Capítulo
XI
Já
foi dito que, se não fosse a reencarnação, a Justiça Divina seria
tudo, menos Justiça Divina. E ao se chegar ao mundo espiritual,
observando como os quadros se invertem, na carne e fora dela,
chegamos a não entender como, pressionados pelos interesses de
grupos, ou mesmo pelos fanatismos sectários, as pessoas chegam a
negar e até a se revoltar contra a lei que é o testemunho da
Justiça Divina. E se parecer a alguém que a simples crença em um
religiosismo é quem obriga a assim pensar e sentir, diremos que isso
não se justifica, porque para milhares de outros fatores, todas as
criaturas vivem mudando de opinião a todas as horas. Também é bom
lembrar o seguinte: as pessoas permutam condições e situações,
costumes e alimentos, amizades e afazeres, e tudo quanto seja
conveniente à vida física, mas ao se tratar de conceitos ditos
religiosos, ou sectários, assim não procedem porque a opinião
pública e a dos parentes, em particular, ficariam chocadas ou
matracando a língua. E mais uma vez diremos que, ao ceder à
ignorância, à covardia e à hipocrisia, o homem cede aos infernos o
direito de manobrá-lo.
Estas
considerações fizemo-las, estando na biblioteca a confrontar os
textos do Evangelho Segundo João Evangelista, onde as alterações
são muito grandes, principalmente onde são, ou eram feitas,
afirmações no sentido de que o Cristianismo teria que ser a
generalização do Profetismo Hebreu, ou a recuperação do Povo
Hebreu, das ovelhas desgarradas, pela Revelação ostensiva, assim
como a desejara Moisés, ou como dizem muitas vezes os Profetas, de
um Espírito derramado sobre toda a carne, que um dia viria a ser
realidade. Naquela hora chegou Celestino e perguntou-me:
– Quer
ir à crosta, em função de aprendizados?
– E
isso é convite que se dispense?! – retruquei, comovido.
Celestino
abanou a cabeça, para dizer:
– Bem...
Você já sabe que temos por aqui muita gente que só vive para
querer engordar as burrices trazidas do mundo... Tinham os seus
credos e, por eles, ainda acham que a Verdade pode muito bem esperar
por outros tempos...
Eu,
que tinha o Manuscrito de João na mão, sabendo quanta coisa errada
haviam cometido em seu nome, murmurei com tristeza:
– Sim,
meu bom irmão!... Que a Verdade espere, porque o mundo ainda é dos
errados e mentirosos... A Verdade é apenas o rótulo, para que a
mentira possa ser bem vendida!...
Celestino
apanhou-me pela mão, enquanto dizia:
– Deixe
estar, que na hora exata fará um pouco, do muito que há por fazer,
a bem do esclarecimento das gentes...
E
fomos dali, constituir um grupo de dez, para viajar à crosta. Na
hora da partida, Celestino falou-nos:
– Vamos
a uma residência muito pobrezinha, atender a um rogo materno. Ali
veremos como irão agir os nossos irmãos médicos e outros
servidores. Nada mais posso dizer, porque nada sei, por ora, do que
irá ocorrer e como.
Fizemos
a viagem repentina, planando numa faixa vibratória acima de
escuridões e sofrimentos, porque Celestino assim disse que convinha
ser feito. E quando alguém que pode, comanda, isso tudo é fácil.
Já
na residência, observamos um lar muito pobrezinho, porém bem
assistido pelo plano espiritual superior. Superior, fica bem
lembrado, pois o mundo espiritual sempre é presente, mas cumpre
saber definir a qualidade. A chave da questão está com os
encarnados, e podemos afiançar que bem poucas vezes usam bem de seus
direitos, pois abrem mais para a entrada dos elementos menos
convenientes. Nem é de estranhar que assim seja, em um mundo
infantil e cheio de erros, onde os desencarnados de baixo padrão
encontram todas as facilidades de acesso.
A
família era constituída de oito pessoas, contando com um sobrinho.
Este, por tornar-se órfão, foi aceito pelos tios, e era o pivô de
uma trama que se estendia para os dias em que um Bórgia estava no
trono pontifício. E foi Celestino ao médico-chefe, rogando sua
atenção, em virtude dos aprendizes presentes. O médico falou a
todos, dizendo:
– É
impossível, aqui no plano espiritual, encarar as doenças de fora
para dentro. Temos de encará-las de dentro para fora, ou a começar
das coroas energéticas, depois entrando no perispírito ou no corpo
dos espíritos. Como vocês já devem saber, os corpos variam ao
infinito, em suas densidades ou intensidades vibracionais, quando se
trata de espíritos desencarnados. E ao se tratar de encarnados, tudo
aumenta de importância, porque o corpo físico é como um agregado
muito denso que o espírito deve, por algum tempo, arrastar e
suportar, para fazer dele uma verdadeira ferramenta de emancipação.
Apontou
para o jovem, o sobrinho da família, que rastejava pelo chão, por
ser aleijado, dizendo:
– Vejam
como a Lei de Justiça age, meus irmãos. Todos aqui são portadores
de doenças, ou têm órgãos afetados. Mas este jovem aleijado é
forte de físico, é um depósito de saúde. Se não fosse o
aleijume, como podem observar, seria perfeito fisicamente.
E
chamando para perto os componentes do grupo de aprendizes, mandou que
todos olhassem para a cabeça do rapaz, enquanto foi elucidando:
– Pensem
fortemente no Pai Divino, em Sua Justiça Absoluta, e vão olhando
para a cabeça do rapaz. Procurem ver o que há dentro dela, para
além do físico e, até muito mais além, para além do perispírito.
Se puderem, olhem para as coroas energéticas que circundam a
centelha espiritual.
Fez
uma pausa, observou a todos e depois perguntou, um por um, sobre o
que tinha visto. Ficamos sabendo que nem todos viram na mesma
proporção, pois enquanto uns viram apenas algumas marcas no
perispírito, outros viram os feios coloridos das coroas energéticas,
enquanto outros puderam ver até mesmo os quadros de vidas
anteriores, onde o pobre irmão mandara cometer horrendos crimes,
além de cenas as mais devassas, tudo numa sucessão de quadros
vivos, como se fossem presentes. E o médico concluiu, aconselhando:
– Em
princípio, toda falha é de ordem Moral, começa na responsabilidade
da centelha. Com isso, mancha negativamente as coroas que a
circundam, com os variantes matizes de cores negativas, além de
comprimir ou contrair as coroas. Depois disso, afeta os elementos
mais eterizados do perispírito, subindo lentamente aos mais
grosseiros, para, no encarnado, atingir os elementos constituintes do
corpo físico, os gases, vapores, líquidos e sólidos. Como o corpo
físico relaciona o espírito com o mundo exterior, uma vez estando
adoecido ou atrofiado por culpa dele mesmo, o espírito, é evidente
que dificulta os melhores contatos, que complica as situações, pois
não lhe permite render o máximo. E assim o espírito pena as suas
mesmas faltas, isto é, tem que colher segundo as semeaduras feitas
anteriormente. Não percam de vista, portanto, que os mundos
materiais rolam no Infinito e perduram na Eternidade, mas o espírito
é tudo, deve ganhar amplidões vibratórias incomensuráveis, e isso
movimentando seus recursos íntimos, a Verdade, o Amor e a Virtude
que em potencial o Pai Divino lhe concedeu, desde a origem comum a
todos. Lembrem-se – repisou ele – que somos, em princípio, acima
de mundos, formas e transições, somos os senhores e não os
escravos da matéria, e isso teremos que provar a nós mesmos, com
fatos e não com teorias religiosistas, para virmos a gozar, de fato,
as Glórias e os Poderes de Deus, o nosso Pai Divino.
E
dispunha-se a partir, mas aguardou a palavra de um antigo clérigo,
que com muito interesse indagou:
– Então,
irmão Bezerra, teremos que mudar quase tudo nos cursos religiosos,
uma vez que o problema não é ser apenas um espírito de Paz, ao
morrer o corpo físico, mas sim ter pela frente todo o processo de
autocristificação?
O
luminoso médico, muito mais médico do espírito do que do corpo,
repetiu:
– As
teorias religiosistas de salvação valeram para os primórdios
evolutivos e valem para aqueles indivíduos ainda nessas paragens
inferiores do campo hierárquico. Entretanto, como a humanidade
terrestre está passando da fase juvenil para a fase madura, importa
saber mais e praticar de acordo com a nova realidade; isto é, que
assim parece aos terrestres, pois na Ordem Divina tudo é eterno,
perfeito e imutável, e, aquilo que as crianças da Terra julgam ser
muito importante e complicado, já é verdadezinha comum para as
humanidades de mundos superiores. O que ocorre, agora, na hora de
transição mais importante da história terrestre, é o choque entre
os velhos conceitos e os conceitos novos. Todos os ranços, todas as
ferrugens, tudo quanto é cronicamente retardado ou atrasado, lança
seus ímpetos rebeldes contra os ensinamentos mais adiantados, reais
e necessários.
O
antigo pastor protestante murmurou:
– E
não deixa de haver alguma razão, para os retardados, em vista do
que dizem as Escrituras...
O
médico, entre bondoso e grave, advertiu:
– A
Escritura afirma, pela boca do Divino Molde, que muitas verdades
ficaram para serem ditas nos devidos tempos... Logo, ninguém ficou
autorizado a dogmatizar em contrário, em benefício dos seus
medíocres interesses sectários. Quem quiser ter onde assentar o seu
fanatismo religiosista, não o faça em nome da Verdade, do Amor e da
Virtude, porque virá a sofrer a inevitável derrota, mais cedo ou
mais tarde. A ordem, na hora em que são terminados os trabalhos de
Restauração da Doutrina do Caminho da Verdade que Livra, é mudar
no rumo da Pureza e da Sabedoria, sempre que seja possível, com os
credos, sem os credos ou contra os credos, se assim for necessário.
Lembrem-se, irmãos, que o Divino Molde foi perseguido, aprisionado,
falsamente julgado e martirizado, pelos donos do credo levita, que se
acreditavam proprietários particulares da Verdade. Lembrem-se bem,
ainda mais de que todos aqueles que se fanatizam por homens e livros
tornam-se algozes de si mesmos, tornando-se inimigos da Verdade.
O
antigo pastor ficou atônito, e com doçura o médico falou, ao
despedir-se:
– Faça
como Jesus ensinou, tomando a cruz dos próprios deveres evolutivos,
lembrando-se de que Ele não recorreu a expedientes ilusórios. E
para assim fazer, procure sujeitar os interesses sectários às
Verdades Divinas, em lugar de querer em contrário, como o fazem os
religiosismos terrestres. Lembre-se dos Fatos de Deus, em lugar de
andar lendo como regras absolutas, os conceitos de homens que, embora
bem intencionados, disseram e dizem, através das Escrituras, coisas
que não representam verdades absolutas. Saiba que muitos dos que
escreveram de um modo, nos longínquos dias, tiveram que voltar à
arena do mundo, para dizer de modo diferente, para tratar da Verdade
com outros quilates interpretativos. E se quiser ser mais prudente,
lembre-se dos infindos mundos e das infindas humanidades, pois Deus
não é Pai Divino de uns e padrasto de outros.
– Isto
é maravilhoso!... – exclamou alguém do grupo.
E o
médico, já subindo, acrescentou:
– Os
homens inferiores, de diferentes mundos, continentes, países, raças
e povos, dividem-se e brigam por suas diversas mesquinharias, mas
terão que responder, queiram ou não, perante Uma Única Justiça
Divina!
Já
em certa altura, perdeu a personagem de Bezerra, porque
transformou-se no Apóstolo que fora médico e pintor. Nós ficamos
rente ao chão, a meditar, reconhecendo que ele sabia muito mais, da
Doutrina da Verdade e do Cristo Modelo, do que sabem, pensam e fazem,
os fanáticos das igrejinhas terrenas.
Os
outros médicos fizeram trabalhos, com instrumentos e elementos
astrais, nos respectivos corpos astrais dos encarnados precisantes. E
quando chegou a hora de rumar aos nossos respectivos lugares e
afazeres, Celestino fez um breve comentário e agradeceu a Deus e a
Jesus Cristo, os aprendizados do momento.
– Sabia
– perguntou-lhe alguém – que viria encontrar aqui o Apóstolo do
coração e da mulher?...
Celestino
respondeu, de pronto:
– Eu
não sabia, mas estou sempre pronto a receber as bênçãos de Deus,
que chegam através de Seus filhos maiores. E mais ainda, pois vivo
sentindo a presença de Deus, a Essência que emana, sustenta e
destina, acima e fora de manias sectárias. Os sectarismos são armas
boas para os exploradores da fé cega, mas jamais para os servidores
da Verdade, do Amor e da Virtude.
E
ali terminou a jornada, pois sempre havia, para depois de tais
aprendizados um longo período meditativo, um tempo oferecido pela
Administração, para que os aprendizes pudessem raciocinar à
vontade, para irem mudando de opinião.
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