanidade, porque vinha proclamar abertamente as verdades fundamentais, sem mistérios e sem portas fechadas, sem rituais e sem mercantilismos, sem clerezias interruptoras e corruptoras, eis que diz o texto:
“Porque para vós é a promessa, e para vossos filhos, e para todos os que estão longe, quantos chamar a si o Senhor nosso Deus.” – Atos, cap. 2.
“E a toda a pessoa se lhe infundia um grande temor; e eram obrados pelos apóstolos sinais e prodígios em Jerusalém, e em todos havia um grande medo.” – Atos, cap.2.
O mediunismo assim manifesto, produzindo curas e outros sinais, certamente havia de abalar as mentes e estimular os corações. O Cristo crucificado e devolvido à vida e ao seio apostolar, crescia de monta em virtude do cumprimento da celeste promessa. Por isso mesmo que surgiram expressões deste quilate:
“Estendendo a tua mão a sarar as enfermidades, e a que se façam maravilhas e prodígios em nome do teu Santo Filho Jesus.” – Atos, cap.4.
“Por isso se demoraram ali muito tempo, trabalhando confiadamente no Senhor, que dava testemunho à palavra de sua graça, concedendo que se fizessem por suas mãos prodígios e milagres.” – Atos, cap.14.
Já ficou dito que o fim do batismo de espírito é provocar, aos poucos, aquele intercâmbio pleno, aquela condição de fáceis e consoladoras relações entre dois planos da vida. Aquilo que foi chamado de prodígio e milagre, nada mais sendo que fenômeno mediúnico, havendo começado de maneira assombrosa para muitos, estando em fase de incompreensão para outros, deverá constituir a rotina porvindoura. O Universo marcha sempre para seu mesmo centro fenomênico, havendo que, por evolução, atingir o ponto ideal, a plenitude consciencial. É normal que o mundo dos efeitos retorne consciente ao mundo das causas. Todos os filhos hão de se fazer, por evolvimento, Cristos e Verbos. As unidades dissociadas tornarão a fazer parte consciente da UNIDADE FUNDAMENTAL. Os dois planos da vida farão a comuna, porque as extensões mediúnicas a isso levarão.
E para aqueles que já puderem entender, não será por causas misteriosas, milagrosas ou prodigiosas, e sim por injunção das leis fundamentais. Ao crescer nos indivíduos componentes da Humanidade a extensão vibratória e mediúnica, certamente haverá o crescimento dos poderes de contato, da Revelação ostensiva.
Podemos afiançar, de ordem superior, que o Divino Mestre aguarda a cooperação de todos os elementos conscientes, a fim de apressar esse feliz evento. Por isso é que vos temos falado em Lei, Amor e em Revelação, com insistência. Todos aqueles que quiserem agir bem, estarão cooperando com Jesus. Ai porém, daqueles infelizes que, sob pretextos vários, continuarem truncando a marcha progressiva da Humanidade. Ninguém tem o direito de ficar na porta e, não entrando, constituir o entrave à entrada daqueles que poderiam fazê-lo...
O serviço de unificação deve prescindir e prescinde realmente dos conchavos e das maquinações subalternas; porque é no seio da Verdade que se dará a junção, e não no seio dos interesses inconfessáveis, dos objetivos imorais e amorais pretendidos por aqueles que tudo reduzem a simples fórmulas econômicas e maliciosas. A hora cíclico-histórica reclama renovações de base, não permuta de maquinações e de trocas cavilosas. Antes de fazerem os homens os seus entendimentos e contratos, perguntem se estão de acordo com o Plano Superior. Sou completamente insuspeito para falar em nome do BOM SENSO; estou capacitado, categorizado e autorizado a falar em nome da Lei. Por isso recordo: muito cuidado com os objetivos de toda e qualquer ação. O que não estiver com a Lei, o que não estiver com o Amor e a Revelação, não estará com o Cristo; e aquilo que é marginal ao Cristo não se recomenda. Desculpas convencem a homens, nunca porém convencerão a Deus.
Mais do que nunca, mais do que em tempo algum, cumpre se façam esforços pela melhora espiritual da Humanidade. Novos tempos são novos encargos, novas obrigações, outras extensões no âmbito das responsabilidades. Aquele que ficava bem como supersticioso, como idólatra e feitor ou cultor de simulacros, terá que avançar e formar ao lado daqueles que se aproximam da perfeição, que sabem e vivem a Doutrina do Espírito e da Verdade; daqueles, enfim, que se avizinham da DIVINA ESSÊNCIA, da LUZ FUNDAMENTAL, que é o CENTRO GERADOR ou Deus. E como a LUZ FUNDAMENTAL é simplesmente íntima, é naturalmente o PRINCÍPIO, eis que, uma vez procurada no íntimo, em base de Lei, de Amor e desabrochamentos mediúnicos, teremos o filho a brilhar, a refletir a DIVINA LUZ do Pai.
Urge, pois, que se abandonem os ronceirismos idólatras ou pagãos, em benefício da Celeste Conexão, daquela unificação de que falaram todos os Grandes Reveladores, daquele ato de consumação unitária de que Jesus tanto falou, e por quem tanto fez, pois abrir as portas das Fraternidades Iniciáticas era o máximo que poderia ter feito. Representou e representará, em qualquer circunstância, oferecer o necessário acesso a quem tenha vontade de crescer, de ser aquele grão de mostarda capaz de ser útil a quem dele quiser acercar.
Não será possível alcançar esse estado de graça, porém, sem que se faça a criatura acima de vícios idólatras. A mediocridade jamais tomará o posto da Sabedoria e do Amor. E ninguém pretende ver o Amor e a Sabedoria em situação humilhante, escravizada sob os pés ou sob as maquinações daqueles que tudo reduzem a meros problemas de bolso, de estômago e de programações aparentemente religiosas, programações que o fazem parecer ministros de Deus e autoridades em fé, quando realmente são apenas negocistas do reino deste mundo à custa da fé.
Que é um espírito desconhecedor de sua ORIGEM e FINALIDADE? Que é um coração que subordina o problema do AMOR aos salamaleques rituais inventados por homens? Que é um cérebro vazio de conhecimentos fundamentais? Tudo isso é apenas tudo aquilo de que está cheio o mundo, as religiões, aquilo que todos os dias passa para estes lados, para estas esferas, elementos que se não vão diretamente para as trevas, também delas não ficam longe. Se não chafurdam no pranto e no ranger dos dentes, nem por isso deixam de ser os eternos medíocres, predispostos a novas etapas carnais em condições e situações deficientes. Esse o roteiro que a idolatria indica. Esse o filho da corrupção. Eis aí a marca da idolatria elevada ao grau de culto religioso.
Bem vedes que não estamos falando aos coxos, aos surdos de espírito; bem vedes que estamos apelando a quem mais tem, para que mais venham a ter. Aos que ainda militam nas esferas inferiores de compreensão, aos que carecem de dobrar joelhos diante de exteriorismos pagãos, convém não reclamar outras e melhores obrigações de cultura religiosa. Estamos pedindo mais aos que mais possam dar, para que não falte ao grande número pelo menos uma certa quantia de elementos em prol, de filhos de Deus equipados de verdadeiros valores, criaturas acima de posturas simiescas, elementos capazes de melhor sintonia, instrumentos de mais afinado contato, diletos trabalhadores, empreiteiros da Verdade pela Verdade, do Amor pelo Amor, da Revelação pela Revelação, funcionários de escol, incapazes de transformar as Graças Fundamentais em objeto de industriosas maquinações utilitárias, de ronceiras e grosseiras aplicações.
O Plano Superior, para agir nas esferas inferiores do astral e na crosta, necessita de elementos capazes, de incontestável padrão psíquico; é notório que esse número deve tender ao crescimento; conseqüentemente, apela-se nesta hora de intensa transição cíclica, para aqueles que sejam capazes de sobrepor aos simulacros e aos engodos o culto de Deus em Espírito e Verdade, a mais intensa suficiência espiritual, para que surja daí a mais eficiente exemplificação social.
Apelamos, portanto, em nome do Céu, para aqueles que desejam portar-se diante do mundo como sendo capazes de severas exemplificações; o Evangelho do Cristo, o Seu Divino Exemplo, é a verdadeira Carta Magna da Humanidade. O que se procura é encontrar dignos servidores, no rol das hostes restauradoras e consoladoras; é fazer que cresça o número de verdadeiros filhos doutrinários do Evangelho, na hora em que tudo tende a voltar para trás, caindo nas garras da pagodeira comercialista e pagã, pelo fato de estarem certos vícios comprometedores reclamando honras e impondo condições.
Um simples pescador, feito por Cristo pescador de almas, deu o primeiro testemunho da Igreja Viva, edificada sobre a Revelação, no nascedouro da Revelação trazida para toda a carne; ninguém conseguirá ver mais do que isso nos dois primeiros capítulos do Livro dos Atos. É o Cristo espírito que volta, que batiza em espírito. É o pescador humilde a dar testemunho do Batismo trazido para toda a carne. Tinha começo a grande fase em que ninguém adoraria a Deus sobre amontoados de aparatos simulosos e retrógrados, mas sim em Espírito e Verdade, pelo conhecimento que a Revelação de portas escancaradas iria fornecer.
E o pescador humilde, prevendo a força do vício a carregar sobre o homem, calculando a fraqueza humana em face dos erros e das corrupções tradicionais, preveniu para que se não permitissem volver o cão ao vômito e porca lavada ao lodaçal... Velho e a findar seus dias, lavrou seu ato de severa advertência, estribado no conhecimento da Graça trazida por Jesus Cristo; sua advertência no entanto, perdeu-se na falta de consciência dos homens de dois séculos depois, na Roma decadente, pagã e faminta de dominação. Eis que transformaram o mesmo velho e humilde pescador em palanque de absurdos, atirando-lhe às costas a responsabilidade da corrupção, sabendo, embora, que foi ele o primeiro a dar testemunho do derrame de espírito sobre toda a carne; que foi ele quem melhor falou diretamente sobre a possibilidade de retornarem as gentes ao erro. Pois foi justamente ele o escolhido pela nossa inconsciência, para servir de paradigma do erro, de chefe da corrupção, com a volta do cão ao vômito e com a volta da porca lavada ao lodaçal! As Epístolas de Pedro ficarão, todavia, a clamar pela sua isenção no tremendo crime de traição à obra messiânica de Jesus Cristo. Suas Epístolas e suas palavras:
“E como eu tivesse começado a falar, desceu o Espírito Santo sobre eles, assim como também tinha descido sobre nós no princípio. E eu me lembrei então das palavras do Senhor, como ele havia dito: João na verdade batizou em água, mas vós sereis batizados no Espírito Santo.
Pois se Deus deu àqueles a mesma graça que também a nós, que cremos no Senhor Jesus Cristo, quem era eu, para que me pudesse opor a Deus?” – Atos, cap. 11.
Eis o grande testemunho daquele humilde pescador, que morreu na ocasião mesma em que Paulo também fora morto, e com eles muito mais, em defesa do Batismo de Espírito, da Graça e da Verdade trazidas por Jesus Cristo. E dizer que, em benefício do Império em tremenda decadência, dois séculos e algumas dezenas de anos depois, atacamos de rijo, liquidamos com os discípulos da Revelação, vindo a transformar o humilde pescador em chefe obrigatório da mais feia corrupção religiosa de todos os tempos!
Olhando para tudo quanto de animalismo desbragado a idolatria implantou; observando em que lavras de materialismo a liquidação do Batismo de Espírito meteu a Humanidade; e temendo pela hecatombe que se mostra ameaçadora nos horizontes da hora cíclico--histórica, rogamos o favor de alguma atenção, para que se levante no mundo uma barreira, a ser construída de espíritos conscientes, de gente superior aos engodos tradicionais. Porque sempre houve quem se entregasse às corrupções, em seguida aos renovos enviados pelo Céu. Sobre o cadáver do Grande Revelador, apareceram os urubus do comercialismo religioso, prontos a fazer das grandes verdades os maiores engenhos de maquinação capciosa. E quando erram aqueles que se dizem ministros de Deus, que mais esperar do grande número que apenas obedece inconscientemente?
Uma vez que viceja fragrante, estuante de esplendor espiritual a reposição do Caminho do Senhor, faça-se tudo para que não surjam mercenarismos traiçoeiros. O comércio das coisas materiais, das utilidades, esse deve obedecer às normas ditadas pelo respeito humano de fraternidade. Comércio sem decência não é comércio, é roubo que deve ser punido por quem de direito e de dever. Acima de tudo, porém, haja quem seja capaz de não transacionar com as manobras da inferioridade espiritual, de onde surtem imperiosos os desvios doutrinários. Quem se estribar na Lei e no Amor, saberá como cultivar a Revelação. E na hora de atender a certos convites, pretextando uniões, unificações, confraternizações, saiba cada qual ficar com o Cristo, que preferiu ser crucificado a bem da Verdade, para não crucificar a Verdade!...
Em nome da Lei, os criminosos sempre se dispuseram a defender suas prerrogativas.
Em nome do Amor, todas as arbitrariedades tiveram as sanções do mundo, mormente das organizações pretensamente religiosas.
Em nome da Revelação, muitos espíritos mentirosos e ignaros transformaram até criaturas honestas em falsos profetas.
Compete, portanto, saber que a Terra não melhorará à custa de conchavismos humanos, principalmente aqueles que visam a manutenção das organizações corruptoras ou avessas à Doutrina de Deus, trazida pelo Seu Verbo ou Cristo. Não aceitar, portanto, tudo quanto é feito em nome do Senhor, pois muitos que andaram clamando Senhor! Senhor! ainda palmilham os tredos abismos, sendo que outros se arrastam pelo chão terrícola, miseráveis e monstruosos, penando as culpas adquiridas.
A simplicidade não exclui a prudência, assim como a prudência não exclui a simplicidade. Se houver realmente prudência, certamente haverá verdadeira simplicidade. As próprias bases da Excelsa Doutrina ensinam como agir, ensinam a separar o joio do trigo.
A Lei testemunha a Revelação, não determinando cultos formais, antes proibindo-os, e reclamando decência de conduta social. Se religiões existem, e muitas já foram as que nasceram e morreram, a Lei delas não cogita, porque ela reclama apenas respeito pela Verdade Básica.
O Amor exemplificado pelo Cristo, alcança o seu máximo esplendor na doação do Cristo em face do martírio. Amar tanto a ponto de entregar-se pela Verdade. Nunca, porém a ponto de ceder aos Tibérios, aos Herodes, aos Pilatos, aos Caifaz de variantes graus e matizes.
A Revelação tem na própria Lei o seu tratado de conduta. Jesus, que veio para viver a Lei na presença da Humanidade, exercitou o Amor e a Revelação de modo harmonioso, sem deixar resquício de dúvida. Outros narradores já disseram o suficiente, não havendo motivo para me estender neste particular. Demais, o mediunismo incipiente de hoje, terá que crescer e tornar-se o intercâmbio glorioso do porvir. A questão é forçar no sentido correto. Por isso mesmo, pedimos para que sejam evitadas as idolatrias. E como seria estultícia pedir a todos, falamos aos elementos vanguardeiros, aqueles que sempre terão mais para dar, pois que se acham preparados naturalmente para receber. Os meninos, como já foi dito, farão coisas de meninos... Que adultos façam aquilo que lhes é da obrigação, sustentando diante do mundo aquela conduta que represente a melhor consciência da Verdade, o modelo humano da Sabedoria e do Amor.
É básico que a Humanidade se constitui de elementos heterogêneos em gradação evolutiva; que a escala se completa de zero a cem por cento. Portanto, que em cada um prevaleça, da melhor forma, a consciência da justa posição. Como seria impossível ao menos evolvido semelhante conduta, concita-se ao mais evolvido que faça o quanto possível, que mantenha alto o seu nível de conhecimento e ação. Nunca se poderá prescindir de fatores hierárquicos, na crosta ou nos planos espirituais. Logo, que a consciência de tal realidade não feneça naqueles que, por evolução, trazem consigo tais obrigações.
Em pureza religiosa, a obrigação é ambivalente: não cometer idolatrias e não dar mau emprego ao culto da Revelação. Quanto ao uso de simulacros, ou formas, a Lei é absoluta em seus preceitos. Quanto ao culto mediúnico, a Lei e o Amor determinam a seleção a ser feita. Podemos garantir, todavia, que em se evitando as práticas idólatras, também se estará eliminando superstições e outras influências inferiores, pois é próprio dos espíritos medíocres apelar para tais recursos. A finalidade é conhecer Deus em Espírito e Verdade, para chegar a agir como Espírito e como Verdade. Quem se escraviza a dogmas, ídolos, rituais, simulacros, etc., por certo não está trabalhando pela evolução, nem própria e nem da Humanidade.
João Evangelista, na sua Primeira Epístola, tratou deste problema de maneira integral; vede como encarou semelhante questão:
“Filhinhos, guardai-vos dos ídolos.” – I Ep. de João, cap. 5.
“Caríssimos, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus...” – I Ep. de João, cap.4.
A Lei ordenando não cometer idolatrias e o batismo de espírito ordenando que se apelem aos espíritos melhores ou santificados. Nada mais simples, nada mais justo, nada mais terra a terra com a dignidade da criatura.
Os fanatismos religiosos jamais existiriam, se houvesse o bom conhecimento da Verdade. Como se sabe ser Deus a Verdade, temos por Verdade as manifestações de Deus. E como as manifestações de Deus são através de leis, sabemos que o conhecimento das leis que regem os fenômenos significa conhecer a Verdade. Ninguém, segundo a Sabedoria Antiga, pretendia começar da parte para o TODO, mas sim do TODO, ou da UNIDADE, para a parte. Primeiro o alicerce, depois a edificação.
Isto é, começar do COMEÇO da UNIDADE, para ter certeza dos encadeamentos, em linha descendente. Este o ponto chave da Sabedoria, a linha mestra de todo o poder conceptivo. E para quem tivesse faculdades, forçavam o estado de êxtase, a visão da LUZ DIVINA, o chamado batismo de fogo. A seguir, tomando por base a conduta humana, o trabalho ascensional, a marcha evolutiva, vinha então o conhecimento das leis mínimas, das práticas iniciais. A preliminar nunca deixava de ser a conduta social, o tratamento humano. Sem fraternidade, nada feito.
Os espíritos conscientes usam dignamente as leis de Deus, e, por isso, aplicam bem a todos os elementos e recursos. E a conduta de quem sabe o que é e de como deve ser aplicado aquilo que se sabe. Pelo contrário, os espíritos medíocres nada sabem fazer com elevação, acreditando que formalismos e adulações representam a melhor conduta. Por isso mesmo, nos mundos inferiores o problema religioso é o problema das maquinações clericais, é o problema das aparências de culto e do comercialismo em nome da fé. Enfim, as práticas medíocres comprovam a mediocridade de seus autores.
Como se aproximam dias melhores para o Planeta, depois da tremenda transição por que terá que passar, o que estamos fazendo é precisamente isto – convidar cada qual a que faça o possível, a fim de acompanhar a sua marcha, a fim de não vir a ser contado entre os cabritos... Para isso, como temos dado provas através de nossas narrativas, lembramos as bases doutrinárias e os fatos históricos. Porque a Moral, o Amor e a Revelação, queiram ou não, estão nas bases de todos os eventos históricos da Humanidade. Vasculhando as antigüidades, encontrareis os escritos espiritualistas na base das mais remotas civilizações. A Diretoria Planetária de tudo tem zelado, na parte que lhe toca, para que não falte ao homem a instrução espiritual. Como não lhe toca ser responsável pelas liberdades individuais, quem comete faltas fica sujeito ao Supremo Determinismo. Nem mistérios, nem milagres, nem favores e nem desaforos. Apenas leis, sempre leis.
A Bíblia fecha o seu acervo de informes com o Apocalipse; e o último capítulo é formidável em sua capacidade de advertência.
Remetendo os tutelados ao Tutelar do Planeta, remetemos normalmente à Lei e ao Amor, a fim de que saibam como cultivar a Graça da Revelação. Isto quer dizer, então, que os errados como eu, eu e outros que andamos tomando parte no acervo de narrativas, vimos trazer o testemunho da Verdade que livra, o testemunho vivo, e testemunho eloqüente ao infinito, porque a nossa palavra, com ser autorizada pela Diretoria Planetária, contém a confissão das leis e dos fatos. As conseqüências de nossas obras erradas foram trevas e dores; e somos as testemunhas vivas da Lei. As conseqüências das nossas ações amorosas e sábias, estão custando o prazer de transmitir mensagens ungidas de elevado teor fraternal; e somos as testemunhas da Lei e do Amor!
Como a questão da hierarquia é indiscutível, ninguém poderia pretender contatos diretos com o Emanador e o Diretor Planetário, embora o Emanador seja infinitamente íntimo e a presença da Autoridade de Jesus seja fato consumado. Há que atender ao fator dos escalões hierárquicos, para que o sentido de fraternidade jamais fique à margem das transações entre irmãos. Quem quiser continuar resistindo ao Batismo de Espírito, certamente estará resistindo à Deus e ao Cristo. Nem por isso, entretanto, irão prejudicar em muito a evolução planetária. A Lei confere relativas liberdades e responsabiliza pelas obras, uma vez que nenhuma liberdade tem o direito de ser contra a Lei Geral de Harmonia. Cristo, agindo em sintonia com a Lei, e não podendo ficar com o Templo, antes sendo por ele escorraçado, foi cumprir com o Seu dever no seio do povo, nas ruas e nas praças. Portanto, lembrando os deveres de hierarquia e de fraternidade, lembramos que há muita diferença entre o rótulo e o conteúdo, entre as aparências e essências. Gente como eu, que tanto concorreu para estabelecer o erro, tem por obrigação advertir; para fazê-lo em base de simplicidade, diremos que autoridade espiritual se reconhece nos valores espirituais e não nas aparências fornecidas pelo mundo exterior.
Se do ponto de vista hierárquico, o merecimento estivesse nos rótulos ou nas aparências, Jesus Cristo teria perdido tudo em favor de Anaz e Caifaz, de Pilatos e de Herodes... Importa é saber isto: de tudo aquilo que o homem tem e ostenta, o que sobrará para depois do túmulo? Luzes e Glórias ou tremendas decepções?
Em muitas coisas da vida e para muitos efeitos, ao falarem as essências, recorrem aos sucedâneos; em matéria de Lei, de Amor e de Revelação, cremos que não adiantam semelhantes recursos. Eu, por exemplo, sou prova disso. E aqueles que mais fizeram pelos sucedâneos, depondo contra as essências puras, já disseram de suas respectivas tragédias. Com a hierarquia não se deve facilitar.
Nos dédalos infinitos do espaço e do tempo, comporta-se o espírito como quem de direito agencia leis e valores íntimos, registrando em si as reações, comprometendo-se com isso a ser feliz ou infeliz. Atuando sobre si mesmo, para desabrochar o Céu ou para cavar suas trevas e dores, nem sempre o faz com o devido e necessário conhecimento de causa, tomando muitas vezes a nuvem por Juno, colocando as práticas idólatras no lugar da Sabedoria e do Amor. Cede, por injunção da ignorância, situando alto os manobrismos inventados por homens, a fim de rebaixar a Virtude. Essa tem sido a conduta humana, salvo raríssimas exceções. Mormente ao se tomar o culto da fé simples meio de vida, processo de garantir a subsistência, por parte de indivíduos ou agrupamentos.
E a separação entre os dois planos de vida, causada pelo acidente chamado morte, quase sempre entra em cena para causar tremendos abalos e dolorosas decepções. As presunções e as bazófias caem por terra, ficando o espírito, acostumado em suas altas prerrogativas, a gemer cruciantes estados, abandonado nas trevas e por vezes perdido na incomensurável tragédia dos abismos desérticos, onde aflições e gemidos se erguem por todas as partes, sem ao menos serem vistos, parece que apenas existindo para não admitir a mais fugaz idéia de esperança. Como é terrível trocar as pompas e os rótulos do mundo pela devastação geral produzida pela morte! Quanto é triste não ter a menor idéia de esperança, o menor sentimento de que tudo um dia terá passado, continuando o espírito a sua marcha progressiva!
Surgem, então, os brados desesperantes – Senhor! Senhor!
E o Senhor, por Lei e por Justiça, responde através do silêncio, do abandono e da treva – Não vos conheço. Apartai-vos de mim, os que obrais a iniquidade.
Figurões do mundo, tende muito cuidado sobre vós mesmos; porque de tudo chega a hora. E como escapulários humanos de nada valem; e como perdões e absolvições de institutos inventados por homens de nada resolvem, eis que a treva assalta, eis que o pranto e o ranger de dentes envolve a criatura e a faz vítima de suas próprias condições criadas.
Perguntarei pelo valor dos recursos comprados aos mercados religiosos do mundo, mergulhados na aflição mais negra e devorante; e pelos caminhos da tragédia imensa, a Lei e a Justiça falarão pelo Senhor, respondendo – Onde estão as virtudes salvadoras? Onde esquecestes o Amor e a Sabedoria? Aí está que, concorrendo aos simulacros inventados por homens, vos esquecestes das práticas dignas em sociedade. Ficai pois, com aquilo que é vosso. Apelai para vossos ídolos, apelai para vossas invenções, continuai a confiar na mentira.
Foi o que aconteceu, é o que está acontecendo em milhões de casos.
Ao deixar o mundo, envolvido por amigos, fui dormir o meu sono reparador. Ao acordar, sentindo-me leve qual pluma, feliz a mais não poder conceber, vi que tinha ao redor dezenas de amigos e de parentes já desencarnados. Dentre eles, compareceu esbelto e simpático vulto que assomando à frente de todos, falou:
– Pierre, aqui estou... Sou Eugênio, o seu guia...
Se é certo que cada um dos que se foram apresentando custou funda emoção ao meu coração de recém desencarnado, mais certo é que Eugênio fez-me sentir profunda comoção emotiva. Aquele que fora, por quase cinqüenta anos, um constante e digno mediador entre os altos planos da Grande Vida e eu, fez-me realmente considerar a importância dos motivos causais da existência. Minhas lágrimas foram os meus agradecimentos. Quis beijar-lhe as mãos; ele porém não concordou, afirmando:
– Pierre, a vida é, queiramos ou não, o processo evolutivo natural. Estamos formando, no vasto mecanismo, a nossa própria caracterização psíquica. O produto da movimentação, em concordância com a grande Lei de Harmonia, é o benefício geral, é a colheita coletiva, é a elevação consciente, é a religação com a LUZ DIVINA. Qual de nós foi mais bem sucedido? Eu não sei ao certo, irmão Pierre. Sei, todavia, que em virtude dos nossos respectivos comportamentos, aqui estamos respondendo graças ao Céu, pela colheita que fizemos.
Comovido, ainda murmurei:
– Sim, Graças ao Céu!...
Eugênio repetiu a sua palavra de sempre:
– O Céu é sempre perfeito e completo. O Céu não depõe contra quem quer que seja. Ao render graças ao Céu, consideremos o bom caminho trilhado, a justeza e a precisão dos esforços empregados... Muitos daqueles que confiam no Céu, de tal modo se portam, de tal maneira agem, que o Céu os repele. Sempre disse e repito, Pierre, a linha certa a ser observada – “Faça-se em nome do Céu, aquilo que é do Céu!”. Verdadeiramente, as trevas exteriores estão cheias de elementos que, de um ou de outro modo, andaram acreditando em Deus e tendo lá a sua religião. Como porém a lei é Justa e a Justiça se impõe, exclamar Senhor! Senhor! de nada vale. O que vale é não esquecer da Sabedoria e do Amor nos tratos sociais, pois as macaquices feitas a título de obras de fé não convencem ao Senhor.
Fazendo silêncio, apresentou a um outro, majestosa figura irradiando fortaleza e bondade:
– Gastão, o nosso chefe. Sempre lhe falei dos nossos superiores, não é verdade? Gastão é o chefe da nossa comunidade servidora.
Vindo abraçar-me, Gastão falou-me:
– Subordinado, graças a Deus, a outros chefes, aos quais sirvo com grande satisfação. É a Ordem Divina que se movimenta, que se filtra e impõe pelos escalões hierárquicos. Servindo uns aos outros, obedecemos a Deus e colhemos vantagens na própria obra levada a termo.
Fora grande, a seguir, a movimentação das apresentações. Alguns tinham vindo de outras esferas, de outras regiões, de outros departamentos de trabalho, para visitarem o amigo recém-desencarnado, o companheiro de serviços, aquele que fora servido e que nalguns casos também servira. Quanta alma! Quanto reconhecimento! Quanto amor em tudo aquilo! Penhorado de gratidão, parecia-me desfazer o coração em pedacinhos, a fim de ir-se por toda aquela multidão de parentes e amigos.
Ao cabo de tudo, Eugênio convidou-me:
– Pierre, vamos também nós daqui. Esta casa, onde você dormiu o seu sono reparador, tem por função apenas isso. Quem merece, para aqui é trazido, somente para dormir o seu sono reparador. Deixemos, portanto, esta casa; vamos para o nosso departamento, pois você está inscrito como seu funcionário, faz muitos anos. A sua inscrição foi feita, depois de vinte e dois anos de trabalhos no mundo... É que, no seu passado, havia muita coisa a ser reparada; isto é, devia reparar no presente a muitas lesões do passado. Quando, pelo trabalho, atingiu o ponto exato de rearmonização, deu-se a sua inscrição no departamento em que trabalhamos, eu e centenas de outros, sob as ordens de Gastão.
Ouvindo falar em passado, lembrei-me de visões tenebrosas, perguntando:
– Sim, o meu passado... É certo, Eugênio, que andei cometendo tremendas faltas?
Assentiu com a cabeça, indagando:
– Não lhe mostramos, algumas vezes, para fins de observações os lugares onde foram massacrados aos milhares os discípulos do Caminho do Senhor? Você não reviveu cenas terríveis, com fedores e tudo? Não lhe ficaram gravadas nos ouvidos as palavras de acusação e agravo, de misericórdia e de perdão, vibradas por aqueles que preferiam a morte, a trair ao Divino Portador da Graça e da Verdade?
– Então, Eugênio, fui mesmo um inquisidor?!...
Eugênio abanou a cabeça em sinal de não, ficou muito triste e balbuciou:
– Não, Pierre, você não foi apenas um inquisidor... Muitos inquisidores agiram, mais tarde, acreditando na justiça do Santo Ofício, apesar de ser ele contradição à Lei de Deus. Todavia, tiveram suas dirimências, porque encontraram a instituição em pleno funcionamento criminoso, agindo como se fosse realmente uma das guardas doutrinárias . Você foi, entre muitos outros, pior do que um simples inquisidor... Porque foi um dos corruptores do Caminho do Senhor!... Sob as ordens de Constantino e seus imediatos políticos, chefes militares e dominadores, vocês crucificaram o Cristo pela segunda vez... Vocês liquidaram com a Excelsa Doutrina, edificada pelo Divino Mestre sobre a Lei, sobre o Amor e sobre a Revelação. Vocês truncaram, por muitos séculos, o Caminho do Senhor. Vocês fizeram verter o sangue de milhares de milhares de criaturas, além de terem imposto ao mundo as trevas da idolatria e do materialismo. Liquidando com a Revelação, para criarem a Igreja Católica Romana, no quarto século, vocês espargiram pelo mundo avalanches de erros, de falsas doutrinas, de animalismos desbragados. Aqueles mais simples e ignaros, tornaram-se crédulos e supersticiosos; aqueles mais inteligentes e analíticos, descambaram para o materialismo e para a brutalidade. Eis o que vocês fizeram, contra o Cristo e contra a Humanidade. Realmente, eis o que vocês fizeram contra vocês mesmos...
– Santo Deus!... – exclamei, profundamente conturbado.
Eugênio falou-me, conselheiro e fraterno:
– Não se aborreça agora, que quase tudo está reparado... Grandes lavras foram levadas a termo, lavras que resultaram nos benefícios do presente e nas glórias do porvir. Lembre-se, Pierre, que grandes resgates foram feitos.
– Agradeço a Deus, agradeço a Jesus e a vocês todos...
Ele interrompeu-me, para dizer:
– Quanto a mim, não tem de que agradecer, pois também andei metido naquelas coisas feias... Meus erros foram decorrentes dos seus, por isso obtive boa soma de dirimência. Já lhe disse, o Santo Ofício parecia ser mesmo a guarda fiel e necessária da Igreja. Foi por isso que, embora reconhecendo ser ele contrário à Lei de Deus, ainda lhes demos completa guarida, aplicando-o rigorosamente. Não tivemos, eu e muitos mais, conhecimento algum de ser a Igreja Romana a corrupção do Caminho do Senhor. Assim como agora acontece, que os clérigos e o povo confundem catolicismo romano com Cristianismo, assim mesmo nós o entendemos no século sete, quando foi consolidado o papado, quando aumentou bastante o rigor do controle inquisitorial.
Estava eu meditando gravemente naquelas questões, sem ter coragem para falar, quando se chegou radioso vulto feminino, espargindo graças espirituais e absorvente simpatia.
– Isabel... Isabel foi uma das mártires do seu movimento corruptor...
Não tive acanhamento algum, diante daquela vítima de outrora, porque ela esplendia graças espirituais para mim indefiníveis, porém altamente convincentes. A sua alegria, tão pura e tão penetrante, tão viva e tão envolvente, derreteu em mim qualquer resquício de receio ou de introspecção. Ela abraçou-me, falou-me e tomou conta de minha alma. Parecia feita de amor, de graça e de virtude.
Quando falou, aparteou as palavras de Eugênio.
– Antes de ser vítima do seu movimento corruptor do Caminho do Senhor, fui feiticeira no tempo em que Elias viveu e deu grandes provas em favor do Deus de Verdade e de Justiça. Escapei da morte por haver fugido em tempo, continuando a servir à rainha Jezabel, que por sua vez acreditava em Baal e Astartéa, como deuses superiores ao Deus Vivo de Israel. Pode ver, portanto, que andou fazendo justiça ao lançar-me no suplício da fogueira...
– Andei cometendo gravíssimas faltas, pois ninguém tem o direito de contrariar a Lei de Deus.
– De qualquer maneira – revidou ela – eu teria que pagar pelos meus erros, assim como você pelos seus, e, assim por diante, todos os que erram devem resgatar seus erros. A Sabedoria Divina, entretanto, na hora justa vai buscar o elemento com que fazer acertar os passos ao que disso carece. Quando menos a criatura perceber, estará sendo servida ou estará sendo servidora da Lei. Quem erra entre irmãos, entre irmãos acertará. Disto, ninguém jamais poderá furtar-se. E agora, que estamos em melhor posição perante a Lei de Equilíbrio, vamos tratar de quem está precisando de nossos trabalhos?
– Convite ao trabalho é convite ao progresso – comentou Eugênio, fagueiro.
– Estive no seu departamento – esclareceu ela – para Gastão tomar conhecimento do caso em vista. A ordem veio de esfera bem mais alta, endereçada para vocês, em virtude da volta de Pierre aos quadros de trabalho.
Depois que ele falou, explicou Eugênio:
– Isabel é mensageira entre vários departamentos. Ela transmite ordens e sabe muitas particularidades sobre assuntos os mais vastos, estando a par de fatos e de questões de grande importância, fatos e questões que envolvem elevadíssimo número de irmãos. Ora, dentre eles, como poderá calcular, muitos se acham na carne, muitos se encontram nas zonas de trevas, outros muitos perambulam pela atmosfera da Terra, e, ainda outros vivem em planos ou esferas de nosso próprio mundo, ora mais para baixo, ora mais para cima. Como vê, Pierre, a vida continua e os fatos pertencem a seus feitores, para todos os efeitos. Os indivíduos e suas questões formam a História Geral, sendo que cada qual tem os seus particulares a atender, a fim de evoluir em si mesmo e de cooperar na evolução da coletividade. O que é acima de cogitações, no entretanto, é isto – ninguém jamais poderá ser e agir de maneira isolada, nem tão pouco furtar-se às leis de Causa e Efeito. Como está observando, nós e o nosso histórico formamos um todo, uma unidade. Quando quisermos vir a ser melhores e mais felizes, somente poderemos fazê-lo agindo no próprio âmbito histórico. Não é certo que nos encontramos entrelaçados pelos fatos? Não é certo que estamos agindo em conformidade com os fatos remotos? E no futuro, ao termos que assentar condições de trabalho no plano carnal, como poderíamos sair fora do círculo histórico e das relações entre indivíduos pertencentes ao mesmo círculo, em fatos e em história?
Isabel anuiu:
– Nossas ações, ou nossos fatos históricos, nos prendem às mesmas ações e aos mesmos fatos históricos. Por isso mesmo, no curso dos milênios, estaremos sempre relacionados, os fatos e as criaturas. Bem por isso, felizes aqueles que se entregam a bons trabalhos, procurando sempre harmonizar com a Grande Lei de Equilíbrio, de quem tanto faz lembrar a Lei de Deus, o Decálogo. Porque este, ao preceituar, lembra a necessidade de não contrariar o equilíbrio íntimo, de não criar lesão na organização do caráter. De resto, uma vez criada a lesão, ninguém escapará ao dever de reparo. Resgatará até o último ceitil, continuando a marcha em benefício da Sabedoria e do Amor. E como tudo é em base de intimidade, de fatos consumados, aí temos que não existem milagres, nem mistérios, nem favores e nem desaforos em Deus. Não se justificando, portanto, dogmas, rituais, idolatrias e simulacros exteriores de qualquer espécie. O Reino do Céu, que é interior, como Jesus o elucidou muito bem, e como dele assim mesmo falaram os Grandes Iniciados de todos os tempos, é unicamente uma questão íntima, uma questão de Pureza e de Sabedoria, um caso de consciência.
Feita a sua anuência , perguntou-me:
– Gostaria de servir a alguém que tanto necessita de seus deveres?
– Isenção feita de minhas falhas e fraquezas, queira ter a bondade de me utilizar, naquilo que esteja ao meu alcance, irmã Izabel. Como sabe, sou recém-vindo, pouco ou nada tendo para dar...
Envolvendo-me com a sua aura, ela interrompeu-me com a sua palavra ungida de suma irmandade e doçura cristã:
– Não lhe seria fácil atender a um companheiro de erros e crimes? Sem ter o que pensar, não poderia apiedar-se de quem tanto errou e de quem tanto clama pelo Deus da Verdade e da Justiça?
Assim alertado, expliquei-me:
– Renderia graças a Deus, pelo fato de ser útil, pois que reconheço imensamente o quanto há de vantagem na reparação dos males e no reatamento das amizades. Quanto é sublime, irmã Isabel, tornar a conhecer as pessoas e tornar a ser útil a Deus e aos irmãos. Faça o favor de ordenar, que minha vontade é servir, é alcançar a graça de ser útil. Nunca pensei tanto, irmã, nas vantagens de ter o que fazer de bem e de bom pelo próximo.
Isabel sorriu, ela que era toda feita de amor e de cordura, dizendo:
– Vamos embora. Vamos, que está na hora.
Segundos depois, eis-nos ao rés do chão terrícola, defronte a um homem chagoso, em miserável estado, febrífugo e em estado de coma, num arrabalde de Paris, atirado a um canto de terreno baldio. Estava em farrapos, cheio de moscas, emporcalhado e mal cheiroso. Ao lado, agarrados a ele, estavam quatro vultos iguais, em idênticas condições, que não nos viram. Falavam idioma estrangeiro e comentavam sobre economia, achando que a Humanidade inteira acabaria em fome e desgraças derivantes, em assaltos e roubos.
– Aí temos um dos grandes errados do passado, um dos papas do século oito, que não encontra jeito de se elevar acima das muitas faltas pretéritas. Sempre que retorna ao mundo carnal, deixa-se influir pela sanha de domínio, procura ser superior a qualquer custo, reincidindo em erros e caindo em abismos de dor e de trevas. Nesta vida, tendo escolhido posição humílima, ainda assim deixou-se dominar pela sede de mando, forçando situação que lhe não favorecia pela programação anterior. Desesperado, depois de tentar inutilmente, abandonou a família e formou ao lado de muitos vagabundos e miseráveis. Entretanto, não prejudicou propositalmente, não cometeu crimes, como o fizera em outras romagens carnais. Os erros cometidos não lhe embargam o socorro desta hora, em que o pensamento se fundamenta, atingido pela dor e pelo abandono em que se acha.
Realmente se alguma coisa havia de vivo naquele farrapo humano, eram fraquíssimos lances mentais, que se esvaíam em forma de semi-apagadas florações esbranquiçadas, ao redor da cabeça. Não chegavam a um ponto de luminosidade, morrendo num fumaçado opaco, minguando no próprio nascedouro. Todavia, pelo que se sentia, era um grito de dor endereçado a Deus; era o rogo final, era apelação à morte, já que de tudo se achava liquidado, inibido de qualquer movimentação física. O ser imortal é que clamava em sua fragilidade.
Tornando a falar, Isabel esclareceu:
– Foi sustentado por todos os modos possíveis, a fim de aguardar pelo seu regresso, uma vez que se devem mútuos erros e mútuas obrigações ressarcitivas. Sua colaboração, irmão Pierre, acha-se no rol das leis cármicas. Deve-lhe amparo, deve-lhe socorro, porque ele acreditou nas vossas invenções corruptas, vindo a trilhar sendas erradas e criminosas. Se foi alguém que fez mal, também pode ele afirmar que herdou de outros a escola do erro e do crime. Quanto a você, agora que é consciente e tem algum valor espiritual, procure fazer o possível para libertá-lo da agonia em que se encontra, onde apenas o espírito sente o frio da morte e as agonias da treva imensa. Nós auxiliar-lhe-emos, Pierre, para que comece hoje mesmo uma bela jornada de trabalhos fraternos e harmoniosos.
– Ele deve deixar o corpo? – indaguei, contrito, com a alma em pena, diante daquele infeliz irmão, uma das grandes vítimas da corrupção doutrinária.
– Somente o coração e o cérebro ainda vivem nesse, muito tênue. Atraindo-o pela oração, fará com que deixe de vez o corpo. Será o passo inicial para a libertação relativa, digo bem, porque terá de renascer o quanto antes, para tentar novo programa e em melhores condições. Sabemos que, dadas as privações em que viveu e dado o sofrimento por que tem passado, sem se revoltar, tornou-se merecedor de tentar uma vida de serviços mediúnicos. Virá a ser, pelo que sabemos, um médium cheio de obrigações, atraindo a si elementos endurecidos e rudes, grandemente sofredores. Assim agindo, se cumprir com os deveres normalmente, apesar do grande esforço que deverá por em prática, certamente conseguirá elevar-se a bom nível reparador. Em outras vidas, então, poderá ele mesmo escolher programa, sempre no rol dos trabalhos espiritualistas, onde tantas faltas cometeu no passado; porque, como sabe, naquela esfera em que se errou é que importa reacertar.
Coloquei-lhe a mão sobre a cabeça, entrando a orar com o maior poder de concentração, pungido que estava diante daquele quadro penoso, sujeito que me achava àquela pressão de antigas culpas. Aos poucos, foi saindo uma nuvem branca, porém opaca, sem forma humana; era apenas comprida e horizontal, um floco parecia de vapor, que se mantinha no ar, a um metro acima do corpo. Aos poucos foi tomando a posição vertical, mantendo porém a condição de nuvem branca e opaca.
– Vamos conduzi-lo para junto do mar; façamos força mental para que nos acompanhe – disse Isabel.
Volitando, a alguns poucos metros do chão, fomos atingir o mar dentro de poucos minutos, pois a viagem foi feita lentamente. Ao chegarmos à costa, deitamos a fumaça em local verde, sobre a relva bafejada pelos ventos marinhos. E ali fizemos orações, com ambas as mãos aplicadas sobre ele. Foi então que a nuvem se adensou, achatou-se ficando mais ou menos do tamanho de um homem, embora continuando fumaça.
Isabel deu nova ordem:
– Vamos dar uma volta? Vamos então conversar com aqueles quatro irmãos que nada viram. Temos o que lhes dizer. Enquanto isso, este irmão irá assomando à sua consciência individual, irá tomando forma pelo seu próprio esforço mental. O poder da vontade, ao desaparecer, criou campo para essa condição infeliz. Abandonar-se ao nada, ou desejar ser nada, para não mais sofrer, custa desequilíbrios dessa ordem e outros mais. Além do mais, as energias do mar irão produzir seus efeitos, assim que começar a respirar e a ter consciência de si.
Atingindo o local onde jazia o corpo abandonado pelo espírito, e onde permaneciam indiferentes aqueles quatro vagabundos, Isabel adensou o seu corpo espiritual, a fim de entender-se com eles. Houve um diálogo interessante, porque os quatro não podiam admitir que fossem criaturas desencarnadas. Fazia anos que eram vagabundos de Paris; estavam com seus corpos perfeitamente densos; sentiam a vida plena através dos sentidos físicos e pensavam como criaturas normais. Isabel apelou então para os seus poderes, aparecendo e desaparecendo, iluminando-se e volitando, com o que eles ficaram amedrontados, julgando estarem diante de um fantasma.
Aos poucos, porém, foram cedendo, muito medrosos, até mesmo apavorados. Quando estavam em melhor estado, Isabel perguntou-lhes se não desejavam ir ter a um Centro Espírita, onde poderiam ouvir preleções e terem boas oportunidades de conhecimento do estado.
– Isto somente nos trará imensos aborrecimentos. Que adianta sabermos que somos espíritos desencarnados?!... Teremos mais comida, mais roupas, ou por acaso alguém nos dará o Reino do Céu?!... – começou a esbravejar um deles, acometido de nervosismo terrível.
Isabel deu-lhe respostas e mais respostas, explicando-lhe que o espírito cumpre atingir elevados píncaros hierárquicos, e que isso é possível somente através do trabalho íntimo, do desabrochamento das virtudes latentes, etc.
– E Deus?!... Onde está esse Deus?!... – respondeu ele às perguntas de Isabel, num tom de cólera.
Isabel tornou à fala, meiga e paciente, explicando-lhe que não existe o Deus antropomórfico, o Deus figura exterior, que muitos credos ensinam estar num canto qualquer do Universo, comandando a Emanação através de atos apalhaçados, despóticos, exigindo salamaleques pagãos, idolatrias e bajulações pagãs; falou-lhe do Deus íntimo e fundamental, da ESSÊNCIA DIVINA, cuja presença em tudo é como FUNDAMENTO SAGRADO; falou-lhe que o espírito é derivação dessa DIVINA ESSÊNCIA, importando totalmente que faça o trabalho de evolvimento íntimo, a fim de vir a sintonizar com o PAI, tomando parte em SUA GLÓRIA e PODER.
– É uma nova interpretação de Deus?... – perguntou ele duvidoso.
Isabel respondeu-lhe:
– É a interpretação de todos os GRANDES REVELADORES, pode estar certo. Se os homens, posteriormente, inventarem credos a seu modo e gosto, falando em Deus e nos Reveladores, e criando manobrismos clericais e formais que lhes dariam pomposas posições e rendosas oportunidades, isso não nos importa. Estamos falando como sabemos que é, para que saiba e faça algum esforço em benefício próprio. Foi a piedade cristã que nos moveu a este ato, não a vontade de pregar novas interpretações teológicas. Sabemos como as verdades de Deus querem que cumpramos com os nossos deveres, e, por isso mesmo, depois de retirar o espírito desse corpo que aí está, viemos para avisá-los. Lembrem-se de que o seu companheiro está morto, de que não mais lhes fornecerá fluidos e energias. O seu vampirismo terminou sobre esse companheiro de dores e de misérias, de amarguras e de angústias mortais.
Eles fitaram o morto, aterrorizados, sem dizer palavra. Aos poucos se avizinharam, para verem-no de perto. E quando julgaram mesmo a consumação do amigo, ou pelo menos do companheiro, tiveram forte abalo. Baixaram a cabeça e assim ficaram, tristes e compungidos, mudos e lagrimosos.
Isabel chamou-lhes a atenção:
– Seu amigo não está aí... Nós o levamos até à beira-mar, a fim de se recuperar e seguir o novo caminho...
– Novo caminho?!... – fez aquele que deu para estrilar anteriormente.
– Sim, novo caminho... É um espírito capaz de ter pensamentos diferentes, e o Bom Deus lhe facilitará acesso ao conhecimento do estado e dos deveres progressivos. Ele não tem melhores conhecimentos sobre Deus e nem sobre a boa religião; o que tem, no entanto, são alguns merecimentos a mais. Não procurou ser vagabundo e miserável; foi o Carma que lhe pesou nas costas espirituais, foi a expiação que lhe invadiu a vida. E não se fez incrédulo e nem maldoso... Não roubou para saciar a fome e nem para vestir o corpo... Pediu esmolas e continuou crente, confiante em Deus... No fim, agora mesmo, pois faz minutos que o retiramos do corpo, o que pretendia era morrer, deixar o mundo, acabar com o tremendo sofrimento...
Calados, não tinham sequer coragem para encará-la de frente. E Isabel lhes endereçou a palavra final:
– Irmãos, nós temos que ir... O slovaco, assim como vocês o tratam, está a nos reclamar as atenções. Fiquem por aí feito fantasmas miseráveis, já que nem ao menos podem ser homens miseráveis... Se algum dia quiserem melhorar, antes de que a Lei os obrigue, procurem um Centro Espírita e peçam aos guias o necessário.
Eles não disseram palavra; e nós fomos em busca do local onde havíamos deixado aquela fumaça branca e opaca. Lá chegando, vimos que ela se movimentava, tendo já o aspecto ou a forma anatômica parecida com o corpo humano. Isabel mandou-me por as mãos sobre a parte que se revelava a cabeça, dizendo:
– Chame por ele... Slovaco é como lhe apelidaram, por ser originário daquele País.
Passei a chamá-lo pelo apelido, indo ele se esforçando para me atender. E foi assim que surgiu o homem, a figura humana perfeita, daquela fumaça branca e opaca. Ao estar em condições de partir, conduzimo-lo ao local de tratamento, onde o pobre ficou, para dormir o seu sono reparador. Deixamo-lo, alegre e feliz, embora cansadíssimo e sonolento. Ele reconheceu o socorro celestial: estava contente.
Desde que desencarnei, depois de trabalhar longos anos e porfiadamente nas hostes mediúnicas, tenho meditado bastante sobre o tema essencial, que é a usina humana, a centelha divina, o homem transcendente.
Tendo tido no slovaco o meu primeiro caso a observar, de maneira transcendente ou historicamente espiritual, firmei base na certeza de que nunca encontraria um espírito grandes dificuldades a vencer, e nem tão pouco abismos a enfrentar, ou reencarnações dolorosas a viver, se quisesse de fato compreender e seguir a trilha ideal, a perfeita escola espiritual, aquela que ensina estar Deus nos fundamentos de tudo e de todos, e um Deus que exige apenas Sabedoria e Amor, tratos sociais decentes, nunca porém macaquices e simulacros, rótulos pomposos e falsas culturas, essa vastíssima fauna que ostenta a santidade postiça, uma vez que nada sabe e nada faz pela esfera íntima, pelo Reino do Céu que é interior, conforme os verdadeiros ensinos do Cristo.
Chamado, dias depois, para sondar o histórico daquele pobre slovaco, encontrei a mim e a outros, alguns tantos mais pobres ainda, porque muito mais errados, fartamente carregados de gravíssimas faltas, muito sangue derramado, perseguições e crueldades pelo curso de toda vida, e muitas tormentas pelas vidas a fora. Ao cabo de tudo, veio a palavra de quem nos instruía, afirmando:
– Aí tendes o que fizestes no passado pelo presente, e o presente como é em virtude do passado. Tendes a história da humanidade, pois que, tudo se resume em marchar do indivíduo para a coletividade, encontrando nesta soma dos erros ou dos acertos dos indivíduos em particular. Quem somos? Somos o passado, somos o presente e seremos o futuro. Como viremos a ser? Viremos a ser como nos fizermos. Qual o entendimento ideal?
E depois de breve silêncio, olhando grave e fraternalmente para nós todos:
– Ideal é o entendimento que reflete a sabedoria da Lei, do Amor e da Revelação. Ideal é cultivar as virtudes fundamentais, os valores da consciência e os poderes da inteligência. Aquele que se entrega a inventar e a cultivar aparências de culto religioso, macaquices comerciáveis, naturalmente se desvia do reto caminho da Sabedoria e do Amor. Descamba, então, para os erros, somando faltas sobre faltas, enviando seus irmãos às faltas e aos erros, cavando para si e para os outros agravos e tormentas, abismos trevosos e encarnações dolorosas.
Sem termos o que dizer, ficamos a espera de suas palavras sensatas, palavras de todo um simples, que refletiam a mais límpida e ferreteante realidade; e o instrutor convidou-nos, agora sorridente e objetivo ao máximo:
– Vamo-nos desta casa de sondagens maravilhosas, que o Reino do Céu é interior e aguarda de todos nós o trabalho desabrochante. Vamos procurar a melhor forma de servir, de ser socialmente decentes, a fim de podermos seguir a trilha dos Cristos, não com adulações repugnantes, não criando rituais e engodos com que engordar vaidades e empanturrar bolsos e estômagos, mas sim para realizar o Cristo interno, a exposição das Virtudes Divinas que jazem em nós mesmos em estado latente. Em outros mundos, outras humanidades cresceram em si mesmas, foram ao encontro da luz divina no templo interior; realizaram por isso a liberdade e se fizeram cheias de glória e poder, alçando-se muito acima das formas pagãs e ronceiras de culto, muito acima da pestilente sociologia do interesse subalterno e dos assanhamentos imediatistas que produzem a treva e a dor, as chagas da alma e as purulências dos corpos, quando em novas encarnações expiatórias.
Saímos e fomos em busca dos respectivos departamentos de trabalho; como todos estávamos formando na legião dos recursos entre os dois planos da Vida, fomos ter com o trabalho de enxugar as lágrimas, pensar feridas, consolar aflitos, amparar desencarnados sofredores, preparar novas encarnações a velhos devedores, etc. Fomos a luta pela exposição do Céu interno, mas trilhando agora a via de fato, a oficina redentora, sem pompas e sem títulos, sem rótulos pomposos e sem os galardões enganosos do mundo, extraindo merecimentos do emprego virtual do espírito, fazendo valer o cérebro e o coração na ação fraternal direta, sem pensar sequer nas invenções mentirosas, nos simulacros com que procuramos, naqueles dias de treva, encostar ao longe o Cristo e a graça por Ele trazida, a Revelação para toda carne, o instrumento que faz compreender a dignidade fundamental da Lei e a divinização final do Amor.
Como faltosos do passado, inventores de formalismos, ou por culpa daqueles que primam pela manutenção dos mesmos, em benefício de regalias mundanas, vivemos em estado de alerta e compunção. Não faltam aqueles que procuram o Reino do Céu, não escasseiam aqueles que sentem apego pelas verdades do espírito; o que falta são os recursos perfeitos, o que falta é abandonar a idolatria. O mundo está cheio dos que procuram o Deus de Verdade e de Justiça, Deus que é divinamente íntimo, que no íntimo deseja e quer ser encontrado; o Deus de todos os Grandes Reveladores, o Deus desejoso de união no templo íntimo, na consciência plena de cada filho. Mas, infelizmente, não é assim que os filhos vivem a procurar o Pai Divino, o FUNDAMENTO ESSENCIAL do Infinito e de todas as infinitas partículas. Procuram-No, é certo, mas pelos escaninhos do erro, sem ESPÍRITO e sem VERDADE, por meio de fantocharias inventadas por homens, através de salamaleques vendidos ou comprados, sempre em desacordo com os Mandamentos da Lei, sempre ou quase sempre resistindo à Revelação, à comunicabilidade dos anjos ou espíritos, por onde veio a mesma Lei. A Escritura diz muito bem:
“Porque não poderão jamais morrer; porquanto são iguais aos anjos, e são filhos de Deus, visto serem filhos da ressurreição.” – Lucas, cap. 20.
“Ora Deus não o é de mortos, mas de vivos, porque todos vivem para Deus.” – Lucas, cap. 20.
“Vós que recebestes a Lei por ministério dos anjos, e não a guardastes.” – Atos, cap. 7.
“Porque se a Lei, que foi anunciada pelos anjos, ficou firme, e toda a prevaricação e desobediência recebeu a justa retribuição que merecia...” – Hebreus, cap. 2.
Mais do que ninguém, temos a obrigação de lembrar a Revelação como sendo o Instrumento Divino de Informação e Consolo; tendo sido parte integrante da pior de todas as corrupções, lembramos com reverência a palavra do Senhor:
“Eu tenho ainda muitas coisas para vos dizer, mas vós não as podeis suportar agora. Quando vier porém aquele Espírito de Verdade, ele vos ensinará todas as verdades, porque ele não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e anunciar-vos-á as coisas que estão para vir.” – João, cap. 16.
Recebendo ordem, cumprindo deveres, fazemos a parte que nos toca, de direito e de obrigação. Poderemos estar quinhentos ou mil anos adiante do tempo em que viveis. Talvez até mais, pois a Religião Perfeita é para espíritos perfeitos, e , em verdade, ninguém irá realizar prodígios evolutivos. Casos de consciência, de caráter, não se modificam em cem anos, e nem mesmo em centenas, quando se transformam em coletivos, em problemas da Humanidade inteira. Todavia, custe mais ou custe menos, ou custe lá quanto custar, tereis que trilhar a senda justa, porque todos deveremos trilhá-la, à base de Lei, de Amor e de Revelação, para atingirmos a plenitude religiosa, a união perfeita, a adoração em ESPÍRITO e VERDADE.
Enquanto, porém, os retardatários forem ficando para trás, ou mesmo se entregando a erros e caindo em abismos, de onde não se levantarão sem pagar até o último ceitil, é certo que os vanguardeiros da VERDADE receberão segundo as suas obras. Como a escritura finda suas lições, assim findamos, remetendo nossos leitores ao capítulo final do Apocalipse. Todos encontrarão ali o que aprender, porque ali estão o Cordeiro, a Esposa e o Espírito: ou o Messias, Sua Igreja Viva e a Revelação, testemunhando a verdade que livra e advertindo contra as corrupções.
Se as nossas palavras vos parecem exigentes; se os nossos conceitos vos acutilarem os vícios idólatras, a culpa não nos cabe. Nosso intento foi transmitir a mensagem certa e necessária, justa e oportuna. Há quase dois mil anos disse-nos o Cordeiro de Deus, que muitas coisas tinha para nos dizer, coisas que ficariam a cargo do Consolador i-las anunciando. Quem vos transmite a mensagem, através do Consolador reposto no lugar, é em verdade a voz da própria experiência. Convém ouvir, portanto, aquilo que naqueles dias o Messias não pode anunciar. O benefício será, bem o sabeis, para aqueles que se fizerem adoradores de Deus em ESPÍRITO e VERDADE. Porque estes não acompanharão idolatrias e nem simulações, não amarão mais as coisas do mundo e dos homens, deixando de lado as de Deus. Não farão a obra da traição, incutindo práticas que redundarão em trevas e dores. Serão, em face do mundo, exemplos do Caminho do Senhor.
FIM
“Mas recebereis a virtude do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e me sereis testemunhas em Jerusalém, e em toda a Judéia e Samaria, e até as extremidades da Terra.” – Atos, cap.1.
Aquilo que foi arrolado, como documentação textuária, no livro, A BÍBLIA DOS ESPÍRITAS, foi para dar informes sobre a Revelação, o Profetismo ou Mediunismo; e como é sabido que antes de Jesus Cristo tudo era em caráter fechado, oculto ou esotérico, sabido é, conseqüentemente, que do Cristo em diante a Revelação, o Profetismo ou Mediunismo, deve ser o veiculador da Excelsa Doutrina.
Tudo aquilo que pode ser lido no Livro dos Atos, capítulos um, dois, sete, dez e dezenove sobre a comunicação dos anjos, espíritos ou almas, corresponde ao que se encontra prometido nos profetas e nos capítulos quatorze, quinze e dezesseis, de João, quando trata do Consolador ou Batismo de Espírito.
Tudo aquilo que está contido nos capítulos doze, treze e quatorze, da Primeira Epístola de Paulo aos Coríntios, sobre as mediunidades e as sessões, tal como as faziam os Apóstolos, corresponde a ser, de portas abertas (sem ocultismo ou esoterismo) a prática do Revelacionismo, do Profetismo ou Mediunismo.
O Espiritismo é o Profetismo exercitado nas bases da Lei de Deus; a Moral, o Amor, a Revelação, o Saber e a Virtude esplendem na Codificação, no trabalho de Elias.
Não disse Jesus que Elias, quando viesse de novo, restauraria todas as coisas? Ou que reporia as coisas no lugar?
De qualquer modo ou forma o Profetismo reclama o direito de ser a Matriz de todas as Revelações; e quem desejar estudar a vida dos Grandes Reveladores, por certo que encontrará o fenômeno mediúnico nas bases da obra levada a termo.
Jesus foi anunciado pelos anjos, espíritos ou almas, desde trinta e seis séculos antes de nascer; Jesus foi na hora precisa, anunciado pelo espírito chamado Gabriel; Jesus tinha os anjos, espíritos ou almas subindo e descendo sobre Sua cabeça; Jesus foi com três apóstolos, falar com Moisés e Elias no alto do monte Tabor; Jesus, depois de crucificado, por onze anos manteve contato com os apóstolos guiando-os.
Apresentando agora, um roteiro das Sessões de Irradiação, desejamos as bênçãos do Senhor a todos; aqueles que forem sinceros cultivadores do Profetismo, terão o amparo dos Amigos Sublimes, porque a Palavra de Jesus é impassável.
Nós Te rogamos, Pai de Infinita Bondade e Justiça, as graças de Jesus Cristo, através de Bezerra de Menezes e suas legiões de companheiros. Que eles nos assistam, Senhor, consolando os aflitos, curando aqueles que se tornem merecedores, confortando aqueles que tiverem suas provas e expiações a passar, esclarecendo aos que desejarem conhecer a Verdade e assistindo a todos quantos apelam ao Teu Infinito Amor.
Jesus, Divino Portador da Graça e da Verdade, estende Tuas mãos dadivosas em socorro daqueles que Te reconhecem o Despenseiro Fiel e Prudente; faze-o, Divino Modelo, através de Tuas legiões consoladoras, de Teus Santos Espíritos, a fim de que a Fé se eleve, a Esperança aumente, a Bondade se expanda e o Amor triunfe sobre todas as coisas.
Bezerra de Menezes, Apóstolo do Bem e da Paz, amigo dos humildes e dos enfermos, movimenta as tuas falanges amigas em benefício daqueles que sofrem, sejam males físicos ou espirituais. Santos Espíritos, dignos obreiros do Senhor, derramai as graças e as curas sobre a humanidade sofredora, a fim de que as criaturas se tornem amigas da Paz e do Conhecimento, da Harmonia e do Perdão, semeando pelo mundo os Divinos Exemplos de Jesus Cristo.
1- Procure freqüentar sessões de irradiação e curas espirituais onde seja utilizada a operosa Falange de Bezerra de Menezes; porque ela auxilia em tudo e faz operações espirituais, quando a pessoa chega a merecer.
2- Tome água dez ou mais vezes ao dia, três ou quatro goles por vez, esteja onde estiver, pensando assim: “Tomo esta água, graças a Deus, para ter Saúde e Paz”; porque a água pode ser fluída a qualquer hora.
3- Que o precisado, ou alguém por ele, freqüente assiduamente as sessões de irradiação; porque para tudo há necessidade de cooperação.
4- Horas de concentração: 6, 12, 18 e 21 horas; porém às 21 horas é preferível, porque muitos milhares de pessoas a fazem.
5- Procure merecer a atenção das Falanges de Bezerra de Menezes, purificando o seu íntimo: evite os vícios, as palavras ruins, o orgulho, o egoísmo, a mentira, o ciúme, a inveja, a calúnia, a idolatria, as simulações e tudo quanto seja contra os Dez Mandamentos da Lei.
6- Só a Verdade terá por Religião! A Lei dá testemunho da Moral, do Amor e da Revelação, sem falar em religiosismos; e o Cristo veio para exemplificá-la, não para derrogá-la.
7- Dê para receber! Auxilie as organizações espíritas de caridade, isto é muito importante, porque a caridade enobrece o espírito e equilibra o organismo.
1- Uma prece de abertura, lida ou de improviso, por alguém indicado pelo presidente da sessão;
2- Uma pregação, porque a sessão é de passes, curas e irradiações, terá o devido caráter evangélico para exaltar o teor vibratório;
3- Comunicação dos Guias, feita brevemente. Convém lembrar que o trabalho dos Guias, sempre deve ser após a apresentação dos mesmos pelos médiuns. Isto imprime um caráter de confiança nos presentes, principalmente nos que precisam dos trabalhos dos Guias;
4- Uma breve oportunidade aos videntes, para relatos sobre o visto; sobre o preparo do ambiente espiritual; também, com isto, se preparam bem os médiuns;
5- Irradiação, com a Oração a Bezerra de Menezes, que deve ser feita com o máximo de atenção;
6- Pedir pelos que têm seus nomes nos papéis que estão sobre a mesa e nos livros de orações; não é preciso ler os nomes, porque os guias usam os duplos etéricos dos mesmos. Importa é dar oportunidade aos videntes, porque isto eleva a confiança dos precisados, pelas narrativas;
7- Pedir pelos doentes presentes, também dando alguns minutos para os devidos trabalhos dos Guias; que os videntes falem, também, para que saibam os precisados que estão sendo atendidos;
8- Pedir pelos espíritos sofredores; também conferir aos videntes a oportunidade de falar, pois o que ocorre é instrutivo para todos.
9- Orar pela paz mundial;
10- Orar pelas Falanges da Verdade ou Espírito da Verdade, rogando que estenda sobre a terra o conhecimento da Verdade que livra;
11- Mentalizar o Cristo Planetário, agradecendo por tudo, procurando realizar o máximo em matéria de sintonia vibratória. Nestas alturas o mundo espiritual está esplendente de Luz e Glória, nem sempre sendo possível aos videntes relatarem o visto; os mais elevados mentores têm oportunidade de achego, porque o padrão mental está muito elevado;
12- Mentalizar o Pai Divino, o Sagrado Princípio que é Onipresente, Onisciente e Onipotente; lembrar que Deus não está no Céu, mas que é o Céu e está no imo de tudo e de todos, razão porque cada um deve com Ele falar no Templo da Consciência. Coisas divinamente gloriosas podem ser vistas pelos videntes, nesta fase do trabalho mediúnico. A seguir, encerrar.
N.B. – Tudo feito no claro. Basta de trevas!
A Crística é a Oração do homem inteligente e amoroso; daquele que, consoante as palavras de Jesus Cristo, procura amar a Deus de toda a inteligência e com toda a força do coração. Nenhuma Oração jamais escrita lhe igualou o poder de penetração vibratória; ela remete o seu leitor aos Princípios Fundamentais, no seio dos quais tudo é e fora dos quais nada poderá ser. A essência da verdade se expressa através dela absolutamente, tal como homem algum poderá definir ainda; e o espírito doutrinário que vaza, jamais poderá ser alterado por homem algum. Ela é uma exposição intelectual das verdades que em Deus são Eternas, Perfeitas e Imutáveis.
CRÍSTICA
Sagrado Princípio do Universo, que em Ti mesmo crias, sustentas e dás destino. Senhor das virtudes, das leis, das vidas e dos infindos mundos. Sagrada Causa Primária, onde tudo é, movimenta e atinge a Sagrada Finalidade.
Pai Divino, Tu que és o nosso Alicerce, o nosso Esteio, a nossa Luz e a nossa Glória; guia nossos passos, Senhor, para que a Tua Lei seja o nosso Caminho, para que o Teu Amor seja o nosso Pão Eterno, para que a Tua Graça constitua a nossa Consolação Imperecível.
Senhor Deus, que nos enviaste a Jesus, o Cristo Planetário, a fim de nos Batizar em Revelação; estende, Senhor, a Revelação aos infindos mundos e humanidades, porque ela é a Tua Palavra.
Pai Santo, enche o Universo de Servos e Profetas, para que todos saibam das leis fundamentais de Essência, Existência, Movimento, Imortalidade, Evolução, Responsabilidade, Reencarnação, Revelação, Habitação Cósmica e Sagrada Finalidade.
Senhor do Infinito, faze que todos saibam de Tua Lei, onde esplendem a Moral que harmoniza e dignifica; o Amor que sublima e diviniza; a Revelação que adverte, ilustra e consola; a Sabedoria que confere autoridade; e a Virtude que sintetiza a união com a Tua Divina Vontade.
Princípio Sem Fim do Cosmo, dá-nos o Conhecimento, para que Te adoremos em Espírito e Verdade, assim como Tu és e queres que Teus filhos venham a ser.
Afasta-nos, ó Pai Divino, de qualquer idolatria!
Livra-nos, ó Deus, de qualquer tentação!
Liberta-nos, ó Amor, de toda e qualquer iniqüidade!
Pai Nosso, que és o Céu e está no imo de tudo e de todos, suspende nossas almas ao Teu Reino de Luz, Glória e Poder. Atrai-nos, Senhor, a esse Reino de Amor, Verdade e Justiça, que embora estando no seio dos mundos, das formas e das transições, é entretanto acima de mundos, formas e transições!
Pai de Justiça e de Verdade, dá-nos a Consciência da Unidade, para que façamos de nossa vontade a Tua Vontade, de nosso amor o Teu Amor, de nossa vida a razão de ser de Teus santos desígnios. E que assim sendo, ó Pai Divino, venhamos a transformar a Terra na Jerusalém Eterna, onde não haverá mais trevas e nem dores.
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